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Um minuto só

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Fiquei novamente impressionada com a diferença que faz um minuto.

No sábado (24/05), foi a final da Liga dos Campeões, importante campeonato no futebol europeu. Pela primeira vez dois times da mesma cidade, digamos, um primo rico e outro pobre, disputaram essa final. A cidade é Madri, embora a disputa tenha sido em Lisboa. Os dois times eram Atlético de Madri e Real Madri.

O Atlético venceu por 1 a 0 no tempo de 90 minutos, tempo oficial de uma partida. Campeão? Não, geralmente os juízes dão alguns minutos de prorrogação. Aquele juiz resolveu dar 5 minutos. Passado os 4 minutos, onde o Atlético já sentiu o gostinho da vitória, praticamente com a taça na mão, ainda tinha o minuto final e nesse, tão somente um minuto, o Real empatou. E na próxima meia hora de prorrogação o abatimento e cansaço do Atlético fez com que ele encerrasse aquela partida perdendo pelo placar de 4 a 1. Que virada!

Chamou-me a atenção a diferença que um minuto fez na vida daqueles jogadores. Sobretudo, para os jogadores do Atlético, fiquei a imaginar o quanto eles lamentariam e carregariam para sempre na memória a diferença que esse 1 minuto fez. Tão perto e tão longe de ser campeão por causa de um tempinho tão curto…

A expressão “espere um pouco, só um minutinho” é comum. Dizemos para expressar que não estamos prontos, que haverá necessidade de esperar, que agora não. São filhos que dizem às mães, esposas que dizem aos maridos, empregados que dizem a seus chefes, e por aí vamos, banalizando 1 minuto.

Lembrei também de outro minuto final. Quando Jesus já estava crucificado, outros dois criminosos foram crucificados com ele. Um deles insultava Jesus nos minutos restantes de vida. Preferiu terminar sua vida com xingamentos, com reclamações e blasfêmias. Essa foi sua escolha do que fazer com seu minuto, com seu fim. Já o outro o repreendeu, depois, virou-se a Jesus e disse: “Jesus, lembra-te de mim quando entrares no teu Reino” (Lc 23.42). Ele, assim, preferiu investir ao invés de desperdiçar seu último minuto. Optou por um diálogo significativo, boa reflexão sobre a vida e arrependimentos possíveis. Soube bem aproveitar, e mesmo perdendo a vida, ainda a ganhou.

Uma linda canção, de um dos maiores poetas que já tivemos dentro da música cristã brasileira – Sérgio Pimenta, também salienta o momento (que pode ser de um minuto só): “Nem um momento só deixou sua mão/Deixou-me o seu olhar/Nem quando eu dava dó/Negou-me o seu amar”. Como essa convicção faz toda a diferença em cada minuto que se vive!

Um minuto não é pouco, dependendo do contexto, ele pode fazer toda a diferença. Como olhamos para uns poucos minutos? Eles lhe são preciosos ou tem sido desperdiçados? Já calculou a sua vida não em anos, mas em minutos? Talvez tenha até a impressão maior de que envelheceu mesmo. Mas o ponto é considerarmos como lidamos com o tempo, ainda que curto. Aproveitamos ou banalizamos?

Não sei quantos minutos gastou para ler esse breve texto, mas que lhe ajude a pensar sobre suas escolhas em relação ao tempo, sem esbanjar insensatamente. Que tal prestar mais atenção em seu próximo minuto, e no outro, e no que vem a seguir, enfim, na vida?

Amigos do baú do coração

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Amigo não precisa de dia porque todo dia ele é – suficiente afeto.

Das coisas da vida, dentre as melhores, estão os amigos que ganhei. Algumas amizades construí, mas, a maioria foram presentes, daqueles que fazem a vida valer até nos dias maus. No bolo de amigos que ganhei tem um que quero hoje celebrar.

Amigos há daqueles que são interessantes, os que são engraçados, os que são artistas (os que brincam com ideias e te levam junto), os que são belos, os que são leais. Ele é um ser cativante (e muito mais).

Esse amigo é um contador de histórias que me emociona a cada encontro. Ele tem poesia na língua, delicadeza no coração e uma mente, realmente, brilhante (além da careca).

Ele gosta de gente, nem sempre tão perto, mas ele se aproxima muito, como poucos.

Ele tem contos cotidianos porque vê o que pela maioria passa desapercebido. Ele tem memórias que desabrocham em causos risonhos, com pitadas folclóricas, que te levam para dentro. Ele tem pensamentos surpreendentes que arrancam-nos risos e lágrimas, muitas vezes simultaneamente.

Ele me ajuda a pensar melhor, a amar melhor, a aproveitar melhor a vida, inquietando-me e fazendo observações pouco prováveis. Sim, ele chega a ser irritante…

É também acelerado. Acompanha de tudo, sabe bastante e brinca com coisas sérias de tal forma que nos leva a perceber a seriedade da coisa.

Quem aguentaria um sujeito assim? Quem seria esse alguém à altura? Uma esposa singular. Que dialoga, que acolhe, que devolve, que se cala, que observa e critica, que chora e ri, que é leve sem perder a densidade da vida. Mais do que simpatia, entende de empatia. Ela que colore dias escuros do companheiro, e quando não, apenas permanece na escuridão deles, sim, ela veio para ficar.

Exercita o corpo, a mente, a alma, tudo discretamente, com sabedoria. Pessoa rara, certa para andar com ele.

Juntos tiveram duas meninas, hoje, mulheres. Imagine o que são duas filhas de um casal como esse? Sim, espetaculares em suas singularidades.

Ah, e em tempo, tem a Farofa, não na mesa, na casa. Uma cachorra sapeca que faz toda família multiplicar histórias e alegrias.

Idealização? Não ignoro limitações, fraquezas, mas isso é parte da vida de todos. Mas, reconhecer e celebrar as belezas das relações é algo necessário e delicioso.

C. S. Lewis dizia que “vivemos num mundo sedento de silêncio, privacidade e, portanto, sedento de meditação e amizade verdadeira”. E isso não é difícil de verificar, ainda que nem todos consigam assim nomear e reconhecer.

Quero meditar mais e melhor, mas em meio a essas que consigo, vejo melhor meus amigos, e desejo agradecer.

Hoje minha homenagem carregada de gratidão vai para Valdir e Diva que entraram há anos em minha história e me abençoam continuamente.

O monge cisterciano, Aelred de Rievaulx, que viveu no século XII d.C., parafraseou I Jo 4.16, dessa forma: “Deus é amizade, e todo aquele que permanece na amizade permanece em Deus”. Quero permanecer.

Coisas que eu nem sei

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É impressionante nossa capacidade de achar que já entendemos o que tinha para ser entendido, e também, ignorar algumas coisas que estão tão perto de nós.

Num quarto de hospital a conversa se deu entre duas mulheres:

– Na igreja a gente fez a campanha da dracma perdida.

– O que é dracma?

– É tudo aquilo que a gente esquece de fazer.

O relato da parábola de Jesus que encontramos no registro do Evangelho de Lucas 15.8-10 é tão precioso, contando de algo valioso (especialmente para quem tem pouco) que foi perdido, mas também foi buscado, e ao ser achado a festa se dá. A dracma era uma moeda de prata equivalente a diária de um trabalhador braçal. E ela não precisa ser esquecida, tão pouco ser sinônimo de descuido. Lembrei-me da música de Danni Carlos (Coisas que eu sei) que diz: “Meu conhecimento é minha distração”.

Por esses dias a mídia noticiou o tesouro que um casal da Califórnia, já de meia-idade, passeando com o cachorro em sua propriedade rural, nas colinas de Gold Country, achou – US$ 10 milhões (R$23,5 milhões) em moedas de ouro raras. Eles já moravam há anos nesse lugar e não faziam ideia do tesouro bem debaixo de seus pés, ali o tempo todo. Que surpresa quando resolveram examinar o que parecia uma lata enferrujada que começava a sair da terra, em um caminho já conhecido de anos dentro da propriedade deles. Quantas vezes não caminharam por aquele trecho ignorando o tesouro?!

Jacó também foi surpreendido, ficou maravilhado e até teve medo diante da grandeza achada. No caminho entre Berseba e Harã parou para pernoitar, afinal, já estava escuro e seria difícil prosseguir. Pegou uma pedra, fez de travesseiro e pronto, foi o suficiente para pegar no sono e sonhar. O sonho era estranhamente bom, uma escada apoiada na terra, tinha o topo no céu, e nela anjos subiam e desciam. Ao lado estava Deus e este lhe dizia coisas maravilhosas, renovando a aliança que havia feito ao seu avô Abraão. Nesse sonho Jacó ouvia do Senhor: “Estou com você e cuidarei de você, onde quer que vá. Não o deixarei”. E então, quando Jacó acorda, simplesmente reconhece: “Sem dúvida, o Senhor está neste lugar, mas eu não sabia!” (Gn 28.16).

A vida é assim, ignorâncias e mal entendidos, que nos atrasam e confundem. Limitações e teimosias, medos e sustos, distrações e faltas nos fazem lembrar quem somos. Mas, a vida também é surpreendente, trazendo-nos alegrias, possibilitando achados e descobertas que são tesouros. Buscar, passear, viajar, rir, dormir, encontrar, são movimentos da vida, corriqueiros, porém, podem nos trazer maravilhas inesperadas, podem deixar nossa caminhada melhor, mais tranquila.

Brennan Manning se examinava: “Será que passei a levar a vida muito a sério? Será que na confusão do dia a dia permiti que se dissipasse o meu senso pueril de maravilhosamento? Será que parei de atentar para pôr-do-sol e o arco-íris? Será que me perdi tanto em ensinar, escrever, viajar que já não ouço o som da chuva no telhado? Será que levar a vida a sério passou a significar levar uma vida de tristeza? Será que viver é apenas outra palavra para resistir?”.

Leveza e reflexão, alegria, atenção e nova compreensão podem deixar a vida mais saborosa. E o que pode haver de mais maravilhoso do que encontrar Deus?

Jesus nos convida para irmos até ele, sem enganos, o fardo existe, mas trata-se de algo leve (Mt 11.28-29). O que é certo é que encontrarão descanso. Muitos se perguntam onde está a leveza porque vivem com pesos quase insuportáveis e as forças se esgotam, contudo, o convite é válido ainda hoje. Com Jesus nos surpreendemos e nos maravilhamos porque nele há uma vida que ignorávamos, há novidade no viver que não fazíamos ideia ser real. Há movimentos que podem nos levar a ele, depende de nós, pois, sua misericórdia, compaixão e graça já temos.

Viagem das férias

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Janeiro é um mês de férias, ao menos, para a maioria. No calendário escolar o ano letivo ainda não se iniciou. Portanto, é tempo de aproveitar.

Como, em nossos dias, aproveitamos bem o tempo? Que significado isso traz? O que se entende por férias? Inquietos e supostamente pensantes, não queremos mais perguntas, queremos é sossego. Pois bem, e o que faz sossegar nossa alma? Ops, escapou…

Essas férias de janeiro, em geral, as famílias, amigos pensam em viajar. Viajar pode ser uma grande aventura, pode ser divertido, pode ser tanta coisa. Parece que em nosso tempo de exibicionismos sem fim, o que vale é você mostrar para onde foi, postar fotos lindas, onde se tenta convencer o outro que você realmente está aproveitando a vida. Ali a intensidade lhe pede licença, os sorrisos ainda são tímidos perto de tudo o que está sentindo e desfrutando, e se você imprimir a boa imagem de um sujeito relaxado e de bem com a vida, se dá por satisfeito por uns instantes.

Estranho, mas aumenta a sensação de que as férias tem se tornado uma grande competição onde os que se sentem atrás, perdendo, forçam ou inventam histórias e criam montagens para também poder esnobar como vitoriosos.

Frei Betto assim coloca: “Por que a ambição de uma viagem ao exterior não se reflete também no desejo de viajar para dentro de si mesmo? Mundo desconhecido, esse que trazemos no espírito. Recolher-se ao silêncio interior é sempre um excelente ponto de partida. Para quem nunca fez essa viagem, a partida assusta, porque não nos é dado o roteiro, e a passagem exterior tenta-nos a abandonar o trem. Se controlarmos ‘a louca da casa’, a imaginação, logo o silêncio interior se faz voz. Então, somos apresentados ao nosso verdadeiro eu”. Ou, em outras palavras mais sucintas, Pascal já dizia: “A causa única da infelicidade do homem está no fato de ele não saber ficar tranquilo em seu quarto”.

Não sou contra viagens, ao contrário, tento apreciá-las melhor cada vez que embarco numa, por mais simples que possa ser. Viajar nos enriquece, ao menos, potencialmente, em termos de cultura. E você não precisa sair do país para isso, aliás, nem mesmo de seu estado, e, às vezes, nem se quer da cidade onde reside.

Viagens, sem dúvida, podem ser um excelente investimento, podem nos acrescentar conhecimentos, belezas, novas referências, e muito mais. Viagens podem ser curtas, singelas, mas valiosas. Elas podem nos marcar positivamente, nos unir, nos ajudar a sair da rotina e ter um descanso diferenciado. Entretanto, por que desprezar, ignorar, ou mesmo, fugir da viagem para dentro? Por que evitar tanto a quietude, o silêncio? É sábio esquivar-se de autoconhecimento, poupar a ampliação da consciência de quem se é? Fernando Pessoa, num de seus versos, faz uma triste constatação: “não sou para mim mais que um vizinho”.

Nem todos menosprezam, evitam ou fogem desesperadamente dos encontros mais profundos consigo mesmo, nem necessariamente, ignoram viagens para dentro de si. Alguns são estimulados através da meditação, de terapias, ou de leituras preciosas. São caminhos diferentes, recursos variados, mas, para mim, nada nos conduz melhor e mais profundamente a isso do que o evangelho de Jesus Cristo.

Discípulos peregrinos no processo aprendem a silenciar-se mais, ouvir melhor. Dedicam-se mais atenciosamente ao que acontece nele e ao seu redor. Interações com a sociedade e com o Reino de Deus. Aprofundam compreensões, sobretudo, vivências. Experimentam uma vida que passa a ser abundante, não porque lhe sobram coisas, tempo, não porque não haja faltas, mas, porque a referência é outra, vem de dentro, de quem lhe habita.

Se a leitura é um recurso importante nas viagens para dentro, a leitura da Bíblia é primordial. A leitura pode ser um instrumento bastante útil na transformação e organização da vida. A leitura bíblica pode ser regeneradora por se tratar de uma palavra-semente viva. A leitura pode ir muito além do que um lazer passivo, trazer sentidos, valores, compreensões que contribuem para novas leituras da realidade, com implicações sociais significativas. A leitura bíblica pode converter nosso coração a Deus, e consequentemente ao próximo, e isso, concomitante ao conhecimento do nosso próprio coração, em sua fragilidade e vulnerabilidades, tesouros e marcas.

Aproveitar a vida, o tempo, as viagens pode ter tudo a ver com a disposição para leitura, ainda mais, com o compromisso saboroso da leitura das Escrituras Sagradas.

Coragem e boa viagem!

Mandela – um promotor da paz

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Neste mês de dezembro relembramos o texto da multidão do exército celestial com o anjo, onde todos louvavam a Deus dizendo: “Glória a Deus nas maiores alturas, e paz na terra entre os homens, a quem ele quer bem” (Lc 2.14).

Os pastores nos campos foram surpreendidos com o surgimento de um anjo do Senhor e as boas novas de grande alegria que ele trazia: “hoje vos nasceu na cidade de Davi, o Salvador, que é Cristo, o Senhor” (Lc 2.11).

A celebração cristã nessa época é intensa. Continuamos a louvar a Deus e aprofundar a compreensão do significado da encarnação de Deus, de Cristo em nós.

Glórias nos damos a Deus, mas nem sempre promovemos com afinco a paz entre os homens. Embora, saibamos nós que Jesus assim ensinou: “Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5.9).

O Filho de Deus, Jesus Cristo, veio fazer a paz (Rm 5.1), trazer paz (Jo 14.27), e disse que ser pacificador é ser felizmente chamado filho de Deus.

Tendo Jesus como fonte de paz não seria natural para os filhos de Deus tornarem-se pacificadores? Quais as referências de pacificadores em nosso tempo de tantas guerras?

Henri Nouwen, em seus últimos anos de vida, ponderava sobre sua trajetória e começou a perceber que ela havia sido violenta e assim disse: “tão cheio de desejos de ser melhor do que os outros, tão marcado pela rivalidade e pela competitividade, tão invadido por compulsões e ideias fixas e tão obcecado por momentos de desconfiança, inveja, ressentimento e vingança! Ah, certamente a maior parte do que eu fiz chamava-se ministério, o ministério da justiça e da paz, o ministério do perdão e da reconciliação. Mas, quando aqueles que querem paz estão igualmente tão interessados no sucesso, na popularidade e no poder como os que querem a guerra, qual a verdadeira diferença entre guerra e paz?”

Nelson Mandela, também com o avançar dos anos, olhando sua jornada, e sendo criticado por alguns como tendo discursos um pouco sem graça, diz: “tento não ser agitador de multidões. As pessoas querem ver como você lida com as situações. Querem as coisas explicadas clara e racionalmente. Amadureci. Era muito radical quando jovem, brigando com todo mundo, usando linguagem bombástica.” Nossa linguagem, nossas escolhas, nossas posturas nem sempre sinalizam reconciliação, às vezes, pouco comunicam a respeito da paz, mas, Mandela compreendia e ensinou que o principal estilo de liderança não era se lançar à frente, mas ouvir e conseguir o consenso. Sua vida nos inspira, sua morte ainda fala, sua história por um pouco nos cala.

Faço silêncio reverente. Falece um homem que viveu nosso tempo, lutou por justiça, enfrentou o apartheid, tornou-se símbolo de reconciliação e um forte promotor da paz.

O editor-executivo da revista Time, Richard Stengel, que colaborou com Nelson Mandela na autobiografia Longo Caminho para a Liberdade, e que escreveu Os Caminhos de Mandela, diz o seguinte: “ele sabia que nenhum de nós é tão bom quanto as melhores coisas que fazemos ou tão ruim quanto as piores delas”, e ainda sobre essa arte de promover paz através de diálogos difíceis em situações extremas, ele conta: “em suas negociações para o primeiro governo do país assumiu vários compromissos fundamentais a fim de chegar a um acordo. Embora muitos de seus companheiros se opusessem firmemente, ele deu ao Partido Nacional o direito de manter seus cargos públicos e um governo de união, no qual de Klerk foi vice-presidente. Mas ele conseguia ver o lado dos nacionalistas e sabia que o objetivo principal era o que importava. Sim, havia alguns princípios que não eram negociáveis – ‘uma pessoa, um voto’; democracia universal -, mas, depois disso, a maior parte das coisas tinha gradações cinza. Gradações cinza não são fáceis de articular. Preto e branco é mais sedutor porque é simples e absoluto. Parece claro e decisivo. Por causa disso, muitas vezes gravitamos em volta de respostas ‘sim’ ou ‘não’, quando ‘ambos’ ou ‘talvez’ está mais perto da verdade. Algumas pessoas escolhem um categórico ‘sim’ ou ‘não’ porque pensam que isso parece ser forte. Mas se cultivarmos o hábito de considerar ambos – ou mesmo vários – os lados de uma questão, como Mandela fazia, de manter o bom e o mau em nossas mentes, podemos ver soluções que de outra forma não nos ocorreria. Esse modo de pensar é exigente. Mesmo se nos mantivermos apegados ao nosso ponto de vista, isso exige que nos coloquemos no lugar daqueles com os quais discordamos. Exige vontade, empatia.”

Ainda fazendo outras considerações a respeito de Mandela, do que viu e ouviu dele, acrescenta: “vinte e sete anos na prisão ensinam muitas coisas, e uma delas é pensar a longo prazo. Nossa cultura recompensa a velocidade, mas Mandela dizia que não devemos deixar a ilusão da urgência nos forçar a tomar decisões antes de estarmos prontos. Melhor ser lento e ponderado do que rápido apenas para parecer decisivo. Não é a velocidade da decisão, mas a sua direção. Não é a rapidez que torna alguém corajoso. De fato, assumir a visão a longo prazo com frequência exige estar disposto a mudar ideias acalentadas ou profundamente arraigadas havia muito tempo.”

Ansiosos e intolerantes pouco sabemos dialogar. Nossos pronunciamentos ou mesmo conversas informais favorecem mais intrigas, confusões e guerras do que o cuidado de promover a paz. A curta visão denuncia a curta compreensão. O fundamentalismo cresce, as discórdias se multiplicam, ninguém quer se colocar no lugar do outro e ouvir serenamente. Convictos de que somos os certos, que o equívoco sempre está do lado de lá, que competir é melhor que colaborar e servir, que dialogar é convencer, e que vencer custando o que custar é o que vale mais, não promoveremos a paz. As implicações são muitas e variadas, mas reparar em quais sinais nos acompanham pode ser proveitoso.

Novamente Stengel: “Mandela é um corredor de longa distância, um pensador de longa distância. E a prisão foi uma maratona. Mandela pensava em termos de história. A história, por definição, é a longo prazo.”

Nesse dezembro o corredor descansou. Mas suas marcas históricas permanecerão. Caminhos de paz ainda estão em construção. Vamos?

Pelo direito de não ser tão brilhante

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Um país dito “emergente” da perspectiva econômica colabora para uma sociedade cada vez mais competitiva. Nessa selva só sobrevivem os mais fortes. Só os mais fortes, os bons, são vencedores. Como se reconhece um “vencedor”? Olhe para suas conquistas! Você vale pelo que você tem a mostrar. Se não tiver provas a serem exibidas, você será excluído. Ou você desfila orgulhosamente ou trate de com afinco impressionar as pessoas e dizer que está quase lá. Mas, apresse-se, as pessoas são impacientes, e ninguém quer ficar ao lado de “perdedores”.

Como se prepara um vencedor? Segundo a cultura brasileira, ensine-o a ser esperto, o que equivale a nem sempre ser honesto, tirar vantagem atropelando os distraídos e mal informados, esconder, ou no mínimo, omitir partes da história, toda a verdade nem sempre é conveniente, portanto, treine-o disfarçar, a ter truques, cartas na manga. Instrua-o a rapidamente reconhecer e explorar idiotas, isto é, ingênuos.

A vitória é dos ligeiros. Saia na frente. Quando o acusarem de coisas ilícitas, de falta de ética, de bom senso, falta de solidariedade, finja que não é com você. Quando reclamarem de falta de tempo para as relações, ignore ou justifique com excesso de responsabilidade e desafios. Lembre-se, qualquer sacrifício é legitimado em nome do bom desempenho. Muito esforço, muito merecimento. E esforço não tem fim, sempre achará novos empreendimentos. Afinal, precisa se manter no topo.

Pais que ficaram pelo caminho impõem aos filhos metas cruéis. Pais que chegaram lá, não todos, mas muitos, exigem que seus filhos os alcance e os supere. E diga-se de passagem, praticamente nenhum pai e mãe admitirá isso. E quando e se o fizerem, explicarão que é para o bem dos filhos. Pura preocupação supostamente amorosa. Será?

Indicar que não obrigatoriamente todos devem ser brilhantes, ou, alcançar o lugar mais alto no pódio, é uma heresia. É tudo ou nada. É ouro ou é lixo. Se não realizar um feito espetacular, de preferência único, arrancando a admiração das pessoas, então, é sinônimo de uma vida medíocre, um perdedor. Claro, só é contabilizado aquilo que pode aparecer, aquilo que é tido como “sucesso” (fama, mídia, muito dinheiro, consumismo sem miséria, etc.) – variadas formas de poder na sociedade do espetáculo.

Tenho visto pais e mães bastante aflitos com sua cria, angustiados com a possibilidade do filho “fracassar”, ser mais um na multidão de “perdedores”. Alguns até explicitam que querem investir mais, para irem mais longe, pois, num mundo tão inseguro, eles não estarão sempre por perto para “cuidar”, mas, no fundo é um pavor de que os filhos desperdicem os recursos e não compartilhem dos sonhos que eles têm para a sua continuidade na terra, no fundo, seria uma “desonra” a família.

Vejo também muitos adolescentes e jovens, abatidos com tamanha pressão. Ansiosos, com muito medo de decepcionarem seus progenitores. Muitos sentem-se culpados antecipadamente por receberem tanto investimento financeiro, afinal, muitos pais deixam claro os sacrifícios que fizeram para os filhos pudessem ter certas “regalias”.

Um dos sintomas, com índices cada vez mais elevados, é a depressão. Não poucas vezes acabam em suicídio, ou tentativas de. Mas, outro, também frequente, que é queixa comum dos adultos, é uma apatia crônica – desistências sutis da própria vida.

A resposta a tanta pressão familiar e social para que tenham um desempenho brilhante os faz cada dia mais reclusos. Quando em casa, adolescentes e jovens, ficam a maior parte do tempo no quarto. Ali ficam plugados no mundo externo, via redes sociais, navegando pelo mundo, conhecendo mares perigosos, entrando em ondas avassaladoras. Se possível, até tomam as refeições ali. Cansados, entretidos por um pouco, no fundo, esvaziados em boa parte. Eles ficam a observar sua própria incompetência para o nível de exigência que lhe foi imposta, disfarçada ou explicitamente.

E muitos dos que se rendem a tais pressões e naufragam com elas diriam que dominam o evangelho, que conhecem a Deus e o seguem.

Jesus diz algo muito claro àqueles que desejam ser seus discípulos: quem não perder a vida não pode encontrá-la Mc 8. Em outras palavras, Jesus diz que há uma vida que leva à morte. E a maneira que muitos tem vivido, de fato, os tem feito morrer aos poucos, mas, talvez não para aquilo que Jesus teria apontado como morte necessária. Vivemos mal porque escolhemos mal. Abrigar a ansiedade em nós, viver de preocupações e estresses, é um modo de vida que nos levar a morte, mas de maneira alguma era o que Jesus ensinava.

Qual seria a compreensão dos pais dito cristãos, e como eles tem ensinado seus filhos a esse respeito?

As imposições ansiosas e exigentes dos pais resultam em compulsões na vida de alguns filhos e em tédio na vida de outros. Pais não gostam de ver seus filhos respondendo dessa maneira, ficam ainda mais angustiados, porém, não mudam suas inquietações e posturas.

O sábio dizia: “O homem que ama a sabedoria dá alegria a seu pai” (Pv 29.3). Hoje precisamos refletir o que pais e filhos consideram sabedoria, e, o que de fato agradam os pais. Quem ama o quê?

38ª semana de 2013

“A depressão cresce entre as crianças em parte pelas razões pelas quais está aumentando em toda a sociedade, mas também porque as crianças estão sob mais pressão, são mais superestimuladas, mais levadas a se movimentar de um lugar para o outro e de escola para escola. Isso acontece porque os pais estão ambos trabalhando fora, e as crianças têm ficado com uma variedade de cuidadores que as amam menos que os pais. Isso acontece por causa do colapso da família.”

Andrew Solomon, O Estado de S.Paulo – 15/09/2013

 

“Alguns trabalhos recentes mostram que, em tempos em que tudo acontece nas redes sociais, declarações e publicações em páginas pessoais poderiam dar pistas para amigos e parentes das intenções de alguém que enfrenta sérias dificuldades. Estar atento a esses sinais poderia ajudar a evitar suicídios.”

Jairo Bouer, O Estado de S.Paulo – 15/09/2013

 

“Se você deixar, tudo gira em torno do dinheiro. Depende de como você encara a profissão. (…) Os temas mais perturbadores são os que nos levam a um maior entendimento sobre a vida.”

Jake Gyllenhaal, ator, O Estado de S.Paulo – 15/09/2013

 

“Estar pobre torna as pessoas menos capazes de fazer as coisas direito e afeta a habilidade de pensar.”

Eldar Shafir, Folha de S.Paulo – 15/09/2013

 

“‘Câncer’ são centenas de doenças diferentes. Não há uma cura, mas muitas. A genética nos dá uma nova visão da doença. A batalha é longa e, quanto mais vivermos, maior será a probabilidade de que algo dê errado. No meio tempo, 50% dos cânceres são evitados com medidas como não fumar e evitar muito sol.”

Marcelo Gleiser, Folha de S.Paulo – 15/09/2013

 

“Hoje existe essa coisa de ‘escolha’, profissão, filhos depois da pós, direitos iguais, ar-condicionado, reposição hormonal, bolsa Prada. Esquecemos que direitos e escolhas são produtos mais caros do que bolsa Prada. Pensamos que brotam em árvores.”

Luiz Felipe Pondé, Folha de S.Paulo – 16/09/2013

 

“Não a afetividade melosa de incontáveis declarações de amor ao filho, e sim a amorosidade de introduzi-lo na vida como ela é, de dar banhos de realidade no filho de acordo com a idade que ele tem.”

Rosely Sayão, Folha de S.Paulo – 17/09/2013

 

“A primeira lição a tirar de junho é a seguinte: a política brasileira transformou-se em algo profundamente instável. Nada nos garante que não estamos vendo apenas um momento de calmaria antes de uma nova tempestade. Note-se como, desde junho, este país viveu, de maneira praticamente ininterrupta, em um estado contínuo de manifestações de toda ordem. (…) Por um momento, parecia que certas instituições brasileiras tinham sentido o golpe. Tudo isso durou um instante. Logo em seguida, tais instituições demonstraram seu caráter radicalmente irredutível em relação a reformas e voltaram a operar como sempre operaram. (…) Nada mais equivocado do que confiar em uma calmaria aparente. Quando uma sociedade acorda, ela não volta a dormir completamente. Na verdade, sua elaboração passa a um estado de latência. Em latência, ela vai aos poucos se desacostumando de suas antigas formas, até que chega o momento em que provocar mudanças equivale a chutar uma porta podre. Muitas das transformações fundamentais ocorrem assim, ou seja, o trabalho mais importante foi feito em silêncio aparente.”

Vladimir Safatle, Folha de S.Paulo – 17/09/2013

 

“Não educar bem uma criança, deixá-la crescer no shopping center, consumindo loucamente sem ter desafios e sonhos que transcendam um abdômen de tanquinho e o próximo modelo de iPhone é falta de amor com ela e falta de responsabilidade com o país.”

Nizan Guanaes, Folha de S.Paulo – 17/09/2013

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