Opinião
- 05 de julho de 2023
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As respostas da igreja evangélica brasileira diante das violências sexuais contra crianças e adolescentes
Por Alexandre Gonçalves
As respostas da igreja evangélica brasileira frente à dura realidade das violências sexuais contra crianças e adolescentes são variadas e divergentes. No que se refere ao rompimento do ciclo da violência, do cuidado às vítimas e responsabilização dos(as) autores(as), há respostas ágeis, concretas e de efetividade incontestável. Essas, infelizmente, não são a regra. Há ainda aquelas que, embora bem elaboradas, são tão burocráticas que custam a produzir os efeitos esperados. Mas há também respostas que, quando não negam a violência ocorrida, silenciam sobre ela.
Casos recentes envolvendo a prisão de três pastores evangélicos acusados de abuso sexual infantil ilustram bem como a negação e o silêncio de grande parte das igrejas ainda persistem.
O primeiro se refere a Rosinaldo Cavalcante Moura, 51 anos, preso em Belém, PA, sob a acusação de estupro de vulnerável, assédio e importunação sexual. Uma das vítimas alega que ele a teria violentado sexualmente quando ela tinha apenas 12 anos de idade, época em que congregavam na mesma igreja.
O segundo, envolve Moisés Barbosa Ferreira, 34 anos, em Belo Horizonte, MG. Ele foi acusado de estupro por um homem, que à época era adolescente. Moisés teria aliciado ainda um outro adolescente, de 13 anos de idade, a dormir em seu apartamento. Moisés teve contato inicial com ambos na igreja onde congregavam e onde Moisés era pastor.
No terceiro caso, Joilson da Silva de Freitas Santos, 39 anos, foi preso em Guarulhos, SP, acusado de estuprar adolescentes frequentadores da igreja na qual atuava como líder de célula.
Tanto Rosinaldo quanto Joilson, embora não estivessem atuando formalmente como pastores em suas respectivas igrejas, se autodenominavam e eram reconhecidos enquanto tal por muitos, dentro e fora de suas comunidades.
Nos casos de Rosinaldo e Moisés, há o agravante de que atuavam em ações de proteção infantojuvenil. O primeiro foi secretário de Assistência Social do município de Manacapuru, AM, e o segundo coordenador do Fórum de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes de Minas Gerais (FEVCA/MG). Semanas antes de ter a prisão decretada, o pastor Rosinaldo ajudou a organizar a formação “Igreja Segura para Crianças”, curso que tem como um de seus principais objetivos promover a criação de políticas de proteção infantil nas igrejas. Já Moisés, atuava também como professor na rede municipal de ensino de Belo Horizonte, MG, e era instrutor em um projeto circense.
Em comum a todos os casos está o fato de que, por sua posição e influência, esses líderes inspiravam confiança suficiente para ter livre acesso a crianças e adolescentes em suas igrejas, escolas ou projetos sociais, sem serem questionados. E foi exatamente sua credibilidade que lhes possibilitou manter por muito tempo o pacto de silêncio com as vítimas e seus familiares, seja pelo oferecimento de benefícios ou através de ameaças.
E a resposta das igrejas?
Rosinaldo foi exonerado da Secretaria de Assistência Social de Manacapuru após as denúncias virem à tona, mas não há notícia do posicionamento público da igreja da qual ele faz parte. Situação parecida aconteceu com Moisés, destituído da coordenação do FEVCA/MG, mas da igreja na qual é pastor não se conhece qualquer posicionamento.
A exceção ocorreu no caso de Joilson. Sua igreja veio à público, mas a priori para defender-se, afirmando que o suspeito não era pastor da denominação, não havia sido ordenado por ela e que tampouco os abusos teriam acontecido nas dependências da igreja, mas na casa do acusado. Ou seja, o movimento inicial da denominação foi de rejeitar qualquer vinculação ou responsabilidade pelos crimes cometidos por uma de suas lideranças, mas omitiu que Joilson usou de seu status, prestígio e credibilidade para aliciar os adolescentes justamente na igreja.
Desligar autores(as) de violência sexual contra crianças e adolescentes, como ocorreu com Joilson, não é suficiente, embora importante. É preciso que as igrejas atuem preventivamente para que todo seu corpo pastoral e ministerial receba formação sobre a temática, acompanhamento, e que preste contas regularmente sobre sua atuação.
A despeito de várias iniciativas das igrejas para a garantia de direitos e proteção das crianças e adolescentes, ainda há muita resistência nesses espaços para tratar do tema e implementar políticas de proteção. Muitas se ofendem pela simples suposição de que a violência sexual possa acontecer em suas dependências, ou que seus líderes possam praticá-la.
Mas ao não enfrentar essa questão em suas raízes, a igreja só contribui para a reprodução e a manutenção da violência. Quanto menos ela falar sobre o tema, menos instrução oferecer às crianças, adolescentes e famílias, quanto menor for sua preocupação em treinar sua liderança e colocar em prática estratégias de prevenção, enfrentamento e responsabilização da violência, maiores são as chances de que os casos se multipliquem, muitos deles por anos.
Reafirmando agora de forma positiva: Quanto mais a igreja falar sobre o tema, mais instrução oferecer às crianças, adolescentes e famílias, quanto maior for sua preocupação em treinar sua liderança e colocar em prática estratégias de prevenção, enfrentamento e responsabilização da violência, mais protegidas estarão as crianças e adolescentes que ali vivem a sua fé.
- Alexandre Gonçalves, educador social há 20 anos, presidente e instrutor certificado da Associação Claves Brasil, Co-idealizador e mediador do coletivo Eles & Elos – Espaço de Acolhida, Diálogo e Revisão de Paradigmas sobre Masculinidades –, membro da Igreja da Irmandade, Mestre em Divindade pelo Bethany Theological Seminary.
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