Rafael (1499-1502) - Ressurreição de Cristo

Medito sobre a ressurreição. Mais que o fato físico de um corpo inanimado que voltou inexplicavelmente a executar suas funções biológicas, olho para Jesus Cristo e o vejo vitorioso. Venceu o que parecia impossível vencer. Superou o que aos olhos humanos não seria superado. A grande vitória da vida sobre a morte. A superação da esperança cristã sobre o pessimismo materialista (este que até parece algo são, mas não passa de mediocridade).

Ainda assim a ressurreição é bem difícil de crer e compreender, tanto como fato biológico quanto como significado metafísico e espiritual. Tomé quem o diga (ou prove). Precisamos de ingredientes concretos para falar sobre ela no mundo de hoje. Os ouvintes não serão satisfeitos apenas por provas físicas, mas precisarão encontrar significado real no que veem enquanto caminham.

Talvez a maior evidência resida, não no memorial religioso da Páscoa – há tantos outros memoriais religiosos e há tantas outras formas comerciais de comemorá-los -, mas na coerência de quem foi transformado e vive por meio da ressurreição de Cristo. Aqui está a grande prova e a grande responsabilidade: viver plenamente a ressurreição de Jesus Cristo.

Mas como?

Claro, não há fórmulas prontas, principalmente porque estamos falando de algo extraordinário em todos os sentidos. Mas não estamos totalmente confusos. Depois da confusão das primeiras testemunhas da ressurreição de Jesus, veio a convicção e a alegria (Mt 28).

1. A vitória de Cristo no terceiro dia nos dá toda a esperança possível. Como disse certo teólogo, “depois da ressurreição de Cristo, é impossível perder a esperança”. E por esperança podemos entender a certeza de que Deus irá cumprir seu próprio desejo para o mundo. Não obstante o horror, sempre há no fundo um sonho do reencontro, da justiça feita, da cura, da alegria recuperada. Quando este sonho se encontra com o desejo de Deus, se transforma em esperança. Quem crê na ressurreição de Jesus, tem uma esperança concreta, baseada num fato histórico.

2. A vitória de Cristo nos faz enxergar a vida com olhos de primavera. “Se alguém está em Cristo, é nova criação. As coisas antigas já passaram; eis que surgiram coisas novas!” (2 Co 5.17). Não precisamos das novidades fabricadas pela indústria do entretenimento; temos a obra de Cristo restaurando e tornando novas todas as coisas. Com isso, cada circunstância da vida, cada movimento, cada objeto ou ser vivo… tudo e todos são alvo da ressurreição de Cristo. O “Renovo” brota (Is 11.1). A poesia tem matéria-prima completa, a beleza faz sentido, a coragem volta, forte. A eternidade tem cheiro de primavera quando vivemos a ressurreição.

3. A vitória de Cristo restaura nossa noção de comunidade. Somos o povo da ressurreição, porque em Cristo os relacionamentos só existem à sombra da redenção. Nele, toda relação está submetida à realidade salvífica. Há salvação para o relacionamento quebrado. Há perdão. Há reconciliação. Assim sendo, caminhamos juntos; continuamos a errar, mas sempre lembrados pela Páscoa de que a morte foi derrotada, de que o terceiro dia anuncia a vitória do amor e da justiça sobre o mal. No Cristo Ressurreto, a comunidade é um edifício em construção – nunca terminado, mas sempre em construção. Sempre tijolos que antes estavam separados, ma agora juntos. Sempre há novos cômodos. Sempre há abrigo e acolhimento. Sempre há e sempre haverá uma comunidade distinta que respira o ar da ressurreição. Quem nos dá esta certeza é a ressurreição de Jesus Cristo.

Que nossas vidas provem que a Páscoa não é um mero feriado religioso, entre tantos outros.

 

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