Opinião
- 05 de julho de 2021
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A Igreja na Índia foi pega de surpresa?
Igreja em ação
Por Mark Raja
No final de fevereiro, quando as coisas estavam voltando ao normal, eu estava planejando uma viagem em família durante um fim de semana, já que minha filha estava terminando suas provas. Cansado de trabalhar em casa, eu estava ansioso por voltar ao escritório. Nossas reuniões tinham sido retomadas pela liderança da igreja e até um acampamento estava sendo planejado.
Eu nunca imaginei que as coisas dariam uma virada tão chocante e tão rapidamente. Nas últimas semanas, eu perdi muitos amigos. Ouço falar de pelo menos cinco a dez mortes diárias entre os meus contatos, sem falar nas notícias locais. Nem sei ao certo se sobreviverei ao que alguns chamam de O Apocalipse do COVID.
Famílias foram dizimadas em duas semanas, às vezes deixando para trás crianças e até mesmo bebês. Os que ficaram estão se perguntando: “quem será o próximo?”. Cidadãos foram pegos desprevenidos e o governo os abandonou à própria sorte.
A Igreja também foi pega desprevenida?
Em fevereiro, o ânimo dos fiéis estava esperançoso e alegre enquanto surgia a possibilidade de voltar aos cultos de domingo que eles perderam no ano passado. Planejar o calendário anual voltou a ocupá-los.
Hoje, muitas igrejas que estão preocupadas com seus encontros semanais, performances de domingo, debates doutrinários, números de crescimento da igreja, etc. não têm ideia de como entender a situação.
Nas últimas semanas, algumas igrejas nem sequer refletiram sobre a crise atual. Os sermões não foram muito além de: "Não fique ansioso, confie em Deus e ele o protegerá", "Nós não podemos fazer nada além de orar", "Nós precisamos retornar para Deus", "O pecado é mais mortal que o vírus", "Pregue o evangelho aos desesperados" e assim por diante. Na melhor das hipóteses, eles estavam ocupados com orações pelos doentes e encaminhando pedidos de oração pelo WhatsApp.
Deus falou com o infiel Judá em Isaías, capítulo 1, que diz o seguinte:
“Quando vocês estendem as mãos, eu fecho os meus olhos; sim, quando multiplicam as suas orações, não as ouço, porque as mãos de vocês estão cheias de sangue.
Lavem-se e purifiquem-se! Tirem da minha presença a maldade dos seus atos; parem de fazer o mal!
Aprendam a fazer o bem; busquem a justiça, repreendam o opressor; garantam o direito dos órfãos, defendam a causa das viúvas.”
Se aquele era o infiel Judá, com o que se parece a Igreja infiel hoje? No ano passado, durante o bloqueio, estávamos mais preocupados em retomar as reuniões da igreja ou com os pobres, doentes e desempregados em nossos bairros?
Felizmente, Deus encontrou alguns fiéis. Para eles, amar a Deus e ao próximo é o principal mandamento do seu Senhor Jesus. Eles arriscaram suas vidas (tomando todas as precauções) para serem seus discípulos fiéis, como que dando os cinco pães e dois peixes que tinham.
Eles ajudaram os doentes, sepultaram os mortos, alimentaram os trabalhadores migrantes famintos em sua jornada horrenda de volta para suas aldeias. Por que não foi este o “fardo” da Igreja em geral? Teria sido porque não se encaixou na nossa ideia de “ministério” ou “igreja”? Ajudar o próximo necessitado não é tão valioso quanto como pregar o evangelho? A Igreja deve preocupar-se com a situação dos trabalhadores migrantes ou com os doentes desconhecidos do COVID? Será que este ano nós acordamos apenas porque o COVID está criando estragos nas famílias de nossas igrejas?
Sim, fomos pegos de surpresa porque amar a Deus e amar nossos vizinhos como a nós mesmos não é mais central na nossa teologia e prática. Passamos essa responsabilidade para ONGs ou grupos da igreja (Isaías 1.25).
A boa notícia é que Deus quer restaurar a Igreja como uma cidade de retidão e justiça se nos arrependermos de nossos caminhos (Isaías 1.26-27). Podemos responder ao seu chamado?
Amar o trabalhador migrante
Um voluntário, que dirige o seu próprio negócio, respondeu a um pedido de ajuda. Seu amigo de Mumbai pediu-lhe para ajudar um grupo de trabalhadores migrantes do estado de Orissa, trabalhando em Bangalore. Ele rapidamente comprou mantimentos suficientes para uma semana para 30 deles. Ele orou com eles e pediu que entrassem em contato, caso precisassem de qualquer ajuda durante a semana. Eles ficaram radiantes e gratos a Deus por sua generosidade.
Tais acontecimentos rapidamente levaram a várias chamadas com numerosos voluntários em muitas cidades. Por meio de grupos de WhatsApp, serviram aos trabalhadores migrantes com refeições, planejamento de viagens, assistência médica etc. Eles arriscaram suas vidas, contribuíram generosamente, uniram forças com os governos locais e voluntários de diferentes religiões e línguas neste momento de crise.
Após o fim da crise dos migrantes, os casos de COVID atingiram o seu auge em setembro do ano passado. Eles estabeleceram linhas de ajuda emergencial em diferentes cidades para prover leitos hospitalares, oxigênio, plasma, funerais, aconselhamento etc. Agora, durante a segunda onda, eles continuam o trabalho, mesmo quando a escala é muitas vezes maior.
Você é cristã?
Esta foi a pergunta que uma desconhecida fez a uma voluntária no final da sua ligação, depois que um paciente conseguiu um leito hospitalar por meio da sua ajuda.
Assim que o governo anunciou o bloqueio no ano passado, esta voluntária, uma terapeuta comportamental, começou a distribuir refeições recém-preparadas para pessoas de uma favela perto de sua casa.
Hoje, junto a muitos outros voluntários, ela está ajudando com uma média de 50 pedidos de leito hospitalar por dia. Sua tarefa é falar com o acompanhante do paciente para entender a condição, ligar para os hospitais a fim de verificar a disponibilidade de leitos e para o centro de comando das autoridades locais (BBMP) para alocar os leitos disponíveis. Estes voluntários às vezes fazem 40 a 50 chamadas para obter um leito confirmado.
Depois de todo esse esforço, eles ainda perdem pacientes no caminho ou mesmo depois de obter o leito. Juntos, eles choram o luto quando um dos pacientes morre e louvam a Deus quando outro é curado e liberado.
Certo dia, ela estava em uma chamada com a acompanhante, que é filha de um paciente. A filha lhe suplicou: "Por favor, fique na chamada comigo; acho que estou perdendo meu pai." A voluntária podia ouvir o som da máquina do coração diminuir até chegar a um som contínuo. Ela ficou lá para confortar aquela filha naquele momento.
Uma voluntária encontra Deus no cemitério
Durante o bloqueio no ano passado, ela se ofereceu ao departamento de trabalho para ajudar a fornecer comida para milhares de trabalhadores migrantes que viajaram para suas cidades natal com quase nada com eles.
Depois que a crise dos trabalhadores migrantes terminou, ela recebeu uma chamada para ajudar com um enterro de uma vítima do COVID, já que não havia ninguém para enterrar essa pessoa falecida. Ela não fazia a menor ideia de como fazer isso, mas correu para o cemitério.
A partir desse dia, ela ajudou com cerca de mil funerais com o apoio de muitos grupos de voluntários. Ver a impotência das famílias tentando dar um funeral digno com protocolos do COVID que pouco conhecem é desanimador. Ela decidiu ajudar a reverter a situação.
Isso não foi fácil. Em um dos primeiros funerais, o corpo não estava em um caixão. Com as mãos desprotegidas e apenas uma máscara, a equipe teve que enterrar o corpo. Mas ao colocar o corpo na cova, ele acabou caindo. Ela ficou apavorada. Os próprios coveiros não podiam ajudar, porque não tinham equipamento de proteção.
A maioria dos corpos que eles recebem dos hospitais vem em um estado terrível, às vezes até mesmo em decomposição. Se a família deseja ver o rosto do falecido, ela abre o invólucro, sem saber quão infectado está o corpo. Além do invólucro, infelizmente, não há nada mais cobrindo os cadáveres. Em alguns casos, o invólucro que transportava o cadáver rasgou e o corpo caiu. Eles rapidamente tiveram que cobri-lo com o equipamento de proteção pessoal (EPP) extra que tinham. Imagine o trauma que a família teria enfrentado se tivesse visto o seu ente querido nesse estado.
Sua equipe enfrenta exaustão física e mental todos os dias. Ela diz: "Eu não consigo mais pensar". Por muitos dias, ela não podia cheirar ou provar algo devido ao risco de infecção. Ela disse: "Estou protegida puramente pela graça de Deus".
Essa voluntária compartilhou que não era uma pessoa muito espiritual antes dessa crise do COVID. Ela conheceu Deus no cemitério, e isso mudou sua vida.
Mais histórias
Essas histórias são apenas alguns retratos do que os discípulos fiéis estão fazendo em todo o país ao servir seus vizinhos e estrangeiros em necessidade.
Outro voluntário que trabalha como profissional de logística está sempre na linha de frente, ajudando centenas de pacientes a encontrar leitos. Mas ele não conseguiu encontrar um quando seu irmão precisava. O irmão dele morreu.
Outro voluntário, junto com seu amigo muçulmano, recebeu uma ligação para realizar os últimos ritos de um homem hindu idoso enquanto seus filhos eram hospitalizados por COVID. Ele conseguiu fazer todo o ritual de cremação, quebrando todos os limites e barreiras criados pela religião e casta. Ele se tornou filho daquela família naquele dia.
Duas mulheres em Nova Deli fundaram a Nivi Helpline porque muitas pessoas precisavam de ajuda. Apesar de saberem que não eram especialistas nem tinham contatos especiais, a dupla começou a ajudar uma família de cada vez. Tanto para um leito de hospital quanto para medicamentos ou oxigênio; elas garantiram que famílias conseguissem ajuda, especialmente aqueles que não tinham ninguém para ajudar.
O chamado não é sobre quantos projetos de ajuda minha igreja local ou organização está fazendo, embora eles sejam importantes. O mandamento de Deus é amar sacrificialmente os nossos próximos como uma comunidade de discípulos em nossos ritmos diários de vida. Confesso que também eu luto com isso.
Oro para que o resto de nós se junte a eles, mantendo o principal mandamento de nosso Senhor, para vivermos nossas vidas dignas de nossa vocação.
• Mark Raja é um designer de produto digital na indústria de software. É formado em Belas Artes e fundador do Movimento Integrado de Artes.
Traduzido por: Elisa Camargo, voluntária do Movimento Vocare.
Texto originalmente publicado em Christian Trends. Reproduzido com permissão.
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