Opinião
- 17 de fevereiro de 2014
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Refugiados sírios em São Paulo
“Mas ele, querendo justificar-se, perguntou a Jesus: “E quem é o meu próximo?” (Lucas 10.20)
No final de janeiro, num dos dias em que mais choveu em São Paulo (SP), com alagamentos, trânsito lento e parado, árvores caídas e tudo mais que traz o caos à nossa cidade de São Paulo, um grupo entre 10 a 15 refugiados sírios se reuniu numa pequena sala de aula improvisada para, pela primeira vez, aprender português.
A mesma sala que havia sido improvisada com sofá e televisão para acomodar famílias que estão morando nesta igreja era agora novamente improvisada como sala de aula. Uma professora com vários anos de experiência levava aqueles jovens, idosos, crianças, pais, mães, avós nos primeiros passos de seu aprendizado. Com entusiasmo, eles repetiam simplesmente: “eu”, “você”, “ele”, “ela” e daí por diante. Alguns se encontravam molhados de chuva, pois foram pegos de surpresa no caminho. Alguns levaram até duas horas para chegar ao local da aula.
A maioria deles veio de jornadas mais longas ainda. Eles vieram de casas destruídas por morteiros, passando dias dormindo no chão do banheiro, pois era o único cômodo seguro da casa. Escaparam de seus bairros que foram devastados pelos bombardeios e combates entre rebeldes e forças do governo. Alguns com suas famílias, a maioria com alguns familiares e outros ainda totalmente sozinhos neste país enorme, desconhecido e com um idioma que eles não entendem nada! Seus ouvidos e olhos estavam atentos a cada palavra e gesto da professora. A sede de aprendizado era realmente de alguém que depende daquilo para sobreviver.
Ao vê-los, eu sabia um pouco do que estavam sentindo. Sabia da dificuldade de estar numa nação onde não se sabe nada da língua nem se consegue ler placas, sinais e informações. Porque já passei por isso, eu sabia como estava sendo difícil para eles conseguirem realizar tarefas simples do dia a dia, como pegar ônibus e metrô, conseguir documentação e até mesmo comprar pão e leite na padaria da esquina.
Eu conhecia alguns daqueles alunos e sei de suas histórias de dor e sofrimento até chegarem ao Brasil. Sofrimento que foi aliviado, mas ainda está presente. Muitos moram em condições difíceis, apertados com familiares e na maioria estranhos que são conhecidos de algum parente na Síria. Outros tiverem portas fechadas quando pediam por abrigo: “Aqui não! Aqui não damos ajuda”.
Assim, voltando à pergunta do mestre da lei: “E quem é o meu próximo?” A resposta vem de seus próprios lábios depois da parábola de Jesus: “Aquele que teve misericórdia dele”. Jesus lhe disse: “Vá e faça o mesmo”.
Muitos outros refugiados estão vindo para o Brasil. Milhões estão dispersos em vários países. Estão cansados, famintos, feridos na alma e, por vezes, feridos fisicamente. Mas eles estão sendo deixados do lado de fora, batendo à nossa porta.
Graças a Deus, existem aqueles que têm aberto suas portas e até suas igrejas para estes que caem feridos por essa guerra. Mas ainda somos poucos e muitos são os necessitados. Há bastante trabalho a fazer!
Ao fim daquela aula, Ibni, com os olhos cheios de lágrimas me abraçou e disse: “Eu nunca tinha visto tantas pessoas ajudando sírios.”
Notas:
1. O texto foi escrito por Mano Souza (pseudônimo). Ele e sua família serviram como missionários no Egito junto com a agência Interserve Brasil. Lá trabalharam com crianças refugiadas. A família voltou para o Brasil em 2013 e agora iniciaram o trabalho com refugiados sírios em São Paulo (SP). Se você deseja mais informações, escreva para isbrasil@cem.org.br
2. Segundo estimativa da ONU, há mais de 2,3 milhões de refugiados sírios nos países vizinhos e Norte da África. Diz a organização que é “um dos maiores êxodos de refugiados na história recente”.
3. Os conflitos na Síria entre oposição e governo começaram em 2011. Mais de 100 mil pessoas já foram mortas. As conversas entre o governo sírio e a oposição, mediadas pela ONU, foram retomadas na segunda-feira (10) após uma primeira rodada que terminou com poucos progressos.
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Legenda da foto: Refugiados sírios em um abrigo coletivo na cidade de Arsal, no Vale do Bekaa, a 100 quilômetros da capital libanesa, Beirute. (©ACNUR/S.Malkawi)
No final de janeiro, num dos dias em que mais choveu em São Paulo (SP), com alagamentos, trânsito lento e parado, árvores caídas e tudo mais que traz o caos à nossa cidade de São Paulo, um grupo entre 10 a 15 refugiados sírios se reuniu numa pequena sala de aula improvisada para, pela primeira vez, aprender português.
A mesma sala que havia sido improvisada com sofá e televisão para acomodar famílias que estão morando nesta igreja era agora novamente improvisada como sala de aula. Uma professora com vários anos de experiência levava aqueles jovens, idosos, crianças, pais, mães, avós nos primeiros passos de seu aprendizado. Com entusiasmo, eles repetiam simplesmente: “eu”, “você”, “ele”, “ela” e daí por diante. Alguns se encontravam molhados de chuva, pois foram pegos de surpresa no caminho. Alguns levaram até duas horas para chegar ao local da aula.
A maioria deles veio de jornadas mais longas ainda. Eles vieram de casas destruídas por morteiros, passando dias dormindo no chão do banheiro, pois era o único cômodo seguro da casa. Escaparam de seus bairros que foram devastados pelos bombardeios e combates entre rebeldes e forças do governo. Alguns com suas famílias, a maioria com alguns familiares e outros ainda totalmente sozinhos neste país enorme, desconhecido e com um idioma que eles não entendem nada! Seus ouvidos e olhos estavam atentos a cada palavra e gesto da professora. A sede de aprendizado era realmente de alguém que depende daquilo para sobreviver.
Ao vê-los, eu sabia um pouco do que estavam sentindo. Sabia da dificuldade de estar numa nação onde não se sabe nada da língua nem se consegue ler placas, sinais e informações. Porque já passei por isso, eu sabia como estava sendo difícil para eles conseguirem realizar tarefas simples do dia a dia, como pegar ônibus e metrô, conseguir documentação e até mesmo comprar pão e leite na padaria da esquina.
Eu conhecia alguns daqueles alunos e sei de suas histórias de dor e sofrimento até chegarem ao Brasil. Sofrimento que foi aliviado, mas ainda está presente. Muitos moram em condições difíceis, apertados com familiares e na maioria estranhos que são conhecidos de algum parente na Síria. Outros tiverem portas fechadas quando pediam por abrigo: “Aqui não! Aqui não damos ajuda”.
Assim, voltando à pergunta do mestre da lei: “E quem é o meu próximo?” A resposta vem de seus próprios lábios depois da parábola de Jesus: “Aquele que teve misericórdia dele”. Jesus lhe disse: “Vá e faça o mesmo”.
Muitos outros refugiados estão vindo para o Brasil. Milhões estão dispersos em vários países. Estão cansados, famintos, feridos na alma e, por vezes, feridos fisicamente. Mas eles estão sendo deixados do lado de fora, batendo à nossa porta.
Graças a Deus, existem aqueles que têm aberto suas portas e até suas igrejas para estes que caem feridos por essa guerra. Mas ainda somos poucos e muitos são os necessitados. Há bastante trabalho a fazer!
Ao fim daquela aula, Ibni, com os olhos cheios de lágrimas me abraçou e disse: “Eu nunca tinha visto tantas pessoas ajudando sírios.”
Notas:
1. O texto foi escrito por Mano Souza (pseudônimo). Ele e sua família serviram como missionários no Egito junto com a agência Interserve Brasil. Lá trabalharam com crianças refugiadas. A família voltou para o Brasil em 2013 e agora iniciaram o trabalho com refugiados sírios em São Paulo (SP). Se você deseja mais informações, escreva para isbrasil@cem.org.br
2. Segundo estimativa da ONU, há mais de 2,3 milhões de refugiados sírios nos países vizinhos e Norte da África. Diz a organização que é “um dos maiores êxodos de refugiados na história recente”.
3. Os conflitos na Síria entre oposição e governo começaram em 2011. Mais de 100 mil pessoas já foram mortas. As conversas entre o governo sírio e a oposição, mediadas pela ONU, foram retomadas na segunda-feira (10) após uma primeira rodada que terminou com poucos progressos.
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Legenda da foto: Refugiados sírios em um abrigo coletivo na cidade de Arsal, no Vale do Bekaa, a 100 quilômetros da capital libanesa, Beirute. (©ACNUR/S.Malkawi)
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