Opinião
- 01 de agosto de 2013
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As “burcas” que impomos
Em minhas perambulações pelo ciberespaço, sugeriu-se que eu apreciasse um blog cristão sobre a patrística e a teologia medieval, que logo achei muito interessante, com textos realmente condizentes com o meu gosto e estudos anteriores.
Mas qual não foi minha surpresa quando no Facebook da entidade eu me deparei com a seguinte postagem: uma série de fotos de mulheres feias (realmente não eram propriamente bonitas, devo dizer, mas quem há de julgar padrões de beleza?) com uma frase insinuante e provocativa que dizia mais ou menos isso: “Todas elas seguiram carreira e nenhuma se casou ou teve filhos...”.
Com tantas mulheres inteligentes e competentes no mundo, inclusive que harmonizam suas carreiras com as suas famílias, algumas até com certa penetração nos meios teológicos, por que será que os colegas do mencionado site foram escolher as mais feias, não casadas e sem filhos?
Como se não bastasse, houve uma revoada de respostas de rapazes que curtiram a postagem como se fosse brincadeira - que seria, no mínimo, de mau gosto em todos os sentidos - e outros chamando a atenção das mulheres: “O que é isso que vocês (mulheres) estão fazendo?”
Não preciso replicar aqui a minha resposta em apoio ao protesto de uma única mulher corajosa que se destacou no meio dos comentários, mas gostaria de usar esse exemplo para destacar um fenômeno crescente nos meios “cristãos” (não temos espaço para discutir esse conceito aqui), que eu chamaria de “burcação” da condição da mulher. Claro, a palavra vem de “burca” que é aquele véu que as mulheres usam até hoje, principalmente nos países muçulmanos, com sinal, não diria de submissão (esse conceito merece outro artigo) apenas, mas de “subserviência”, ou seja, a impossibilidade de qualquer mulher exercer um cargo de liderança, seguir carreira ou exercer qualquer tipo de “poder”.
Nos meios cristãos de hoje há mais líderes homens do que mulheres, como em igrejas, seminários e faculdades teológicas, editoras cristãs, a mídia cristã em geral, etc., mas sem generalizar para todas essas entidades. Algumas mulheres com quem tenho compartilhado essas observações, para as quais não tenho dados estatísticos, mas bons exemplos, comentaram comigo: “Só falta agora nos imporem o uso da burca”.
Não preciso responder, mas tenho para mim que a provocação, que nos meios acadêmicos de hoje se chamaria de misógina, nada mais é do que um reflexo, um termômetro do que realmente os homens pensam acerca das mulheres no meio cristão de hoje, ou seja, aquilo que se pensava em épocas do Antigo Testamento (mesmo naqueles tempos têm-se registros de mulheres líderes).
Será que o site acha que o pensamento medieval e da patrística era assim misógino? Não estaria o site se esquecendo de que esses primeiros sete séculos da era cristã foram decisivos para o resgate do papel da mulher na comunidade cristã primitiva (valores esses que infelizmente estão se perdendo no mundo moderno)?
Será que eles (digo eles, no masculino, pois é inconcebível que haja uma só mulher nesse grupo) entenderam o que significa “medieval” (um período de mil anos da história, de grandes conquistas e avanços e uma época “das trevas” limitada aos séculos finais)? Até os mais renomados historiadores estão dando a mão à palmatória sobre as injustiças cometidas contra esse importante período da história, inclusive com suas líderes mulheres.
Não seria então o caso de eles estarem sendo os “medievais”, no pior e mais pejorativo dos sentidos, e ignorando as discussões mais avançadas e científicas sobre a Idade Média?
Longe de estar apenas expressando sentimentos de ofensa pessoal, quero aqui chamar a atenção do equívoco histórico e bíblico da misoginia e do que resolvi chamar de “burcação” da mulher.
Eu teria mais a dizer sobre esse assunto, comentando outras frases famosas sobre as mulheres, que não são poucas, do tipo:
“As mulheres são um sexo puramente decorativo. Elas nunca têm nada a dizer, mas dizem de forma encantadora”. (Oscar Wilde – O Retrato de Dorian Gray)
Mas penso que já disse o bastante e de forma não tão encantadora quanto talvez se esperasse ouvir de mim.
Leia mais
Pelo fim de uma “cultura da violência”
Caminhos da graça
Deixem que elas mesmas falem
Mas qual não foi minha surpresa quando no Facebook da entidade eu me deparei com a seguinte postagem: uma série de fotos de mulheres feias (realmente não eram propriamente bonitas, devo dizer, mas quem há de julgar padrões de beleza?) com uma frase insinuante e provocativa que dizia mais ou menos isso: “Todas elas seguiram carreira e nenhuma se casou ou teve filhos...”.
Com tantas mulheres inteligentes e competentes no mundo, inclusive que harmonizam suas carreiras com as suas famílias, algumas até com certa penetração nos meios teológicos, por que será que os colegas do mencionado site foram escolher as mais feias, não casadas e sem filhos?
Como se não bastasse, houve uma revoada de respostas de rapazes que curtiram a postagem como se fosse brincadeira - que seria, no mínimo, de mau gosto em todos os sentidos - e outros chamando a atenção das mulheres: “O que é isso que vocês (mulheres) estão fazendo?”
Não preciso replicar aqui a minha resposta em apoio ao protesto de uma única mulher corajosa que se destacou no meio dos comentários, mas gostaria de usar esse exemplo para destacar um fenômeno crescente nos meios “cristãos” (não temos espaço para discutir esse conceito aqui), que eu chamaria de “burcação” da condição da mulher. Claro, a palavra vem de “burca” que é aquele véu que as mulheres usam até hoje, principalmente nos países muçulmanos, com sinal, não diria de submissão (esse conceito merece outro artigo) apenas, mas de “subserviência”, ou seja, a impossibilidade de qualquer mulher exercer um cargo de liderança, seguir carreira ou exercer qualquer tipo de “poder”.
Nos meios cristãos de hoje há mais líderes homens do que mulheres, como em igrejas, seminários e faculdades teológicas, editoras cristãs, a mídia cristã em geral, etc., mas sem generalizar para todas essas entidades. Algumas mulheres com quem tenho compartilhado essas observações, para as quais não tenho dados estatísticos, mas bons exemplos, comentaram comigo: “Só falta agora nos imporem o uso da burca”.
Não preciso responder, mas tenho para mim que a provocação, que nos meios acadêmicos de hoje se chamaria de misógina, nada mais é do que um reflexo, um termômetro do que realmente os homens pensam acerca das mulheres no meio cristão de hoje, ou seja, aquilo que se pensava em épocas do Antigo Testamento (mesmo naqueles tempos têm-se registros de mulheres líderes).
Será que o site acha que o pensamento medieval e da patrística era assim misógino? Não estaria o site se esquecendo de que esses primeiros sete séculos da era cristã foram decisivos para o resgate do papel da mulher na comunidade cristã primitiva (valores esses que infelizmente estão se perdendo no mundo moderno)?
Será que eles (digo eles, no masculino, pois é inconcebível que haja uma só mulher nesse grupo) entenderam o que significa “medieval” (um período de mil anos da história, de grandes conquistas e avanços e uma época “das trevas” limitada aos séculos finais)? Até os mais renomados historiadores estão dando a mão à palmatória sobre as injustiças cometidas contra esse importante período da história, inclusive com suas líderes mulheres.
Não seria então o caso de eles estarem sendo os “medievais”, no pior e mais pejorativo dos sentidos, e ignorando as discussões mais avançadas e científicas sobre a Idade Média?
Longe de estar apenas expressando sentimentos de ofensa pessoal, quero aqui chamar a atenção do equívoco histórico e bíblico da misoginia e do que resolvi chamar de “burcação” da mulher.
Eu teria mais a dizer sobre esse assunto, comentando outras frases famosas sobre as mulheres, que não são poucas, do tipo:
“As mulheres são um sexo puramente decorativo. Elas nunca têm nada a dizer, mas dizem de forma encantadora”. (Oscar Wilde – O Retrato de Dorian Gray)
Mas penso que já disse o bastante e de forma não tão encantadora quanto talvez se esperasse ouvir de mim.
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Pelo fim de uma “cultura da violência”
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Deixem que elas mesmas falem
É mestre e doutora em educação (USP) e doutora em estudos da tradução (UFSC). É autora de O Senhor dos Anéis: da fantasia à ética e tradutora de Um Ano com C.S. Lewis e Deus em Questão. Costuma se identificar como missionária no mundo acadêmico. É criadora e editora do site www.cslewis.com.br
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