Opinião
- 11 de dezembro de 2013
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“Tudo é culto”?
A ideia de que tudo é culto é brandida por quem defende um programa “descontraído”, “criativo”, ou por quem simplesmente não se dá ao trabalho de planejar e preparar a liturgia. E a turma do “tudo é culto” parece ter descoberto um argumento teológico da maior profundidade: o que será impróprio para o nosso momento de culto comunitário, se “tudo é culto”?
Em Mateus 4.10, quando Jesus cita a limitação da lei divina quanto ao objeto da adoração, ele emprega as expressões “adorar” e “dar culto”. A primeira, “proskyneo”, tem o sentido de reverência, de prostrar-se diante da deidade. A segunda, “latreuo”, tem o sentido de adoração. Outra palavra usada para culto é glorificação, relacionada originalmente com “valorização”. Adorar a Deus é reconhecer o seu valor. O salmo 24 encerra com a afirmação de que o Senhor dos exércitos é o rei da Glória. E o salmo 29 nos chama a tributar ao Senhor a glória devida ao seu nome (v.1). Isso é reconhecimento do valor, é honrar, é adoração.
Aí está a porta, entendem alguns, para o “tudo é culto”. Devemos fazer tudo para a glória de Deus (1 Co 10.31). Para isso fomos criados (Is 43.7). Então adoremos a Deus comendo ou bebendo, trabalhando ou no lazer. Tudo é santo ao Senhor, como profetizou Zacarias com respeito ao Reino de Deus (Zc 14.20,21).
O Dia do Senhor anunciado pelos profetas já se iniciou com Jesus (Mt 12.28). Mesmo assim, sob orientação apostólica, a igreja continuou a reunir-se para a adoração comunitária em dia e local combinados. Vindos todos de um dia-a-dia tomado por atividades realizadas para a glória de Deus, os crentes ainda assim se reuniam para o estudo das Escrituras, para comer a Ceia do Senhor e para as orações. Ao disciplinar o programa de culto em Corinto, Paulo menciona partes do culto relacionadas com adoração, louvor e ensino comunitário (1 Co 14.26-29). O que tiver caráter e interesse apenas pessoal deve ficar de fora (v.28). “Tudo é culto”, mas quando a igreja se reúne para adoração concentra-se nesses elementos: as orações, os cânticos, a leitura e o ensino da Escritura.
A teologia do “tudo é culto” mudou o que se vê na Escritura e na prática do povo de Deus desde os tempos antigos. “Tudo é culto”, então podemos intercalar duas orações com o aviso de que o seu Pedrinho retornou de merecidas férias. Ah, é claro, damos um toque litúrgico acrescentando o indefectível “Amém, irmãos”. Os que estiverem próximos poderão abraçar o seu Pedrinho. Se desejar, aproveite para comentar que ele ficou melhor sem aquela barba. Ainda não conseguimos inventar o culto sem avisos. Eu sei, a imprensa com os tipos móveis já foram inventados um dia desses (para não falar das redes sociais), mas nada como terminar o sermão e ouvir que o pessoal do passeio da mocidade vai se encontrar sábado às oito em frente à igreja. “Tudo é culto.”
“Tudo é culto,” então incluímos no programa cânticos que exaltam a pessoa humana, em vez do Criador. Deus é que devia ser exaltado, mas insistimos que “você tem valor” (Abrace o seu irmão, diga que o ama em nome de Jesus, diga que ele tem valor). Exaltar o ser humano e massagear o ego de cada pessoa também faz parte do “Tudo é culto”. Deus chegou antes de qualquer um de nós em qualquer canto do universo que ele mesmo criou e “é ele quem nos convoca para a sua adoração”, mas insistimos em lhe dizer que “tu és bem-vindo em nosso meio”. E chamamos esse equívoco cósmico de “culto”.
O pessoal da música pode muito bem afinar os instrumentos depois que o hino ou cântico foi anunciado. É claro que daria para fazer isso antes, mas afinação de instrumentos também é culto. O coral não começa sem antes o regente combinar uns últimos detalhes com a pianista ou com o próprio coral. Afinal, ensaio também é culto. Pequenos detalhes ganham conotação litúrgica. Todos os domingos o pregador prega, mas trazer um copo de água para o púlpito também é culto, por isso os diáconos preferem fazer isso depois que o culto começa.
Inventamos algo impensável nos tempos apostólicos: um programa de culto sem o ensino da Palavra de Deus. Colocamos no lugar a cantata do coral ou “apresentação” de uma banda. Um show. Não é à toa que alguns batem palmas no fim. “Tudo é culto.”
O “Tudo é culto” está, na verdade, acabando com o culto, com a ideia de nos prostrarmos diante da deidade (“proskyneo”). Ou resulta de não reconhecermos a majestade de Deus. Não precisamos de programas conservadores ou contemporâneos. Precisamos de temor de Deus. Convém voltar ao modelo do Novo Testamento e nos reunirmos para adorar a Deus com orações, cânticos, leituras bíblicas e para ouvir o ensino da Palavra de Deus.
Tudo para a glória de Deus.
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A Hospitalidade da Palavra
Louvor, Adoração e Liturgia (Rubem Amorese)
A Espiritualidade na Prática
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Aí está a porta, entendem alguns, para o “tudo é culto”. Devemos fazer tudo para a glória de Deus (1 Co 10.31). Para isso fomos criados (Is 43.7). Então adoremos a Deus comendo ou bebendo, trabalhando ou no lazer. Tudo é santo ao Senhor, como profetizou Zacarias com respeito ao Reino de Deus (Zc 14.20,21).
O Dia do Senhor anunciado pelos profetas já se iniciou com Jesus (Mt 12.28). Mesmo assim, sob orientação apostólica, a igreja continuou a reunir-se para a adoração comunitária em dia e local combinados. Vindos todos de um dia-a-dia tomado por atividades realizadas para a glória de Deus, os crentes ainda assim se reuniam para o estudo das Escrituras, para comer a Ceia do Senhor e para as orações. Ao disciplinar o programa de culto em Corinto, Paulo menciona partes do culto relacionadas com adoração, louvor e ensino comunitário (1 Co 14.26-29). O que tiver caráter e interesse apenas pessoal deve ficar de fora (v.28). “Tudo é culto”, mas quando a igreja se reúne para adoração concentra-se nesses elementos: as orações, os cânticos, a leitura e o ensino da Escritura.
A teologia do “tudo é culto” mudou o que se vê na Escritura e na prática do povo de Deus desde os tempos antigos. “Tudo é culto”, então podemos intercalar duas orações com o aviso de que o seu Pedrinho retornou de merecidas férias. Ah, é claro, damos um toque litúrgico acrescentando o indefectível “Amém, irmãos”. Os que estiverem próximos poderão abraçar o seu Pedrinho. Se desejar, aproveite para comentar que ele ficou melhor sem aquela barba. Ainda não conseguimos inventar o culto sem avisos. Eu sei, a imprensa com os tipos móveis já foram inventados um dia desses (para não falar das redes sociais), mas nada como terminar o sermão e ouvir que o pessoal do passeio da mocidade vai se encontrar sábado às oito em frente à igreja. “Tudo é culto.”
“Tudo é culto,” então incluímos no programa cânticos que exaltam a pessoa humana, em vez do Criador. Deus é que devia ser exaltado, mas insistimos que “você tem valor” (Abrace o seu irmão, diga que o ama em nome de Jesus, diga que ele tem valor). Exaltar o ser humano e massagear o ego de cada pessoa também faz parte do “Tudo é culto”. Deus chegou antes de qualquer um de nós em qualquer canto do universo que ele mesmo criou e “é ele quem nos convoca para a sua adoração”, mas insistimos em lhe dizer que “tu és bem-vindo em nosso meio”. E chamamos esse equívoco cósmico de “culto”.
O pessoal da música pode muito bem afinar os instrumentos depois que o hino ou cântico foi anunciado. É claro que daria para fazer isso antes, mas afinação de instrumentos também é culto. O coral não começa sem antes o regente combinar uns últimos detalhes com a pianista ou com o próprio coral. Afinal, ensaio também é culto. Pequenos detalhes ganham conotação litúrgica. Todos os domingos o pregador prega, mas trazer um copo de água para o púlpito também é culto, por isso os diáconos preferem fazer isso depois que o culto começa.
Inventamos algo impensável nos tempos apostólicos: um programa de culto sem o ensino da Palavra de Deus. Colocamos no lugar a cantata do coral ou “apresentação” de uma banda. Um show. Não é à toa que alguns batem palmas no fim. “Tudo é culto.”
O “Tudo é culto” está, na verdade, acabando com o culto, com a ideia de nos prostrarmos diante da deidade (“proskyneo”). Ou resulta de não reconhecermos a majestade de Deus. Não precisamos de programas conservadores ou contemporâneos. Precisamos de temor de Deus. Convém voltar ao modelo do Novo Testamento e nos reunirmos para adorar a Deus com orações, cânticos, leituras bíblicas e para ouvir o ensino da Palavra de Deus.
Tudo para a glória de Deus.
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Casado com Sandra, é jornalista, pastor presbiteriano e editor da Cultura Cristã.
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