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Opinião

Ciências e fé cristã: Quais perguntas que têm rondado sua mente?

Por Deborah Vieira

Sabemos que para a igreja em geral, por vezes, a relação com a universidade e as ciências é turbulenta. Basta trazer à memória os embates que o que evangélicos travaram durante a pandemia da Covid-19 contra a vacinação e medidas protetivas. Neste cenário, quem fica no meio do fogo cruzado são, principalmente, os pesquisadores cristãos. Como eles podem criar pontes entre o que pesquisam e a igreja? E como ser um missionário das boas novas no seu trabalho acadêmico?
 
Em 2021, conduzi uma pesquisa com acadêmicos cristãos brasileiros para entender um pouco mais sobre os desafios que eles enfrentam na universidade e no que acreditam. Dos entrevistados, apenas 7,7% responderam que os cristãos brasileiros conectam bem a sua fé e a ciência, 25,3% disseram que não conectam a fé com a ciência, enquanto 60,4% acreditam que conectam mal a fé e a ciência – o que é ainda mais alarmante. Entretanto, apenas 7,7% responderam que enxergam que, de forma categórica, não há espaço para fé nas universidades brasileiras. O restante, em diferentes gradações, vislumbra possibilidades e oportunidades para conexão entre as ciências e a fé. Essa sim é uma ótima notícia! Isso significa que existe uma grande seara a ser explorada, na qual é possível agir como testemunhas de Jesus.
 
Estar no vão entre a igreja e a universidade também é uma estrada de duas vias. A maioria dos entrevistados na pesquisa citada acima considera que a vivência universitária contribuiu para sua prática de fé cristã. Muitos deles disseram que essa experiência gerou maior vontade de se aprofundar nos estudos bíblicos e teológicos, que estudar sobre a criação de Deus é uma forma de conhecer mais sobre o Criador, que estudar sobre temas acerca da vulnerabilidade social ajuda a amar mais o próximo, que conviver com opiniões distintas é um constante convite para exercer a humildade, o respeito e compaixão, além de que na universidade desenvolvem um pensamento crítico.
 
Vamos focar no último item citado: o desenvolvimento de um pensamento crítico. Na prática acadêmica, é impossível prosseguir em uma pesquisa se não temos uma pergunta motivadora. Aprendemos a olhar nosso contexto e questionar: por que isso acontece? Qual a consequência disso ou daquilo? Como alcançar tal objetivo? Porém, muitos de nós, pesquisadores, possuímos experiências negativas quando levamos essas mesmas perguntas para os contextos eclesiais. Explorar as dúvidas é por vezes entendido como falta de fé, como se nosso relacionamento com Deus não estivesse bom, ou ainda, pode esbarrar em situações de abuso espiritual ao questionar uma liderança e receber como resposta que questionar esse líder é questionar o próprio Deus. Em outras situações, aqueles que perguntam recebem respostas demasiadamente simplistas para questões complexas: “Porque sim”.
 
Porém, quando olhamos para a Bíblia, não encontramos um Deus que proíbe as perguntas, ao contrário, encontramos muitos exemplos que nos convidam a contemplar e explorar a criação e a realidade por meio de perguntas e da curiosidade e ir mais fundo em conhecimento, entendimento e sabedoria que são dados pelo Senhor (Pv 2.6).
 
 
No Antigo Testamento, no livro de Jó, vemos um homem que sofre ao indagar a Deus diversas vezes sobre seu plano, propósito sabedoria e desígnio (9.15-17; 12.4; 13:22; 23.5; 30.20; 31.35; 38.2), e quando Deus reaparece no final do livro, ele não diz simplesmente: “Como ousas fazer perguntas para mim?!” O que ele faz é devolver a Jó inúmeras questões como quem diz “Não vou te entregar tudo de mão beijada. Vamos trabalhar por meio de perguntas! Quero que você explore o conhecimento”. É por meio de perguntas que Deus conduz Jó a uma nova perspectiva sobre seu governo providencial.
 
De semelhante modo, no Novo Testamento vemos Jesus inúmeras vezes envolvido em diálogo com perguntas: Se vocês amarem aqueles que os amam, que recompensa receberão? Não é a vida mais importante do que a comida, e o corpo mais importante do que a roupa? Qual de vocês, se seu filho pedir pão, lhe dará uma pedra? Que é mais fácil dizer: ‘Os seus pecados estão perdoados’, ou: ‘Levante-se e ande’? Qual de vocês, se tiver uma ovelha e ela cair num buraco no sábado, não irá pegá-la e tirá-la de lá? Jesus também acolhe aqueles que chegam a ele com dúvidas, como quando conversa com Nicodemos. Por outro lado, ele é bem duro com aqueles que afirmam possuir todas as respostas, os chamados homens da lei: “Guias cegos! Vocês coam um mosquito e engolem um camelo” (Mt 23.24).
 
Certa vez, durante um encontro com minha mentora, compartilhei algumas dúvidas que tinha e buscas por respostas. Ela sugeriu que eu não perguntasse às pessoas simplesmente o que elas pensavam acerca do tema, mas que perguntasse como elas chegaram àquela conclusão. Precisamos aprender a questionar e fazer perguntas que nos ajudem a ir cada vez mais fundo, e não apenas riscar a superfície – como Jesus fazia, e como também aprendemos a fazer nas universidades.
 
Fazer perguntas também pode ser uma prática espiritual muito importante para desenvolver o nosso relacionamento com Deus, para não apenas comprarmos a fé que nos foi entregue a nós por alguém. E foi pensando nisso que decidimos colocar como tema da mesa central do Colaboratório: encontro de pesquisadores cristãos, dúvida, porque acreditamos que nessa intersecção entre fé e ciências, o ato de questionar pode ser mais do que uma disciplina espiritual individual com Deus, mas uma forma coletiva de conhecer ao Criador e de inspirar perguntas com os outros para compartilhar as boas novas, a exemplo de Jesus.
 
Agora é com você! Quais são as perguntas que têm rondado sua mente? 
 
  • Deborah Vieira é poeta, com graduação em Letras (UFPel) e mestrado em Literatura e Estudos Culturais (UFJF). Faz parte da Aliança Bíblica Universitária e é uma das catalisadoras da Iniciativa Logos e Cosmos da Comunidade Internacional de Estudantes Evangélicos (IFES na sigla em inglês) para a América Latina.

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