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- 12 de junho de 2023
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A fé cristã e as tragédias ambientais: o que a igreja ainda pode fazer hoje?
2 mil municípios passam, anualmente, por situações dramáticas relacionadas a desastres naturais
Por Lissânder Dias
Vivemos em um mundo machucado e aguardamos ansiosamente pela redenção completa. Não somente o ser humano, mas toda a criação de Deus se manifesta na esperança da conclusão definitiva da obra de Cristo. Nas palavras de Paulo, “até hoje toda a criação geme e padece, como em dores de parto” (Rm 8.22). Esse olhar de Paulo sobre a criação se mostra muito mais abrangente e inclusivo do que nós costumamos ser.
Na terça-feira, dia 06/06, o Diálogos de Esperança – em parceria com o Movimento Renovar Nosso Mundo - proporcionou uma conversa igualmente abrangente sobre o cuidado da criação de Deus. Os convidados foram a educadora e fundadora do Centro Gênesis Lourdes Brazil e engenheiro florestal e mobilizador Carlos Vicente. A live foi conduzida por Claudia Moreira e Valdir Steuernagel.
Histórias de vida
Ambos evangélicos, Lourdes e Carlos iniciaram a conversa contando suas próprias trajetórias, desde a infância e adolescência, e como a natureza fez parte de suas vidas.
Lourdes lembrou de quando ia ao sítio do avô na Baixada Fluminense, que terminava no rio Guandu. “As mulheres da minha família iam lavar roupa no rio e nós, crianças, também íamos. Lá tomávamos banho, comíamos frutas e brincávamos com os animais. Mesmo quando nos mudamos para uma área urbana, tinha uma lagoa do fundo do nosso quintal. E eu passava o dia pescando, tomando banho e brincando. Então, eu tive contato muito grande com a natureza, que alguns estudiosos chamam de ‘experiências significativas de vida’. Na faculdade me distanciei da natureza, mas quando me mudei para São Gonçalo, trabalhei no movimento de mulheres e constatamos as precárias condições ambientais em que viviam. Estava chegando a data da Rio 92 e eu participei de todos os encontros preparatórios com a sociedade civil. Na época, eu pouco tinha estudado sobre as questões ambientais. Mas a partir daí eu decidi que seria esse o ministério que Deus me deu”.
Carlos Vicente lembrou de sua origem pobre em Cabo Frio, região de praia do Rio de Janeiro. “Sobrevivíamos servindo aos turistas, vendendo picolés. Mas eu descobri que na praia, aquele ambiente natural comum, eu poderia desfrutar das mesmas coisas que as pessoas quando eu estava dentro d’agua. Quando eu estava na areia, vinham todas as diferenças sociais (falta de recursos, função social). Na areia eu era vendedor de picolé, mas dentro da água, eu era uma pessoa como qualquer outra, rica ou pobre, que estava desfrutando da natureza. Com muitos desafios, consegui estudar e me formar em engenharia florestal. Por falta de oportunidades de emprego no Rio, fui parar no Acre, e por providência divina, conheci o Chico Mendes, a Marina Silva e toda uma geração de jovens trabalhando na defesa dos agricultores familiares e dos indígenas. Ali foi uma grande escola, pois não havia separação entre a luta pela justiça social e preservação ambiental. Sai de lá com o compromisso de trabalhar para reduzir o abismo de desigualdade social e preservação dos nossos recursos naturais. Para mim, a natureza foi um espaço de me constituir como uma pessoa, apesar de todas as diferenças sociais que enfrentava. Aprendi que trabalhar em defesa da natureza era também a forma de combater a pobreza e a desigualdade e de amar ao próximo”.
Municípios em perigo e como ajudar a igreja a ajudar
Longe de ser um assunto apenas sobre plantas e animais, a pauta ambiental representa um dos maiores desafios de gestão pública e de mobilização social atualmente. Carlos Vicente lembrou que, segundo o Observatório dos Desastres Naturais da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), dois mil municípios estão passando, anualmente, por situações dramáticas relacionadas a desastres naturais. De acordo com o Observatório, de 2013 a 2022, o Brasil teve um prejuízo de 340 bilhões de reais com os desastres. “A questão das mudanças climáticas já é um problema de hoje, não de amanhã”, afirma Carlos.
Lourdes ressalta que a pandemia deixou ainda mais claro o abismo social de quem sofre com os efeitos das mudanças climáticas. “Os desastres acontecem nos mesmos lugares todos os anos, na periferia, atingindo os mais pobres e configurando um racismo ambiental”, diz Lourdes.
Como ajudar as igrejas locais a enfrentarem o problema antes que as tragédias cheguem novamente? Para Lourdes, é preciso explicar para as pessoas como as alterações climáticas acontecem no dia a dia. “Precisamos dizer que as chuvas torrenciais, a partir de agora, sempre vão ocorrer”. Ela ressaltou ainda que as igrejas precisam agir, e fugir do discurso teológico escapista. “Um pastor disse em um culto que as pessoas que não têm moradia devem apenas esperar o momento de ir para o céu. Eu o questionei: ‘e o que a pessoa faz enquanto não vai para o céu, pastor?’. Ele ficou bravo comigo. Sim, a gente espera no Senhor, mas também age, se organiza, luta, conversa, ensina, desenvolve um trabalho didático e pedagógico. É inadmissível que [os temas ambientais] não sejam abordados nas igrejas”. Ela também destacou que para incluir, precisa ter uma formação das novas lideranças desde o seminário. “Já passamos do período de uma formação ‘de comemoração’ (dia da terra, dia do meio ambiente etc); precisamos de uma formação permanente nas igrejas, desde as criancinhas até a terceira idade”.
Carlos Vicente acredita que é fundamental proporcionar encontros das lideranças religiosas com os especialistas da área, já que o tema ambiental ainda é novo para as igrejas e elas precisam de suporte para prosseguir. “Quando os líderes religiosos participaram de eventos com especialistas na área ambiental que promovemos, entendendo que suas comunidades são as mais afetadas pelas tragédias, eles voltam para suas comunidades, e até agora 99% deles começaram a atuar. Começaram a trabalhar, criando ensino de eco-teologia em suas igrejas e desenvolvendo projetos em suas comunidades”. Por último, Carlos ressaltou que diante desse “novo normal”, que as desastres ambientais estão se intensificando, precisamos criar uma cultura de prevenção e de respostas adequadas a esses desastres climáticos. “Muitas pessoas morrem porque não acreditam no alerta que a Defesa Civil dá. Por causa disso, em muitos lugares, apesar de acionar o alerta, a Defesa Civil não chega com eficiência porque a população não fez sua parte. O líder religioso tem enorme credibilidade e papel nessas comunidades; por isso, se passa a ter esse conhecimento correto, ele consegue dialogar com o poder público e isso qualifica a demanda que ele, sua igreja e sua comunidade têm junto ao Estado na perspectiva de proteger”.
Live na íntegra
Você pode ver e ouvir, em sua íntegra, a live “Mudanças climáticas e as tragédias: qual o papel da igreja?” AQUI.
Recursos didáticos e sites
Durante a live, o Diálogos ofereceu gratuitamente alguns recursos didáticos que podem ajudar as igrejas a desenvolverem o assunto junto com seus membros e comunidades:
Recursos didáticos:
- Curadoria “Cuidado com a Criação” [download]
- Cartilha “Como as crenças impactam nossa resposta aos desastres”, da Tearfund [download]
Sites:
Movimento Renovar Nosso Mundo [acesse]
Centro Gênesis [acesse]
*
Próxima live
A próxima live do Diálogos de Esperança acontecerá no dia 20 de junho e terá como tema “Brasil: o país mais ‘crente’ do mundo”.
*
Playlist do Diálogos de Esperança
Assista a todas as lives já realizadas aqui.
Saiba mais:
» Assim Na Terra Como no Céu – Experiências socioambientais na igreja local, Gínia César Bontempo, org.
» Jesus e a Terra – A ética ambiental nos Evangelhos, James Jones
» O Reino de Deus e a Transformação Social – Fundamentos, Princípios e Ferramentas, Mauricio José da Silva Cunha
» Cuidado com a criação: um assunto também para crianças e adolescentes
Por Lissânder Dias
Vivemos em um mundo machucado e aguardamos ansiosamente pela redenção completa. Não somente o ser humano, mas toda a criação de Deus se manifesta na esperança da conclusão definitiva da obra de Cristo. Nas palavras de Paulo, “até hoje toda a criação geme e padece, como em dores de parto” (Rm 8.22). Esse olhar de Paulo sobre a criação se mostra muito mais abrangente e inclusivo do que nós costumamos ser.
Na terça-feira, dia 06/06, o Diálogos de Esperança – em parceria com o Movimento Renovar Nosso Mundo - proporcionou uma conversa igualmente abrangente sobre o cuidado da criação de Deus. Os convidados foram a educadora e fundadora do Centro Gênesis Lourdes Brazil e engenheiro florestal e mobilizador Carlos Vicente. A live foi conduzida por Claudia Moreira e Valdir Steuernagel.
Histórias de vida
Ambos evangélicos, Lourdes e Carlos iniciaram a conversa contando suas próprias trajetórias, desde a infância e adolescência, e como a natureza fez parte de suas vidas.
Lourdes lembrou de quando ia ao sítio do avô na Baixada Fluminense, que terminava no rio Guandu. “As mulheres da minha família iam lavar roupa no rio e nós, crianças, também íamos. Lá tomávamos banho, comíamos frutas e brincávamos com os animais. Mesmo quando nos mudamos para uma área urbana, tinha uma lagoa do fundo do nosso quintal. E eu passava o dia pescando, tomando banho e brincando. Então, eu tive contato muito grande com a natureza, que alguns estudiosos chamam de ‘experiências significativas de vida’. Na faculdade me distanciei da natureza, mas quando me mudei para São Gonçalo, trabalhei no movimento de mulheres e constatamos as precárias condições ambientais em que viviam. Estava chegando a data da Rio 92 e eu participei de todos os encontros preparatórios com a sociedade civil. Na época, eu pouco tinha estudado sobre as questões ambientais. Mas a partir daí eu decidi que seria esse o ministério que Deus me deu”.
Carlos Vicente lembrou de sua origem pobre em Cabo Frio, região de praia do Rio de Janeiro. “Sobrevivíamos servindo aos turistas, vendendo picolés. Mas eu descobri que na praia, aquele ambiente natural comum, eu poderia desfrutar das mesmas coisas que as pessoas quando eu estava dentro d’agua. Quando eu estava na areia, vinham todas as diferenças sociais (falta de recursos, função social). Na areia eu era vendedor de picolé, mas dentro da água, eu era uma pessoa como qualquer outra, rica ou pobre, que estava desfrutando da natureza. Com muitos desafios, consegui estudar e me formar em engenharia florestal. Por falta de oportunidades de emprego no Rio, fui parar no Acre, e por providência divina, conheci o Chico Mendes, a Marina Silva e toda uma geração de jovens trabalhando na defesa dos agricultores familiares e dos indígenas. Ali foi uma grande escola, pois não havia separação entre a luta pela justiça social e preservação ambiental. Sai de lá com o compromisso de trabalhar para reduzir o abismo de desigualdade social e preservação dos nossos recursos naturais. Para mim, a natureza foi um espaço de me constituir como uma pessoa, apesar de todas as diferenças sociais que enfrentava. Aprendi que trabalhar em defesa da natureza era também a forma de combater a pobreza e a desigualdade e de amar ao próximo”.
Municípios em perigo e como ajudar a igreja a ajudar
Longe de ser um assunto apenas sobre plantas e animais, a pauta ambiental representa um dos maiores desafios de gestão pública e de mobilização social atualmente. Carlos Vicente lembrou que, segundo o Observatório dos Desastres Naturais da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), dois mil municípios estão passando, anualmente, por situações dramáticas relacionadas a desastres naturais. De acordo com o Observatório, de 2013 a 2022, o Brasil teve um prejuízo de 340 bilhões de reais com os desastres. “A questão das mudanças climáticas já é um problema de hoje, não de amanhã”, afirma Carlos.
Lourdes ressalta que a pandemia deixou ainda mais claro o abismo social de quem sofre com os efeitos das mudanças climáticas. “Os desastres acontecem nos mesmos lugares todos os anos, na periferia, atingindo os mais pobres e configurando um racismo ambiental”, diz Lourdes.
Como ajudar as igrejas locais a enfrentarem o problema antes que as tragédias cheguem novamente? Para Lourdes, é preciso explicar para as pessoas como as alterações climáticas acontecem no dia a dia. “Precisamos dizer que as chuvas torrenciais, a partir de agora, sempre vão ocorrer”. Ela ressaltou ainda que as igrejas precisam agir, e fugir do discurso teológico escapista. “Um pastor disse em um culto que as pessoas que não têm moradia devem apenas esperar o momento de ir para o céu. Eu o questionei: ‘e o que a pessoa faz enquanto não vai para o céu, pastor?’. Ele ficou bravo comigo. Sim, a gente espera no Senhor, mas também age, se organiza, luta, conversa, ensina, desenvolve um trabalho didático e pedagógico. É inadmissível que [os temas ambientais] não sejam abordados nas igrejas”. Ela também destacou que para incluir, precisa ter uma formação das novas lideranças desde o seminário. “Já passamos do período de uma formação ‘de comemoração’ (dia da terra, dia do meio ambiente etc); precisamos de uma formação permanente nas igrejas, desde as criancinhas até a terceira idade”.
Carlos Vicente acredita que é fundamental proporcionar encontros das lideranças religiosas com os especialistas da área, já que o tema ambiental ainda é novo para as igrejas e elas precisam de suporte para prosseguir. “Quando os líderes religiosos participaram de eventos com especialistas na área ambiental que promovemos, entendendo que suas comunidades são as mais afetadas pelas tragédias, eles voltam para suas comunidades, e até agora 99% deles começaram a atuar. Começaram a trabalhar, criando ensino de eco-teologia em suas igrejas e desenvolvendo projetos em suas comunidades”. Por último, Carlos ressaltou que diante desse “novo normal”, que as desastres ambientais estão se intensificando, precisamos criar uma cultura de prevenção e de respostas adequadas a esses desastres climáticos. “Muitas pessoas morrem porque não acreditam no alerta que a Defesa Civil dá. Por causa disso, em muitos lugares, apesar de acionar o alerta, a Defesa Civil não chega com eficiência porque a população não fez sua parte. O líder religioso tem enorme credibilidade e papel nessas comunidades; por isso, se passa a ter esse conhecimento correto, ele consegue dialogar com o poder público e isso qualifica a demanda que ele, sua igreja e sua comunidade têm junto ao Estado na perspectiva de proteger”.
Live na íntegra
Você pode ver e ouvir, em sua íntegra, a live “Mudanças climáticas e as tragédias: qual o papel da igreja?” AQUI.
Recursos didáticos e sites
Durante a live, o Diálogos ofereceu gratuitamente alguns recursos didáticos que podem ajudar as igrejas a desenvolverem o assunto junto com seus membros e comunidades:
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- Curadoria “Cuidado com a Criação” [download]
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Próxima live
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REVISTA ULTIMATO | SOMOS TODOS FRACOS
Não é fácil assumir-se fraco. Não é nem um pouco confortável vivenciar a fraqueza. Ela causa dor, limita, envergonha, humilha, incomoda, nos encurrala. É, muitas vezes, o lugar do desânimo, da ansiedade, do desespero, da tristeza, da desorientação, do cansaço, da indiferença. Mas é também o lugar onde clamamos com toda a sinceridade pela força que vem de Deus. E ele nos atende!
É disso que se trata a edição 401 da Revista Ultimato. Para assinar, clique aqui.
Saiba mais:
» Assim Na Terra Como no Céu – Experiências socioambientais na igreja local, Gínia César Bontempo, org.
» Jesus e a Terra – A ética ambiental nos Evangelhos, James Jones
» O Reino de Deus e a Transformação Social – Fundamentos, Princípios e Ferramentas, Mauricio José da Silva Cunha
» Cuidado com a criação: um assunto também para crianças e adolescentes
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