Opinião
23 de março de 2011
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Fukushima, Chernobyl, terremotos e tsunamis
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De fato, há energias que estão acima de nossas capacidades de controle. Todavia, podemos ponderar sobre a Terra e reconstruir nossas relações com o planeta, de modo a respeitá-lo. Podemos reconstruir os sonhos que dignificam e redefinem a casa da humanidade. Devemos observar nossa interação com o mundo natural e redirecionar nossos esforços.
Estrelas explodem, galáxias devoram umas às outras. Há 15 bilhões de anos, dizem os geólogos, a Terra se ajusta num constante desorganizar para organizar, regida por leis naturais. As mesmas que nos permitem observar as mudanças das estações. Os canais de televisão mostram cenas e memórias de outras catástrofes naturais igualmente devastadoras. O fio dessas calamidades naturais é longo. No Oceano Índico, em 2005, usou-se pela primeira vez a palavra “tsunami”.
O impacto de um tsunami faz lembrar que a mãe Terra não suporta tudo o que se impõe a ela (J. Perkins). Imaginem se ela resistirá ao que temos imposto ao planeta, depredando-o e aviltando-o com a ganância que nos é peculiar! Porém, buscamos esclarecimentos racionais para o imponderável. Queremos entender os fatos perguntando sobre a cumplicidade de Deus. Uma inversão radical da questão. Por que Deus criou um mundo finito, vulnerável, que sofre? Por que o destino de cada astro ou estrela é desaparecer? Por que uma estrela morta há milhões de anos luz ainda brilha no céu? Por que existem terremotos e tsunamis? Deveríamos perguntar sobre o tratamento que damos ao planeta criado, quando o submetemos a danos irreparáveis.
Insistimos em manter o mundo à espera, aguardando possíveis desastres nucleares e não assumimos nossas responsabilidades quanto ao futuro da Terra e a devastação ecológica de todos os dias. Podemos fazer um balanço do que temos feito e planejar ações para o futuro que nos espera, além das denúncias em relação ao que vem transformando o planeta num imenso depósito de lixo (Fukushima opera com lixo nuclear reciclado!). Não há nada que escape à voracidade do capital.
O assunto pareceria anacrônico, se refletisse uma questão vencida anos anteriores à explosão religiosa carismática. É perda de tempo repetir os chavões da teologia intimista, salvacionista, conservadora ou fundamentalista. A compreensão negativa sobre Deus não pode apagar tudo, como juízo indesejável. Na Bíblia, há uma legião de fantasmas e monstruosidades atribuídas a Deus: o mandato (herem) justificado e expresso para o genocídio de povos inteiros, sem levar em conta inocentes, anciãos, enfermos, inválidos, mulheres e crianças; castigos coletivos até a “terceira e quarta gerações”, por autores que apresentam-se sob o “aval de Deus”. É assombroso que o rosto misericordioso do Deus Salvador seja escondido no esforço humano da vingança contra o semelhante. Envergonhamos Deus.
O horror de Hiroshima e Chernobyl são fantasmas da ameaça nuclear; Auschwitz, Ruanda, Timor Leste, Bálcans, da“limpeza” étnica, das sombras da crueldade humana. Tratam das profundas experiências da dor, encravada na consciência moderna. São milhões de mortos. Mas, onde está a Palavra de Deus para a salvação, ali está o Espírito. Deus cria por meio da Palavra (davar). Tudo é precedido da energia vibrante que traz a salvação. O mundo criado pelo fôlego de Deus estimula respeito e comunhão com os seres da criação. Deus respira por meio de toda criação (Moltmann), seres, raças, povos.
A crise ecológica não deve ser separada da concepção do universo concreto: todos somos destinados ao mundo recriado (Ap 21). A Igreja e os crentes, como representantes da fé bíblica, não podem se esquecer que, no momento, “a criação geme (...) em dores do parto” (Rm 8.22, NVI) para uma nova realidade.
O mundo do lucro, da exploração e da ganância, introduziu-nos num círculo vicioso, atraindo ou criando dívidas sociais e ecológicas ao mesmo tempo (2 bilhões de pessoas experimentam fome e endemias). Os limites das condições de equilíbrio chegam a uma situação drástica. A catástrofe maior da miséria, que atinge o fraco por deferência, também denuncia o descaso no qual vivemos. Faz parte da indiferença de toda a humanidade quanto ao seu futuro. Reflitamos.
É pastor emérito da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil e autor de livros como “Pedagogia da Ganância" (2013) e "O Dragão que Habita em Nós” (2010).
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