Opinião
- 27 de agosto de 2024
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Como sintonizar nossa devoção
Para a fé, a devoção e a ética a ruptura entre essência e estética – entre ser e parecer – pode ser desastrosa
Por William Lane
Em uma sociedade marcada pela estética, aspectos físicos e materiais se sobressaem na valorização das pessoas, dos bens de consumo e de espaços de trabalho, lazer e habitação. Não é difícil assimilar e absorver esses valores estéticos culturais nas relações com as pessoas, com Deus e com a fé. Isso pode ser um problema quando aceitamos com naturalidade que o mais importante é a aparência, não a essência: parecer correto passa a ser mais importante do que ser correto.
Para a fé, a devoção e a ética a ruptura entre essência e estética – entre ser e parecer – pode ser desastrosa. As consequências óbvias é que julgamos os outros pela aparência, valorizamos ações maravilhosas e impactantes, e respeitamos as pessoas mais atraentes. Porém, além disso, passamos a construir nossa devoção e ética a partir da aparência. Somos encorajados pelas tecnologias visuais modernas e pelas redes sociais a divulgar nossas boas ações e exemplos de consagração.
Esse não é só um problema moderno, é um problema humano. Os profetas no Antigo Testamento e Jesus nos Evangelhos combatiam uma religiosidade de aparência, e que omitia os aspectos mais essenciais da fé, do amor ao próximo e da justiça.
Vejo nas palavras da sabedoria em Provérbios o caminho para evitar o distanciamento entre a essência e a estética. A sabedoria no Antigo Testamento reconhece pelo menos duas realidades humanas: a interior e a exterior. O mundo interior é onde se guarda os mandamentos, as instruções e conhecimento da sabedoria. O mundo exterior é onde se colhe os resultados do que é semeado no interior.
Provérbios 3, por exemplo, contém uma exortação ou convite para o filho/discípulo não se esquecer dos ensinos do mestre e também para prendê-los “ao redor do seu pescoço” e escrevê-los “na tábua do seu coração” (v. 3). Percebo dois movimentos. Um para dentro, a internalização das palavras de instrução. O outro para fora, a demonstração exterior do que está dentro do coração. Uma não pode caminhar sem a outra. Uma devoção só interior pode levar a uma fé intimista, não engajada e, possivelmente solitária. É típica de quem não quer demonstrar a sua fé e se recusa a conviver em comunidade. É do tipo, ‘tenho minha fé em Deus, faço minhas leituras e orações, e não preciso da igreja’. Por outro lado, uma devoção apenas exterior pode levar a um exibicionismo, superficialidade, podendo chegar à hipocrisia. É típica de pessoas que gostam de aparecer e receber os aplausos das pessoas. Jesus já tinha advertido os discípulos a não praticarem a sua compaixão “diante dos outros para serem vistos por eles” (Mt 6.1).
Penso que são questões desse tipo que Tiago trata quando diz, “Quem é sábio e tem entendimento entre vocês? Que o demonstre por seu bom procedimento, mediante obras praticadas com a humildade que provém da sabedoria” (Tg 3.13). A sabedoria interior se manifesta exteriormente. Ao mesmo tempo, não se deve tratar os outros por sua posição social, como Tiago também nos exorta (Tg 2.1-4).
Mas vejo ainda um terceiro movimento em Provérbios 3. Do “eu” para o “Senhor”. Os versículos 5-8 nos ensinam que não devemos ser sábios aos nossos próprios olhos ou confiar em nós mesmos, pelo contrário, temos de confiar no Senhor, reconhecê-los em todos os nossos caminhos.
O caminho da sabedoria é um equilíbrio entre nosso interior e o exterior. É uma harmonia, não ruptura entre o interior e o exterior. Acredito que esse equilíbrio se alcança quando somos capazes de reconhecer o Senhor em todos os nossos caminhos e reconhecer nossa dependência na sabedoria que procede dele (Pv 3.5-7).
Saiba mais:
» Lendo o Sermão do Monte Com John Stott, John Stott
» Pessoas: Humanas e Divinas – Ensaios sobre a natureza e o valor das pessoas, Peter van Inwagen
Por William Lane
Em uma sociedade marcada pela estética, aspectos físicos e materiais se sobressaem na valorização das pessoas, dos bens de consumo e de espaços de trabalho, lazer e habitação. Não é difícil assimilar e absorver esses valores estéticos culturais nas relações com as pessoas, com Deus e com a fé. Isso pode ser um problema quando aceitamos com naturalidade que o mais importante é a aparência, não a essência: parecer correto passa a ser mais importante do que ser correto.
Para a fé, a devoção e a ética a ruptura entre essência e estética – entre ser e parecer – pode ser desastrosa. As consequências óbvias é que julgamos os outros pela aparência, valorizamos ações maravilhosas e impactantes, e respeitamos as pessoas mais atraentes. Porém, além disso, passamos a construir nossa devoção e ética a partir da aparência. Somos encorajados pelas tecnologias visuais modernas e pelas redes sociais a divulgar nossas boas ações e exemplos de consagração.
Esse não é só um problema moderno, é um problema humano. Os profetas no Antigo Testamento e Jesus nos Evangelhos combatiam uma religiosidade de aparência, e que omitia os aspectos mais essenciais da fé, do amor ao próximo e da justiça.
Vejo nas palavras da sabedoria em Provérbios o caminho para evitar o distanciamento entre a essência e a estética. A sabedoria no Antigo Testamento reconhece pelo menos duas realidades humanas: a interior e a exterior. O mundo interior é onde se guarda os mandamentos, as instruções e conhecimento da sabedoria. O mundo exterior é onde se colhe os resultados do que é semeado no interior.
Provérbios 3, por exemplo, contém uma exortação ou convite para o filho/discípulo não se esquecer dos ensinos do mestre e também para prendê-los “ao redor do seu pescoço” e escrevê-los “na tábua do seu coração” (v. 3). Percebo dois movimentos. Um para dentro, a internalização das palavras de instrução. O outro para fora, a demonstração exterior do que está dentro do coração. Uma não pode caminhar sem a outra. Uma devoção só interior pode levar a uma fé intimista, não engajada e, possivelmente solitária. É típica de quem não quer demonstrar a sua fé e se recusa a conviver em comunidade. É do tipo, ‘tenho minha fé em Deus, faço minhas leituras e orações, e não preciso da igreja’. Por outro lado, uma devoção apenas exterior pode levar a um exibicionismo, superficialidade, podendo chegar à hipocrisia. É típica de pessoas que gostam de aparecer e receber os aplausos das pessoas. Jesus já tinha advertido os discípulos a não praticarem a sua compaixão “diante dos outros para serem vistos por eles” (Mt 6.1).
Penso que são questões desse tipo que Tiago trata quando diz, “Quem é sábio e tem entendimento entre vocês? Que o demonstre por seu bom procedimento, mediante obras praticadas com a humildade que provém da sabedoria” (Tg 3.13). A sabedoria interior se manifesta exteriormente. Ao mesmo tempo, não se deve tratar os outros por sua posição social, como Tiago também nos exorta (Tg 2.1-4).
Mas vejo ainda um terceiro movimento em Provérbios 3. Do “eu” para o “Senhor”. Os versículos 5-8 nos ensinam que não devemos ser sábios aos nossos próprios olhos ou confiar em nós mesmos, pelo contrário, temos de confiar no Senhor, reconhecê-los em todos os nossos caminhos.
O caminho da sabedoria é um equilíbrio entre nosso interior e o exterior. É uma harmonia, não ruptura entre o interior e o exterior. Acredito que esse equilíbrio se alcança quando somos capazes de reconhecer o Senhor em todos os nossos caminhos e reconhecer nossa dependência na sabedoria que procede dele (Pv 3.5-7).
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» Pessoas: Humanas e Divinas – Ensaios sobre a natureza e o valor das pessoas, Peter van Inwagen
Pastor presbiteriano e doutor em Antigo Testamento, é professor e capelão no Seminário Presbiteriano do Sul, e tradutor de obras teológicas. É autor do livro O propósito bíblico da missão.
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