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- 09 de maio de 2014
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A mãe das mães solteiras
A propósito do Dia das Mães a ser celebrado no próximo domingo, resgatamos a história de compaixão e serviço de Helene Londahl, publicada no então jornal Ultimato nº 62, em agosto de 1973. Confira.
***
Uma senhora norueguesa, chamada Helene Londahl, oficial do Exército de Salvação, radicada em São Paulo, certo sábado à noitinha vendia o jornal “Brado de Guerra” nas ruas da capital bandeirante. Atravessou o Largo Paissandu e entrou na rua Timbiras, naquela época lugar suspeito. De repente, a moça solteira, de 33 anos, se viu, pela primeira vez na vida dentro de uma zona de meretrício. O vocabulário, as fisionomias, os corpos seminus, os olhares transbordantes de lascívia, a deturpação e a comercialização do sexo, tudo isso enche a mente de Helene de um misto de pavor, revolta e asco. Prevaleceu também um sentimento de profunda piedade pela figura universal e tão antiga da chamada “mulher perdida”. Naquela noite e naquele lugar [que hoje é a Cracolândia], Deus começou a empurrar a norueguesa para um tipo de ministério diferente e muitíssimo difícil. Ela ou aquele momento foram “a aurora do horizonte social do Brasil”, como alguém escreveu.
Aproximava-se o Natal de 1936. Helene, que era salvacionista desde os 23 anos, resolveu fazer alguma coisa em favor das mulheres a rua Timbiras. Obteve a colaboração das senhoras da Igreja Presbiteriana Unida, cujo templo ficava ali perto, na rua Helvétia, e de Maria Josefina Anderson, uma jovem brasileira de 21 anos. O plano era oferecer àquelas mulheres a oportunidade de participarem de uma mesa de guloseimas e mostrar-lhes o amor de Deus, a necessidade e a possibilidade de deixarem aquele tipo de vida. O local de encontro seria no salão social da igreja da rua Helvétia. Para avisá-las disso, Helene e Maria Josefina se enfiaram na rua Timbiras e fizeram cerca de 300 convites, entre o espanto, o desprezo e o estado de embriaguez das mulheres ali residentes. NO dia de Natal, a mesa estava muito bem adornada e suprida. As senhoras presbiterianas se perguntavam: elas virão? Quantas? Por fim, chegaram quatro, apenas quatro. Sentaram-se à mesa, foram servidas com amor. Enquanto participavam, desenvolveu-se um pequeno e bem organizado programa espiritual, com cânticos, leitura da Bíblia. Uma delas, de tão sensibilizada, levantou-se bruscamente e pôs-se a chorar. Helene foi ao seu auxílio e ofereceu-lhe hospedagem em seu próprio quarto, até que ela se ajeitasse. A prostituta aceitou. Ficou combinado que em breves dias a norueguesa iria busca-la. A palavra, no entanto, foi cumprida tão somente pela salvacionista. A mulher da rua Timbiras não conseguiu libertar-se da rede em que fora colhida.
Em termos de frutos e frutos imediatos, o balanço da tão bela iniciativa foi melancólico. Porém, é bom saber que o Lar das Moças, do Exército de Salvação, no Bosque da Saúde, onde se ampara e se procura erguer as mães solteiras, antes que as circunstâncias e a sociedade as tornem mulheres da vida, é resultado da visão e do trabalho de Helene Londahl! Inaugurado no dia 12 de fevereiro de 1938 – um ano e alguns dias depois daquela refeição natalina da rua Helvétia – o Lar das Moças acolheu mais de 1.300 mães solteiras nos primeiros 20 anos de sua história.
Depois de trabalhar 18 anos no Brasil, a coronel Londahl tornou-se chefe do serviço social feminino sucessivamente na África do Sul e Suécia até sua aposentadoria. Regressou então ao Brasil, doutorou-se em sociologia na Universidade de São Paulo (1967), recebeu a Medalha de Honra do Esso Brasileiro de Petróleo e a Medalha de Santo Olavo, do rei Olavo V, da Noruega. Morreu de uma trombose, no Dia das Mães, em 1973, ela que, embora sendo solteira, era a mãe das mães solteiras!
Notas:
1. Artigo publicado por ocasião da morte de Hele Londahl no então jornal Ultimato, nº 62, em agosto de 1973, p. 3).
2. O Lar das Moças hoje se chama Projeto FloreSER e continua acolhendo meninas grávidas em São Paulo (SP). Sabia mais.
Leia também
Uma mulher na rua Timbiras (revista Mãos Dadas)
A mãe do Verbo que se fez carne
Deixem que elas mesmas falem
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Uma senhora norueguesa, chamada Helene Londahl, oficial do Exército de Salvação, radicada em São Paulo, certo sábado à noitinha vendia o jornal “Brado de Guerra” nas ruas da capital bandeirante. Atravessou o Largo Paissandu e entrou na rua Timbiras, naquela época lugar suspeito. De repente, a moça solteira, de 33 anos, se viu, pela primeira vez na vida dentro de uma zona de meretrício. O vocabulário, as fisionomias, os corpos seminus, os olhares transbordantes de lascívia, a deturpação e a comercialização do sexo, tudo isso enche a mente de Helene de um misto de pavor, revolta e asco. Prevaleceu também um sentimento de profunda piedade pela figura universal e tão antiga da chamada “mulher perdida”. Naquela noite e naquele lugar [que hoje é a Cracolândia], Deus começou a empurrar a norueguesa para um tipo de ministério diferente e muitíssimo difícil. Ela ou aquele momento foram “a aurora do horizonte social do Brasil”, como alguém escreveu.
Aproximava-se o Natal de 1936. Helene, que era salvacionista desde os 23 anos, resolveu fazer alguma coisa em favor das mulheres a rua Timbiras. Obteve a colaboração das senhoras da Igreja Presbiteriana Unida, cujo templo ficava ali perto, na rua Helvétia, e de Maria Josefina Anderson, uma jovem brasileira de 21 anos. O plano era oferecer àquelas mulheres a oportunidade de participarem de uma mesa de guloseimas e mostrar-lhes o amor de Deus, a necessidade e a possibilidade de deixarem aquele tipo de vida. O local de encontro seria no salão social da igreja da rua Helvétia. Para avisá-las disso, Helene e Maria Josefina se enfiaram na rua Timbiras e fizeram cerca de 300 convites, entre o espanto, o desprezo e o estado de embriaguez das mulheres ali residentes. NO dia de Natal, a mesa estava muito bem adornada e suprida. As senhoras presbiterianas se perguntavam: elas virão? Quantas? Por fim, chegaram quatro, apenas quatro. Sentaram-se à mesa, foram servidas com amor. Enquanto participavam, desenvolveu-se um pequeno e bem organizado programa espiritual, com cânticos, leitura da Bíblia. Uma delas, de tão sensibilizada, levantou-se bruscamente e pôs-se a chorar. Helene foi ao seu auxílio e ofereceu-lhe hospedagem em seu próprio quarto, até que ela se ajeitasse. A prostituta aceitou. Ficou combinado que em breves dias a norueguesa iria busca-la. A palavra, no entanto, foi cumprida tão somente pela salvacionista. A mulher da rua Timbiras não conseguiu libertar-se da rede em que fora colhida.
Em termos de frutos e frutos imediatos, o balanço da tão bela iniciativa foi melancólico. Porém, é bom saber que o Lar das Moças, do Exército de Salvação, no Bosque da Saúde, onde se ampara e se procura erguer as mães solteiras, antes que as circunstâncias e a sociedade as tornem mulheres da vida, é resultado da visão e do trabalho de Helene Londahl! Inaugurado no dia 12 de fevereiro de 1938 – um ano e alguns dias depois daquela refeição natalina da rua Helvétia – o Lar das Moças acolheu mais de 1.300 mães solteiras nos primeiros 20 anos de sua história.
Depois de trabalhar 18 anos no Brasil, a coronel Londahl tornou-se chefe do serviço social feminino sucessivamente na África do Sul e Suécia até sua aposentadoria. Regressou então ao Brasil, doutorou-se em sociologia na Universidade de São Paulo (1967), recebeu a Medalha de Honra do Esso Brasileiro de Petróleo e a Medalha de Santo Olavo, do rei Olavo V, da Noruega. Morreu de uma trombose, no Dia das Mães, em 1973, ela que, embora sendo solteira, era a mãe das mães solteiras!
Notas:
1. Artigo publicado por ocasião da morte de Hele Londahl no então jornal Ultimato, nº 62, em agosto de 1973, p. 3).
2. O Lar das Moças hoje se chama Projeto FloreSER e continua acolhendo meninas grávidas em São Paulo (SP). Sabia mais.
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