Por Abraão Filipe

Durante todo este ano, em minha comunidade de fé, estamos sendo desafiados a discutir, entender e viver a santificação – esse é o tema anual da Igreja. E por isso, nos últimos dias, tenho pensado e refletido sobre esse fundamento bíblico.

Santificação muitas vezes é confundida com legalismo, religiosidade, moralismo e até perfeição. Jesus, porém, na sua oração registrada em João 17, traz grandes esclarecimentos sobre como nos relacionar com o mundo que nos cerca, já que Ele mesmo disse que não nos tiraria do mundo, mas pediu: “Santifica-os na tua verdade; a tua palavra é a verdade” (João 17.17).

Como nos consagrar, então, à luz da Verdade que seguimos?

Um dos versículos bastante citados das Escrituras é “Segui a paz com todos e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hebreus 12.14). Com essa ilustração, o escritor aos Hebreus traz algo curioso: quem não tiver uma vida santa não será capaz de ver o Senhor. Ora, a santidade seria, então, um choque de realidade, que está estreitamente ligado à nossa visão.

A salvação é o início da vida cristã, mas é andando com Cristo que o homem simul justus et peccator (simultaneamente justo e pecador, segundo Lutero) se torna como Ele. O nosso padrão de santidade é ser como Cristo: “Agora, porém, sejam santos em tudo que fizerem, como é santo aquele que os chamou. Pois as Escrituras dizem: ‘Sejam santos, porque eu sou santo’” (1 Pedro 1.15,16). A intenção que nos guia é o desejo de agradar a Deus, o Senhor, de quem somos e a quem servimos: “Amados, visto que temos essas promessas, purifiquemo-nos de tudo que contamina o corpo ou o espírito, tornando-nos cada vez mais santos porque tememos a Deus” (2 Coríntios 7.1). Inclusive, John Piper diz: “Nossa nova vida começou com um milagre – e ela continua com um milagre. O milagre ininterrupto que Deus opera por Seu Espírito consiste em que nos tornemos cada vez mais parecidos com aquele que admiramos e apreciamos – Cristo.”

O Segundo Livro dos Reis de Israel conta uma história interessante. Os sírios estavam em guerra contra Israel e as estratégias envolvidas eram brutais. Porém, todas as vezes que eles tentavam se posicionar em algum lugar para atacar, o profeta Eliseu era avisado por Deus e alertava o rei de Israel: “Não se aproxime de tal lugar, pois os sírios planejam posicionar suas tropas ali”. Chegou um momento que o rei da Síria pensou que alguém os estava informando, até que ele foi notificado pelos seus servos: pela revelação, Eliseu sabia até as palavras que eram ditas nos aposentos. Furioso, o rei decidiu então enviar os oficiais atrás de Eliseu e, numa noite, um grande exército com muitos carros de guerra e cavalos cercaram a cidade. Pela manhã, o ajudante de Eliseu, Geazi, acordou e se desesperou com a cena que viu: “Ai, meu senhor, o que faremos agora?”.

Porém, há algo incrível nesse episódio. A resposta de Eliseu é totalmente serena, já que ele conhecia Quem estava do lado deles. O servo, contudo, não acreditava. Foi quando o profeta orou: “Ó SENHOR, abre os olhos dele, para que veja” (2 Reis 6.17). Foi surpreendente: o servo viu as colinas ao redor de Eliseu cheias de cavalos e carruagens de fogo. Aqui há uma descoberta transformadora. Santidade é enxergar o invisível. Santificação é ter os olhos abertos para ver o sobrenatural. Um processo que é obra do Espírito, trazendo discernimento ao homem, e envolve a realidade do Eterno.

No Novo Testamento, quando os dois discípulos, desolados pelo sepultamento do Mestre, iam de Jerusalém para Emaús e Jesus apareceu, eles não perceberam. Seus olhos estavam cobertos: é isso que o pecado, a tristeza e a dor fazem conosco. Só Cristo, a glória da nova aliança, remove esse véu e nos enche de esperança, confiança e coragem (2 Co 3.4,12). Eles foram andando, conversando e discutindo a respeito de tudo que havia acontecido, sem assumir a presença do Autor da Vida. Até que anoiteceu e convenceram Jesus a ir para casa com eles. Quando já estavam à mesa e Ele tomou o pão para dar graças: “abriram-se-lhes, então, os olhos”. Jesus foi reconhecido e, na mesma hora, desapareceu. Enquanto iam no caminho, o Caminho estava o tempo todo entre eles, e era por isso que o coração não parava de arder (Lucas 24.32).

Da mesma forma, Salomão diz que: “O caminho dos justos é como a primeira luz do amanhecer, que brilha cada vez mais até o dia pleno clarear” (Provérbios 4.18). O Haja de Deus brilhou para nós! Foi assim também no deserto, por quarenta anos, com o povo de Israel – “Guardem fielmente meus mandamentos pondo-os em prática, pois eu sou o Senhor. Não desonrem meu santo nome, pois demonstrarei minha santidade no meio dos israelitas. Eu sou o Senhor, que os santifica. Eu os libertei da terra do Egito para ser o seu Deus. Eu sou o Senhor” (Levítico 22.31-33). Deus não os deixou nem um minuto. E até hoje, Ele está conosco todos os dias, pois Seu Filho assim prometeu (Mateus 28.20).

O apóstolo Paulo deixou registrado que a beleza desse processo é a glória de Deus: “E todos nós, com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito” (2 Coríntios 3.18). Logo, nunca desistimos: Cristo se manifesta em nós e apesar de nós. Dia após dia, estamos sendo renovados à medida que nos atentamos para o invisível e contemplamos o inabalável, aquilo que é eterno (2 Coríntios 4).

Assistindo a uma dessas palestras de teólogos famosos que aparecem na internet, ouvi a seguinte frase: acostuma-se a ver e contemplar, cotidianamente, o invisível! Ou seja, a santificação diária é o processo que permite que o sobrenatural se revele e transforme todas as coisas. Não sejamos como o pobre Tomé, que ouviu de Jesus: “Você crê porque me viu. Felizes são aqueles que creem sem ver!” (João 20.29). Sim, nós somos dotados de um sentido que nos capacita a ver o invisível, ouvir o inaudível, experimentar o futuro antes dele chegar. É assim que o cristão trilha seus dias aqui na Terra: casa, estuda, se relaciona, enfim, vive. Afinal, olhamos prAquele que é a Verdade, o Caminho e a Vida.

Humildemente, podemos dizer como Paulo, que reconhecia que ainda não alcançou a perfeição, mas concentrava todos os seus esforços nisso (Fp 3.11,12). Mais do que isso, o caminho da santificação é uma postura de visão: a opção de olhar para o que está adiante e não para as coisas passadas, para o que é velho. Sim, Paulo está falando do final da corrida, do prêmio que nos aguarda nos Céus, do grande momento de ver o Pai como Ele é. Maranata – ora vem, Senhor Jesus!

  • Abraão Filipe, 19 anos. Natural de São Mateus (ES) e estudante de Jornalismo em terras mineiras, na Universidade Federal de Viçosa.
  1. Eliseu Marques de Oliveira

    Essa é uma leitura edificante e prazerosa! Que nossos olhos estejam abertos a esse maravilhoso “momento” que Deus reservou aos seus. Gratidão por compartilhar tamanha inspiração.

  2. Estou sem palavras para descrever o que li e sentir nessas linhas . Elas saltam da tela para nossos corações. Que Deus continue te usando poderosamente, obrigada por partilhar esse lindo presente de Deus conosco e creio outros maravilhosos que viram .Parabéns meu querido . Um abraço (menino*) do coração de Deus.
    *carinhosamente .

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