Opinião
- 29 de janeiro de 2019
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Os engenheiros foram presos. E daí?
Por Paulo F. Ribeiro
Escolheram um bode expiatório: o engenheiro.
Os engenheiros às vezes não se consideram responsáveis pelos resultados de suas ações porque contribuem apenas para uma pequena parte de um processo mais amplo. Esse sentimento de impotência é consequência, em parte, da fragmentação e especialização tecnológica.
Neste crescente mundo das especializações, deve-se agir com cautela na imposição da responsabilidade a um engenheiro ou gerente de um projeto. As pessoas são responsáveis pelo que podem fazer em sua própria situação, dentro de seu próprio espaço de competência, não pelo que poderiam ter feito se tivessem todo o poder nas mãos.
Também é importante perceber que as ações de engenheiros e cidadãos sempre ocorrem em uma complexa rede de relações e contextos. O recente desastre em Brumadinho é consequência de uma malha de responsabilidades que quebrou em muitos pontos.
Além disso, deve-se reconhecer que a responsabilidade de um engenheiro em relação à sua profissão é diferente da responsabilidade de um gerente administrativo ou de um político.
O fato de os engenheiros terem uma responsabilidade técnica específica em relação a um projeto ou sistema pode implicar não apenas que eles tenham conhecimento, mas também que eles devam ter um senso de responsabilidade pela questão da integração da tecnologia ou do interesse público.
A maneira como os sistemas tecnológicos são projetados é uma questão pública. Deve-se buscar não só a solução mais eficaz em um sentido tecnológico, mas também que ela contribua para a qualidade de vida no sentido mais abrangente. Dessa forma, o desenvolvimento do sistema torna-se uma responsabilidade conjunta.
Enquanto os engenheiros se concentram no conteúdo técnico, os gerentes devem se concentrar principalmente na criação de uma condição na qual todos os profissionais possam fazer bem o seu trabalho e obter o melhor desempenho. Isso significa que os gerentes têm uma responsabilidade que não pode ser reduzida à responsabilidade dos outros atores e que também transcende apenas o lucro.
Além de engenheiros e gerentes, também existem outros atores. O governo, por exemplo, tem um papel significativo em cuidar que nenhum sistema seja prejudicial ao público nem ao meio ambiente. No entanto, a responsabilidade do governo, cidadãos e grupos de interesse é limitada.
É por isso que precisamos da ética na engenharia para nos ajudar a lidar com essa complexa malha de responsabilidades. Existem três tipos diferentes de ética: ética do dever, ética do propósito e ética da virtude. Cada um deles analisa a prática de uma perspectiva específica e pode, dessa maneira, contribuir para a reflexão sobre a responsabilidade do engenheiro e do gerente de tecnologia.
Finalmente, neste mundo tecnológico complexo, os elos fracos tornam-se os pontos críticos em que uma falha final se transforma em tragédia. Que nós (engenheiros e cidadãos) estejamos sempre alertas e ousemos nos atrever a falar quando vemos possíveis perigos.
A possibilidade de dor é inerente à própria existência do nosso mundo. São os homens – não Deus, nem a natureza, nem a fatalidade – que produzem tais desastres. A avareza, a estupidez e a irresponsabilidade de engenheiros, técnicos, administradores, legisladores, juízes e políticos é que geram tais catástrofes.
Em Príncipe Caspian (“As Crônicas de Nárnia”) lemos uma passagem profética sobre as consequências da irresponsabilidade humana e que lembra o desastre em Brumadinho:
“Agora”, disse o Texugo, “se ao menos pudéssemos acordar os espíritos dessas árvores, deveríamos ter feito um bom dia de trabalho”.
“Não podemos?”, disse Caspian.
“Não”, disse Trufflehunter. “Nós não temos poder sobre eles. Desde que os humanos vieram para a terra, derrubando florestas e contaminando riachos, todos afundaram em um sono profundo. Quem sabe se alguma vez eles vão se mexer novamente? E isso é uma grande perda para nossa vida.”
Que esse desastre possa abrir os olhos de todos para a responsabilidade humana – e que essas vidas não tenham perecido em vão... como meu lamento e lágrimas pelas vidas perdidas e as consequências ambientais.
Dois engenheiros foram presos, mas não significa que encontramos os culpados. A responsabilidade por essa catástrofe vai além desses dois escravos de um sistema profundamente corrupto.
Doutor em Engenharia Elétrica pela Universidade de Manchester, na Inglaterra, foi Professor em Universidades nos Estados Unidos, Nova Zelândia e Holanda, e Pesquisador em Centros de Pesquisa (EPRI, NASA). Atualmente é Professor Titular Livre na Universidade Federal de Itajubá, MG. É originário do Vale do Pajeú e torcedor do Santa Cruz.
>> http://lattes.cnpq.br/2049448948386214
>> https://scholar.google.com/citations?user=38c88BoAAAAJ&hl=en&oi=ao
Pesquisa publicada recentemente aponta os cientistas destacados entre o “top” 2% dos pesquisadores de maior influência no mundo, nas diversas áreas do conhecimento. Destes, 600 cientistas são de Instituições Brasileiras. O Professor Paulo F. Ribeiro foi incluído nesta lista relacionado a área de Engenharia Elétrica.
>> http://lattes.cnpq.br/2049448948386214
>> https://scholar.google.com/citations?user=38c88BoAAAAJ&hl=en&oi=ao
Pesquisa publicada recentemente aponta os cientistas destacados entre o “top” 2% dos pesquisadores de maior influência no mundo, nas diversas áreas do conhecimento. Destes, 600 cientistas são de Instituições Brasileiras. O Professor Paulo F. Ribeiro foi incluído nesta lista relacionado a área de Engenharia Elétrica.
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