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- 24 de fevereiro de 2022
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Família de cristãos paquistaneses é liberta da escravidão
Missionário brasileiro relata momentos de tensão em uma fábrica de tijolos em Faisalabad
Por Lissânder Dias
“Eu não vou mais apanhar?”. Foi o que perguntou o cristão Javed no instante em que o pastor Shahzad disse que sua dívida havia sido paga. Ele, sua esposa e seus cincos filhos agora podem usufruir de um direito fundamental de todo ser humano (a liberdade), mas que lhes fora negado por 27 anos. Graças a uma mobilização feita por um grupo de brasileiros (o evangelista Edson Teixeira, o dentista Tiago Figueira e os artistas missionários Hudson Zanoni e Alexandre Penha), o paquistanês Javed e sua família foram “resgatados” do trabalho forçado pela quantia de U$ 2.200 dólares. Eles também ganharam uma motocicleta nova. No total, os brasileiros gastam U$ 3.180 dólares (o equivalente a R$ 16.700 reais) com a família.
Shahzad e Javed vivem na cidade de Faisalabad, no Paquistão, sudoeste da Ásia. Lá, embora menos de 3% da população se declare cristã, as igrejas são cheias, os cultos festivos e de longa duração (de 4 a 5 horas). O ministério do pastor Shahzad envolve a pregação do Evangelho, que redunda na libertação de dezenas de famílias submetidas ao trabalho forçado. Elas são vítimas de uma prática de endividamento geracional denominada peshgi. As famílias precisam pagar por dívidas antigas de seus antepassados. Essa forma de exploração foi declarada ilegal em 1992, mas a sua erradicação ainda está longe de acontecer. Segundo a agência Repórter Brasil, estima-se que cerca de um milhão de trabalhadores vivem nessas condições no Paquistão.
Em novembro de 2021, Edson Teixeira e sua equipe de missionários foi à Faisalabad para realizar um projeto missionário chamado “Missão Paquistão 2021”, que consistiu em atividades evangelísticas, artísticas e sociais na cidade. Usando a linguagem universal do palhaço, eles distribuíram cestas básicas e propagaram o Evangelho por meio do bom humor, do teatro e da palhaçaria para crianças e adultos.
Hudson foi um dos missionários artistas que participaram do projeto. Ele relata o que viu sobre a realidade do trabalho escravo na cidade:
Hudson foi um dos missionários artistas que participaram do projeto. Ele relata o que viu sobre a realidade do trabalho escravo na cidade:
“De todas as realidades que vimos por aqui, a que mais nos chocou e partiu o meu coração, são as famílias que vivem em situação de escravidão e trabalham em fábricas de tijolos da forma mais sub-humana que você possa imaginar. Infelizmente são escravos ‘geracionais’ que vivem há 300 anos ou mais trabalhando na mesma atividade por troca de comida e um abrigo que parece de animais. Essas famílias possuem um débito (dívida) com esses supostos “patrões” que jamais conseguirão pagar com aquilo que ganham e por isso vivem sem nenhum tipo de esperança. Cada família (incluindo crianças e idosos) trabalha cerca de 10 horas por dia, vigiada por carrascos com machados e pedaços de pau, debaixo de um sol escaldante para conseguirem entregar 600 a 700 tijolos por dia, que são vendidos por aproximadamente R$ 20 reais e depois repassam mais de 80% desse valor para o ‘patrão’.
A boa notícia é que essa ‘dívida’ pode ser quitada a qualquer momento e libertar a família escravizada para sair dessas fábricas e procurarem uma nova vida. Quando descobrimos isso, juntamos os recursos que trouxemos para resgatar a família do Javed, sua esposa e seus cinco filhos. Além disso, compramos uma motocicleta nova Tuk Tuk para ele recomeçar uma nova vida. Tudo isso acompanhado pelo Pastor Shahzad.
Quem sabe essa tenha sido a cena mais linda que já vi: quando fomos comunicar sua liberdade, Javed, antes de sorrir, perguntou: ‘Não vou mais apanhar?’. E o pastor Shahzad respondeu: “Não, você está livre agora!” Todos nós caímos no choro.
Nos comprometemos que, ao voltar ao Brasil, mobilizaremos irmãos e igrejas para nos ajudar a construir uma escola dentro da igreja do Pastor Shahzad para tirar as crianças do trabalho escravizado e levantarmos recursos para resgatar outras centenas de famílias!”.
Hostilidade
Hudson relata ainda momentos de tensão que eles experimentaram em uma das visitas a uma fábrica de tijolos no dia 09 de novembro de 2021:
“Hoje pela manhã, tínhamos uma programação para alimentar 100 pessoas com marmitas e água numa fábrica distante das outras. Quando entramos no bairro, logo percebemos um clima de hostilidade dos moradores. Estacionamos na fábrica, saímos do carro já vestidos de palhaços. Estava indo tudo bem, assim como foram as outras quatro ações de evangelismo realizadas, porém quando chegamos perto dos trabalhadores, apareceu um capataz que ligou para o proprietário. Ele nos disse que aquele era o horário de mais produtividade dos escravos e que deveríamos ir embora imediatamente.
Nesse momento, o Pastor Shahzad tentou negociar com eles para deixar as marmitas, mas de repente apareceram outros quatro capatazes fortemente armados com metralhadoras, revólveres e porretes e partiram pra cima da nossa equipe. Foi nessa hora que a nossa escolta (dois soldados do exército com metralhadoras) interveio e, com muita sabedoria, não levantaram as vozes e nem as armas, evitando assim o início de um tiroteio. Rapidamente, eles nos colocaram nos carros, porém as crianças e adultos que estavam perto foram alvos de agressões violentas dos capatazes: com paus, batiam na cabeça dos idosos até sangrarem. As crianças corriam desesperadas vendo seus pais apanharem, inclusive as mulheres. Nessa hora, nossos soldados nos orientaram a acelerar o carro, porém o motorista que levava a alimentação ficou por último. Não o deixaram sair, pois era muçulmano e, portanto, não deveria ajudar os cristãos (embora tenha sido contratado para o transporte). Ele foi agredido violentamente nos braços, nas costas e recebeu diversos tapas e coronhadas na cabeça. Uma cena assustadora que assistimos pelo retrovisor do carro e que nunca mais vou esquecer. Começamos a orar e clamar pelo livramento daquele homem. Graças a Deus, ele conseguiu acelerar a moto em que estava e sair da fábrica correndo o risco de levar um tiro por trás.
Dirigimos cerca de 5 minutos pela estrada, quando o Pastor Shahzad parou o carro no acostamento e despencou a chorar e lamentar pelos escravos que sofreram com a violência. Também choramos muito e oramos para que não houvesse retaliação para as famílias que trabalham nesse cativeiro.
Depois de alguns minutos, entendemos que a comida deveria ser distribuída e deveríamos visitar outra fábrica perto dali e fomos com mais cautela, esperamos no carro até o proprietário autorizar nossa ação e mesmo depois de liberado, ele ainda ficou supervisionando o trabalho pois tinha sido avisado pelos capatazes da outra fábrica. No começo houve um clima de tensão da nossa equipe, por pensar que aquela cena assustadora poderia se repetir, porém a presença do Senhor se manifestou naquele lugar e todos foram abençoados com a comida e com os palhaços”.
Imagens: Missão Paquistão
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Lissânder Dias do Amaral é jornalista, blogueiro, poeta e editor de livros. Integra o Conselho Nacional da Interserve Brasil e o Conselho da Unimissional. É autor de “O Cotidiano Extraordinário – a vida em pequenas crônicas” e responsável pelo blog Fatos e Correlatos do Portal Ultimato. É um dos fundadores do Movimento Vocare e ajudou a criar as organizações cristãs de cooperação Rede Mãos Dadas e Rede Evangélica Nacional de Ação Social (RENAS).
- Textos publicados: 125 [ver]
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Site: http://www.fatosecorrelatos.com.br
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