Opinião
- 28 de setembro de 2022
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O mundo perde um gigante da fé
Por Volney Faustini
Era ainda muito jovem que li O Contrabandista de Deus. Um livro icônico de um homem com uma missão frente ao Império Soviético-Comunista. Seu autor: Irmão André. Em razão de suas peripécias para levar Bíblias para os irmãos perseguidos, fundou seu ministério, a partir da Holanda, denominado Open Doors. Em 1978 chega ao Brasil, sendo Elmira Pasquini a madrinha e Dr. Dale Kietzman o celebrante. A Missão Portas Abertas do Brasil foi assim batizada.
O escritório brasileiro nasceu no apartamento do tio Cássio – um pastor vibrante e fervoroso da igreja Cristo Salva, localizada atrás do Esporte Clube Sírio, no bairro de Indianópolis em São Paulo. Fui eleito presidente da primeira diretoria. Nos anos seguintes conseguimos apresentar às igrejas brasileiras o que significava ser uma igreja perseguida e o sentido de sofrer por amor a Cristo.
Para trazer relatos de primeiro grau, recebemos diversos missionários e pastores vinculados à Open Doors. Eles representavam 2 Timóteo 3.12 em sua essência. Abro parênteses. Se você não consegue citar de cor esse verso, prova que desde então a crítica que recebíamos procedia. Tínhamos à época, um ambiente de tranquilidade e paz para se viver o Evangelho. nossos irmãos do Oriente, não! Fecho parênteses.
Viajei com o Irmão André para o Nordeste, e fui seu intérprete em diversas ocasiões. Em nova vinda para o Brasil, ele pregou em São Paulo e, depois, em Niterói, na Igreja Presbiteriana Betânia a convite de Caio Fabio. Também o acompanhei como seu intérprete. Mais do que beber de suas mensagens, eu, pessoalmente, era impactado pelos pequenos detalhes do convívio. Um homem de oração e de uma fé monstruosa, com uma serenidade sem comparação, que amava a Palavra e a obediência a Deus. Era uma sensação ouvi-lo. Estava à frente das igrejas alguém que tinha experimentado diferentes episódios de milagres e intervenção divina, no esforço de espalhar o Evangelho.
Como bons brasileiros, abusávamos do rigor de uma agenda planejada, sempre ampliando compromissos e demandando horas extras de contato com nosso povo. Ao final da temporada brasileira, Irmão André retornava à Holanda precisando de umas boas férias.
Para entendermos o contexto histórico, o Império Soviético que se encerrou em 1991, circundava vários países debaixo do regime comunista, com um domínio sobre a vida do cidadão que (a exemplo do que acontece hoje em partes da China e na Coreia do Norte) não lhe era dado liberdade de culto e de fé. As igrejas foram fechadas e qualquer tentativa de encontro de religiosos seria considerado crime contra o Estado. Pastores eram presos e cristãos perseguidos. As Bíblias eram escassas e proibidas de serem impressas ou importadas.
Nesta terça-feira, dia 27 de setembro, recebemos a notícia que Anne van der Bijl, conhecido internacionalmente como Irmão André, veio a falecer aos 94 anos de idade. Era o contrabandista de Deus. Assim apelidado, em razão de que desde 1955 atendendo às demandas de crentes por trás da Cortina de Ferro, levava carregamentos de Bíblias e Novos Testamentos para a igreja perseguida. Dois anos depois, usaria um fusquinha azul para percorrer centenas de milhares de quilômetros, e assim angariar histórias e casos da fantástica atuação de Deus abrindo portas.
Sua mais famosa oração ao chegar às fronteiras, fortemente guardadas e inspecionadas pela polícia comunista era: “Senhor, eu lhe peço que cegue os olhos dos que enxergam.” E Deus atendia a sua oração.
Creio que a morte de Irmão André (1928-2022), juntamente com a de outros gigantes da nossa fé – entre eles John Stott (1921-2011), Billy Graham (1918-2018) e Desmond Tutu (1931-2021) –, encerra no presente século a era dos grandes ícones mundiais da fé cristã. Redobrada responsabilidade recai hoje sobre líderes e leigos, para que o Reino de Deus se faça presente através do testemunho de um Corpo unido e amoroso, que atua regional e localmente na sociedade, em carne e osso, como exemplo e testemunho de Cristo.
- Volney Faustini, autor e consultor, foi presidente da Missão Portas Abertas no Brasil. É membro da 1ª Igreja Presbiteriana Independente de São Paulo.
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