Opinião
- 14 de novembro de 2008
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A pedagogia do erro no processo de santificação
Anderson Clayton
A verdade científica não é outra coisa senão a soma de “erros retificados”, dizia Gaston Bachelard. Ao longo de séculos, tivemos muitas dificuldades de fazermos uma leitura positiva do erro. O ideal de perfeição transformou nosso senso moral em ética neurótica de impecabilidade. Nossa concepção desta dimensão da realidade humana -- a do fenômeno do erro -- colocou entraves à compreensão positiva que poderíamos ter dela sem tantos exageros preconceituosos mal fundamentados. Nossa busca pela impecabilidade é tamanha que, ao falarmos do erro como realidade presente em nosso cotidiano, o fazemos com um pavor interpretativo tal que não há como não concebê-lo de forma pedagogicamente improdutiva para o cotidiano de uma fé aprendiz.
No entanto, ao falarmos do “erro”, acabamos falando de uma outra coisa que tem muitos outros desdobramentos para a fé dos indivíduos condicionados pela refinada cultura do impecabilismo. O fenômeno do erro, lido à luz do perfeccionismo religioso-cultural, é o principal agente produtor do “capital da culpa”. Pensar na culpa nem sempre leva à sua absolvição; mas lembrar-se do erro, via de regra, acaba inflacionando a culpa, tornado o ser humano um prisioneiro no cárcere das reminiscências não curadas.
A culpa é o imposto cobrado pela consciência do erro não absolvida. Para muitos, a lembrança do erro, cometido ao longo da existência intramundana, dramatiza a condição alienada do ser humano como um ser moralmente adoecido no embrião de sua própria pneumopatia (doença espiritual): o pecado que gera a vergonha. Agostinho pensou a hybris (auto-elevação, pecado da soberba) como o pecado original, que deu ensejo à culpa por conta do mau uso da boa vontade. Portanto, a alienação é a imagem mais nítida que o espelho da culpa revela a consciência do ser humano, e insufla nela a auto-imagem distorcida.
O sentido da fé, no entanto, é orientado pelo sol da justiça. O conceito de justiça, no Ocidente cristão, foi muito impregnado pelos ideais éticos do perfeccionismo, proveniente da ética da impecabilidade moral, fortemente influenciada pela filosofia da moral helênico-platônica. É inevitável, portanto, não conceber o pecado como etiologia (origem) da moral da culpa.
Esta engenharia do “mal moral” (“hamartía”, no grego) tornou o ser humano mais vulnerável do ponto de vista psicológico. A crítica que a modernidade ocidental fez aos postulados da fé cristã se fundou no pressuposto da insuficiência ontológica (finitude humana). A moral da insuficiência humana torna-se um conceito hermeneuticamente significante para precisar o contorno ético da culpabilidade do ser humano, tornado pecador irrecuperável pela jurisprudência do impecabilismo ético da religião dos perfeitos.
A noção de pecado só é real para a consciência que assume a culpa que provém do medo da punição. Neste sentido, o erro se torna um problema para a reflexão do cotidiano da fé. Na consciência do mesmo, a teologia da culpa condena ao ostracismo todo senso de criatividade pedagógica que provém da psicologia do heteroperdão, e do autoperdão. O conceito mais significativo da oração do Pai-Nosso é o perdão (recebido e concedido). Pois nele não é necessário promover a morte de Deus para fazer renascer no cristão a coragem de viver, sem medo e sem culpa.
O erro cometido aponta invariavelmente para a teologia da graça. Pois é a partir dele que ela se torna “pedagogia para a santificação” do ser humano na fé. Eliminar o erro do itinerário moral da fé, que busca santificação, significa eliminar a possibilidade de superação da graça no processo de libertação psicológica do indivíduo. Não se santifica o que é absolutamente santo, imaculado; mas, sim, o que é imperfeito e insuficiente. Os sãos não precisam de médico.
A verdade científica não é outra coisa senão a soma de “erros retificados”, dizia Gaston Bachelard. Ao longo de séculos, tivemos muitas dificuldades de fazermos uma leitura positiva do erro. O ideal de perfeição transformou nosso senso moral em ética neurótica de impecabilidade. Nossa concepção desta dimensão da realidade humana -- a do fenômeno do erro -- colocou entraves à compreensão positiva que poderíamos ter dela sem tantos exageros preconceituosos mal fundamentados. Nossa busca pela impecabilidade é tamanha que, ao falarmos do erro como realidade presente em nosso cotidiano, o fazemos com um pavor interpretativo tal que não há como não concebê-lo de forma pedagogicamente improdutiva para o cotidiano de uma fé aprendiz.
No entanto, ao falarmos do “erro”, acabamos falando de uma outra coisa que tem muitos outros desdobramentos para a fé dos indivíduos condicionados pela refinada cultura do impecabilismo. O fenômeno do erro, lido à luz do perfeccionismo religioso-cultural, é o principal agente produtor do “capital da culpa”. Pensar na culpa nem sempre leva à sua absolvição; mas lembrar-se do erro, via de regra, acaba inflacionando a culpa, tornado o ser humano um prisioneiro no cárcere das reminiscências não curadas.
A culpa é o imposto cobrado pela consciência do erro não absolvida. Para muitos, a lembrança do erro, cometido ao longo da existência intramundana, dramatiza a condição alienada do ser humano como um ser moralmente adoecido no embrião de sua própria pneumopatia (doença espiritual): o pecado que gera a vergonha. Agostinho pensou a hybris (auto-elevação, pecado da soberba) como o pecado original, que deu ensejo à culpa por conta do mau uso da boa vontade. Portanto, a alienação é a imagem mais nítida que o espelho da culpa revela a consciência do ser humano, e insufla nela a auto-imagem distorcida.
O sentido da fé, no entanto, é orientado pelo sol da justiça. O conceito de justiça, no Ocidente cristão, foi muito impregnado pelos ideais éticos do perfeccionismo, proveniente da ética da impecabilidade moral, fortemente influenciada pela filosofia da moral helênico-platônica. É inevitável, portanto, não conceber o pecado como etiologia (origem) da moral da culpa.
Esta engenharia do “mal moral” (“hamartía”, no grego) tornou o ser humano mais vulnerável do ponto de vista psicológico. A crítica que a modernidade ocidental fez aos postulados da fé cristã se fundou no pressuposto da insuficiência ontológica (finitude humana). A moral da insuficiência humana torna-se um conceito hermeneuticamente significante para precisar o contorno ético da culpabilidade do ser humano, tornado pecador irrecuperável pela jurisprudência do impecabilismo ético da religião dos perfeitos.
A noção de pecado só é real para a consciência que assume a culpa que provém do medo da punição. Neste sentido, o erro se torna um problema para a reflexão do cotidiano da fé. Na consciência do mesmo, a teologia da culpa condena ao ostracismo todo senso de criatividade pedagógica que provém da psicologia do heteroperdão, e do autoperdão. O conceito mais significativo da oração do Pai-Nosso é o perdão (recebido e concedido). Pois nele não é necessário promover a morte de Deus para fazer renascer no cristão a coragem de viver, sem medo e sem culpa.
O erro cometido aponta invariavelmente para a teologia da graça. Pois é a partir dele que ela se torna “pedagogia para a santificação” do ser humano na fé. Eliminar o erro do itinerário moral da fé, que busca santificação, significa eliminar a possibilidade de superação da graça no processo de libertação psicológica do indivíduo. Não se santifica o que é absolutamente santo, imaculado; mas, sim, o que é imperfeito e insuficiente. Os sãos não precisam de médico.
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