Opinião
- 30 de março de 2010
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Ramos: um domingo para nunca mais esquecer...
Derval Dasilio
Jesus chega a Jerusalém e comove a multidão (Lc 19.28-40). O povo é diferente das autoridades: aclama-o como Rei, os líderes ficam apreensivos. O povo tem esperança de libertação religiosa, política e econômica. A pobreza e as opressões são dominantes. Autoridades sentem-se ameaçadas no seu prestígio e autoridade e, sem dúvida, no exercício do poder (ah, o ‘pudê’!). E o povo alegre, festivo, cantante, dançando, recebe o Messias... mas logo virá a tristeza. Nesta mesma semana Jesus será preso, torturado, humilhado em sua realeza e esvaziado de qualquer proteção dos céus (Fl 2.6-11)! E então, enfraquecido, vulnerável, despedaçado, será levado ao martírio, sem que esse mesmo povo se comova: “Bem-feito!”, teriam dito. “Não tinha cacife, por que se arriscou e nos enganou?”
Que significados têm o discurso da paz e da justiça segundo o Evangelho, frente à multidão de homens e mulheres que vêm ao encontro de um rei sem poder político e sem domínio sobre a natureza (a não ser no uso “docetista”, espiritualizado)? Lemos os jornais, que falam de conflitos no Oriente Médio, guerra ao terrorismo, Iraque, Irã, Palestina, Israel, Estados Unidos, Inglaterra, França, enfim, mais de cinquenta pontos conflituosos no mundo inteiro. As imagens da mídia mostram campos de batalha sangrentos exigindo atenção e os mesmos pontos de discussão: parlamentos internacionais debatendo a paz.
Inaugura-se o milênio com eventos belicosos jamais imaginados. Al Qaeda, Bin Laden, Bush, invasão do Afeganistão e no Iraque, lutas tribais na África, genocídio no Timor Leste, tudo sob a influência de clamores de guerra animados por pruridos patrióticos fanáticos. Um soco no estômago, verdadeiro show de mortes, mutilações, lágrimas. Atos de crueldade, que costuram a história sangrenta vivida por muitos povos, agregam a destruição sistemática de bens culturais, o coração e a alma dos povos e das etnias. Conhecemos muito bem esses aspectos, desde a dizimação das culturas pré-colombianas, do Caribe e da América Latina. Mas o que significa a paz no âmbito do reinado de Deus?
No campo doméstico não é menor o impacto da violência das armas, perturbando-nos permanentemente. Todos os dias, observamos as notícias mais recentes sobre o crime organizado, combate ao tráfico de drogas, inocentes assassinados no meio das ruas, ontem, hoje, são 15 mil mortes violentas por ano, só no Brasil. O amanhã é pré-definido, só teremos que confirmar o estado de guerra permanente nos grandes centros urbanos vendo o noticiário, tão favorável às elites e aos bem-postos. Enquanto se espera por dignidade da pessoa humana nos setores mais corriqueiros da vida, necessita-se de pão para quem tem fome, morada para quem não tem teto, educação para quem não tem escola, saúde para quem não tem hospitais, trabalho para os alijados da sociedade moderna.
Domingo de Ramos... os cristãos estarão caminhando ao lado de Jesus no caminho da cruz? As implicações dessa caminhada envolvem o compromisso de levar a sério nossa adesão à causa de Jesus Cristo. Acompanhá-lo em sua última jornada a caminho da cruz implica em levar a sério as realidades que corroem o mundo e clamam pela paz. Ninguém mais duvida de que as causas geradoras dos grandes e dos menores conflitos sociais, nacionais e internacionais são encontradas nas desigualdades econômicas, na falta de oportunidades de trabalho e escola, nas políticas domésticas e internacionais, nas questões que passam pela fome de quase dois bilhões de habitantes do planeta. Questões que identificam os abismos das desigualdades em toda parte.
Pode ser que a solidariedade com o mártir do reino, como ocorreu com seus seguidores imediatamente ao seu martírio, nos obrigue a abandonar postulados religiosos quietistas, acomodatícios, fatalistas (Calvino, disse num triste momento: “Deus não somente previu a queda do primeiro homem, e nela a ruína de toda a posteridade, como também a quis; concordando com o Alcorão: Deus perdoa a quem quer e tortura a quem bem entende”). Talvez isso nos force a romper com ideologias e dogmas políticos ou religiosos, para cantarmos com sinceridade o cântico das multidões: “Hosanas! Bendito ‘somente’ aquele que vem em nome do Senhor”.
• Derval Dasilio é pastor da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil. www.derv.wordpress.com
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Jesus chega a Jerusalém e comove a multidão (Lc 19.28-40). O povo é diferente das autoridades: aclama-o como Rei, os líderes ficam apreensivos. O povo tem esperança de libertação religiosa, política e econômica. A pobreza e as opressões são dominantes. Autoridades sentem-se ameaçadas no seu prestígio e autoridade e, sem dúvida, no exercício do poder (ah, o ‘pudê’!). E o povo alegre, festivo, cantante, dançando, recebe o Messias... mas logo virá a tristeza. Nesta mesma semana Jesus será preso, torturado, humilhado em sua realeza e esvaziado de qualquer proteção dos céus (Fl 2.6-11)! E então, enfraquecido, vulnerável, despedaçado, será levado ao martírio, sem que esse mesmo povo se comova: “Bem-feito!”, teriam dito. “Não tinha cacife, por que se arriscou e nos enganou?”
Que significados têm o discurso da paz e da justiça segundo o Evangelho, frente à multidão de homens e mulheres que vêm ao encontro de um rei sem poder político e sem domínio sobre a natureza (a não ser no uso “docetista”, espiritualizado)? Lemos os jornais, que falam de conflitos no Oriente Médio, guerra ao terrorismo, Iraque, Irã, Palestina, Israel, Estados Unidos, Inglaterra, França, enfim, mais de cinquenta pontos conflituosos no mundo inteiro. As imagens da mídia mostram campos de batalha sangrentos exigindo atenção e os mesmos pontos de discussão: parlamentos internacionais debatendo a paz.
Inaugura-se o milênio com eventos belicosos jamais imaginados. Al Qaeda, Bin Laden, Bush, invasão do Afeganistão e no Iraque, lutas tribais na África, genocídio no Timor Leste, tudo sob a influência de clamores de guerra animados por pruridos patrióticos fanáticos. Um soco no estômago, verdadeiro show de mortes, mutilações, lágrimas. Atos de crueldade, que costuram a história sangrenta vivida por muitos povos, agregam a destruição sistemática de bens culturais, o coração e a alma dos povos e das etnias. Conhecemos muito bem esses aspectos, desde a dizimação das culturas pré-colombianas, do Caribe e da América Latina. Mas o que significa a paz no âmbito do reinado de Deus?
No campo doméstico não é menor o impacto da violência das armas, perturbando-nos permanentemente. Todos os dias, observamos as notícias mais recentes sobre o crime organizado, combate ao tráfico de drogas, inocentes assassinados no meio das ruas, ontem, hoje, são 15 mil mortes violentas por ano, só no Brasil. O amanhã é pré-definido, só teremos que confirmar o estado de guerra permanente nos grandes centros urbanos vendo o noticiário, tão favorável às elites e aos bem-postos. Enquanto se espera por dignidade da pessoa humana nos setores mais corriqueiros da vida, necessita-se de pão para quem tem fome, morada para quem não tem teto, educação para quem não tem escola, saúde para quem não tem hospitais, trabalho para os alijados da sociedade moderna.
Domingo de Ramos... os cristãos estarão caminhando ao lado de Jesus no caminho da cruz? As implicações dessa caminhada envolvem o compromisso de levar a sério nossa adesão à causa de Jesus Cristo. Acompanhá-lo em sua última jornada a caminho da cruz implica em levar a sério as realidades que corroem o mundo e clamam pela paz. Ninguém mais duvida de que as causas geradoras dos grandes e dos menores conflitos sociais, nacionais e internacionais são encontradas nas desigualdades econômicas, na falta de oportunidades de trabalho e escola, nas políticas domésticas e internacionais, nas questões que passam pela fome de quase dois bilhões de habitantes do planeta. Questões que identificam os abismos das desigualdades em toda parte.
Pode ser que a solidariedade com o mártir do reino, como ocorreu com seus seguidores imediatamente ao seu martírio, nos obrigue a abandonar postulados religiosos quietistas, acomodatícios, fatalistas (Calvino, disse num triste momento: “Deus não somente previu a queda do primeiro homem, e nela a ruína de toda a posteridade, como também a quis; concordando com o Alcorão: Deus perdoa a quem quer e tortura a quem bem entende”). Talvez isso nos force a romper com ideologias e dogmas políticos ou religiosos, para cantarmos com sinceridade o cântico das multidões: “Hosanas! Bendito ‘somente’ aquele que vem em nome do Senhor”.
• Derval Dasilio é pastor da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil. www.derv.wordpress.com
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É pastor emérito da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil e autor de livros como “Pedagogia da Ganância" (2013) e "O Dragão que Habita em Nós” (2010).
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