Opinião
- 14 de junho de 2017
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O medo do futuro é um prato cheio para o diabo
Screwtape, personagem de C. S. Lewis em Cartas de um diabo a seu aprendiz, como a obra foi traduzida para o português, gosta de previsões de futuro.
Ele é uma espécie de representação do Diabo, para o qual Lewis criou um neologismo da combinação de screw (parafuso, torcer, parafusar, distorcer) e tape (fita adesiva). O livro é uma coleção de cartas desse diabo-mor a um demônio-aprendiz, que é seu sobrinho e está infernizando a vida de um rapaz — que se converte no meio do caminho — com instruções de como levá-lo ao mau caminho. (Estou atualmente no projeto da Thomas Nelson do Brasil de nova tradução do livro que sairá ainda esse ano.)
O diabo até admite, em uma de suas cartas para o seu sobrinho, Wormwood (worm-verme; wood-madeira, uma espécie de cupim – outro neologismo, bem como todos os demônios que aparecem na obra), que é muito interessante fazer o paciente viver no passado também. Mas o passado tem a desvantagem de fazer o paciente revisitar coisas que já viveu e assim, levá-lo à reflexão e quem sabe até mesmo a uma coisa muito trágica para o inferno, que é o arrependimento, pois aproxima o paciente do Inimigo, que é Deus. Boas lembranças também são um perigo.
Então, se não é possível fazê-lo viver no passado puramente no sentido da amargura e do ressentimento, então é melhor projetar e focar sua atenção no futuro, quer seja o positivo, quer o negativo.
Vejam como a tradução da Martins Fontes o coloca:
Nós, no entanto, queremos um homem atormentado pelo Futuro – assombrado por visões de um céu ou de um inferno iminentes sobre a Terra (e pronto a desobedecer às ordens do Inimigo no presente, se ao fazê-lo ele acreditar que poderá obter o céu ou evitar o inferno) – e dependente por sua fé no sucesso ou no fracasso de planos cujo objetivo ele não viverá o suficiente para presenciar. (LEWIS, 2009, p.76)
Realidade versus fantasia
Ou seja, quer sejam idealistas ao extremo, quer sejam alarmistas, as projeções de futuro são interessantes para o diabo, pois elas nos fazem “chocar ovos que ainda não foram postos”, como diz um velho provérbio alemão. Em outras palavras, é viver mais da fantasia do que da realidade dos fatos.
Por mais que eu defenda a imaginação em minhas palestras e artigos, é aí precisamente que se encontra o seu limite: quando ela é usada como “substituto” (como sugere o termo técnico em filosofia “Ersatz” do alemão) da realidade. Quando a imaginação é usada para substituir a realidade, ela passa a ser fantasia, ou seja, uma manipulação da realidade. Não é para menos que uma das maiores diversões de Screwtape é nos fazer desviar da realidade, que está encharcada de pegadas do Inimigo.
O medo das más notícias
Hoje esse tipo de desvio é realizado principalmente através da mídia, tanto a de entretenimento, quanto a de notícias, mas também, pasmem, por meio das igrejas, principalmente no que diz respeito a alertas de fim-de-mundo.
Mas não só nas igrejas, as notícias que temos ouvido ultimamente, não importa de que
lado venham, principalmente a respeito da situação atual do Brasil, mas também do mundo, são tão “apocalípticas” e manipuladas, que mal sabemos distinguir realidade de ficção. As informações que recebemos de todos os lados parece que foram feitas para nos confundir e meter cada vez mais medo. Pois não são só os fatos que metem medo, que, por sinal, são cada vez mais terríveis, mas a própria insegurança a respeito deles.
Temos insegurança com relação aos meios que nos trazem os fatos, ou pretendem trazê-los, que são cada vez mais diversificados e sofisticados. Não sabemos mais, se damos mais atenção às informações trazidas pelos jornais ou pelas rede sociais e ficamos atônitos, principalmente no Brasil, com a diversidade de versões e interpretações existentes daquilo que acontece a cada dia, sendo muitas delas sofisticadamente forjadas. E assim, a bola de neve vai se agigantando, de modo que temos cada vez mais casos de ansiedades, depressões e suicídios, os quais são todos primos do medo, até nos meios cristãos.
Por isso é que a contra estratégia para enfrentar Screwtape é a concentração, o foco, não se deixar distrair pelas muitas vozes e apelos, por mais sofisticadas as técnicas de marketing e publicidade empregadas. E concentrar-se em quê?
Primeiro, noutro palavrão para Screwtape, com o qual ele não consegue se conformar e que não consegue entender de jeito nenhum: o amor.
Não é para menos que 1 João 4.18 diz:
“No amor não há medo; ao contrário o perfeito amor expulsa o medo, porque o medo supõe castigo. Aquele que tem medo não está aperfeiçoado no amor.” (NVI)
Depois, no próprio presente, do qual o Screwtape foge “como o diabo foge da cruz”. “Desvie o paciente para o passado ou para o futuro, de preferência para o futuro,” diz Screwtape, “mas afaste-o a todo custo do presente, onde Deus atua”.
Pois é aí, no presente, que o amor de Deus se manifesta e a partir de onde teremos uma visão clara, tanto do passado, quanto do futuro, mas não de forma saudosista e fantasiosa, mas realista. (Confundir o ser humano quanto à palavra “realidade” e “real” é outra estratégia importante do inimigo, muito associada a essa, que merece outro artigo.) Aí eu me lembro de Paulo, que diz em Filipenses 3.14b-15, passagem essa que Deus esteve e está usando para tocar e transformar minha vida profundamente nos últimos meses e no presente:
“esquecendo-me das coisas que ficaram para trás e avançando para as que estão adiante, prossigo para o alvo, a fim de ganhar o prêmio do chamado celestial de Deus em Cristo Jesus.” (NVI)
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Não fiquem com medo das notícias que ouvirem
Ele é uma espécie de representação do Diabo, para o qual Lewis criou um neologismo da combinação de screw (parafuso, torcer, parafusar, distorcer) e tape (fita adesiva). O livro é uma coleção de cartas desse diabo-mor a um demônio-aprendiz, que é seu sobrinho e está infernizando a vida de um rapaz — que se converte no meio do caminho — com instruções de como levá-lo ao mau caminho. (Estou atualmente no projeto da Thomas Nelson do Brasil de nova tradução do livro que sairá ainda esse ano.)
O diabo até admite, em uma de suas cartas para o seu sobrinho, Wormwood (worm-verme; wood-madeira, uma espécie de cupim – outro neologismo, bem como todos os demônios que aparecem na obra), que é muito interessante fazer o paciente viver no passado também. Mas o passado tem a desvantagem de fazer o paciente revisitar coisas que já viveu e assim, levá-lo à reflexão e quem sabe até mesmo a uma coisa muito trágica para o inferno, que é o arrependimento, pois aproxima o paciente do Inimigo, que é Deus. Boas lembranças também são um perigo.
Então, se não é possível fazê-lo viver no passado puramente no sentido da amargura e do ressentimento, então é melhor projetar e focar sua atenção no futuro, quer seja o positivo, quer o negativo.
Vejam como a tradução da Martins Fontes o coloca:
Nós, no entanto, queremos um homem atormentado pelo Futuro – assombrado por visões de um céu ou de um inferno iminentes sobre a Terra (e pronto a desobedecer às ordens do Inimigo no presente, se ao fazê-lo ele acreditar que poderá obter o céu ou evitar o inferno) – e dependente por sua fé no sucesso ou no fracasso de planos cujo objetivo ele não viverá o suficiente para presenciar. (LEWIS, 2009, p.76)
Realidade versus fantasia
Ou seja, quer sejam idealistas ao extremo, quer sejam alarmistas, as projeções de futuro são interessantes para o diabo, pois elas nos fazem “chocar ovos que ainda não foram postos”, como diz um velho provérbio alemão. Em outras palavras, é viver mais da fantasia do que da realidade dos fatos.
Por mais que eu defenda a imaginação em minhas palestras e artigos, é aí precisamente que se encontra o seu limite: quando ela é usada como “substituto” (como sugere o termo técnico em filosofia “Ersatz” do alemão) da realidade. Quando a imaginação é usada para substituir a realidade, ela passa a ser fantasia, ou seja, uma manipulação da realidade. Não é para menos que uma das maiores diversões de Screwtape é nos fazer desviar da realidade, que está encharcada de pegadas do Inimigo.
O medo das más notícias
Hoje esse tipo de desvio é realizado principalmente através da mídia, tanto a de entretenimento, quanto a de notícias, mas também, pasmem, por meio das igrejas, principalmente no que diz respeito a alertas de fim-de-mundo.
Mas não só nas igrejas, as notícias que temos ouvido ultimamente, não importa de que
lado venham, principalmente a respeito da situação atual do Brasil, mas também do mundo, são tão “apocalípticas” e manipuladas, que mal sabemos distinguir realidade de ficção. As informações que recebemos de todos os lados parece que foram feitas para nos confundir e meter cada vez mais medo. Pois não são só os fatos que metem medo, que, por sinal, são cada vez mais terríveis, mas a própria insegurança a respeito deles.
Temos insegurança com relação aos meios que nos trazem os fatos, ou pretendem trazê-los, que são cada vez mais diversificados e sofisticados. Não sabemos mais, se damos mais atenção às informações trazidas pelos jornais ou pelas rede sociais e ficamos atônitos, principalmente no Brasil, com a diversidade de versões e interpretações existentes daquilo que acontece a cada dia, sendo muitas delas sofisticadamente forjadas. E assim, a bola de neve vai se agigantando, de modo que temos cada vez mais casos de ansiedades, depressões e suicídios, os quais são todos primos do medo, até nos meios cristãos.
Por isso é que a contra estratégia para enfrentar Screwtape é a concentração, o foco, não se deixar distrair pelas muitas vozes e apelos, por mais sofisticadas as técnicas de marketing e publicidade empregadas. E concentrar-se em quê?
Primeiro, noutro palavrão para Screwtape, com o qual ele não consegue se conformar e que não consegue entender de jeito nenhum: o amor.
Não é para menos que 1 João 4.18 diz:
“No amor não há medo; ao contrário o perfeito amor expulsa o medo, porque o medo supõe castigo. Aquele que tem medo não está aperfeiçoado no amor.” (NVI)
Depois, no próprio presente, do qual o Screwtape foge “como o diabo foge da cruz”. “Desvie o paciente para o passado ou para o futuro, de preferência para o futuro,” diz Screwtape, “mas afaste-o a todo custo do presente, onde Deus atua”.
Pois é aí, no presente, que o amor de Deus se manifesta e a partir de onde teremos uma visão clara, tanto do passado, quanto do futuro, mas não de forma saudosista e fantasiosa, mas realista. (Confundir o ser humano quanto à palavra “realidade” e “real” é outra estratégia importante do inimigo, muito associada a essa, que merece outro artigo.) Aí eu me lembro de Paulo, que diz em Filipenses 3.14b-15, passagem essa que Deus esteve e está usando para tocar e transformar minha vida profundamente nos últimos meses e no presente:
“esquecendo-me das coisas que ficaram para trás e avançando para as que estão adiante, prossigo para o alvo, a fim de ganhar o prêmio do chamado celestial de Deus em Cristo Jesus.” (NVI)
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Não fiquem com medo das notícias que ouvirem
É mestre e doutora em educação (USP) e doutora em estudos da tradução (UFSC). É autora de O Senhor dos Anéis: da fantasia à ética e tradutora de Um Ano com C.S. Lewis e Deus em Questão. Costuma se identificar como missionária no mundo acadêmico. É criadora e editora do site www.cslewis.com.br
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Ricardo Barbosa