Opinião
- 21 de julho de 2022
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Oração arriscada: “Senhor, me ajuda na minha incredulidade!”
Por Elsie C. Gilbert
Oração é o esforço humano de estabelecer comunicação com Deus. Precisamos admitir que nem sempre vamos até a presença do Eterno com um coração puro. Isto não assusta ao Senhor pois ele conhece o nosso coração. Sabe, por exemplo, quando estamos tentando manipular aquele que tem o controle da vida em suas mãos.
Um dos grandes efeitos da oração ocorre justamente quando a gente se vê mudado. Quando a nossa perspectiva muda, nossas ações seguem este movimento de transformação. Foi isto que aconteceu na história do menino possuído por demônios cujo pai buscou uma audiência com o Mestre. “Jesus se encontra com um pai aflito” seria um subtítulo mais apropriado para a versão dos acontecimentos descrita por três dos quatro evangelistas: Mateus, Marcos e Lucas (Mateus 17.14-21; Marcos 9.19-28; e, Lucas 9.37-42).
Mateus e Lucas contam a história de forma abreviada, enquanto Marcos gasta o dobro de palavras. Na manhã seguinte à subida do Mestre e dos três discípulos, Pedro, Tiago e João, ao monte onde ele foi transfigurado, Jesus encontrou lá embaixo uma situação embaraçosa. Os nove discípulos que tinham ficado discutiam com líderes religiosos sobre o problema de um pai que queria ajuda para seu filho. Chama a atenção o fato de que eles discutiam a situação do menino e, enquanto discutiam, a criança permanecia oprimida. Quem sabe eles recorreram às disputas para esconder o fato de que não tinham conseguido libertar o menino?
Jesus entrou em cena e a primeira pessoa a se dirigir a ele foi o pai do menino. Nem os escribas nem os discípulos tinham resolvido nada. O pai não disfarçou sua decepção ou angústia. No evangelho segundo Mateus, encontramos o detalhe de que ele se colocou de joelhos ao dizer, “Senhor, tem misericórdia de meu filho, que é lunático e sofre muito”. No evangelho segundo Lucas, descobrimos mais um detalhe comovente: “Mestre, peço-te que olhes para meu filho, porque é o único que eu tenho”.
A situação era grave, já aconteceu há muito tempo, colocou a vida do menino em risco porque eram frequentes os ataques e costumavam acontecer quando ele estava perto de água ou fogo. O menino não falava. Os ataques o deixava como se estivesse morto.
Depois de relatar o quadro, o pai disse, “Se tu podes fazer alguma coisa...”. Jesus o interrompeu e disse: “Se tu podes? Tudo é possível ao que crê”. Então o pai falou: “Eu creio. Senhor, me ajuda na minha incredulidade!”.
Me identifico muito com este pai. Eu creio. Senhor, me ajuda na minha incredulidade!
Só consigo mentir momentaneamente para Jesus. Ele sabe o quanto eu temo os dardos inflamados do maligno que incidem sobre os meus filhos constantemente. Eu sei que a minha luta não é contra a carne, mas contra autoridades espirituais num mundo impregnado pela sua influência. E, se for honesta, me pego duvidando do poder do Espírito Santo para operar em nós tanto o querer como o realizar.
O que os discípulos queriam? Uma medida de poder. Queriam demonstrar que estavam do lado certo e tinham autoridade sobre os demônios. A conversa deles era de quem queria aprender um passe de mágica. Tanto que eles, depois, perguntaram o que foi que deu errado?
O que os líderes religiosos queriam? Discutir questões teológicas sem nenhum interesse pelo menino. A conversa destes líderes é questionadora – o que em si não está errado. Mas, ela é também estéril. É uma conversa que parte de mentes e corações fechados para o mover do Espírito e que tem mais interesse em ganhar um argumento do que ser transformado pelo Mestre.
O que o pai queria? Que o menino fosse liberto. Ele já tinha feito o seu diagnóstico. “Eis que um espírito o toma e de repente clama, e o despedaça até espumar; e só o larga depois de o ter quebrantado”. Mas de que adianta um diagnóstico se não temos o remédio? Quem tem autoridade sobre os espíritos desse mundo tenebroso?
Esta terceira conversa – a mais honesta – é justamente a que Jesus encara. E ele muda a perspectiva do pai. “Tudo é possível ao que crê”. Não foi só o menino que saiu liberto daquele encontro. O pai também. Porque a crença de que não havia remédio para o diagnóstico, de que os poderes das trevas não cederiam à luz, caiu por terra. O pai saiu liberto da sua incredulidade.
No tempo de Jesus, assim como hoje, existiam dimensões onde as mentiras do Diabo tinham se tornado sistemas de crenças muito bem articulados e convincentes. Eram muralhas, filosofias vãs, que impediam a pessoa de ver o que estava óbvio para Jesus. Quando Jesus diz: “Esta casta só é expulsa com jejum e oração”, ele está falando de um esforço a mais, nosso, de mudança de visão. Uma dedicação em oração para que Deus nos mostre onde focar nossas energias. Ele quer que tenhamos clareza sobre que parte da luta é nossa, que parte é orquestrada pelo Espírito Santo, a assim o medo soprado pelo maligno cede e a nossa confiança num Deus que age cresce.
Embora eu creia que todo cristão precisa orar sobre tudo que o estiver incomodando, penso também que, a julgar pelos pedidos compartilhados em nossos grupos, o Espírito Santo tem um trabalho muito rotineiro e nada transformador. Cura fulano, abre as portas para um emprego para a fulana, provê segurança na viagem do outro fulano.
Enquanto Marcos nos dá uma visão bem próxima da conversa de Jesus com o pai do menino, Mateus coloca a incredulidade nos ombros dos discípulos. A falta de fé dos discípulos é mais preocupante do que a do pai se levarmos em conta tudo o que eles já tinham presenciado até então. Descreram não pela falta de demonstração de poder da parte de Jesus, mas sim pela falta de um coração que almeja amar e servir, que quer o melhor para o próximo, que se abstém de julgamentos e discussões sobre importância, impacto, relevância.
Onde está a oração que muda as intenções, muda o coração, quebra barreiras, derruba mentiras, liberta e transforma? Enquanto não formos confrontados na nossa própria incredulidade e no quanto a usamos, inclusive como escudo, nada muda. Obter uma audiência com Jesus é um negócio perigoso.
Eu e meu esposo temos orado já há quase um ano a oração deste pai, “Eu creio. Senhor, me ajuda na minha incredulidade!”. Não vale a pena orar se não estivermos dispostos a correr os riscos. Mateus registra até uma promessa depois da bronca no final deste relato. É uma promessa para o discípulo, para você e para mim: “Porque em verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e há de passar; e nada vos será impossível” (Mateus 17.20).
- Elsie Cunha Gilbert, missionária, jornalista e coordenadora da Rede Mãos Dadas. Casada com James Gilbert, mãe de três filhos e de uma filha.
EXERCITE-SE! SAIA DA INÉRCIA ESPIRITUAL
A cultura dominante parece ter uma relação ambígua com a disciplina. Em algumas áreas, a despreza em nome de uma “liberdade” sem limites. Em outras, a valoriza e até mesmo a enaltece.
A cultura dominante parece ter uma relação ambígua com a disciplina. Em algumas áreas, a despreza em nome de uma “liberdade” sem limites. Em outras, a valoriza e até mesmo a enaltece.
Ainda que exija esforço, o exercício das práticas espirituais não deve ser um peso, mas sim levar-nos às águas de descanso. Quanto mais exercitamos a disciplina, mais nos damos conta que – embora nos imponha restrições – ela nos leva a um caminho de liberdade interior.
É disso que trata a matéria de capa da edição de 387 da revista Ultimato. Para assinar, clique aqui.
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Saiba mais:
» Como Lidar com a Dúvida, de ALISTER McGRATH
» Práticas Devocionais: exercícios de sobrevivência e plenitude espiritual, de Elben César
» Súplicas de Um Necessitado, de Elben César
» A Oração Nossa de Cada Dia, de Carlos Pinheiro Queiroz
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