20 de outubro de 2010. Quarto dia do maior congresso de missões do mundo, e eu teria a oportunidade de ler um poema que escrevi. Sim, eu estava tenso. Lia e relia meu texto, pensando: “o que eu estou fazendo aqui?”.

De repente, entrou pela porta um homem bem alto, sério e concentrado; talvez um pouco tímido. Ele se sentou e eu percebi que todos que estavam na pequena sala olhavam disfarçadamente para ele. “Deve ser alguém famoso”, pensei.

Isso não mudou muito minha reação, já que meu foco estava no que eu teria que fazer minutos depois. Na verdade, meu sentimento era de honra porque naquela sala também estavam presentes René Padilla e Samuel Escobar, teólogos latino-americanos pelos quais eu já nutria grande admiração.

Me chamaram antes daquele homem alto e sério. Fui lá e declamem em português, e com muita emoção, as frases poéticas. O tempo passou rápido e eu sai do palco diretamente à sala dos bastidores. Enquanto entrava, o tal homem ia em minha direção. Não pensei, claro, que receberia um cumprimento dele, mas uma coisa aconteceu: a tal seriedade que ele transmitia deu lugar a uma resoluta serenidade. Eu vi nele uma face tranquila rumo ao palco do Terceiro Congresso Lausanne de Evangelização Mundial em um gigantesco salão na Cidade do Cabo, África do Sul, com mais de 4 mil pessoas de todo o mundo. A Igreja estava lá em uma manifestação multicultural e histórica.

Eu continuava sem saber quem era o tal homem, mas sabia que seria o pregador da noite. Falaria sobre o livro de Jonas e como podemos aprender sobre fazer missões com um personagem tão controverso. A explanação durou cerca de 15 minutos, como era o padrão do evento. Infelizmente, não consegui ouvi-lo, porque ainda permaneci dentro da sala, e não tinha a tradução simultânea. No outro dia, ouvi o comentário de um brasileiro que dizia o quanto as palavras daquele homem foram desafiadoras. Ele teria usado o exemplo de Jonas para ensinar como a igreja deve ser relevante nas cidades.

Conversando com outros colegas no evento, descobri que o nome do pregador era Tim Keller. Naquela época, acho que ainda não tínhamos tantos livros dele traduzidos e publicados em português, o que se tornou algo mais comum anos depois.

Talvez por conta desse episódio, sempre que lançavam um livro dele, eu procurava saber. Li alguns, mas bem menos do que gostaria. Um deles foi sobre casamento (escrito junto com sua esposa Kathy) em um pequeno grupo que participávamos. O que li, no entanto, sempre me trazia a certeza de que era um teólogo e pastor equilibrado, bíblico e disposto a conversar de forma prática sobre o papel da igreja diante de temas relevantes do mundo hoje. Eu admirava o fato de que Keller fora pastor de uma igreja local em pleno centro de Nova York. “Como conseguira?”, eu me perguntava.

Hoje, 19 de maio de 2023, recebo a triste notícia de que Tim Keller faleceu aos 72 anos. Nas fotos, ele está bem mais velho do que quando o conheci pessoalmente. Em suas últimas orações, ele dizia que gostaria de descansar com o Senhor.

Quero guardar em minha memória aquele dia em que o conheci, sem saber quem era. Minha ignorância não impediu que o notasse. Ele não precisou falar nada para que eu o visse como alguém sereno, resoluto e simples. Esta é a lição que Keller me ensinou, silenciosamente: que o maior impacto do testemunho talvez aconteça quando nossa presença não dependa de palavras.

 

Foto: Reprodução/ Facebook

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