Opinião
- 24 de janeiro de 2019
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“Eu não nasci pra trabalho”: o descanso em perspectiva bíblica
Por Vilson Scholz
Houve um tempo – as últimas décadas do século passado – em que se falava sobre a possibilidade de diminuir drasticamente a jornada de trabalho, graças à automação ou ao uso de robôs. Se a Bíblia fala sobre um dia de descanso na semana de sete dias e, no século passado, já se tinha um dia e meio de descanso (do meio-dia do sábado até a segunda-feira), a perspectiva era de que a semana de trabalho poderia ser, quem sabe, reduzida a quatro dias ou até mesmo três! Perguntava-se o que o ser humano faria com tanto tempo livre num mundo robotizado.
É claro que nada disso se confirmou. Trabalhamos mais do que nunca. O termo workaholic, que designa um trabalhador compulsivo, entrou em nosso vocabulário a partir de 1968. O teólogo Jürgen Moltmann criou a expressão homo accelerandus, ou seja, o homem que precisa acelerar. Assim, ao lado do homo faber (homem fabricador), do homo ludens (homem que brinca), fala-se sobre esse homo accelerandus, esse ser que está sempre na corrida.
A vida é mais do que trabalhar
Descansar faz parte de ritmo da vida, mas é raro encontrar alguém que faz uma pausa para refletir sobre o tema do descanso ou do lazer. Mais comum é ver estudos sobre o tema do trabalho em visão bíblica; uma teologia do lazer é mais difícil de encontrar. Mas a Bíblia deixa entrever que a vida é mais do que trabalhar, e trabalhar.
Segundo o Gênesis, o primeiro dia dos primeiros seres humanos foi um dia de descanso. O ser humano foi criado no sexto dia (Gn 1.31), e no sétimo dia Deus descansou (Gn 2.2-3). É possível supor que ser humano participou desse descanso. Esse início de vida humana com descanso sugere que o propósito ou destino final da humanidade não é o trabalho, mas o descanso. Aliás, diferentemente do que se lê na mitologia antiga, o ser humano não foi criado para ser escravo da divindade. Deus descansou e repassou ao ser humano a sua postura em relação a trabalho e descanso. Criado à imagem de Deus, o ser humano imita Deus no trabalho e no descanso. Deus descansou, e isto fundamenta a santificação do descanso (Êx 20.10-11).
Na Bíblia, o primeiro a descansar foi Deus. Esse descanso de Deus chama a atenção, especialmente porque descanso parece pressupor cansaço. Será que a obra da criação deixou Deus cansado? Alguém poderia argumentar que a resposta passa pelo ajuste da tradução, porque, afinal, o verbo utilizado em Gn 2.2 (shabat) significa propriamente “cessar” ou “parar”. Assim, Deus “descansou” no sentido de que deu por encerrada a criação do universo.
O que é o descanso
No entanto, esta solução aparentemente fácil é colocada em xeque pelo texto de Êx 20.11, no qual se utiliza um verbo hebraico diferente, o verbo que normalmente significa “descansar” (nuach), para dizer que o SENHOR Deus “descansou”. Em Êx 31.17, o escritor bíblico vai além, dizendo que o SENHOR “descansou e tomou alento”. Literalmente, Deus “puxou fôlego”. Esta formulação ajuda a mostrar que o descanso, no caso de Deus, é uma descrição antropomórfica, ou seja, uma fala a respeito de Deus como se fosse um ser humano. Não pode ser levada ao pé da letra, mesmo que ensine uma verdade. Por ser quem ele é, Deus não está sujeito às limitações humanas. Ele não se cansa nem se fatiga, diz Isaías (Is 40.28). O fato de Deus descansar ao final da criação não significa que estava cansado, como acontece com um ser humano após o trabalho, mas que Deus viu que tudo que tinha feito era bom (Gn 1.31). Se recorrermos a outro antropomorfismo, podemos dizer que Deus contemplou a sua obra e ficou admirado com a sua beleza e perfeição.
O descanso de Deus não significa que ele se separou definitivamente do universo criado. Em teologia, fala-se sobre a “criação contínua”. No livro de Jó se afirma: “Se Deus pensasse apenas em si mesmo e fizesse voltar para o si o seu espírito e o seu sopro, toda a humanidade morreria ao mesmo tempo, e o homem voltaria para o pó” (Jó 34.14-15). Jesus afirmou: “Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também” (Jo 5.17). O autor aos Hebreus afirma que o Filho de Deus sustenta todas as coisas pela sua palavra poderosa (Hb 1.3). Por vezes se diz que descansar é “mudar de atividade”, porque, a rigor, é praticamente impossível ficar sem fazer nada. Aplicando isto ao que se diz a respeito de Deus, o descanso de Deus é a mudança da atividade criativa para a atividade preservadora, que não deixa de ser, também ela, uma atividade criativa.
Quando se considera o ministério terreno de Jesus, fica-se com a impressão de que foi marcado por uma intensa atividade. Jesus chegou a descansar? Ele próprio afirmou que o Filho do Homem não tinha onde reclinar a cabeça (Mt 8.20). Em Mateus 11.2, o evangelista fala sobre “as obras de Cristo”. No Evangelho de João, repetidas vezes Jesus fala sobre realizar as obras do Pai (Jo 5.36; 9.4). Marcos, que é o evangelista mais rico em detalhes, nos mostra um Jesus que parece sempre com pressa, na medida em que insiste no uso do advérbio “logo” ou “imediatamente”. Marcos relata que Jesus convidou os discípulos para um retiro num lugar deserto. “Isto porque eles não tinham tempo nem para comer, visto serem muitos os que iam e vinham” (Mc 6.31). No entanto, o retiro foi frustrado pela grande multidão que os recepcionou do outro lado do lago. Em vez de reclamar, Jesus compadeceu-se deles (Mc 6.34). E seguiu-se a multiplicação dos pães e peixes.
Alguém poderia dizer que Jesus finalmente descansou, quando inclinou a cabeça e entregou o espírito (Jo 19.30). No entanto, o Filho de Deus não entrou em seu descanso eterno. Exaltado à direita de Deus, ele foi preparar um lugar para os seus (Jo 14.2-3). Pode-se dizer que Jesus trabalhou e ainda trabalha para nos dar descanso (Ap 14.13). Sendo Cristo aquele que trabalhou em nosso lugar, podemos dizer que não é no trabalho que o ser humano se salva, mas no descanso. É o descanso para o qual Jesus nos convida (Mt 11.28-29).
Trabalho não é castigo
O trabalho não é castigo pela rebelião contra Deus (Gn 3), pois o trabalho é anterior à queda. Mas essa rebelião trouxe maldição sobre a terra e fez com que o ser humano agora tenha de obter o seu sustento “em fadigas” (Gn 3.17). A rebelião contra Deus traz o cansaço à vida humana. Em Jesus, Deus chama os cansados e sobrecarregados – todos nós, sem exceção – para lhes dar alívio. Neste sentido, o alívio do descanso não decorre da cessação do trabalho, mas da presença de Jesus e do encaminhar-se a Jesus. Descansar agora, no dia do descanso (e nas férias), é a antecipação desse descanso – sempre na companhia daquele que conduz os seus “para junto das águas de descanso” (Sl 23.2; Ap 7.17).
Estamos acostumados a pensar no descanso como uma atividade individual, mas a Bíblia também fala sobre o repouso do povo de Deus como um todo (Hb 4.9). Para entender isto, é preciso voltar ao Antigo Testamento, onde a terra prometida aparece como lugar de descanso. Depois de séculos de escravidão no Egito e dezenas de anos de peregrinação pelo deserto, receber a terra prometida era, de fato, entrar no descanso. Em Josué 1.13 diz: “O SENHOR, seu Deus, está dando descanso a vocês e lhes dará esta terra”. Neste ponto, o conceito de descanso se aproxima da noção de paz, no sentido de shalom, que denota vida plena. Descanso como paz não é apenas ausência de movimento ou atividade, mas estar bem instalado em determinado lugar, com segurança. A situação no tempo de Salomão é um exemplo disso: “Judá e Israel habitavam seguros, cada um debaixo de sua videira e debaixo de sua figueira, desde Dã até Berseba...” (1Rs 4.25).
Porém, nem todos os israelitas entraram na terra prometida. Segundo o Salmo 95, Deus jurou em sua ira: “Eles não entrarão no meu descanso” (Sl 95.11). O autor da carta aos Hebreus cita este texto, tirando algumas conclusões (Hb 3.7—4.11). Não entraram no descanso aqueles que foram desobedientes (Hb 3.18). Neste sentido, Josué não lhes deu descanso. Em outras palavras, a promessa do descanso não se cumpriu no Antigo Testamento. Ela está reservada para o “hoje” de que Davi fala no Salmo 95. Assim, “resta um repouso sabático para o povo de Deus”, diz o autor aos Hebreus (4.9). E ele conclui: “Portanto, esforcemo-nos por entrar naquele descanso, a fim de que ninguém caia, segundo aquele exemplo de desobediência” (Hb 4.10). Segundo o autor aos Hebreus, cabe ao povo de Deus da nova aliança reivindicar a antiga promessa do descanso de Deus, disponível em Jesus Cristo, e já lançar mão dessa promessa, na esperança, mediante a fé em Cristo como Senhor.
Descansar é mais do que parar de trabalhar
Não é possível não descansar. E, num tempo de vida agitada, é bom saber que o descanso, mais do que um intervalo entre períodos de trabalho, é o ponto alto da vida. O propósito maior da humanidade não é trabalhar sem cessar, mas desfrutar da companhia de Deus. Descansar é ter um tempo especial, cada semana, para renovação física, mental, emocional, mas principalmente espiritual. Descanso é mais do que parar de trabalhar; é participar do descanso de Deus, é ter tempo para contemplar as obras de Deus, incluindo a obra da salvação. Descansar de verdade é receber o descanso que Jesus oferece (Mt 11.28-29).
Para muitos, a semana ainda é de seis dias. Outros já desfrutam de dois dias de descanso. Há mais tempo para lazer, mas, acima de tudo, há tempo para comunhão com Deus. O lazer alcança seu potencial máximo quando se vive em comunhão com Deus. Melhor ainda é poder fazer isso na companhia do povo de Deus, em culto de adoração. Porque, mais do que ordenar simplesmente que a pessoa descanse, a Bíblia fala sobre santificar o dia do descanso (Êx 20.8). E essa santificação se dá “pela Palavra de Deus e pela oração” (1Tm 4.5).
• Vilson Scholz é pastor, professor de Teologia Exegética e doutor na área de Novo Testamento. Consultor de Tradução da Sociedade Bíblica do Brasil, Scholz é tradutor do Novo Testamento Interlinear Grego-Português (SBB) e autor de Princípios de Interpretação Bíblica (Editora da Ulbra).
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» Você se sente culpado quando descansa?
Houve um tempo – as últimas décadas do século passado – em que se falava sobre a possibilidade de diminuir drasticamente a jornada de trabalho, graças à automação ou ao uso de robôs. Se a Bíblia fala sobre um dia de descanso na semana de sete dias e, no século passado, já se tinha um dia e meio de descanso (do meio-dia do sábado até a segunda-feira), a perspectiva era de que a semana de trabalho poderia ser, quem sabe, reduzida a quatro dias ou até mesmo três! Perguntava-se o que o ser humano faria com tanto tempo livre num mundo robotizado.
É claro que nada disso se confirmou. Trabalhamos mais do que nunca. O termo workaholic, que designa um trabalhador compulsivo, entrou em nosso vocabulário a partir de 1968. O teólogo Jürgen Moltmann criou a expressão homo accelerandus, ou seja, o homem que precisa acelerar. Assim, ao lado do homo faber (homem fabricador), do homo ludens (homem que brinca), fala-se sobre esse homo accelerandus, esse ser que está sempre na corrida.
A vida é mais do que trabalhar
Descansar faz parte de ritmo da vida, mas é raro encontrar alguém que faz uma pausa para refletir sobre o tema do descanso ou do lazer. Mais comum é ver estudos sobre o tema do trabalho em visão bíblica; uma teologia do lazer é mais difícil de encontrar. Mas a Bíblia deixa entrever que a vida é mais do que trabalhar, e trabalhar.
Segundo o Gênesis, o primeiro dia dos primeiros seres humanos foi um dia de descanso. O ser humano foi criado no sexto dia (Gn 1.31), e no sétimo dia Deus descansou (Gn 2.2-3). É possível supor que ser humano participou desse descanso. Esse início de vida humana com descanso sugere que o propósito ou destino final da humanidade não é o trabalho, mas o descanso. Aliás, diferentemente do que se lê na mitologia antiga, o ser humano não foi criado para ser escravo da divindade. Deus descansou e repassou ao ser humano a sua postura em relação a trabalho e descanso. Criado à imagem de Deus, o ser humano imita Deus no trabalho e no descanso. Deus descansou, e isto fundamenta a santificação do descanso (Êx 20.10-11).
Na Bíblia, o primeiro a descansar foi Deus. Esse descanso de Deus chama a atenção, especialmente porque descanso parece pressupor cansaço. Será que a obra da criação deixou Deus cansado? Alguém poderia argumentar que a resposta passa pelo ajuste da tradução, porque, afinal, o verbo utilizado em Gn 2.2 (shabat) significa propriamente “cessar” ou “parar”. Assim, Deus “descansou” no sentido de que deu por encerrada a criação do universo.
O que é o descanso
No entanto, esta solução aparentemente fácil é colocada em xeque pelo texto de Êx 20.11, no qual se utiliza um verbo hebraico diferente, o verbo que normalmente significa “descansar” (nuach), para dizer que o SENHOR Deus “descansou”. Em Êx 31.17, o escritor bíblico vai além, dizendo que o SENHOR “descansou e tomou alento”. Literalmente, Deus “puxou fôlego”. Esta formulação ajuda a mostrar que o descanso, no caso de Deus, é uma descrição antropomórfica, ou seja, uma fala a respeito de Deus como se fosse um ser humano. Não pode ser levada ao pé da letra, mesmo que ensine uma verdade. Por ser quem ele é, Deus não está sujeito às limitações humanas. Ele não se cansa nem se fatiga, diz Isaías (Is 40.28). O fato de Deus descansar ao final da criação não significa que estava cansado, como acontece com um ser humano após o trabalho, mas que Deus viu que tudo que tinha feito era bom (Gn 1.31). Se recorrermos a outro antropomorfismo, podemos dizer que Deus contemplou a sua obra e ficou admirado com a sua beleza e perfeição.
O descanso de Deus não significa que ele se separou definitivamente do universo criado. Em teologia, fala-se sobre a “criação contínua”. No livro de Jó se afirma: “Se Deus pensasse apenas em si mesmo e fizesse voltar para o si o seu espírito e o seu sopro, toda a humanidade morreria ao mesmo tempo, e o homem voltaria para o pó” (Jó 34.14-15). Jesus afirmou: “Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também” (Jo 5.17). O autor aos Hebreus afirma que o Filho de Deus sustenta todas as coisas pela sua palavra poderosa (Hb 1.3). Por vezes se diz que descansar é “mudar de atividade”, porque, a rigor, é praticamente impossível ficar sem fazer nada. Aplicando isto ao que se diz a respeito de Deus, o descanso de Deus é a mudança da atividade criativa para a atividade preservadora, que não deixa de ser, também ela, uma atividade criativa.
Quando se considera o ministério terreno de Jesus, fica-se com a impressão de que foi marcado por uma intensa atividade. Jesus chegou a descansar? Ele próprio afirmou que o Filho do Homem não tinha onde reclinar a cabeça (Mt 8.20). Em Mateus 11.2, o evangelista fala sobre “as obras de Cristo”. No Evangelho de João, repetidas vezes Jesus fala sobre realizar as obras do Pai (Jo 5.36; 9.4). Marcos, que é o evangelista mais rico em detalhes, nos mostra um Jesus que parece sempre com pressa, na medida em que insiste no uso do advérbio “logo” ou “imediatamente”. Marcos relata que Jesus convidou os discípulos para um retiro num lugar deserto. “Isto porque eles não tinham tempo nem para comer, visto serem muitos os que iam e vinham” (Mc 6.31). No entanto, o retiro foi frustrado pela grande multidão que os recepcionou do outro lado do lago. Em vez de reclamar, Jesus compadeceu-se deles (Mc 6.34). E seguiu-se a multiplicação dos pães e peixes.
Alguém poderia dizer que Jesus finalmente descansou, quando inclinou a cabeça e entregou o espírito (Jo 19.30). No entanto, o Filho de Deus não entrou em seu descanso eterno. Exaltado à direita de Deus, ele foi preparar um lugar para os seus (Jo 14.2-3). Pode-se dizer que Jesus trabalhou e ainda trabalha para nos dar descanso (Ap 14.13). Sendo Cristo aquele que trabalhou em nosso lugar, podemos dizer que não é no trabalho que o ser humano se salva, mas no descanso. É o descanso para o qual Jesus nos convida (Mt 11.28-29).
Trabalho não é castigo
O trabalho não é castigo pela rebelião contra Deus (Gn 3), pois o trabalho é anterior à queda. Mas essa rebelião trouxe maldição sobre a terra e fez com que o ser humano agora tenha de obter o seu sustento “em fadigas” (Gn 3.17). A rebelião contra Deus traz o cansaço à vida humana. Em Jesus, Deus chama os cansados e sobrecarregados – todos nós, sem exceção – para lhes dar alívio. Neste sentido, o alívio do descanso não decorre da cessação do trabalho, mas da presença de Jesus e do encaminhar-se a Jesus. Descansar agora, no dia do descanso (e nas férias), é a antecipação desse descanso – sempre na companhia daquele que conduz os seus “para junto das águas de descanso” (Sl 23.2; Ap 7.17).
Estamos acostumados a pensar no descanso como uma atividade individual, mas a Bíblia também fala sobre o repouso do povo de Deus como um todo (Hb 4.9). Para entender isto, é preciso voltar ao Antigo Testamento, onde a terra prometida aparece como lugar de descanso. Depois de séculos de escravidão no Egito e dezenas de anos de peregrinação pelo deserto, receber a terra prometida era, de fato, entrar no descanso. Em Josué 1.13 diz: “O SENHOR, seu Deus, está dando descanso a vocês e lhes dará esta terra”. Neste ponto, o conceito de descanso se aproxima da noção de paz, no sentido de shalom, que denota vida plena. Descanso como paz não é apenas ausência de movimento ou atividade, mas estar bem instalado em determinado lugar, com segurança. A situação no tempo de Salomão é um exemplo disso: “Judá e Israel habitavam seguros, cada um debaixo de sua videira e debaixo de sua figueira, desde Dã até Berseba...” (1Rs 4.25).
Porém, nem todos os israelitas entraram na terra prometida. Segundo o Salmo 95, Deus jurou em sua ira: “Eles não entrarão no meu descanso” (Sl 95.11). O autor da carta aos Hebreus cita este texto, tirando algumas conclusões (Hb 3.7—4.11). Não entraram no descanso aqueles que foram desobedientes (Hb 3.18). Neste sentido, Josué não lhes deu descanso. Em outras palavras, a promessa do descanso não se cumpriu no Antigo Testamento. Ela está reservada para o “hoje” de que Davi fala no Salmo 95. Assim, “resta um repouso sabático para o povo de Deus”, diz o autor aos Hebreus (4.9). E ele conclui: “Portanto, esforcemo-nos por entrar naquele descanso, a fim de que ninguém caia, segundo aquele exemplo de desobediência” (Hb 4.10). Segundo o autor aos Hebreus, cabe ao povo de Deus da nova aliança reivindicar a antiga promessa do descanso de Deus, disponível em Jesus Cristo, e já lançar mão dessa promessa, na esperança, mediante a fé em Cristo como Senhor.
Descansar é mais do que parar de trabalhar
Não é possível não descansar. E, num tempo de vida agitada, é bom saber que o descanso, mais do que um intervalo entre períodos de trabalho, é o ponto alto da vida. O propósito maior da humanidade não é trabalhar sem cessar, mas desfrutar da companhia de Deus. Descansar é ter um tempo especial, cada semana, para renovação física, mental, emocional, mas principalmente espiritual. Descanso é mais do que parar de trabalhar; é participar do descanso de Deus, é ter tempo para contemplar as obras de Deus, incluindo a obra da salvação. Descansar de verdade é receber o descanso que Jesus oferece (Mt 11.28-29).
Para muitos, a semana ainda é de seis dias. Outros já desfrutam de dois dias de descanso. Há mais tempo para lazer, mas, acima de tudo, há tempo para comunhão com Deus. O lazer alcança seu potencial máximo quando se vive em comunhão com Deus. Melhor ainda é poder fazer isso na companhia do povo de Deus, em culto de adoração. Porque, mais do que ordenar simplesmente que a pessoa descanse, a Bíblia fala sobre santificar o dia do descanso (Êx 20.8). E essa santificação se dá “pela Palavra de Deus e pela oração” (1Tm 4.5).
• Vilson Scholz é pastor, professor de Teologia Exegética e doutor na área de Novo Testamento. Consultor de Tradução da Sociedade Bíblica do Brasil, Scholz é tradutor do Novo Testamento Interlinear Grego-Português (SBB) e autor de Princípios de Interpretação Bíblica (Editora da Ulbra).
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Ricardo Barbosa