Na sociedade do “cada um por si e Deus por todos”, misericórdia é raridade
Por Jeferson Cristianini
O excesso de barulho nas ruas é comum àqueles que estão na correria cotidiana. São muitos os barulhos da vida moderna e urbana. Na cidade, acordamos com o som do despertador e não com o canto galo. A chaleira faz barulho e o micro-ondas também. Os toques dos celulares, cada vez mais escandalosos, roubam o sono de muitos no transporte coletivo. Os carros, as motos e os ônibus são ruidosos. As máquinas da construção civil são barulhentas, e o som das buzinas no trânsito caótico nos leva a um estresse, muitas vezes absorvido como normal da loucura da vida urbana.
Em meio a tanto barulho, o som das sirenes não provoca mais inquietação em nós. Acostumamo-nos com elas. Para nós, é mais uma viatura que está passando. O estranho é que a banalização da vida é perceptível a nós quando não valorizamos quem está dentro da ambulância ou da viatura policial. Nossa banalização da vida é uma violência contra o criador, é um ato de barbárie.
Vivemos como se as pessoas fossem descartáveis. Nosso senso de compaixão é sufocado pela correria cotidiana que tende a nos levar a lugar algum. Diante dos sons das sirenes, deveríamos parar e pensar: E se fôssemos nós que estivéssemos numa ambulância, como gostaríamos de ser tratados? Gostaríamos que orassem por nós? Deveríamos pensar: E se fosse uma pessoa querida, será que nos preocuparíamos mais? Agiríamos com misericórdia.
Misericórdia é uma palavra rara nessa sociedade do “cada um por si e Deus por todos”.
Na parábola do bom samaritano, Jesus acusa os religiosos de passaram de largo, ou seja, de darem a volta para não ajudar. Jesus reprova a indiferença dos religiosos e valoriza um samaritano que teve compaixão.
É curioso como sabemos dessa história, mas não aplicamos no cotidiano seus belos ensinos. Ouvimos o ruído das sirenes e “passamos de largo”, não paramos para orar pela mãe do adolescente preso na viatura policial. Não oramos pelas pessoas presas jogadas na viatura militar, clamando a Deus que essas vidas possam ter um encontro com Jesus.
Não oramos quando vemos o caminhão do Corpo de Bombeiros correndo contra o tempo para salvar uma vida, para apagar o fogo de uma casa de uma família que está perdendo tudo. Não intercedemos quando vemos a ambulância do SAMU passando ao nosso lado à toda velocidade para salvar um ferido pelo trânsito violento de nossas cidades.
Não oramos pela pessoa que sofreu um ataque cardíaco, que teve um AVC, que sofreu uma queda e que precisa de um atendimento urgente. Não oramos pelas famílias das pessoas que estão nas ambulâncias, aflitas com a situação de seus entes queridos.
Numa sociedade robotizada e pragmática, acostumamo-nos com as tragédias, com a violência e com a banalização da vida. O capitalismo ensina que há muita mão de obra, assim, não nos preocupamos como deveríamos com as pessoas.
Diante de tanto sofrimento humano que nos rodeia, ao ouvir um som de uma sirene, nós como cristãos deveríamos interceder e orar pelas pessoas que precisam de atendimento. O som das sirenes pode ser uma das formas de exercitarmos nossa fé cristã. Uma forma de pararmos e por uns instantes tirar o foco de nós mesmos e orarmos pelas pessoas que sofrem.
Que ao som das sirenes possamos amar o próximo com nossa oração sem sabermos o nome e a dificuldade. Aqueles que amam o Senhor acima de tudo, não passam de largo diante do sofrimento humano, pelo contrário se compadecem e agem em favor do necessitado. O som das sirenes deve nos levar ao Senhor em profunda gratidão e oração. Nutra compaixão em seu coração, orando.
- Jeferson Rodolfo Cristianini é pastor da PIB Bauru.