Duas mulheres e um colo vazio
Chegamos para a consulta de rotina de minha esposa. Também à espera do ginecologista, duas mulheres. Uma, jovem, grávida de oito meses; a outra, com feição triste e aparentando uns 30 anos, carregava uma pasta cinza nas mãos. O médico está atrasado, e minha esposa aproveita para fazer umas compras no supermercado ao lado, e deixa nosso filho em meu colo.
De repente então, me vi na seguinte cena: eu, desajeitado com meu filho de três meses nos braços. Em minha frente, duas mulheres: uma jovem quase mãe e outra na espera impaciente do médico. A grávida puxa assunto com a colega que acaba de conhecer. Descubro então que a tal mulher também estivera grávida, mas ainda no início perdera o bebê. Tudo bem recente. Ela estava voltando ao médico para apresentar os exames feitos após a interrupção da gravidez. Mesmo já tendo filhos, a tristeza pela perda é evidente.
Veja bem. A vida, suas circunstâncias e suas estações condensadas em um único momento. Tantas perguntas! Tanto mistério entre a vida celebrada, a vida esperada e a vida perdida.
Por um lado, sinto pena e sou tentado a pensar que não deveria ser assim. Esses encontros entre circunstâncias tão opostas não deveriam existir. Por outro lado, devo admitir que a vida real é mais parecida com o que vejo neste momento do que com o que elaboram os que não a querem enfrentar. Encarar a vida não é idealizá-la, mas sim admiti-la, mesmo quando nos encontramos com sua face misteriosa.
Ainda estou com meu filho no colo, ele que já dorme há alguns minutos. Começo a imaginar no que essas duas mulheres estariam pensando a meu respeito. “Ele não sabe carregar o bebê!”. “Onde está a mãe desta criança?”. “Por que eu, que sou mulher, estou com as mãos vazias, e ele, que é homem, não está?”. Sinto-me um pouco constrangido tanto diante da possibilidade de que elas realmente tenham pensado isso quanto da minha imaginação absurda.
Sinto calor. Saio do local e vou para a calçada. Meus braços estão cansados. Elas continuam lá à espera do médico que não chega.
Ah, essa vida estranha que nos faz esperar enquanto sofremos, e sofrer enquanto esperamos!
Aline Trindade
O bom de tudo, e de admitir também a vida, é que a nossa Fé em Deus aumenta, mesmo no sofrimento. Quando somos fracos, somos fortes. Né?
Lissânder Dias
Tem razão, Aline!
Ivny
Muito bom, querido amigo!
isalo
ruim
patricia
Gostei
Tamy Martins
Interessante, já analisei tanto conversar em ônibus, trens, clínicas, e reflito comparando com a minha. A vida é surpreendente!! 😊