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Opinião

Uma juventude protestante cosmopolita

A origem da Associação Cristã de Moços (ACM) remonta ao ano de 1844, em Londres, Inglaterra, quando um caixeiro de tapeçaria, George Williams, iniciou de forma modesta o esforço de assistir jovens necessitados. O contexto da segunda revolução industrial criou bolsões de miséria e desamparo para a população migrante dos campos. Nos Estados Unidos e Canadá, a partir de 1851, as associações se espalharam formando uma aliança com inúmeras sedes, sócios, patrimônio e capital. Diferentes grupos sociais, raciais e econômicos formaram associações, como estudantes, operários, indígenas, negros, militares e mercadores.

No Brasil, duas tentativas sem sucesso antecederam a criação da ACM quando foi formada oficialmente no ano de 1893. A primeira aconteceu em 1875 e a segunda em 1885. As dificuldades e os embates encontrados pelos brasileiros em torno das questões litúrgicas e doutrinárias foram superados quando da vinda do norte-americano Myron A. Clark. Assim, a ACM foi finalmente fundada depois de reunir jovens lideranças das duas principais igrejas do Rio de Janeiro, a Igreja Evangélica Fluminense e a Igreja Presbiteriana. Clark era secretário da Comissão Internacional das Associações Cristãs de Moços nos Estados Unidos.

A ACM foi uma espécie de entidade civil e religiosa que propagava um ideal de ser humano capacitado a viver o progresso de sua época. Por conta desta ideologia religiosa e secularizada, no Brasil ela promoveu o ensino semanal e gratuito de línguas estrangeiras e do próprio português, eventos culturais e de lazer, além de palestras de cunho moral e religioso, abertas ao público. Suas atividades visavam atrair jovens afetados pelos vícios, lhes conceder um espaço de sociabilidade e disseminar o Evangelho.

O discurso da ACM acompanhou a crítica do protestantismo aos costumes tidos como impuros e às manifestações da cultura identificadas como pecaminosas. A contingência da bebida e do fumo, as posturas corretas e o vestuário, a higiene pessoal e pública, a alimentação e o asseio doméstico eram enunciados que faziam parte das falas e das ações dos serviços públicos do período republicano nascente. Havia um ideal de cristão jovem urbano, puro, trabalhador, moralmente responsável, saudável, esportista e intelectualizado.

A ACM foi uma das poucas entidades no Brasil que, neste período inicial da república brasileira, estimulava o exercício corporal como atividade lúdica e de aperfeiçoamento do caráter, juntamente com as escolas protestantes que incluíram a educação física no seu currículo. O puritanismo da entidade contrastava com as formas culturais nativas, mas recolocava outras formas culturais de vida mais adequadas à modernidade. Projetou um ideal de juventude que fosse o mesmo em qualquer parte do mundo, munido de valores morais e religiosos, educado e saudável, cidadão protestante e cosmopolita.

O projeto da ACM no Brasil foi elitista, distante das questões sociais e políticas e, principalmente, das camadas mais carentes da sociedade, meio e ambiente de onde e para onde surgira com George Williams. Contudo, a ACM foi um espaço de sociabilidade para lideranças jovens eclesiásticas e leigas que despontariam no cenário protestante brasileiro. Suas atividades culturais e religiosas serviram para formar uma geração de lideranças engajada em compreender o protestantismo e a sua relação com a cultura brasileira.

Alguns números registraram as atividades da ACM nos anos de 1901 e 1902:

Atividades
Total em 1902
Mês de DezembroTotal em  1901Mês de Dezembro      
Assistência Diária106035118038
Conferências Dominicais1724314329
Conferências Populares7070  -  -
Reuniões de Oração46114511
Reuniões Sociais1062623759
Aula Bíblica23113810
Aulas Noturnas173111707
Reunião de Vigílias180  -80  -

Fontes:
SANTOS, Lyndon de A. As outras faces do sagrado: protestantismo e cultura na primeira república brasileira. São Luis: EDUFMA; São Paulo: Ed. ABHR, 2006. Pp. 191 a 195.
Jornal da ACM – Órgão Mensal da Associação Christã de Moços – Anno V – Rio de Janeiro, Janeiro de 1903 – No. 157.

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Lyndon de Araújo Santos é historiador, professor universitário e pastor da Igreja Evangélica Congregacional em São Luís, MA. Faz parte da Fraternidade Teológica Latino-americana - Setor Brasil (FTL-Br).
  • Textos publicados: 35 [ver]

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