Opinião
- 08 de junho de 2018
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Não abandonem os hinos
Por Gerson Borges
“Os teus decretos são o tema da minha canção em minha peregrinação” (Sl 119.54)
Se há um consenso no meio literário não é sobre o que é literatura ou muito menos sobre o que é arte. Longe disso. Uma ideia, no entanto, que é quase universal entre os escritores e artistas em geral é a verdade inegável e intrigante de que a Bíblia é a sua grande fonte de inspiração. Eu passaria um tempão citando gente de peso e renome que podem confirmar minha afirmação; críticos literários consagrados e renomados que admiro, tais como Harold Bloom, Northrop Frye, George Steiner o brasileiro Alfredo Bosi e muitos outros. Como John Gabel e Charles Charles Wheeler mostram em “A Bíblia como literatura”, a influência da Palavra de Deus é central e única na literatura. A lista percorre criadores geniais que vão desde Dante, Bach, Rembrandt e Michelângelo, Guimarães Rosa, Machado de Assis, Paulo Leminski, Melville, Dickens, Conrad, até nas letras de canções de Chico Buarque e Sting. Como disse a intelectual protestante norte-americana Susan Wise Bauer na sua deliciosa obra “Como educar a mente – O guia para entender grandes autores”: “todo poema ou é sobre Deus, ou sobre o amor ou sobre a morte.”
Nas palavras do mais importante dos intelectuais cristãos, o indiano Vishal Mangalwadi, a Bíblia é “o livro que criou a alma da civilização ocidental”. Sim, a Bíblia Sagrada é excelente literatura e fonte de inspiração literária. Seu tema é esse mesmo: Deus, o amor e a condição humana, salva apenas pela graça. Mas é muito mais que isso, é a soberba revelação do Criador. Revelação maior que a Palavra só a Palavra encarnada, Cristo (João 1). C. S. Lewis, sempre ele, comentou que “para Hamlet conhecer Shakespeare somente se Shakespeare entrasse na trama. Deus entrou no nosso enredo. O Criador entrou na sua criação.”
Eu sei disso muito bem. Não sei compor sem a Bíblia. Simplesmente sou incapaz de escrever canções que não sejam bíblicas. Ou a uso de diferentes formas: adaptando, parafraseando trechos dos salmos, dos profetas ou dos evangelhos, ou pensando em como posso falar de Deus sem falar de Deus, como fez o autor do livro de Ester – um dos livros que mais expressam a soberania divina, teocêntrico de ponta a ponta, mas que sequer cita o Deus de Abraão, Isaque e Jacó. Até quando escrevo uma canção de amor para minha esposa ou meus meninos, sempre tem algo escriturístico e teológico nas linhas ou entrelinhas. Algum princípio cristão, algum mandamento, alguma bem-aventurança ou enfrentamento de algum pecado ou demônio, real ou imaginário. “Os teus decretos são o tema da minha canção em minha peregrinação” (Sl 119.54), diz o salmista nessa obra-prima que é o Salmo 119, um poema-acróstico, numa homenagem metalinguística (uma obra literária sobre uma obra literária).
Foi lendo, meditando e orando por semanas nesse tesouro davídico que compus “A minha delícia” (facilmente encontrado nos serviços como como o Spotify, Deezer e Google Play Music - basta digitar “Gerson Borges A minha delícia”).
Rios de águas correm dos meus olhos
Quando não guardo a sua Lei
Teus mandamentos, os teus preceitos
São perfeitos, eu sei
Teu Estatuto é a minha canção
A alegria do meu coração
Sou peregrino na terra
Tua palavra não esquecerei
A minha delícia é a Tua Lei
Uma canção simples, um lamento pungente de um coração que, orando e adorando, expressa tanto seu apreço pelas Escrituras quando seu pesar por não obedecê-las. A condição humana sem o Salvador. Ah, como preciso da Graça! O que seria de mim se não “alcançássemos a Misericórdia de Deus”, como Paulo fala repetidamente a Timóteo (1Tm 1.13, 15).
Outro exemplo é “A alegria da minha alegria”, composta há mais de 20 anos em um momento que eu, em meio às lutas da juventude, não me sentia exatamente alegria. Aliás, é uma canção muito apropriada para esses dias cinzentos do nosso país e da desesperança que cobre a geopolítica mundial:
“Mesmo quando estiver atribulado
Mesmo quando estiver sendo provado
Tu serás a alegria da minha alegria
Minha força é a tua alegria…”
Um hino quase à antiga moda protestante, quase um spiritual em compasso 12 por 8 (anotação técnica para os músicos que me leem, perdão) que começa com citações de Isaías 61: “Vestes de louvor ao invés de espírito angustiado, óleo de alegria ao invés de pranto”, à exortação pastoral de Esdras 8.10, em um momento de profunda tristeza e abatimento: “A alegria do Senhor é a nossa força”. Finalmente, a letra parafraseia Paulo aos Filipenses: “Ser cristão é aprender a viver contente”.
Eu poderia citar meus mestres, os irmãos Wesley, Isaac Watts e tantos e maravilhosos tesouros que estão esquecidos nos nossos hinários ou ainda Guilherme Kerr, Nelson Bomilcar, Sérgio Pimenta e Aristeu Pires. Todos cantaram direta ou indiretamente a Palavra. Nossa espiritualidade e culto perdem se esquecermos disso. Os antigos executivos das gravadoras, agora empregados das plataformas de streaming de música, não podem definir a nossa liturgia. Eles adoram a Mamom, como sabemos. Não ao Deus de Davi, Isaías e Jesus. Podem crer na minha palavra. Melhor, creiam na Palavra de Deus. E então, cantem-na. Aliás, para fim de papo, alguém, por favor, comece uma hashtag #salveoshinarios ou #naoabandoneoshinos.
Leia mais
Contando e Cantando – Conhecendo as Histórias de Hinos Cristãos [Henriqueta Rosa F. Braga]
Ser Evangélico Sem Deixar de Ser Brasileiro [Gerson Borges Martins]
Contando e Cantando – Conhecendo as Histórias de Hinos Cristãos [Henriqueta Rosa F. Braga]
Louvor, Adoração e Liturgia [Rubem Martins Amorese]
Perdão e purificação nos hinos que a igreja canta
A igreja deveria cantar mais os salmos
Photo by chuttersnap on Unsplash
“Os teus decretos são o tema da minha canção em minha peregrinação” (Sl 119.54)
Se há um consenso no meio literário não é sobre o que é literatura ou muito menos sobre o que é arte. Longe disso. Uma ideia, no entanto, que é quase universal entre os escritores e artistas em geral é a verdade inegável e intrigante de que a Bíblia é a sua grande fonte de inspiração. Eu passaria um tempão citando gente de peso e renome que podem confirmar minha afirmação; críticos literários consagrados e renomados que admiro, tais como Harold Bloom, Northrop Frye, George Steiner o brasileiro Alfredo Bosi e muitos outros. Como John Gabel e Charles Charles Wheeler mostram em “A Bíblia como literatura”, a influência da Palavra de Deus é central e única na literatura. A lista percorre criadores geniais que vão desde Dante, Bach, Rembrandt e Michelângelo, Guimarães Rosa, Machado de Assis, Paulo Leminski, Melville, Dickens, Conrad, até nas letras de canções de Chico Buarque e Sting. Como disse a intelectual protestante norte-americana Susan Wise Bauer na sua deliciosa obra “Como educar a mente – O guia para entender grandes autores”: “todo poema ou é sobre Deus, ou sobre o amor ou sobre a morte.”
Nas palavras do mais importante dos intelectuais cristãos, o indiano Vishal Mangalwadi, a Bíblia é “o livro que criou a alma da civilização ocidental”. Sim, a Bíblia Sagrada é excelente literatura e fonte de inspiração literária. Seu tema é esse mesmo: Deus, o amor e a condição humana, salva apenas pela graça. Mas é muito mais que isso, é a soberba revelação do Criador. Revelação maior que a Palavra só a Palavra encarnada, Cristo (João 1). C. S. Lewis, sempre ele, comentou que “para Hamlet conhecer Shakespeare somente se Shakespeare entrasse na trama. Deus entrou no nosso enredo. O Criador entrou na sua criação.”
Eu sei disso muito bem. Não sei compor sem a Bíblia. Simplesmente sou incapaz de escrever canções que não sejam bíblicas. Ou a uso de diferentes formas: adaptando, parafraseando trechos dos salmos, dos profetas ou dos evangelhos, ou pensando em como posso falar de Deus sem falar de Deus, como fez o autor do livro de Ester – um dos livros que mais expressam a soberania divina, teocêntrico de ponta a ponta, mas que sequer cita o Deus de Abraão, Isaque e Jacó. Até quando escrevo uma canção de amor para minha esposa ou meus meninos, sempre tem algo escriturístico e teológico nas linhas ou entrelinhas. Algum princípio cristão, algum mandamento, alguma bem-aventurança ou enfrentamento de algum pecado ou demônio, real ou imaginário. “Os teus decretos são o tema da minha canção em minha peregrinação” (Sl 119.54), diz o salmista nessa obra-prima que é o Salmo 119, um poema-acróstico, numa homenagem metalinguística (uma obra literária sobre uma obra literária).
Foi lendo, meditando e orando por semanas nesse tesouro davídico que compus “A minha delícia” (facilmente encontrado nos serviços como como o Spotify, Deezer e Google Play Music - basta digitar “Gerson Borges A minha delícia”).
Rios de águas correm dos meus olhos
Quando não guardo a sua Lei
Teus mandamentos, os teus preceitos
São perfeitos, eu sei
Teu Estatuto é a minha canção
A alegria do meu coração
Sou peregrino na terra
Tua palavra não esquecerei
A minha delícia é a Tua Lei
Uma canção simples, um lamento pungente de um coração que, orando e adorando, expressa tanto seu apreço pelas Escrituras quando seu pesar por não obedecê-las. A condição humana sem o Salvador. Ah, como preciso da Graça! O que seria de mim se não “alcançássemos a Misericórdia de Deus”, como Paulo fala repetidamente a Timóteo (1Tm 1.13, 15).
Outro exemplo é “A alegria da minha alegria”, composta há mais de 20 anos em um momento que eu, em meio às lutas da juventude, não me sentia exatamente alegria. Aliás, é uma canção muito apropriada para esses dias cinzentos do nosso país e da desesperança que cobre a geopolítica mundial:
“Mesmo quando estiver atribulado
Mesmo quando estiver sendo provado
Tu serás a alegria da minha alegria
Minha força é a tua alegria…”
Um hino quase à antiga moda protestante, quase um spiritual em compasso 12 por 8 (anotação técnica para os músicos que me leem, perdão) que começa com citações de Isaías 61: “Vestes de louvor ao invés de espírito angustiado, óleo de alegria ao invés de pranto”, à exortação pastoral de Esdras 8.10, em um momento de profunda tristeza e abatimento: “A alegria do Senhor é a nossa força”. Finalmente, a letra parafraseia Paulo aos Filipenses: “Ser cristão é aprender a viver contente”.
Eu poderia citar meus mestres, os irmãos Wesley, Isaac Watts e tantos e maravilhosos tesouros que estão esquecidos nos nossos hinários ou ainda Guilherme Kerr, Nelson Bomilcar, Sérgio Pimenta e Aristeu Pires. Todos cantaram direta ou indiretamente a Palavra. Nossa espiritualidade e culto perdem se esquecermos disso. Os antigos executivos das gravadoras, agora empregados das plataformas de streaming de música, não podem definir a nossa liturgia. Eles adoram a Mamom, como sabemos. Não ao Deus de Davi, Isaías e Jesus. Podem crer na minha palavra. Melhor, creiam na Palavra de Deus. E então, cantem-na. Aliás, para fim de papo, alguém, por favor, comece uma hashtag #salveoshinarios ou #naoabandoneoshinos.
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Perdão e purificação nos hinos que a igreja canta
A igreja deveria cantar mais os salmos
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Gerson Borges, casado com Rosana Márcia e pai de Bernardo e Pablo, pastoreia a Comunidade de Jesus no ABCD Paulista. É autor de Ser Evangélico sem Deixar de Ser Brasileiro, cantor, compositor e escritor, licenciado em letras e graduando em psicologia.
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