O noticiário está alvoroçado. Muitos temas efervescentes, entre eles, especulações quanto ao novo Papa, morte de Hugo Chávez e futuro da Venezuela, além de outros tanto, sobretudo do nosso próprio quintal brasileiro.
Há dias as manchetes quase se repetem, temas se arrastam, e as discussões e indagações se ampliam, contudo, chega o dia 08 de março, tido como Dia Internacional da Mulher. Não se pode ignorar, não seria politicamente correto, então, empurrados pela obrigação, quase à força, abre-se espremidos espaços para se abordar o tema. Há real necessidade?
Opiniões divergem-se, resgates históricos se dão, tons de vozes e cinzas são jogados, solicitados, e a questão da mulher e sua construção como sujeito através de lutas pela igualdade, requer memória histórica e ponderações a respeito do contexto social. “Mas o circo precisa mesmo ser montado?”, é a pergunta de alguns inquietos que acreditam, apesar de não assumirem, que há questões outras prioritárias. O próprio Alain Touraine, sociólogo renomado, foi e ainda é criticado pela importância insistente e excessiva, na opinião de muitos, a respeito da consciência feminina e tanto estudo voltado para isso. “Por que escolher as mulheres como figuras centrais de nossa sociedade quando as desigualdades crescem, a violência se intensifica em nível internacional e exércitos e terroristas se enfrentam?”. Ao que ele responde: “As mulheres hoje, têm mais capacidade do que os homens de se portar como sujeitos. E isso porque elas carregam consigo o ideal histórico de recompor o mundo e de superar os dualismo antigos, e porque assumem mais diretamente a responsabilidade com seu corpo, com seu papel de criadoras da vida, com a própria sexualidade”. E completa: “Nós vivemos um longo período no qual os homens geraram a historicidade e criaram uma consciência de si. Agora, depois de várias décadas e por uma duração indeterminada e talvez sem um acaso previsível, entramos numa sociedade e experimentamos caminhos individuais cujo sentido está mais nas mãos, na cabeça e no sexo das mulheres do que nas mãos, na cabeça e no sexo dos homens” .
Tratar do tema significa falar sobre questões fortes e delicadas, tais como, violência doméstica, abuso sexual, mercado de trabalho, maternidade no contexto do século XXI, etc. Dia 08 de março é dia onde se pode ler, ouvir e assistir vários debates, ponderações sobre o mundo das mulheres, suas representações e seus projetos, os desafios da sociedade atual e a figura do feminino no mal-estar contemporâneo. E aí? Do dia 09 em diante, como fica? Ou seja, a médio e longo prazo como a questão da mulher é tratada? Volta-se ao tema apenas e tão-somente quando surge mais uma manchete trágica ligada à mulher ou alguma estatística lamentável é tornada pública? E, alguns, podem nessa hora, apropriar-se da velha questão freudiana: “Afinal, o que quer uma mulher?”. Freud, aliás, após três décadas de investigação da “alma feminina”, interrogações internas levadas a sério, já no final da vida, teria confessado sua decepção e insatisfação com os resultados de seu saber sobre a mulher .
Voltando a Touraine, “as mulheres da geração pós-feminista não têm objetivos mais limitados daqueles de suas mães, mas elas acrescentam à sociedade em que vivem uma orientação cultural nova e bastante carregada de ‘conflitividade’, em ruptura com uma definição negativa da ação das mulheres que se limitaria a derrubar a desigualdade e as discriminações no intuito de eliminar as diferenças entre os gêneros”. E sugere que mais do que vítimas, podemos também ser atrizes que consolidam suas funções com uma vitalidade raramente encontrável em outras categorias sociais. Será? Quem se importa e quem acredita? Quem deseja conversar, participar e aprofundar conceitos, possibilidades, projetos e abrir espaços para a promoção dessa agenda?
A percepção do que nos cerca, as aceleradas mudanças, algumas tendências e confusões, muitas dúvidas e conflitos, não terá nas comunidades cristãs espaços legítimos para o diálogo? Não se pode ignorar algumas iniciativas e tentativas, entretanto, não se pode mais e além? Pelo que vejo, especialmente no meio cristão, é algo que se passa de largo. Há muito medo, uma sensação de ameaça, de descontrole, um incômodo que é tratado como peso a se livrar. O bonde da história já se perdeu, e em nosso tempo, o trem bala é uma realidade. Não seria o caso de apressarmo-nos em rever compreensões, assumir ignorâncias e não desprezarmos a velocidade da sociedade? Com pressa não quero dizer afobação, até porque o risco da superficialidade no trato com o tema é grande. Mas desconfio que seja bom salientar a urgência e demanda real crescente.