Opinião
- 11 de novembro de 2021
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Duas vezes mais rápido. Sem tempo para esperar as respostas de Deus
Por Quézia Alcantara
Quando eu era menina, minhas três irmãs e eu nos divertíamos com um toca-discos. Depois de colocar a agulha sobre o disco vinil, nós mudávamos a rotação, acelerando nas velocidades disponíveis para cair na risada diante da voz distorcida, geralmente aguda e cômica, dos cantores. Era uma brincadeira que sempre terminava com mamãe ou papai “ralhando” com a gente.
Hoje, uma função semelhante invadiu um dos aplicativos de conversa, que tornou-se praticamente o principal para nossa comunicação – o WhatsApp. E não é mais brincadeira. A coisa agora é séria. O que para muitos pode passar despercebido, é fato de que estamos ficando cada vez mais impessoais, robotizados e alheios à beleza e singularidade do diálogo e à voz humana, que, com certeza, foram criados pelo Eterno, para que pudéssemos viver em comunidade.
Cada vez que uma tecnologia é criada ou aprimorada, ela o é para melhorar a vida no sistema do homem, do fazer, do ir e vir, de sua sobrevivência e da sua comunicação. As atualizações de equipamentos tecnológicos são a prova disso.
Porém, há uma espécie de “necessidade” imposta pela vida pós-moderna, imersa na globalização, interconectada, numa velocidade cada vez mais acelerada e acelerante que nos faz acreditar que se não a acompanharmos, perderemos terreno, seja no meio competitivo do trabalho, como nos simples afazeres cotidianos e na forma como nos comunicarmos.
Eu, como pessoa da nominada “geração X” ou “bloomer”, vi a função “acelerar 2x” pela primeira vez ser usada por meu filho, escutando um áudio de sua namorada. E estranhei! Por que ela falaria tão rápido? Eu o inquiri se ela não estaria com algum problema, talvez até psiquiátrico, por estar tão acelerada. O rapaz caiu na risada e me explicou que era mais uma funcionalidade do aplicativo: acelerar o áudio para não perder tanto tempo escutando os áudios enviados.
Exato: ouvir o áudio com as devidas pausas, reticências, entonações, vocativos, faz com que a geração Y, W, Z (já me perdi nas letras!) perca tempo... e tempo não é só dinheiro, é valor!
Mas o que essa geração e as futuras, que possivelmente criarão ferramentas e dispositivos que acelerem ainda mais os processos comunicativos, estão deixando escapar? Perdem a beleza das nuances da comunicação humana e da interatividade. A subliminaridade e a subjetividade já foram perdidas na frieza de um texto on-line, seja nos aplicativos de mensagem ou no quase ultrapassado e-mail, com abreviações e jargões da linguagem informatizada, mediada por bits e bytes.
Explico: com a comunicação por e-mail e mensagens por aplicativos perde-se a expressão facial do emissário e do remetente, hoje substituídas pelos emojis e figurinhas. Restavam ainda, para se ter uma ideia do estado de espírito entre os interlocutores, a entonação da voz, a dinâmica da fala – com pausas, suspiros, velocidade dos sons – cujas emoções são expressa pelos agudos, graves, rouquidão, para citar alguns exemplos. Alegria, euforia, tristeza, solidão, desânimo eram traduzidas pelos nossos áudios, que, agora tornam-se lineares, frios, distantes, com a aceleração possível para 1,5 ou duas vezes.
E eu fico aqui imaginando como essa linda geração, da qual meus filhos fazem parte, se expressam em suas orações. Acostumados com essa velocidade no falar e agora, no ouvir, como podem esperar as respostas de Deus, cujo tempo é totalmente diverso do humano, visto que é baseado na eternidade?
Deus não se limita a tempo e espaço e essas quimeras das mídias sociais não o afeta, a Bíblia já nos diz isso. Nós, ao contrário, somos afetados e até mesmo conduzidos pelas mensagens que esses novos meios de comunicação lançam no mercado.
Nessa sociedade pós-moderna, definida por Zygmunt Baumam como “sociedade líquida”, não estamos mais escravos do tique-taque do relógio, da tirania do tempo, com seu marcador implacável das horas. Somos, antes, dominados pelas diversas mídias sociais, pelas quais nos conectamos, encontramos pessoas, realizamos compras, tomamos decisões profissionais e até mesmo estudamos, sem nos preocupar com horários de funcionamento do comércio ou das escolas, se é dia ou noite. Nós fazemos o nosso tempo, nós temos, a priori, o controle de quando e onde realizaremos as nossas tarefas e obrigações e como iremos nos divertir.
Essa autonomia precisa ser lembrada a nós cotidianamente. Afinal, a inteligência, a capacidade de decidir e o realizar vieram do Criador. São habilidades inerentes ao ser humano, esse criado à imagem e semelhança de Deus.
O que precisamos nos lembrar é de sermos mordomos dos nossos dias, sejam marcados pelo relógio e calendário, sejam flexíveis e fluidos, atemporais e sem fronteiras.
Temos nas mãos as ferramentas tecnológicas que nos inserem na “aldeia global” e possibilitam nossa comunicação cada vez mais expansível.
No entanto, acima de tudo, temos uma mente e um coração extremamente complexos, e por isso mesmo, extraordinariamente fascinantes, com os quais podemos ter relacionamentos saudáveis, qualidade de vida e a plenitude de comunhão entre nosso Pai Celestial e nossos irmãos.
Perguntou-lhe o Senhor a Moisés, certa ocasião: “Que é isso que tens na mão?” Moisés tinha um cajado e Deus o usou para realizar sinais e milagres a fim de corroborar a missão dada ao líder diante do povo de Israel. Se a nós fosse dirigida tal questão, o que responderíamos? E como esse objeto pode ser benção ou maldição em nossa vida. Pensemos!
• Quézia de Alcântara é cristã, escritora, jornalista, mestre em comunicação, mãe e esposa.
Leia mais:
» As redes sociais e os irmãos de carne e osso
Quando eu era menina, minhas três irmãs e eu nos divertíamos com um toca-discos. Depois de colocar a agulha sobre o disco vinil, nós mudávamos a rotação, acelerando nas velocidades disponíveis para cair na risada diante da voz distorcida, geralmente aguda e cômica, dos cantores. Era uma brincadeira que sempre terminava com mamãe ou papai “ralhando” com a gente.
Hoje, uma função semelhante invadiu um dos aplicativos de conversa, que tornou-se praticamente o principal para nossa comunicação – o WhatsApp. E não é mais brincadeira. A coisa agora é séria. O que para muitos pode passar despercebido, é fato de que estamos ficando cada vez mais impessoais, robotizados e alheios à beleza e singularidade do diálogo e à voz humana, que, com certeza, foram criados pelo Eterno, para que pudéssemos viver em comunidade.
Cada vez que uma tecnologia é criada ou aprimorada, ela o é para melhorar a vida no sistema do homem, do fazer, do ir e vir, de sua sobrevivência e da sua comunicação. As atualizações de equipamentos tecnológicos são a prova disso.
Porém, há uma espécie de “necessidade” imposta pela vida pós-moderna, imersa na globalização, interconectada, numa velocidade cada vez mais acelerada e acelerante que nos faz acreditar que se não a acompanharmos, perderemos terreno, seja no meio competitivo do trabalho, como nos simples afazeres cotidianos e na forma como nos comunicarmos.
Eu, como pessoa da nominada “geração X” ou “bloomer”, vi a função “acelerar 2x” pela primeira vez ser usada por meu filho, escutando um áudio de sua namorada. E estranhei! Por que ela falaria tão rápido? Eu o inquiri se ela não estaria com algum problema, talvez até psiquiátrico, por estar tão acelerada. O rapaz caiu na risada e me explicou que era mais uma funcionalidade do aplicativo: acelerar o áudio para não perder tanto tempo escutando os áudios enviados.
Exato: ouvir o áudio com as devidas pausas, reticências, entonações, vocativos, faz com que a geração Y, W, Z (já me perdi nas letras!) perca tempo... e tempo não é só dinheiro, é valor!
Mas o que essa geração e as futuras, que possivelmente criarão ferramentas e dispositivos que acelerem ainda mais os processos comunicativos, estão deixando escapar? Perdem a beleza das nuances da comunicação humana e da interatividade. A subliminaridade e a subjetividade já foram perdidas na frieza de um texto on-line, seja nos aplicativos de mensagem ou no quase ultrapassado e-mail, com abreviações e jargões da linguagem informatizada, mediada por bits e bytes.
Explico: com a comunicação por e-mail e mensagens por aplicativos perde-se a expressão facial do emissário e do remetente, hoje substituídas pelos emojis e figurinhas. Restavam ainda, para se ter uma ideia do estado de espírito entre os interlocutores, a entonação da voz, a dinâmica da fala – com pausas, suspiros, velocidade dos sons – cujas emoções são expressa pelos agudos, graves, rouquidão, para citar alguns exemplos. Alegria, euforia, tristeza, solidão, desânimo eram traduzidas pelos nossos áudios, que, agora tornam-se lineares, frios, distantes, com a aceleração possível para 1,5 ou duas vezes.
E eu fico aqui imaginando como essa linda geração, da qual meus filhos fazem parte, se expressam em suas orações. Acostumados com essa velocidade no falar e agora, no ouvir, como podem esperar as respostas de Deus, cujo tempo é totalmente diverso do humano, visto que é baseado na eternidade?
Deus não se limita a tempo e espaço e essas quimeras das mídias sociais não o afeta, a Bíblia já nos diz isso. Nós, ao contrário, somos afetados e até mesmo conduzidos pelas mensagens que esses novos meios de comunicação lançam no mercado.
Nessa sociedade pós-moderna, definida por Zygmunt Baumam como “sociedade líquida”, não estamos mais escravos do tique-taque do relógio, da tirania do tempo, com seu marcador implacável das horas. Somos, antes, dominados pelas diversas mídias sociais, pelas quais nos conectamos, encontramos pessoas, realizamos compras, tomamos decisões profissionais e até mesmo estudamos, sem nos preocupar com horários de funcionamento do comércio ou das escolas, se é dia ou noite. Nós fazemos o nosso tempo, nós temos, a priori, o controle de quando e onde realizaremos as nossas tarefas e obrigações e como iremos nos divertir.
>> Realidade produzida: uma análise sobre O Dilema das Redes, da Netflix <<
O que precisamos nos lembrar é de sermos mordomos dos nossos dias, sejam marcados pelo relógio e calendário, sejam flexíveis e fluidos, atemporais e sem fronteiras.
Temos nas mãos as ferramentas tecnológicas que nos inserem na “aldeia global” e possibilitam nossa comunicação cada vez mais expansível.
No entanto, acima de tudo, temos uma mente e um coração extremamente complexos, e por isso mesmo, extraordinariamente fascinantes, com os quais podemos ter relacionamentos saudáveis, qualidade de vida e a plenitude de comunhão entre nosso Pai Celestial e nossos irmãos.
Perguntou-lhe o Senhor a Moisés, certa ocasião: “Que é isso que tens na mão?” Moisés tinha um cajado e Deus o usou para realizar sinais e milagres a fim de corroborar a missão dada ao líder diante do povo de Israel. Se a nós fosse dirigida tal questão, o que responderíamos? E como esse objeto pode ser benção ou maldição em nossa vida. Pensemos!
• Quézia de Alcântara é cristã, escritora, jornalista, mestre em comunicação, mãe e esposa.
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