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- 07 de julho de 2015
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Vocação: descansar!
Julho, férias, descanso, certo? Nem sempre. Não são poucas as pessoas que “desaprenderam” a descansar. Não basta não precisar ir ao trabalho. É necessário ter compreensão do valor do descanso verdadeiro; daquele que renova forças e alivia as cargas. Deus pode nos ajudar a descansar.
Aproveitamos a data e o tema para compartilhar um trecho do livro Trabalho, Descanso e Dinheiro, de Timóteo Carriker. O livro, de 80 páginas, é um simples, mas precioso guia para vivermos uma espiritualidade sadia, equilibrada e coerente com a vontade de Deus. E, por falar nisso, afinal, o que a Bíblia fala sobre descanso? Confira a seguir.
****
“E, havendo Deus terminado no dia sétimo a sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a sua obra que tinha feito”. (Gn 2.2)
Parte da nossa vocação consiste em descansar. O próprio Deus descansou depois de haver criado o mundo. Aliás, no Decálogo, a proibição de trabalhar no sábado tem o mesmo peso que a proibição de matar ou de roubar. Enquanto Israel estava no deserto e, depois, no exílio, Deus lhe prometeu descanso na terra (Dt 3.20; Jr 46.27). A nação toda seguia o ritmo de uma vida de trabalho e descanso. Cada sétimo dia, cada sétimo ano e cada sétimo de sete anos era um sábado para as pessoas, os animais e até para a própria terra.
Esse ciclo de trabalho e descanso estava intimamente ligado à sua dependência fiel de Deus. Pois, para descansar no sétimo ano, Israel precisava confiar em Deus que a terra produziria o suficiente para passar o ano sabático (Lv 25.18-24). No quinquagésimo ano, a sua fé era provada mais ainda, porque Israel precisava passar dois anos sem trabalhar com as mãos, dependendo de doações de Deus (Lv 25.8-12).
De modo semelhante, no Novo Testamento, a nossa suprema dependência de Deus, a salvação, é descrita em termos de entrar no descanso do Senhor (Hb 3-4). Não se deve confundir este descanso com a inatividade física ou mental. Para justificar sua atividade no sábado, isto é, o seu descanso, Jesus disse: “Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também” (Jo 5.17). Portanto, o descanso cristão não é a falta de esforço físico ou mental, como no conceito popular. Em Hebreus 4.11, muito longe de pressupor inatividade, o repouso cristão exige empenho, requer esforço (cf. Hb 12.2, 3). Trata-se de um esforço para permanecer na dependência de Deus.
No conceito bíblico, o descanso se define como nossa dependência de Deus e a sua resposta em Jesus à maldição da dor no trabalho (Mt 11.28-30). São os desobedientes, ou independentes de Deus, que não conseguem entrar no descanso do Senhor (Hb 4.11). Ora, não foi a primeira desobediência humana - a vontade de ser independente de Deus - que causou, como castigo divino, a dor do trabalho (Gn 3.14-19)? Se o castigo, a dor e o sofrimento do trabalho, e não o trabalho em si, foram resultados de um desejo de independência de Deus — uma vontade outras vezes descrita como desobediência ou infidelidade —, a reversão desse castigo se dá pela obediência e fidelidade ao Deus Supremo, em Cristo, e é descrita como o antônimo do trabalho doloroso, isto é, o descanso. O apelo para entrar no descanso de Deus, então, é um convite para entregar todas as nossas ansiedades, todas as nossas preocupações e toda a nossa autossuficiência a Jesus. Expressa-se mais nítida e profundamente no convite de Jesus: “Vinde a mim todos os que estais cansados” (Mt 11.28). O verdadeiro repouso está em Jesus. Não é a invulnerabilidade e a inércia dos estoicos, mas a paz, o contentamento, a segurança e a completa dependência de Deus, revelados em Jesus.
Dito dessa forma, vejamos quais são as implicações da visão bíblica do descanso para nós. Quero destacar três princípios:
1. O descanso é mais que recuperação do serviço ou preparo para ele. Não é simplesmente o produto de fatores externos, o resultado inevitável de tempo sobrando, um feriado ou um fim de semana. É uma condição, e até atitude, de toda nossa vida. Aliás, o descanso e o trabalho podem envolver atividades semelhantes, porém realizadas com perspectivas, atitudes e motivações diferentes. Por exemplo, a leitura faz parte tanto do meu trabalho como do meu descanso. E o meu descanso inclui tanto uma longa caminhada, como o trabalho duro na horta e o esforço físico de um dia inteiro surfando na praia.
2. O descanso está ligado à fé. Esta é a razão por que a maioria de nós evita o verdadeiro descanso e a razão por que o cristianismo medieval o entendeu como uma atividade mais elevada. A Bíblia relaciona a falta do descanso à desobediência e incredulidade (Sl 95.8-11; Hb 3.7-4.10). Quando descansamos estamos reconhecendo que todo esforço da nossa vontade, por si só, nada adianta. O descanso genuíno pressupõe o reconhecimento de que os nossos irmãos na fé sobrevivem sem a nossa intervenção. Esse descanso requer o reconhecimento da nossa própria insuficiência e uma entrega de responsabilidade. É uma trégua real aos caminhos de Deus. E é um momento de celebração quando reconhecemos que a bênção vem somente de Deus. É por isso que o descanso exige fé. É também por essa razão que a salvação pode ser descrita em termos de descanso. Quando descansamos, aceitamos a graça de Deus: não procuramos ganhar, recebemos; não justificamos, somos justificados.
3. O descanso não se destina ao consumo. Nossa sociedade está cada vez mais distante do descanso. Seus feriados fabricados se transformam cada vez mais em veículos de consumo. Nos países onde o expediente do dia útil diminuiu, o resultado que Karl Marx esperava acontecer acabou não acontecendo. Em vez de provocar, nos povos, o desenvolvimento da dedicação ao trabalho e do senso crítico, bem como o florescimento da cultura, produziram-se nações de consumidores. O descanso genuíno deve fluir de uma fé viva no Salvador, que assume o nosso fardo.
Nota: trecho retirado do livro Trabalho, Descanso e Dinheiro (páginas 55-59), de Timóteo Carriker.
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Saúde emocional e vida cristã
Livres da tirania da urgência
A benção de desligar-se
Foto: freeimages.com/photo/1215934
Aproveitamos a data e o tema para compartilhar um trecho do livro Trabalho, Descanso e Dinheiro, de Timóteo Carriker. O livro, de 80 páginas, é um simples, mas precioso guia para vivermos uma espiritualidade sadia, equilibrada e coerente com a vontade de Deus. E, por falar nisso, afinal, o que a Bíblia fala sobre descanso? Confira a seguir.
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“E, havendo Deus terminado no dia sétimo a sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a sua obra que tinha feito”. (Gn 2.2)
Parte da nossa vocação consiste em descansar. O próprio Deus descansou depois de haver criado o mundo. Aliás, no Decálogo, a proibição de trabalhar no sábado tem o mesmo peso que a proibição de matar ou de roubar. Enquanto Israel estava no deserto e, depois, no exílio, Deus lhe prometeu descanso na terra (Dt 3.20; Jr 46.27). A nação toda seguia o ritmo de uma vida de trabalho e descanso. Cada sétimo dia, cada sétimo ano e cada sétimo de sete anos era um sábado para as pessoas, os animais e até para a própria terra.
Esse ciclo de trabalho e descanso estava intimamente ligado à sua dependência fiel de Deus. Pois, para descansar no sétimo ano, Israel precisava confiar em Deus que a terra produziria o suficiente para passar o ano sabático (Lv 25.18-24). No quinquagésimo ano, a sua fé era provada mais ainda, porque Israel precisava passar dois anos sem trabalhar com as mãos, dependendo de doações de Deus (Lv 25.8-12).
De modo semelhante, no Novo Testamento, a nossa suprema dependência de Deus, a salvação, é descrita em termos de entrar no descanso do Senhor (Hb 3-4). Não se deve confundir este descanso com a inatividade física ou mental. Para justificar sua atividade no sábado, isto é, o seu descanso, Jesus disse: “Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também” (Jo 5.17). Portanto, o descanso cristão não é a falta de esforço físico ou mental, como no conceito popular. Em Hebreus 4.11, muito longe de pressupor inatividade, o repouso cristão exige empenho, requer esforço (cf. Hb 12.2, 3). Trata-se de um esforço para permanecer na dependência de Deus.
No conceito bíblico, o descanso se define como nossa dependência de Deus e a sua resposta em Jesus à maldição da dor no trabalho (Mt 11.28-30). São os desobedientes, ou independentes de Deus, que não conseguem entrar no descanso do Senhor (Hb 4.11). Ora, não foi a primeira desobediência humana - a vontade de ser independente de Deus - que causou, como castigo divino, a dor do trabalho (Gn 3.14-19)? Se o castigo, a dor e o sofrimento do trabalho, e não o trabalho em si, foram resultados de um desejo de independência de Deus — uma vontade outras vezes descrita como desobediência ou infidelidade —, a reversão desse castigo se dá pela obediência e fidelidade ao Deus Supremo, em Cristo, e é descrita como o antônimo do trabalho doloroso, isto é, o descanso. O apelo para entrar no descanso de Deus, então, é um convite para entregar todas as nossas ansiedades, todas as nossas preocupações e toda a nossa autossuficiência a Jesus. Expressa-se mais nítida e profundamente no convite de Jesus: “Vinde a mim todos os que estais cansados” (Mt 11.28). O verdadeiro repouso está em Jesus. Não é a invulnerabilidade e a inércia dos estoicos, mas a paz, o contentamento, a segurança e a completa dependência de Deus, revelados em Jesus.
Dito dessa forma, vejamos quais são as implicações da visão bíblica do descanso para nós. Quero destacar três princípios:
1. O descanso é mais que recuperação do serviço ou preparo para ele. Não é simplesmente o produto de fatores externos, o resultado inevitável de tempo sobrando, um feriado ou um fim de semana. É uma condição, e até atitude, de toda nossa vida. Aliás, o descanso e o trabalho podem envolver atividades semelhantes, porém realizadas com perspectivas, atitudes e motivações diferentes. Por exemplo, a leitura faz parte tanto do meu trabalho como do meu descanso. E o meu descanso inclui tanto uma longa caminhada, como o trabalho duro na horta e o esforço físico de um dia inteiro surfando na praia.
2. O descanso está ligado à fé. Esta é a razão por que a maioria de nós evita o verdadeiro descanso e a razão por que o cristianismo medieval o entendeu como uma atividade mais elevada. A Bíblia relaciona a falta do descanso à desobediência e incredulidade (Sl 95.8-11; Hb 3.7-4.10). Quando descansamos estamos reconhecendo que todo esforço da nossa vontade, por si só, nada adianta. O descanso genuíno pressupõe o reconhecimento de que os nossos irmãos na fé sobrevivem sem a nossa intervenção. Esse descanso requer o reconhecimento da nossa própria insuficiência e uma entrega de responsabilidade. É uma trégua real aos caminhos de Deus. E é um momento de celebração quando reconhecemos que a bênção vem somente de Deus. É por isso que o descanso exige fé. É também por essa razão que a salvação pode ser descrita em termos de descanso. Quando descansamos, aceitamos a graça de Deus: não procuramos ganhar, recebemos; não justificamos, somos justificados.
3. O descanso não se destina ao consumo. Nossa sociedade está cada vez mais distante do descanso. Seus feriados fabricados se transformam cada vez mais em veículos de consumo. Nos países onde o expediente do dia útil diminuiu, o resultado que Karl Marx esperava acontecer acabou não acontecendo. Em vez de provocar, nos povos, o desenvolvimento da dedicação ao trabalho e do senso crítico, bem como o florescimento da cultura, produziram-se nações de consumidores. O descanso genuíno deve fluir de uma fé viva no Salvador, que assume o nosso fardo.
Nota: trecho retirado do livro Trabalho, Descanso e Dinheiro (páginas 55-59), de Timóteo Carriker.
Leia também
Saúde emocional e vida cristã
Livres da tirania da urgência
A benção de desligar-se
Foto: freeimages.com/photo/1215934
teólogo, missionário da Igreja Presbiteriana Independente, capelão d’A Rocha Brasil e surfista nas horas vagas. Pela Editora Ultimato, é autor de O Propósito de Deus e a Nossa Vocação, A Visão Missionária na Bíblia e Trabalho, Descanso e Dinheiro. É blogueiro da Ultimato.
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