Opinião
- 03 de março de 2023
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Sobre o que realmente fica
Por Ivan Abreu Figueiredo
Talvez seja o som reconfortante do chuvisco que cai enfeitando a madrugada amada com seu som e a antecipação do perfume do chão molhado.
Talvez, quem sabe, a calma apreciação pelas pequenas coisas do dia a dia, perceptíveis somente quando paramos a ponto de aquietar a alma.
Volto ao final dos anos 80, início da carreira docente. Era jovem, com a força, até a impetuosidade do iniciante. E me pergunto: o que ficou? Preocupado em não deixar faltar nada do conteúdo a ser transmitido, ainda era até confundido com algum dos estudantes. As aulas tendiam a ser muito longas, a "pedagogia" (entre aspas mesmos) resumida à intuição nem sempre bem sucedida. Para ser honesto, foram tempos de muita preocupação com a construção de uma imagem de competência, com a afirmação de meu valor próprio.
Coisas naturais nessa fase da vida.
Olho com simpatia para esse ser que eu fui e do qual guardo vestígios ainda.
O tempo passa, seu vento sopra e vai depurando excessos, deixando o que permanece, abrindo lentamente algumas portas de compreensão.
Porque do que fica destaca-se a atitude de se importar com o que se faz e, principalmente, com as pessoas ao redor.
Demorei um bocado a perceber isso. Foi preciso aprender com os pedagogos que o conteúdo não é um fim em si mesmo, mas um ponto de partida é fio condutor de desenvolver habilidades e competências. Não sabia então que minha maior força não estava nas aulas compridas por não deixar de abordar os mínimos detalhes, e sim no cuidado mobilizado pela vontade do outro aprender.
O importar-se é oxigênio do médico em sua relação com o doente, é o oxigênio do pretenso mestre em sua interação com os aprendizes. Conteúdos estão nos livros para serem explorados, são campo fértil das iniciativas de cada um buscar e explorar. Tendem muitas vezes até a serem esquecidos, numa hipótese benéfica, relegados àquela pasta de lembranças recicláveis que todos nós temos.
O que ficou de fato foi o aprender a se importar com os que precisam da gente, tanto pacientes quanto estudantes.
O que ficou e fica são os alertas na estrada contra a indiferença que espreita na rotina mecanizada.
O importar-se é dar bastante lugar aos afetos. É até, na linda afirmação de Foster, ser levado à oração para que Deus supra o que está acima de nossa capacidade de ajudar as pessoas.
O que fica são as amizades, o respeito, até por vezes a inspiração que um professor pode fazer e ser nas vidas dos alunos.
Coisa forjada no cotidiano do envolvimento em compartilhar conteúdos como meio e não fim em si mesmo. O que realmente fica é o importar-se, atitude cheia de vida e desafios, por vezes atrevida e extravagante.
Porque é muito bom quando alguém se importa com a gente. E melhor ainda sermos nós aqueles que se importam.
O QUE ESPERAM OS CRISTÃOS? | REVISTA ULTIMATO
A esperança cristã possibilita alegria hoje, guia os nossos afetos e o modo como vivemos, nos relembra da nossa condição de peregrinos, nos anima na evangelização e na missão, nos dá a perspectiva correta com relação ao sofrimento atual, alinha os nossos planos aos de Deus, não permite que nos acomodemos às facilidades do mundo.
Ivan Abreu Figueiredo, médico, professor universitário, membro da Igreja Batista Plenitude, São Luís, MA.
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