Opinião
- 07 de abril de 2015
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Maioridade penal
Vou logo avisando: sou contra a redução da maioridade penal. E aviso mais: meu posicionamento não tem nada a ver com o fato de eu ser de esquerda, pois não sou; também não se justifica por eu acreditar que um adolescente de 16 anos que assalta e mata não sabe o que está fazendo, pois é óbvio que sabe; e muito menos porque sou cristão e pastor evangélico, pois reconheço não apenas o direito como também a inteligência de tantos outros cristãos que defendem com bons argumentos opiniões contrárias à minha.
Sou contra a redução da maioridade penal porque não acredito que tal decisão implicará a redução da criminalidade e da violência em nosso país - argumento que sustento com estatísticas e experiências de países que escolheram o caminho de julgar seus adolescentes e jovens nos mesmos parâmetros que julgam criminosos adultos. As sociedades que impuseram leis mais severas contra os menores de 18 anos – como Nova York, Mississipi e Wiscosin, EUA, 16, 13 e 10 anos respectivamente, viram o número de menores em penintenciárias aumentar 230% no período de 1990 a 2010, conforme o departamento governamental norte-americano Centers for Disease Control and Prevention.
Sou contra a redução da maioridade penal porque o sistema carcerário brasileiro e suas peninteciárias são sofisticadas e cruéis escolas de crimes. A possibilidade de um adolescente penalizado nos termos de criminosos adultos voltar ao crime é 35% maior, de acordo com a revista The Economist em sua última edição. No Brasil, “entre os criminosos adultos a reincidência no crime chega a 70%. No sistema destinado aos adolescentes gira em torno de 20%. No Estado de São Paulo está próxima de 13%”, informa o Deputado Carlos Bezerra Jr. em entrevista ao blog de Roldão Arruda. A aprovação da PEC 171/93, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos “vai criar um curso profissionalizante de reincidência criminal”, diz o Deputado.
O psiquiatra Daniel Martins de Barros, no artigo “Para que serve alterar a maioridade penal”, publicado no blog que assina no Estadão, observa que a redução da maioridade penal “não cumpre a maioria das funções da pena. Em primeiro lugar, o sistema carcerário não reeduca; além disso, como a porcentagem de crimes cometidas por menores de idade no Brasil é ínfima (99,5% dos crimes são cometidos por adultos), ela também não previne”.
Sou contra a redução da maioridade penal porque descer a régua da imputabilidade para 16 anos acarreta descer também a régua do recrutamento do crime organizado para 15, 14 anos ou menos. Ninguém desconhece o fato de que criminosos adultos aliciam menores para crimes de violência justamente porque os menores recebem julgamento diferenciado. Os criminosos adultos usam adolescentes e jovens como escudos para si mesmos. A redução da maioridade penal, além de não evitar que crianças sejam usadas, resultará que sejam usadas em idade ainda mais tenra.
Sou contra a redução da maioridade penal porque sou a favor de um monumental esforço sistêmico de resgate de milhares de jovens e adolescentes brasileiros, principalmente das futuras gerações, cujos horizontes de possibilidades e oportunidades se limitam à sobrevivência indigna. Em anos passados o número de crianças nascidas em condição de miséria que morriam antes de completar 1 ano de idade era de 127 para cada 1.000. Com providências como a utilização do soro caseiro, campanhas de estímulo ao aleitamento materno, programas pré-natal, suplementação alimentar para gestantes, essas crianças passaram a ter expectativa de vida próxima a 5 anos. Com a introdução da merenda escolar, a idade subiu para 12 anos. Mas depois dos 12 anos, os filhos da miséria (perdoem-me, crianças, pelo pecado da adjetivação) se tornam um problema social com poucas possibilidades de solução. A pena de morte parece uma das mais usuais.
Visitei recentemente os Meninos de Deus. O projeto teve início no ano de 2006, quando a Visão Mundial identificou 76 jovens engajados no crime e praticantes de pequenos delitos numa das comunidades mais pobres da cidade de Fortaleza. Dois anos depois, 46 dels haviam sido assassinados. O panorama social brasileiro coloca adolescentes e jovens cada vez mais cedo na bifurcação que tem para um lado a família-escola-profissionalização-cidadania plena, e para outro lado a rota dos pequenos delitos-crime-encarceramento ou morte. A diminuição da maioridade penal não é uma resposta a essa trágica condição de centenas de milhares de nossos filhos brasileiros.
Sou contra a redução da maioridade penal porque não confundo justiça com vingança. Não sou adepto da filosofia “olho por olho, dente por dente” nem mesmo para criminosos adultos, quanto mais para adolescentes e jovens. “Não precisa ser grande criminalista para saber que é mais fácil recuperar para o convívio social infratores mais jovens”, diz Drauzio Varella em sua coluna na Folha Ilustrada. “Marginais de longa carreira têm a vida tão estruturada no crime que eles dificilmente se adaptam ao convívio com a sociedade que os rejeita”, conclui.
É abominável a crença de que “bandido bom é bandido morto”, ou preso. A opção da reeducação e ressocialização dos jovens e adolescentes me parece mais adequada do que a penalização. Pagar o mal com o mal é justiçamento. Oferecer a possibilidade de voltar ao caminho da vida é prática da justiça.
• Ed René Kivitz é pastor da Igreja Batista de Água Branca, em São Paulo. É mestre em ciências da religião e autor de, entre outros, O Livro Mais Mal-Humorado da Bíblia.
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Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Sou contra a redução da maioridade penal porque não acredito que tal decisão implicará a redução da criminalidade e da violência em nosso país - argumento que sustento com estatísticas e experiências de países que escolheram o caminho de julgar seus adolescentes e jovens nos mesmos parâmetros que julgam criminosos adultos. As sociedades que impuseram leis mais severas contra os menores de 18 anos – como Nova York, Mississipi e Wiscosin, EUA, 16, 13 e 10 anos respectivamente, viram o número de menores em penintenciárias aumentar 230% no período de 1990 a 2010, conforme o departamento governamental norte-americano Centers for Disease Control and Prevention.
Sou contra a redução da maioridade penal porque o sistema carcerário brasileiro e suas peninteciárias são sofisticadas e cruéis escolas de crimes. A possibilidade de um adolescente penalizado nos termos de criminosos adultos voltar ao crime é 35% maior, de acordo com a revista The Economist em sua última edição. No Brasil, “entre os criminosos adultos a reincidência no crime chega a 70%. No sistema destinado aos adolescentes gira em torno de 20%. No Estado de São Paulo está próxima de 13%”, informa o Deputado Carlos Bezerra Jr. em entrevista ao blog de Roldão Arruda. A aprovação da PEC 171/93, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos “vai criar um curso profissionalizante de reincidência criminal”, diz o Deputado.
O psiquiatra Daniel Martins de Barros, no artigo “Para que serve alterar a maioridade penal”, publicado no blog que assina no Estadão, observa que a redução da maioridade penal “não cumpre a maioria das funções da pena. Em primeiro lugar, o sistema carcerário não reeduca; além disso, como a porcentagem de crimes cometidas por menores de idade no Brasil é ínfima (99,5% dos crimes são cometidos por adultos), ela também não previne”.
Sou contra a redução da maioridade penal porque descer a régua da imputabilidade para 16 anos acarreta descer também a régua do recrutamento do crime organizado para 15, 14 anos ou menos. Ninguém desconhece o fato de que criminosos adultos aliciam menores para crimes de violência justamente porque os menores recebem julgamento diferenciado. Os criminosos adultos usam adolescentes e jovens como escudos para si mesmos. A redução da maioridade penal, além de não evitar que crianças sejam usadas, resultará que sejam usadas em idade ainda mais tenra.
Sou contra a redução da maioridade penal porque sou a favor de um monumental esforço sistêmico de resgate de milhares de jovens e adolescentes brasileiros, principalmente das futuras gerações, cujos horizontes de possibilidades e oportunidades se limitam à sobrevivência indigna. Em anos passados o número de crianças nascidas em condição de miséria que morriam antes de completar 1 ano de idade era de 127 para cada 1.000. Com providências como a utilização do soro caseiro, campanhas de estímulo ao aleitamento materno, programas pré-natal, suplementação alimentar para gestantes, essas crianças passaram a ter expectativa de vida próxima a 5 anos. Com a introdução da merenda escolar, a idade subiu para 12 anos. Mas depois dos 12 anos, os filhos da miséria (perdoem-me, crianças, pelo pecado da adjetivação) se tornam um problema social com poucas possibilidades de solução. A pena de morte parece uma das mais usuais.
Visitei recentemente os Meninos de Deus. O projeto teve início no ano de 2006, quando a Visão Mundial identificou 76 jovens engajados no crime e praticantes de pequenos delitos numa das comunidades mais pobres da cidade de Fortaleza. Dois anos depois, 46 dels haviam sido assassinados. O panorama social brasileiro coloca adolescentes e jovens cada vez mais cedo na bifurcação que tem para um lado a família-escola-profissionalização-cidadania plena, e para outro lado a rota dos pequenos delitos-crime-encarceramento ou morte. A diminuição da maioridade penal não é uma resposta a essa trágica condição de centenas de milhares de nossos filhos brasileiros.
Sou contra a redução da maioridade penal porque não confundo justiça com vingança. Não sou adepto da filosofia “olho por olho, dente por dente” nem mesmo para criminosos adultos, quanto mais para adolescentes e jovens. “Não precisa ser grande criminalista para saber que é mais fácil recuperar para o convívio social infratores mais jovens”, diz Drauzio Varella em sua coluna na Folha Ilustrada. “Marginais de longa carreira têm a vida tão estruturada no crime que eles dificilmente se adaptam ao convívio com a sociedade que os rejeita”, conclui.
É abominável a crença de que “bandido bom é bandido morto”, ou preso. A opção da reeducação e ressocialização dos jovens e adolescentes me parece mais adequada do que a penalização. Pagar o mal com o mal é justiçamento. Oferecer a possibilidade de voltar ao caminho da vida é prática da justiça.
• Ed René Kivitz é pastor da Igreja Batista de Água Branca, em São Paulo. É mestre em ciências da religião e autor de, entre outros, O Livro Mais Mal-Humorado da Bíblia.
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