Um velho pastor
A voz saía com dificuldade, sob o peso da velhice e das dores que o afetam constantemente. Mesmo assim os pensamentos eram claros e sucintos. Era a voz de um velho pastor.
João Rodrigues tem 85 anos. Caminha com muita dificuldade. Na verdade, na maior parte do tempo, ele está sentado.
Por muito tempo, morou em uma casa grande, intencionalmente escolhida para acolher pessoas. Hoje, vive em uma residência menor, com a esposa dona Carmen e filhos. Sente-se orgulhoso em contabilizar o número de visitas que já fez na vida.
Eu não conhecia o Pr. João. Fui lá entrevistá-lo para um vídeo. Era uma manhã ensolarada, com os raios entrando pela janela da sala. Começo fazendo uma pergunta específica, mas ele me dá outra resposta. Fala sobre sua vida pessoal. Emociona-se. Conta como Deus lhe é precioso; e conta de um jeito comovente, relevando como sua fé é viva e real.
Enquanto o pastor fala, uma das suas filhas faz gestos para mim, lá no fundo da sala. Ela está tensa com o fato do Pr. João não ter respondido minha pergunta. “Ele sempre faz isso”, diz a filha. Mas eu não estou preocupado. Quero ouvi-lo mais, quero aprender sobre uma vida de fé com o testemunho daquele velho homem frágil fisicamente, mas forte espiritualmente.
Pr. João diz que sem Deus não há prazer na vida. De forma simples, me trata como se eu fosse sua ovelha. É simpático. É pastoral.
Após alguns minutos, eu tive que seguir a pauta da entrevista e, por isso, não ouvi o final da história do Pr. João. Talvez não seja necessário. O que me falou já é suficiente para eu me lembrar que o final da vida é um exercício cotidiano de navegar em uma jangada, sem equipamentos, sem salva-vidas, sem “plano B”. É sobreviver apenas com o essencial, com o básico, com o que nos resta. O que restou àquele homem? Saúde? Recursos? Fama? Nada, exceto o amor que dedicou às pessoas e a intimidade com Deus cultivada ao longo de tantos anos.
Pr. João estava de “mãos vazias”, mas com o coração cheio de graça.
Talvez seja só hábito de pastor. Ou talvez não.
A velhice talvez seja voltar às origens. Assim como Deus sempre quis.
Deus e paixão são os ingredientes essenciais para a vida. (Eugene Peterson)