Em tempos de excessos, onde o estresse e a agitação ganham proporções não bem digeridas pelo nosso organismo, necessitamos lembrar motivos para parar, pequenas pausas, um pouco de sossego.

A pausa na vida é importante, pois pode ser um espaço para repensar a vida, para sonhar e/ou lembrar dos sonhos e tomar um fôlego.

É interessante ver no início da Bíblia, o registro da criação. Deus cria, vê e acha bom. Completa sua criação com o ser humano e aí acha muito bom. Ao terminar, descansa, santifica e abençoa o sétimo dia. Ou seja, observarmos esse eixo é fundamental para nossa saúde e equilíbrio na existência: criação – contemplação – contentamento e celebração.

“A sabedoria, como uma herança, é coisa boa, e beneficia aqueles que veem o sol” (Ec 7.11).

Em geral, entendemos do muito fazer, gente esforçada, gente cansada. No entanto, qual nosso potencial inato? Quando refletimos sobre se o que fazemos tem a ver com nossa vocação? Temos vivido segundo nossas próprias vocações?

É comum compensarmos nossas frustrações, dores e inseguranças com ilusões, prazeres estéticos e acumulação ostentosa de bem materiais. Mas isso tudo se mostra incapaz de satisfazer nossas necessidades de introspecção e de amor. São muitos os que correm atrás do vento, se matam por aquilo que é efêmero.

Como responderíamos à pergunta “quais são seus grandes inimigos internos hoje?”. Do que tenho visto, cansaço e solidão são fortes candidatos a estarem no topo da lista de respostas. E ambos têm a ver com a falta de interrupção no ritmo alucinante. Falta de pausas – pausa para descansar e pausa para investir em relacionamentos.

Pausa para descansar incluir descobrir mais o sabor da vida. E a gente confunde saborear com gula.

Sabe refeições que a gente não desfruta, apenas engole? A gente faz isso com a alimento para o corpo, mas também faz isso com o alimento para a alma. Na vida tem “menu degustação” e tem um menu próprio que é uma espécie de rodízio, onde você tenta comer de tudo um pouco, se empanturra até passar mal e só sentiu um pouco de sabor no começo, de resto, foi só hábito de colocar comida para dentro. “Ah, já que estou pagando deixa eu aproveitar tudo” – isso é raciocínio de gente miserável, que desconfia que o mundo vai acabar com a falta de comida, então, tem que aproveitar tudo naquele momento. E aproveita? Não.

Vivemos uma vida adaptativa ou uma vida criativa?

Ao invés de repensarmos o mundo que vivemos, a maioria apenas adere e adapta-se ao vigente, preferindo apenas dar sua cota de sacrifício, considerando sublime perecer em troca de um enriquecimento que o credencia no rol dos poderosos, assim respeitáveis. Correr atrás do vento como estilo de vida. Lembremos novamente Eclesiastes: “Melhor é ter um punhado com tranquilidade do que dois punhados à custa de muito esforço e de correr atrás do vento” (Ec 4.6).

O trabalho para muitos é sobrevivência, para outros é dever, e ainda, desgosto. O mantra que empurra a muitos é: “o homem que não trabalha, ou que adia, não enche o seu celeiro”. E assim, vive-se a fase de frenético desenvolvimento material. Dessa maneira, seu mundo particular vê-se atormentado pelo pragmatismo onde tudo se transforma em business e lucros. Nesse contexto cresce também o número de profissionais que vivem ao sabor do desamparo do mercado. Trata-se de um cuide-se quem puder!

Cabe perguntar quais as mudanças sociais que você identifica? Não se trata de saber se você passou da classe C para a classe A; nem se em sua opinião a economia do Brasil melhorou ou piorou; mas, que efeitos as mudanças do século XXI atingem sutil ou escancaradamente seu viver? Como seu estilo de vida foi alterado? Sem pausas não nos damos conta, apenas assimilamos e implementamos em nosso jeito de funcionar.

As novas tecnologias da informática desestruturaram o tempo e o espaço das ações e relações humanas. E quando paramos para observar e entender melhor isso tudo?

Hoje somos todos um pouco ou mais escravos das máquinas. Não nos importamos? Qual o limite?

Já nem conseguimos nomear e enumerar os infinitos absurdos organizacionais que nos angustiam no trabalho.

Nosso modelo de trabalho acaba centrado na idolatria e competitividade ao invés de ser exercício de vocação e serviço. E pouco nos incomodamos. Mais uma vez Eclesiastes: “Descobri que não há nada melhor para o ser humano do que ser feliz e praticar o bem enquanto vive”, o que também nos remete para Efésios: “Somos criação de Deus realizada em Cristo Jesus para fazermos boas obras, as quais Deus preparou antes para nós as praticarmos” (Ef 2.10). Como seres vocacionados para o bem vivem no automático das funções com pouco ou nenhum sentido?

Seria possível passarmos de um ser frenético para um ser humano? Lembremos: hiperatividade adoece. A vida frenética nos coloca numa rota mortífera. Pausas podem nos ajudar a ouvir o alarme soar, enxergar a placa de perigo.

Você faz mais coisas com as mãos ou com o cérebro? Se vocês responde que é com o cérebro, então, precisa descansar, aliviar o cérebro, pois, ele pode não te deixar dormir bem enquanto estiver sobrecarregado. Ou apagão ou desmedida pressão – de qualquer forma você é detonado quando anda acima do limite por muito tempo. Não abuse, apenas use. Use criativamente. Mas quem de nós cultiva o ócio criativo?

Temos investido em inovação existencial? Não se trata da novidade pela novidade, tem gente que muda o superficial, mas carrega sempre o velho dentro de si. Permanece sem renovação. A pergunta seria: onde você reconhece criatividade em sua vida? Ou mesmo, quanto de seu trabalho esculpe sua identidade?

O trabalho se tornou tão central que a vida se adaptou a ele e não o trabalho à vida. A programação do ano, as férias, as compras, os compromissos, tudo depende do trabalho. Não há um certo exagero? Por que demos todo esse espaço a ele? Enfim, seu trabalho harmoniza com seu sentido da vida?

O trabalho para muitos é um tédio necessário. E muitos se acomodam nisso. Thomas Merton diz que “se Deus é bom e se a minha inteligência é uma dádiva Sua, o meu dever é mostrar, pela inteligência, a minha confiança na Sua bondade. Devo deixar a fé elevar, curar e transformar a luz da minha mente”.

Considerar o princípio sabático é uma maneira de refletir sobre nossa atitude diante da vida. Averiguarmos quanto e como se é afetado por tudo que nos circunda. Refletirmos sobre o que adoça a vida ou afoga a angústia. Afinal, de que adianta ter tudo e não saber quem se é?

Tem gente que funciona, mas não sabe quem se é. Entende do fazer, mas não do ser. Hoje, cabe a pergunta: o que nos é mais familiar do que o fazer compulsivo?

Nós temos desejos e não gostamos da espera. Cada dia mais impacientes. E a pausa, silenciosa pausa, pode nos ensinar sobre esperar, sobre ter esperança, sobre nutrir paciência.

Nós que vivemos na era do descartável, vivemos com respostas prontas: Deu problema? Troca por outro. É assim com funcionários, amigos, namoradas, maridos e esposas. Somos seduzidos pela reposição instantânea. E desse jeito, vamos perdendo, cada vez ficamos mais distantes das noções de construção, processo, trabalho de elaboração.

Há alguma expectativa de vida que não seja apenas mais longa, mas também mais sadia? Novamente Eclesiastes: “Afaste do coração a ansiedade e acabe com o sofrimento do seu corpo, pois a juventude e o vigor são passageiros” (Ec 11.10).

O ato criativo precisa de pausas. A vida criativa exige quebras de rotina. A vida com Deus exige silêncio.

Tendemos mais a reproduzir e repetir, do que pensar e criar. Onde tudo é muito ligeiro, aumenta a probabilidade de ser tudo rasteiro.

Precisamos de lugar de introspecção. Precisamos de espaço interior para elaborar a existência. Pequenas pausas no dia, que seja, já ajudam. E precisamos de um dia de descanso, uma pausa maior na semana. Eis aí um bom ritmo.

Sem conscientes pausas nós confundimos lixo com luxo. Vamos ficando cada vez mais sem filtros. Perigoso, pois, há um espetáculo hipnotizante de coisas, engenhocas tecnológicas, engodos autodestrutivos que vão se alastrando, ganhando espaços e tempo nosso como se isso fosse vida. Quando não passa de ilusão alienante.

Sinta-se convocado a perceber-se responsável pela administração de seu tempo. Chega de ser engolido. A vida é mais do que entretenimento.

Seres vocacionados não precisam desperdiçar a vida com o vento.

Pausas ajudam a não vivermos divididos entre pertencer a Deus e pertencer a coisas.

Lembremos que a oração, um tempo devocional, e até mesmo um bom encontro em grupos pequenos, podem contribuir para pausas estratégicas no viver. Claro, incluir atividades físicas também é importante, assim como, pausar para ver a natureza, ouvir uma música com calma, etc.

Nós precisamos de pausas que quebram a rotina, suspendem a agitação. Necessitamos de pausas a fim de pensar o que se traz, o que se leva e o que se carrega (exercícios de reconhecimento); pausas para partilhar e confessar, a fim de encontrar suporte tão necessário ao existir.

A pausa pode ser um espaço de rever o sentido, de olhar para a criação e contemplar, saborear o que foi criado; enfim, adorar o Criador e agradecer a criatividade que nos é dada. Aproveite.