“Meu coração está no Afeganistão”, conta missionária brasileira
Ela tem 57 anos e morou por 7 anos no Afeganistão. Provavelmente, ainda estaria lá se não tivesse voltado ao Brasil no final de 2016 para um tempo de descanso; período esse que foi prolongado por questões de saúde. Quando estava prestes a voltar ao Afeganistão, veio a pandemia. O país asiático agora vive dias de desespero, desde que o Talibã retomou o controle em 15 de agosto de 2021.
Professora há muitos anos, ela – que não quer se identificar – exerceu sua profissão em favor do reino de Deus, dando treinamento a professores, dirigindo uma escola e um projeto educacional com mulheres e meninas. “Em todos os lugares onde trabalhamos, tínhamos o objetivo de construir relacionamentos, ouvir as pessoas, andar com elas, compartilhar histórias”, conta.
Confira a seguir a entrevista completa com a professora brasileira chamada por Deus para abençoar as mulheres afegãs.
1. Quanto tempo você morou como missionária no Afeganistão? Qual era basicamente o seu trabalho lá? Você pensa em voltar para lá?
Fui para o Afeganistão em 2009, enviada pela minha igreja, com o apoio de uma organização missionária. Voltei para o Brasil no final de 2016 para um período habitual se descanso e acabei não voltando. Sou professora, com muitos anos de profissão. No Afeganistão trabalhei com educação, oferecendo treinamentos para professores, dirigindo uma escola e um projeto com meninas e mulheres. Nesse projeto as mulheres de diversas idades, tinham aulas de inglês, artes, informática, saúde, exercícios físicos e reforço nos estudos escolares. Em todos os lugares onde trabalhamos, tínhamos o objetivo de construir relacionamentos, ouvir as pessoas, andar com elas, compartilhar histórias… Quando voltei, descobri que teria que ficar no Brasil para tratamento de saúde. Depois, percebi que Deus estava me direcionando para ficar aqui por mais tempo. Demorei um pouco a aceitar. O coração sempre vai estar naquela terra. São rostos com nomes, com histórias, com sonhos … Amigos e muitos irmãos naquele lugar.
2. Fale um pouco mais sobre como é o povo afegão. As meninas e mulheres, principalmente.
O povo afegão é bem ligado às tradições e costumes. São hospitaleiros, simples e desconfiados. Existem muitas etnias dentro do país. Um povo dividido por etnias, idiomas, costumes e pequenas diferenças dentro da própria religião. Conheci mulheres da cidade, mulheres de vilarejo, meninas solteiras, casadas. Mas a mulher sempre é um tanto oprimida pela tradição e religião. A nova geração é bem aberta a mudanças e oportunidades. Algumas famílias das cidades já não obrigavam mais suas filhas à casamentos arranjados. Conheci mulheres que trabalhavam fora de casa, que estudavam, mas tudo sempre com autorização da família (pai ou esposo). A vida das mulheres acontece dentro dos muros de casa. As janelas são sempre fechadas com cortinas. Elas saem para fazer compras no bazar, na maioria das vezes acompanhadas. A maior diversão para as mulheres são os casamentos e as visitas que fazem umas às outras, em comemorações especiais.
3. Como você tem acompanhado os últimos acontecimentos no país? Que sentimentos você tem tido?
Tenho acompanhado através de amigos que ainda estão lá, alguns contatos intermediários e através dos noticiários nacionais e internacionais. Sinto um misto de tristeza profunda, espanto, saudosismo e luto. Mas também há no meu coração uma expectativa e esperança de um crescimento da comunidade cristã.
4. A sua expectativa de crescimento da comunidade cristã é mais um sentimento ou uma perspectiva histórica?
A expectativa de crescimento é baseada no que tem acontecido ao longo da história em países altamente perseguidos. A igreja já cresceu bastante nos últimos anos naquele país.
5. Em sua opinião, como a igreja brasileira poderia ajudar os cristãos e o povo do Afeganistão? Pelo que podemos orar?
A igreja brasileira tem sido mobilizada a interceder. Já vejo movimentos para acolher refugiados em nosso país. Refugiados chegam nos países, na maioria das vezes, com a roupa do corpo, sem recursos financeiros, sem saber se comunicar em idioma diferente do seu próprio e com muitos traumas. A Igreja Brasileira tem como oferecer apoio em todas as áreas que esses refugiados precisam. Precisamos estar abertos e atentos as necessidades e oportunidades que surgirão nesse tempo, para abraçar esse povo, cristãos ou não.
Precisamos:
– Orar por proteção tanto para os que decidiram ficar no país, quanto para os que ainda tentam sair de lá.
– Orar para que as emoções sejam curadas e a fé dos nossos irmãos não se perca.
– Orar para que, até entre os opressores, possa haver mudança de mente, arrependimento e conversão.
– Orar para que tudo se alinhe com os propósitos que o Senhor tem para aquela nação.
6. Qual a sua mensagem para a Igreja Brasileira?
Somos desafiados a ser resposta para o que tem acontecido no Afeganistão. E não são poucos os desafios em nosso próprio país. Como igreja, temos tantos recursos, mas as muitas tantas necessidades e aflições às vezes nos paralisam, ou nos tornam ativistas de muitas causas, sem foco. Jesus, em seu tempo na terra, também se viu diante de desafios e necessidades. Mas ele sempre agiu guiado pelo Espírito, em obediência ao Pai. Como ele, precisamos saber como responder a esses desafios atuais. E tudo começa com a busca por meio da oração e da Palavra. Assim o Espírito Santo nos direciona a fazer o que espera da igreja como um todo, e de cada um individualmente. O que nos cabe é buscar, ouvir e obedecer.