A expectativa e a realidade do Natal
Por Maurício Avoletta Júnior
Immanuel é uma palavrinha hebraica composta por dois termos: Imannu e El. O primeiro remete à ideia de imanência, de algo presente, mais comumente traduzida por conosco. El, por sua vez, é o equivalente hebraico para se referir à divindade, a Deus. Trocando em miúdos, podemos definir Immanuel como Deus conosco, o Deus presente.
Emanuel é como o profeta Isaías se refere ao messias vindouro. É curioso que o profeta tenha se referido à vinda do libertador e redentor como Deus Conosco. Não apenas ele seria concebido por uma virgem, o que por si só já é algo inacreditável, mas o santo profeta Isaías diz que o messias será o Deus presente.
Hoje, para a nossa cultura já em grande parte cristianizada, fica relativamente fácil aceitar o Deus pai, a divindade transcendente, se encarnando em Cristo, a segunda pessoa da Santíssima Trindade; entretanto, isso era inimaginável para a teologia judaica.
O Deus que nem seu nome era pronunciável se encarnaria em sua própria criação? O Senhor da História, o todo poderoso, nasceria de uma virgem? As profecias acerca do messias esperado pelo povo de Deus não correspondiam com as expectativas que eles criaram. Eles esperavam um líder religioso e político, o rei com cetro de ouro assentado sobre o trono que libertaria Israel. Mas Deus tem um jeito curioso de subverter nossas concepções da realidade.
Emanuel não veio como um Rei, mas como plebeu. Numa pequena manjedoura, cercado por animais, esterco, feno e um casal de seres humanos, veio ao mundo o Verbo vivo de Deus pai. O próprio Deus encarnou-se em sua criação. O narrador se misturou com a história narrada. A intervenção divina, pela primeira vez na história, fez-se visível. Nós vimos a glória do pai, vimos o Alpha e o Omega, o princípio e o fim. Vimos, naquele dia, a resposta encarnada àquela atormentadora questão posta à mesa por Jó.
Porventura tens olhos de carne? Enxergas como os mortais? Os teus dias são como o de um frágil ser humano? O tempo e os dias para ti passam do mesmo modo que passam para o homem? (Jó 10:4, 5)
O Deus transcendente revelado ao povo judeu não sabia o que Jó estava sentindo. Ele não sofria as dores de Jó. Ele não via da perspectiva humana, não possuía olhos de carne. Os dias do Senhor da História não são contados. A questão levantada por Jó era a de que Deus não era um bom juiz para seu caso, pois não tinha a mínima ideia do que era sofrer. Curiosamente, o livro de Isaías fornece um lampejo de resposta à pergunta de Jó que reflete o questionamento de toda a humanidade: acaso Deus sente a minha dor?
Isaías, no capítulo 7, dá nome à esperança messiânica que estava por vir: Emanuel, o Deus conosco que nasceria de uma virgem. No capítulo 53, ele evidência características desse messias: Ele não rinha beleza nem formosura, era desprezado e foi o mais rejeitado dentre os homens; homem de dores e experimentado no trabalho. Fizemos pouco caso dEle, mesmo assim, Ele tomou sobre si nossas enfermidades e nossas dores. Ele foi ferido por causa das nossas transgressões e moído por causa das nossas iniquidades. O castigo que trouxe paz entre Deus e o homem recaiu sobre ele e por suas feridas fomos sarados.
A resposta que Jó ansiava está conosco. Jesus Cristo, o Deus conosco, o servo sofredor, Senhor da História, verbo de Deus e rei sobre as nações, encarnou-se!
Em sua última entrevista, o filósofo alemão Martin Heidegger disse que apenas um Deus poderia nos salvar. Ele estava correto, contudo, ignorou um ponto central que, de fato, é central também a toda fé cristã: apenas um Deus que sofre poderia nos salvar. Somente Emanuel pode nos salvar. Cristo é o Deus que sofre e através de suas feridas somos salvos.
Nossa esperança está fixa e firme no Cristo sofredor que, ao esvaziar-se de si mesmo, evidenciou ao mundo o perfeito amor de Deus. Nele, vemos a resposta de todas as dúvidas e de todas as crises da humanidade.
A resposta perfeita é também o homem perfeito. Jesus Cristo, o Deus encarnado, é a esperança que relembramos em todo natal. Há, numa manjedoura, alguém maior que o próprio universo. É Ele a esperança na qual nos agarramos e é ele quem esperamos ansiosamente para nos guiar de volta ao nosso eterno lar, à Cidade de Deus.
Um feliz natal a todos!
- Maurício Avoletta Junior, 24 anos. Congrega na Igreja Batista Fonte de Sicar (SP). Formado em Teologia pela Mackenzie, estudante de filosofia e literatura (por conta própria); apaixonado por livros, cinema e música; escravo de Cristo, um pessimista em potencial e um futuro “seja o que Deus quiser”.