Por Escrito
- 02 de dezembro de 2020
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Convertida aos poucos
Por Ana Claudia Luz
É natural que em diferentes momentos da vida a gente seja surpreendida com perguntas sobre nossa experiência de conversão. Honestamente, não lembro o que respondi nas ocasiões anteriores, mas quando convidada a escrever sobre minha experiência pessoal de conversão percebo que diferentes eventos se projetam pelos corredores da minha memória.
Nasci no que costumamos chamar de “lar evangélico”. Meu pai era pastor da Assembleia de Deus e minha mãe a “esposa do pastor”. Assim como ela, frequentemente tive minha identidade submersa pelo status social e religioso. Cresci sendo a “filha do pastor”, morando na “casa pastoral” e até nas salas de aula do seminário onde meu pai foi diretor e professor. Vivendo 24h nos bastidores das estruturas religiosas, discernir Deus da religião foi um processo progressivo, assim como minha conversão. Uma coisa eu sei: isso não se deu em nenhuma das vezes em que fui à frente compelida pelo medo de não ouvir a trombeta tocar e ficar para a grande tribulação.
Lembro que no Antigo Testamento, Deus adquiriu seus muitos nomes de acordo com os eventos que revelaram parte do seu caráter: o Elohim da trindade criativa, o Edonai que ensina e protege através da lei, o El Shadday intimamente revelado à Abraão como amigo e ao profeta como uma mãe que jamais se esquece “Aquele que nutre, fornece e satisfaz” (Isaías 60:16, 66:10-13). Assim também, cada parte do meu ser e da minha história foi se convertendo e, assim sem saber ao certo quando foi, eu me vi rendida e de mente cativada de evento em evento.
Por muito tempo Ele foi meu “amigo imaginário”. O Deus das histórias ilustradas no flanelógrafos ou nas revistas dos “amigos de Jesus” ganhava a forma de alguém que ouvia todas as minhas vozes e as compreendia melhor do que eu mesma, e isso foi o suficiente na minha infância, mas já nem tanto na adolescência, onde eu já ansiava por sua tradução encarnada. O confundi com meus pais, com amigos que não poucas vezes me decepcionaram porque simplesmente eles não poderiam ser “Deus”, eles não satisfaziam ou preenchiam os quartos vazios de uma imensa casa que só crescia e que, de tão grande, passei a ouvir meus próprios ecos em ondas de repetição doentia. Em uma dessas aventuras de querer encher todos os compartimentos da casa, e fazer cessar essas vozes, coloquei alguém no lugar que somente a Ele pertencia e, de uma hora para outra, só haviam ruínas e decepção. Agora eu me lembro – essa foi a primeira revelação pessoal do Deus manifesto em diferentes matizes: o El Shadday me tomou no colo enquanto afogada em sentimentos de rejeição e abandono. O Deus de Abraão fez uma aliança eterna comigo em um congresso de senhoras! Um “vaso”, como se diz na tradição Assembleiana, afirmava no púlpito da igreja com o dedo apontado para mim que, ainda que por vezes eu esqueça, Ele jamais esqueceria dessa aliança. Desse jeito, na Assembleia de Deus em Belém/PA, recebi e quis para mim esse destino de pertencer somente a Ele.
Outro evento que me vem à mente foi quando experimentei a injustiça e fui confrontada por colegas universitários sobre a existência de um inferno criado por Deus. Se como homens imperfeitos não conseguimos contemplar o sofrimento de um animal por alguns minutos que seja, como conceber a existência de um Deus que criaria um lugar onde seres humanos, criados por suas próprias mãos, experimentariam dor e sofrimento eterno? Foi quando na escuridão e desesperança em que um mundo sem Deus nos encerra, arrisquei uma oração sincera e me rendi ao silêncio que se segue às perguntas profundas. “Eu não criei o inferno para os homens” foi a resposta que ouvi em polifonia crescente.
Eu poderia encher algumas páginas sobre quando cada pedacinho de mim foi convertido ao Jireh (provisão), ao El Hapha (cura), ao Shamah (presente) e ao Emanuel, sua mais perfeita revelação, em graça, em sofrimento, em dores, o cordeiro, aquele “Eu Sou” que há de vir de novo e cujo reino onde espírito e matéria se fundirão em estado perfeito e e-terno.
Hoje eu sou Ana Luz, sirvo ao meu Senhor com tudo o que tenho e o que sei. Ainda o vejo em partes, mas, como o presidiário que escrevia cartas para as igrejas, também aguardo com grande expectativa o verdadeiro grande dia em que o verei como Ele é.
Hoje eu sou Ana Luz, sirvo ao meu Senhor com tudo o que tenho e o que sei. Ainda o vejo em partes, mas, como o presidiário que escrevia cartas para as igrejas, também aguardo com grande expectativa o verdadeiro grande dia em que o verei como Ele é.
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Ana Claudia Luz é jornalista e documentarista. Graduada em jornalismo pela UFPA, desde 1999 trabalha com comunicação e missões. Há 5 anos serve organizações missionárias e humanitárias por todo o mundo. Atualmente trabalha de forma remota com a fundação holandesa Road of Hope e na produção da série de lives "Diálogos de Esperança".
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