Opinião
- 26 de outubro de 2021
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Faço tudo por você
Por Carlos “Catito” e Dagmar Grzybowski
Outro dia, conversando com um casal, ouvi o marido dizer o seguinte:
– Eu não faço tudo por você? Até o seu prato, nas horas das refeições, eu faço!
Ao que a esposa prontamente respondeu:
– É verdade, mas eu gostaria de escolher a comida que você coloca no meu prato!
Essa conversa retrata o que muitas vezes acontece no interior de algumas famílias, em que conflitos surgem por “excesso de agrado”. São cônjuges que querem agradar demais seus pares, pais que querem agradar demais seus filhos, avós que querem agradar demais seus netos. E, no afã de querer agradar, “se esquecem” de perguntar quais são as reais necessidades da outra pessoa.
Você pode estar pensando: “Mas não é bom ter alguém querendo sempre nos agradar?”. Aparentemente parece ser algo bem atraente, entretanto pode ser danoso em dois aspectos: primeiro porque limita a liberdade de expressão do outro e não permite que este manifeste efetivamente seus desejos e necessidades e, desta forma, comunica que ele não é capaz de decidir por si mesmo, infantilizando-o de modo contínuo.
Uma criança nos seus primeiros estágios de desenvolvimento realmente ainda não tem maturidade para fazer escolhas e necessita de alguém que possa fazê-las por ela. Por exemplo: não é sensato levar uma criança de 2 anos a uma loja de calçados e dizer-lhe para escolher o calçado que ela quiser – ela ficará confusa e possivelmente fará escolhas equivocadas. Um adulto precisa fazer essa escolha por ela. Entretanto, se você for com um adolescente a uma loja de calçados e não lhe der a liberdade de escolher seu próprio calçado (dentro de certos parâmetros), estará tirando dele toda a capacidade de iniciativa e comunicando, sem palavras, sua incapacidade para fazer escolhas.
Em segundo lugar, fazer tudo pelo outro também limita o esforço do outro em obter o que necessita. Ouço muitas vezes pais dizendo que “não querem que seus filhos passem pelo que eles passaram!”. E eu me pergunto: por que não?
A avaliação dessa afirmativa está muitas vezes no viés material, e este é um equívoco! A tradução mais correta da frase seria: “Eu não quero que meus filhos passem pelas privações materiais pelas quais eu passei na vida”. Esse é um bom desejo para os filhos, mas não é o essencial. Penso que muito do caráter de pais que passaram por privações foi forjado justamente pelo contexto de dificuldades. Na dificuldade aprende-se o valor do trabalho honesto, a realização de cada pequena conquista e, acima de tudo, a dependência maior de Deus.
Nesse sentido, podemos e devemos permitir ao outro que se esforce para alcançar seus objetivos, pois lhe trará um sentido de realização e laboriosidade, essencial para a afirmação da própria identidade.
Por fim, existe sempre o risco de que o desejo de suprir todas as necessidades quer seja do cônjuge, filhos ou netos encubra um sutil desejo de certo “controle” da vida do outro. Uma dupla mensagem paradoxal: eu lhe dou tudo que você necessita, mas ao mesmo tempo eu defino o que você necessita! E toda dupla mensagem é geradora de patologia.
Esteja atento às necessidades de seus queridos, mas não tome para si a responsabilidade de supri-las todas. Lembre-se sempre: “O Pai de vocês, que está no céu, sabe que vocês precisam de todas elas” (Mt 6.32).
• Carlos “Catito” e Dagmar são casados, ambos psicólogos e terapeutas de casais e de família. São autores de Pais Santos, Filhos Nem Tanto. Acompanhe o blog.
Publicado originalmente na seção "Família" da edição Uma Conversa sobre a Morte (set/out 2021) de Ultimato.
Leia mais:
» Família: diferença e complementaridade
Outro dia, conversando com um casal, ouvi o marido dizer o seguinte:
– Eu não faço tudo por você? Até o seu prato, nas horas das refeições, eu faço!
Ao que a esposa prontamente respondeu:
– É verdade, mas eu gostaria de escolher a comida que você coloca no meu prato!
Essa conversa retrata o que muitas vezes acontece no interior de algumas famílias, em que conflitos surgem por “excesso de agrado”. São cônjuges que querem agradar demais seus pares, pais que querem agradar demais seus filhos, avós que querem agradar demais seus netos. E, no afã de querer agradar, “se esquecem” de perguntar quais são as reais necessidades da outra pessoa.
Você pode estar pensando: “Mas não é bom ter alguém querendo sempre nos agradar?”. Aparentemente parece ser algo bem atraente, entretanto pode ser danoso em dois aspectos: primeiro porque limita a liberdade de expressão do outro e não permite que este manifeste efetivamente seus desejos e necessidades e, desta forma, comunica que ele não é capaz de decidir por si mesmo, infantilizando-o de modo contínuo.
Uma criança nos seus primeiros estágios de desenvolvimento realmente ainda não tem maturidade para fazer escolhas e necessita de alguém que possa fazê-las por ela. Por exemplo: não é sensato levar uma criança de 2 anos a uma loja de calçados e dizer-lhe para escolher o calçado que ela quiser – ela ficará confusa e possivelmente fará escolhas equivocadas. Um adulto precisa fazer essa escolha por ela. Entretanto, se você for com um adolescente a uma loja de calçados e não lhe der a liberdade de escolher seu próprio calçado (dentro de certos parâmetros), estará tirando dele toda a capacidade de iniciativa e comunicando, sem palavras, sua incapacidade para fazer escolhas.
Em segundo lugar, fazer tudo pelo outro também limita o esforço do outro em obter o que necessita. Ouço muitas vezes pais dizendo que “não querem que seus filhos passem pelo que eles passaram!”. E eu me pergunto: por que não?
A avaliação dessa afirmativa está muitas vezes no viés material, e este é um equívoco! A tradução mais correta da frase seria: “Eu não quero que meus filhos passem pelas privações materiais pelas quais eu passei na vida”. Esse é um bom desejo para os filhos, mas não é o essencial. Penso que muito do caráter de pais que passaram por privações foi forjado justamente pelo contexto de dificuldades. Na dificuldade aprende-se o valor do trabalho honesto, a realização de cada pequena conquista e, acima de tudo, a dependência maior de Deus.
Nesse sentido, podemos e devemos permitir ao outro que se esforce para alcançar seus objetivos, pois lhe trará um sentido de realização e laboriosidade, essencial para a afirmação da própria identidade.
Por fim, existe sempre o risco de que o desejo de suprir todas as necessidades quer seja do cônjuge, filhos ou netos encubra um sutil desejo de certo “controle” da vida do outro. Uma dupla mensagem paradoxal: eu lhe dou tudo que você necessita, mas ao mesmo tempo eu defino o que você necessita! E toda dupla mensagem é geradora de patologia.
Esteja atento às necessidades de seus queridos, mas não tome para si a responsabilidade de supri-las todas. Lembre-se sempre: “O Pai de vocês, que está no céu, sabe que vocês precisam de todas elas” (Mt 6.32).
• Carlos “Catito” e Dagmar são casados, ambos psicólogos e terapeutas de casais e de família. São autores de Pais Santos, Filhos Nem Tanto. Acompanhe o blog.
Publicado originalmente na seção "Família" da edição Uma Conversa sobre a Morte (set/out 2021) de Ultimato.
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Ricardo Barbosa