Por Escrito
- 26 de abril de 2017
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“O chamado” começa na empatia
Por Liz Guimarães
Eu tinha sete anos quando me dei conta do significado da expressão “chamado missionário”. Naquela época, achava que essa era uma condição para pessoas especiais, com habilidades especiais. Passei um longo tempo na vida, toda a adolescência e boa parte da juventude com esse pensamento e voltada à missão transcultural – o meu “chamado” era para o continente africano.
Nesse tempo, sempre saltavam aos meus olhos e ouvidos os vulneráveis da cidade, nos caminhos para igreja, a escola, a faculdade, o trabalho e outras atividades cotidianas. Eram sempre alvo da minha atenção as pessoas que passavam necessidade, que dormiam nas ruas, que não tinham o que comer, as crianças expostas aos perigos da urbe. Nunca me foi possível naturalizá-las como “parte do mobiliário urbano”. Contudo, eu ainda pensava no “chamado missionário” transcultural.
A vida seguiu seu fluxo e então em 2010 tive meu primeiro contato com o contexto dos adolescentes privados de liberdade. Quando ouvi a respeito da vida daquelas meninas e meninos e um tempo depois quando olhei pela primeira vez nos olhos de um adolescente privado de liberdade que cumpria medida em uma das unidades fechadas do sistema socioeducativo no Rio de Janeiro deu-se o entendimento: foi à partir do encontro das nossas humanidades, do encontro dos nossos olhares que encontrei a tão esperada “missão” – ali estava o meu “chamado”. Mas, um momento, àquela altura recém-formada na faculdade eu não era, nem de longe, uma daquelas pessoas especiais, vocacionadas que sempre via nos meses de campanha missionária, eu era apenas uma jovem com o desejo de encontrar aquelas meninas e meninos e suas famílias, fazer amizades, conversar, abraçar. E nisso, a meu ver, não havia nada de especial.
Foi naquela época que comecei a entender que o “chamado” é para todas e todos, é para mim e para você, não necessita de qualquer habilidade especial, nem tão pouco uma viagem para um lugar distante, ele está ao nosso redor em todo o tempo. O trabalho em outras culturas é sim muito importante e como disse Jesus em Atos 1.8 começa onde estamos, e em muitos casos, pode se dar por completo onde estamos.
Compreendo a cada dia que as habilidades para exercer a missão são aquelas que adquirimos durante a vida. Minha capacidade de perceber e acolher o outro veio da educação e do afeto que recebi de minha mãe que sempre me falava com amor que pouco que tínhamos tornava-se muito quando comparado aos que não tinham nada e precisavam recorrer ao lixo de uma grande rede de fast food, que ficava no caminho para a escola para ter o que comer. A capacidade de abraçar as pessoas e o apreço pela fraternidade veio dos abraços que recebi ao longo infância e adolescência, e do ambiente de amor fraternal que construímos e mantivemos durantes os tempos de adolescente em que um sorvete pequeno poderia ser partilhado por até dez pessoas apenas pela alegria de estar juntos vivendo aquele momento.
Hoje, atuo na Casa Mãe Mulher, um projeto autônomo de mulheres de várias denominações, que acolhe as mães e familiares dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa de privação de liberdade, na unidade do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (DEGASE) em Belford Roxo, baixada Fluminense. Aqui, o grande mandamento é abraçar as mães, acolhê-las e cuidar delas. Percebo que tudo o que eu acreditava que precisava para exercer a missão sempre esteve dentro de mim. E que aquilo que eu não tenho, o Senhor, através do Espírito Santo, está pronto a suprir assim como faz com o alimento para mais de duzentas pessoas semanalmente na Casa Mãe.
Então, o que eu tenho a dizer a respeito do chamado é que ele está aí ao seu lado, é aquela pessoa, aquele grupo, que “não passa batido” para você, que sempre atrai sua atenção. E o que você precisa para exercê-lo também está muito próximo dentro de você, forjado por trajetória de vida. Como está descrito em Romanos 1.16, o evangelho que é poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê é o evangelho do amor, da amizade, da partilha, do encontro.
“Achega-te também a nós / Aqui neste lugar / Em meu abraço, quero te dizer
Seja bem vindo / Cada um ver outro ser vir / Na direção de cada um de nós
Quando estamos EM / O outro é para nós lugar / Quando estamos com
Acompanhados de alguém / Estamos n’outro e o outro também Altruísta
EmComOutro - Deu-se o verdadeiro encontro” (Roberto Diamanso)
• Elizabeth Guimarães, pedagoga, educadora popular e mobilizadora na Casa Mãe Mulher.
Imagem: Pixabay.com.
Eu tinha sete anos quando me dei conta do significado da expressão “chamado missionário”. Naquela época, achava que essa era uma condição para pessoas especiais, com habilidades especiais. Passei um longo tempo na vida, toda a adolescência e boa parte da juventude com esse pensamento e voltada à missão transcultural – o meu “chamado” era para o continente africano.
Nesse tempo, sempre saltavam aos meus olhos e ouvidos os vulneráveis da cidade, nos caminhos para igreja, a escola, a faculdade, o trabalho e outras atividades cotidianas. Eram sempre alvo da minha atenção as pessoas que passavam necessidade, que dormiam nas ruas, que não tinham o que comer, as crianças expostas aos perigos da urbe. Nunca me foi possível naturalizá-las como “parte do mobiliário urbano”. Contudo, eu ainda pensava no “chamado missionário” transcultural.
A vida seguiu seu fluxo e então em 2010 tive meu primeiro contato com o contexto dos adolescentes privados de liberdade. Quando ouvi a respeito da vida daquelas meninas e meninos e um tempo depois quando olhei pela primeira vez nos olhos de um adolescente privado de liberdade que cumpria medida em uma das unidades fechadas do sistema socioeducativo no Rio de Janeiro deu-se o entendimento: foi à partir do encontro das nossas humanidades, do encontro dos nossos olhares que encontrei a tão esperada “missão” – ali estava o meu “chamado”. Mas, um momento, àquela altura recém-formada na faculdade eu não era, nem de longe, uma daquelas pessoas especiais, vocacionadas que sempre via nos meses de campanha missionária, eu era apenas uma jovem com o desejo de encontrar aquelas meninas e meninos e suas famílias, fazer amizades, conversar, abraçar. E nisso, a meu ver, não havia nada de especial.
Foi naquela época que comecei a entender que o “chamado” é para todas e todos, é para mim e para você, não necessita de qualquer habilidade especial, nem tão pouco uma viagem para um lugar distante, ele está ao nosso redor em todo o tempo. O trabalho em outras culturas é sim muito importante e como disse Jesus em Atos 1.8 começa onde estamos, e em muitos casos, pode se dar por completo onde estamos.
Compreendo a cada dia que as habilidades para exercer a missão são aquelas que adquirimos durante a vida. Minha capacidade de perceber e acolher o outro veio da educação e do afeto que recebi de minha mãe que sempre me falava com amor que pouco que tínhamos tornava-se muito quando comparado aos que não tinham nada e precisavam recorrer ao lixo de uma grande rede de fast food, que ficava no caminho para a escola para ter o que comer. A capacidade de abraçar as pessoas e o apreço pela fraternidade veio dos abraços que recebi ao longo infância e adolescência, e do ambiente de amor fraternal que construímos e mantivemos durantes os tempos de adolescente em que um sorvete pequeno poderia ser partilhado por até dez pessoas apenas pela alegria de estar juntos vivendo aquele momento.
Hoje, atuo na Casa Mãe Mulher, um projeto autônomo de mulheres de várias denominações, que acolhe as mães e familiares dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa de privação de liberdade, na unidade do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (DEGASE) em Belford Roxo, baixada Fluminense. Aqui, o grande mandamento é abraçar as mães, acolhê-las e cuidar delas. Percebo que tudo o que eu acreditava que precisava para exercer a missão sempre esteve dentro de mim. E que aquilo que eu não tenho, o Senhor, através do Espírito Santo, está pronto a suprir assim como faz com o alimento para mais de duzentas pessoas semanalmente na Casa Mãe.
Então, o que eu tenho a dizer a respeito do chamado é que ele está aí ao seu lado, é aquela pessoa, aquele grupo, que “não passa batido” para você, que sempre atrai sua atenção. E o que você precisa para exercê-lo também está muito próximo dentro de você, forjado por trajetória de vida. Como está descrito em Romanos 1.16, o evangelho que é poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê é o evangelho do amor, da amizade, da partilha, do encontro.
“Achega-te também a nós / Aqui neste lugar / Em meu abraço, quero te dizer
Seja bem vindo / Cada um ver outro ser vir / Na direção de cada um de nós
Quando estamos EM / O outro é para nós lugar / Quando estamos com
Acompanhados de alguém / Estamos n’outro e o outro também Altruísta
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• Elizabeth Guimarães, pedagoga, educadora popular e mobilizadora na Casa Mãe Mulher.
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