Opinião
- 19 de novembro de 2012
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Olhos abertos para o diálogo
Dois episódios, envolvendo ateus, cristãos e muçulmanos, além de um documento escrito por várias mãos. Com isso encerro a breve reflexão sobre o testemunho cristão no mundo, iniciada aqui antes com dois artigos (Entre a cruz e o papa e Missão rima com diálogo). Essa curta série levanta ideias sobre como viver e comunicar bem o evangelho de Cristo no mundo de hoje.
Episódio 1
Terminada a palestra na Universidade Federal de Viçosa, fui abordado por um ávido e gentil grupo de estudantes interessados em dialogar. Faziam parte de uma agrupação autodesignada “Incrédulos”. O primeiro súbito desafio: “Prove que Deus existe!”. Intuí que o caminho deveria ser outro: “Aprecio que tenham essa disposição para ouvir e conversar. Eu não posso lhes ‘provar’ que Deus exista, do mesmo modo como vocês também não poderiam ‘provar’ que não exista. Assim, o que acham de começamos de maneira diferente? Eu lhes falo sobre como cheguei a crer naquilo em que creio hoje, desde minha perspectiva existencial. Mas além de subjetiva, ela é também algo objetivo, porque se trata de uma perspectiva histórica que se constrói a partir de uma visão e compreensão dos fatos. Mas antes eu gostaria de ouvir sobre o que vocês creem ou não creem, ou ao que aderem, e como foi que chegaram às suas conclusões”.
O resultado foi uma boa e longa conversa. No final, quando nos despedíamos, animei-os a continuar lendo e investigando. Mas não somente aquilo que reforçava o que eles já pensavam – um conselho que eu também busco seguir. Então um deles me disse algo assim: “excelente diálogo; espero que voltemos a nos encontrar no futuro; pode ser que você então tenha mudado algo na sua fé como fruto de nossa interação ou que a gente também tenha revisado a nossa posição, quem sabe?”. Fui embora feliz e esperançoso. Aquele “quem sabe”, para mim, já era promissor.
Episódio 2
Minha esposa e eu estávamos, antes de nossas filhas nascerem, estudando teologia na Inglaterra. Durante um trimestre encontrava-se em nosso meio um acadêmico de uma universidade do Oriente Médio, um muçulmano convicto e estudioso das relações inter-religiosas. Depois de um período no Vaticano, sua universidade o havia enviado ali para outra etapa de estudos e observação em um instituto do ramo protestante do cristianismo. Houve debates públicos interessantes, como um com nosso professor árabe cristão sobre violência e fé. Mas o mais fascinante era o diálogo pessoal, à mesa ou logo após o momento em que cada um se dedicava, a seu modo, às orações matinais.
Perto do final de seu tempo de intercâmbio, esse brilhante e devoto estudioso convidou alguns amigos nossos para acompanhá-lo nessa hora de orações. Esses amigos cristãos não compartilhavam aquela mesma devoção do “scholar”, mas respeitosamente o acompanharam e ouviram, para sua surpresa, sua prece a “Allah”: “Abra os olhos de meus amigos para que eles vejam toda a verdade. E se há algo que eu não esteja vendo bem, abra também meus olhos para que eu entenda toda a verdade”. A intercessão pelos olhos abertos, de um ou de outro, foi uma oração que me surpreendeu com esperança.
Um documento
Há pouco recebi um documento através de uma professora que tive, a brasileira Rosalee Velloso Ewell, quem atualmente desempenha a função de diretora executiva da Comissão Teológica da Aliança Evangélica Mundial: “O Testemunho Cristão em um Mundo Multi-Religioso”, um texto produzido pela Aliança Evangélica Mundial, o Concílio Mundial de Igrejas e o Vaticano. Me pareceu uma cooperação pouco comum, mas que resultou em um documento relevante para provocar o debate e para resgatar alguns princípios para o diálogo com pessoas de outras crenças. É bem possível (ou mesmo desejável) que não se concorde com tudo o que está escrito aí, mas o fato de que seja possível o diálogo entre diferentes tradições cristãs pode ser um sinal auspicioso do caminho para que com respeito e integridade se possa viver e comunicar melhor o evangelho de Cristo entre aqueles que professam outras religiões ou o ateísmo.
Espero aprender a ouvir, a dialogar, anseio ser coerente e íntegro, na mensagem e na vida. Oro para que sempre meus olhos se abram e “quem sabe” eu consiga revisar em minha atitude e missão o que precise ser mudado ou melhorado. Aprender com a atitude de meus amigos ateus e muçulmanos pode ser um bom começo.
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É casado com Ruth e pai de Ana Júlia e Carolina. Integra o corpo pastoral da Igreja Metodista Livre da Saúde, em São Paulo (SP), serve globalmente como secretário adjunto para o engajamento com as Escrituras na IFES (International Fellowship of Evangelical Students) e também apoia a equipe da IFES América Latina.
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