Opinião
- 25 de abril de 2024
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Uma crônica da minha vida
Por Tácito L. Maranhão Pinto
Sessenta +
Confesso nunca ter pensado muito na idade. Meus pais muito longevos (minha mãe faleceu com 90 anos e meu pai continua vivo, com quase 98 anos, mente clara e pernas fracas!). Sempre vi a vida como um campo de oportunidades. Deus na sua soberania abrindo e fechando portas e me abençoando com discernimento para entrar pela porta certa ou abandonar a porta que se fecharia.
Compartilho uma breve crônica ou história da minha vida. Ainda que vá parecer uma lista de nomes e locais, se você tiver paciência de ler até o final, vai entender porque escrevi desta maneira.
Nasci num lar cristão, desde meus bisavós, dos dois lados, materno e paterno. Mas aos 10 anos, numa escola bíblica de férias, em uma Igreja Metodista em São Paulo, lembro-me de levantar a minha mão e aceitar a Jesus como Senhor e Salvador, ainda que a compreensão do que é ter um Senhor, tenha vindo somente mais tarde na vida.
Cresci em uma Igreja Presbiteriana em São Paulo (Igreja Presbiteriana Ebenézer) – onde fiquei até casar e me transferir para Curitiba, PR. Uma igreja boa, onde o Reverendo Wadislau Martins Gomes exerceu uma influência grande na minha vida e na vida da minha família, seja pela palavra seja pelos exemplos de vida e ministério.
Ali conheci o Ebenezer Bittencourt – uma das mais duradouras das minha amizades.
Estudei em escola pública e bem jovem entrei na Escola de Engenharia onde me envolvi com o ministério da ABUB (Aliança Bíblica Universitária do Brasil). Tínhamos um pequeno grupo de estudo e oração e no dia a dia procurávamos dar testemunho da nossa fé em Jesus. Entre os colegas cristãos alguns foram muito marcantes, Klaus Rempel, Frederico Cruz e Paulo David Battaglin, entre muitos. Nos encorajávamos e orávamos uns pelos outros. Na ABUB aprendi o que era o Senhorio de Cristo. Os acampamentos, Institutos de Preparação de Lideres (IPL’s), Neuza Itioka, Manfred Loitzembauer, Dieter Brepohl, Valdir Steuernagel e Renato Porath foram pessoas que cuidaram de mim – alguns mais, outros menos – e sou o que sou pela influência positiva deles. Estudantes cristãos de outras faculdades fazem parte do meu acervo de amigos “mais chegados que um irmão”, gente que me desafiou, me disse que eu estava errado, que me fez ver situações e circunstâncias de uma maneira diferente, entre eles Samuel Medeiros, Flávio Lalli, Alberto Elfes, Oseas Heckert, Mairton Oliveira, Alcindo Prado, Maria Celia Del Valle e Gilberto Campos.
Os cursos da ABU me permitiram aprender com pessoas como o Dr. Russell Shedd, Samuel Escobar, René Padilla, Pedro Arana Quiroz, sem citar os livros que eu “devorava” – sejam os publicados em português ou em espanhol pela Ediciones Certeza – e a Revista Certeza, cujos números guardei separados até poucos anos atrás.
Enquanto estudava engenharia, comecei a dar aulas, inicialmente em cursos supletivos e, depois, em curso técnico. Identifiquei-me com esta atividade – meu pai e minha mãe também foram professores.
Foi em um encontro da ABU em Porto Alegre, RS, (1974) que conheci aquela que seria minha esposa. Casei-me com a Glacy em dezembro de 1976, poucos dias após os exames finais do curso de engenharia. O casamento, que completou 47 anos, foi a melhor coisa que me aconteceu na vida. Casei-me com uma mulher sensível, inteligente, criativa e acima de tudo temente a Deus. Minha vida teria sido muito diferente e “menor” não fosse pela presença dela nos momentos de alegria e nos momentos de dificuldades e crises. Junto com a esposa, veio a sogra, uma mulher de oração que orou por mim. E muitas das oportunidades que se abriram para mim ao longo da vida, foram respostas às suas orações.
Mas devo voltar alguns meses no tempo. Em janeiro de 1976, participamos do 1º Congresso Missionário da ABU em Curitiba. Falou-se sobre a possibilidade de profissionais que poderiam ir para outros países para ali exercerem seu ministério enquanto trabalhassem em suas respectivas profissões, o que chamamos de “fazedor de tendas”. Ainda faltava quase um ano para terminar a faculdade, mas comecei a pensar se não haveria possibilidades de ensinar eletrônica em algum curso técnico profissionalizante em Angola ou Moçambique. Mas ao longo do ano esta ideia não se demonstrou prática, pois as colônias portuguesas tornaram-se independentes de Portugal e entraram em um período de guerra civil.
Em janeiro de 1977, recém-formado e recém-casado, mudei-me para Curitiba, onde a Glacy morava e ainda estudava. Alguns anos antes, meus pais tinham se transferido para Curitiba juntamente com minhas duas irmãs.
Comecei minha carreira como engenheiro eletrônico em uma empresa na cidade, os chefes foram muito pacientes comigo, ainda que tivesse uma boa formação, minhas habilidades interpessoais e relacionais eram muito precárias, para dizer o mínimo.
Em Curitiba fomos para a igreja de meus pais, Igreja Presbiteriana da Silva Jardim, onde o jovem pastor Alderi S. Matos, nos recebeu muito bem, dando-nos oportunidade de ministrar aos jovens. Conectamo-nos novamente com uma igreja local.
Em janeiro de 1978, aconteceu o 2º Congresso Missionário da ABU, novamente em Curitiba, e ali surgiu a oportunidade de atender um apelo da ABU da Itália (GBU) que estava aberta para receber algum “obreiro” estrangeiro, de algum país em que o ministério estudantil tivesse um comprovado impacto na vida dos estudantes universitários e secundaristas. Era um convite para dois anos com possibilidade de renovação. Resolvemos, Glacy e eu demonstramos nosso interesse por esta oportunidade. Para nossa total surpresa, e incredulidade, em maio/junho 1978 recebemos a carta convite para irmos como participantes de um programa da IFES (ABU Internacional) e nos estabelecermos em Genova. Foi um susto!
Em julho de 1978, Samuel Escobar e Rene Padilla nos ofereceram a possibilidade de um “treinamento intensivo” com eles, por três ou quatro semanas, na Argentina. Tirei férias do trabalho e lá fomos nós para a nossa primeira experiência internacional. Estudávamos a Bíblia, líamos, e compartilhávamos de manhã, de tarde e de noite! Foi um período de intenso aprendizado, não apenas da Bíblia, mas sobre a vida e família destes dois homens, pois ficamos hospedados na casa deles.
Trabalhei mais dois meses, a Glacy se graduou, em farmácia e bioquímica. E, finalmente, no início de outubro fomos para Londres, para um encontro da IFES onde conhecemos outros profissionais que estavam indo, nas mesmas condições, para outros países. (Alemanha, Camarões, Madagascar, Etiópia e ex-Iugoslávia). Após o encontro na Inglaterra, fomos para a Itália, chegamos em Genova na primeira quinzena de outubro. Ali nos esperava Roberto e Ester Frache. Roberto era o presidente do comitê diretivo dos GBU (ABU Italiana) e professor de química na universidade, ambos eram membros de uma Igreja dos Irmãos Unidos. O casal foi extremamente carinhoso e cuidado conosco. Em menos de um mês tínhamos nosso apartamento, conhecíamos várias igrejas evangélicas e pastores. Iniciamos três grupos de estudos bíblicos durante a semana com estudantes universitários e secundaristas. Nosso objetivo era encorajá-los a darem um bom testemunho cristão e orarem por seus colegas e professores. Deus foi muito bom conosco, éramos jovens, imaturos e sem uma experiência intercultural. Mas mesmo assim os estudantes vinham, pastores nos convidavam para falar em suas igrejas, reuníamo-nos com outros obreiros dos GBU em outras cidades. Eu comecei a cursar algumas matérias na Escola de Aperfeiçoamento em Física e assim mantinha contato com estudantes em seu próprio ambiente. A Glacy fez algumas matérias como aluna ouvinte. Ficamos ali pouco mais de dois anos, retornando ao Brasil em dezembro de 1980. Um pouco frustrados: achamos que não houve fruto. Os números de nosso relatório eram baixos e nossa imaturidade e despreparo altos! Mas retornei à Itália em 1997, 2012 e 2018 e pude encontrar vários daqueles outrora estudantes engajados nas suas igrejas locais, na liderança de organizações cristãs. Não fomos os responsáveis diretos por isso, mas cremos que Deus nos usou para influenciá-los de alguma maneira.
Em janeiro 1981, voltei a trabalhar como engenheiro na mesma empresa de antes, é como se Deus tivesse guardado a minha vaga enquanto estávamos na Itália.
No ano seguinte nasceu nossa primeira filha, Elena, e dois anos depois a nossa segunda filha Julia. Neste tempo a Igreja Batista do Prado Velho, que era a igreja original da Glacy, tinha uma boa estrutura para crianças, assim deixamos a Igreja Presbiteriana de Silva Jardim e fomos para ela. Fizemos muito amigos, exercemos um ministério ativo de ensino, crescemos na vida comunitária e somos gratos a Deus por aqueles anos ali.
Em 1985, iniciei um novo trabalho em São Paulo, fomos morar no bairro Perdizes e começamos a frequentar a Igreja Batista do Morumbi. Lembramos com carinho da forma como fomos recebidos pelo pastor Ary Velloso. Naquela igreja, reencontramos com o meu colega da engenharia Frederico Cruz e a esposa Pérola, conhecemos o Paulo Moreira, Lisânias Moura, Daniel Lima, Paulo Andrade e Dora, Oscar Zanquetta e Débora e tantos outros que não imaginam as marcas que deixaram nas nossas vidas e na vida da nossa família.
Em São Paulo, devido à dinâmica da cidade, e a dinâmica da família, frequentamos diversas igrejas. Participamos por vários anos do Projeto Raízes, uma experiência única, uma igreja com jovens casais e muitas crianças onde fomos muito apoiados e suportados em amor. Temos muita gratidão a Deus por aquele tempo. Foi no Raízes que conhecemos aquele que se tornou meu melhor amigo (o irmão que não tive), Valdir Martins Joaquim, a esposa Diva e as filhas Virginia e Carolina. Ainda nos falamos todas as semanas e mantemos um relacionamento que é mais profundo que o de irmão.
Retornamos à Igreja Batista do Morumbi por mais quatro ou cinco anos e, em 2002, passamos a frequentar a Igreja Batista da Água Branca (IBAB). Outra experiência rica e transformadora para todos nós. O pastor Ed René Kivitz e a equipe nos receberam muito bem, desenvolvemos amizades que são para a vida. E por estarmos na IBAB, foram os pastores Ed René e Ariovaldo Ramos que oficiaram os casamentos de nossas duas filhas.
Quando voltamos para São Paulo, pude dedicar-me a aprofundar meus estudos: fiz ma pós graduação em finanças, outra graduação em direito, uma pós-graduação em direito constitucional, e um mestrado em ciências da religião, completado em 2008.
Em 1997 fui trabalhar na Siemens, uma grande empresa global, e pude viajar a trabalho para conhecer a operação da empresa na Alemanha, EUA, Argentina, Chile, Itália, e da posição inicial em vendas migrei para a área de recursos humanos, com a qual muito me identifiquei.
Ao mesmo tempo, comecei a desenvolver uma carreira paralela no ensino superior na FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado), FIAP (Faculdade de Informática e Administração Paulista) e ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).
No início dos anos 2000, minhas filhas com os esposos emigraram para a Austrália, onde se estabeleceram. Em 2012, em uma fase de pré-aposentadoria, Glacy e eu também nos mudamos para o país.
Na Austrália, fazemos parte de uma igreja pentecostal (Life Christian Centre), onde servimos com toda a família. Eu continuo no meu ministério de ensino. A esta altura temos três netos que nos dão muita alegria.
Esta é a minha vida. Uma colcha de retalhos de influências que recebemos de amigos e igrejas. Cada pedacinho de mim reflete algum aspecto da vida destes muitos que citei ao longo desta enfadonha narrativa. “A quem honra, honra”.
Um carreira contendo muitas carreiras. Uma estrada com muitos desvios em que pude aprender a gostar de coisas diferentes e apreciar outros saberes que não faziam parte da minha formação.
Em tudo posso encontrar a fidelidade de Deus, e agora aposentado e descobrindo outras coisas neste país distante, nos anos que me restam, aprendi a agradecer a Deus pela minha vida e família. Viver mais lentamente, contemplar mais, ler mais, descansar mais e estar atento às oportunidades de servir.
Versão ampliada do artigo Uma crônica da minha vida, publicado na edição 407 de Ultimato.
REVISTA ULTIMATO | OS DESAFIOS ÉTICOS DAS NOVAS TECNOLOGIAS
O avanço da tecnologia nas últimas décadas é maior do que em qualquer outra época da história. Tal aumento se dá em muitas frentes e, mais significativo, confere um caráter tecnológico à vida contemporânea.
Quais são os desafios trazidos por esse avanço? A ética cristã é suficiente para responder aos aspectos relacionados às novas tecnologias? Como a igreja pode atuar nesse cenário tão desafiador?
É disso que trata a matéria de capa da edição 407 da revista Ultimato. Para assinar, clique aqui.
Saiba mais:
» Conheça o blog Movimento Cristão 60+
» Eleição e Livre-Arbítrio - confissões de um peregrino, Frans Leonard Schalkwijk
» Aprender a Envelhecer, Paul Tournier
» Fui Moço, Agora Sou Velho... E Daí?, Kléos Magalhães Lenz César
» Envelhecemos - A arte de continuar, edição 404 de Ultimato
» A vocação não tem validade, por Marcos Bontempo
Sessenta +
Confesso nunca ter pensado muito na idade. Meus pais muito longevos (minha mãe faleceu com 90 anos e meu pai continua vivo, com quase 98 anos, mente clara e pernas fracas!). Sempre vi a vida como um campo de oportunidades. Deus na sua soberania abrindo e fechando portas e me abençoando com discernimento para entrar pela porta certa ou abandonar a porta que se fecharia.
Compartilho uma breve crônica ou história da minha vida. Ainda que vá parecer uma lista de nomes e locais, se você tiver paciência de ler até o final, vai entender porque escrevi desta maneira.
Nasci num lar cristão, desde meus bisavós, dos dois lados, materno e paterno. Mas aos 10 anos, numa escola bíblica de férias, em uma Igreja Metodista em São Paulo, lembro-me de levantar a minha mão e aceitar a Jesus como Senhor e Salvador, ainda que a compreensão do que é ter um Senhor, tenha vindo somente mais tarde na vida.
Cresci em uma Igreja Presbiteriana em São Paulo (Igreja Presbiteriana Ebenézer) – onde fiquei até casar e me transferir para Curitiba, PR. Uma igreja boa, onde o Reverendo Wadislau Martins Gomes exerceu uma influência grande na minha vida e na vida da minha família, seja pela palavra seja pelos exemplos de vida e ministério.
Ali conheci o Ebenezer Bittencourt – uma das mais duradouras das minha amizades.
Estudei em escola pública e bem jovem entrei na Escola de Engenharia onde me envolvi com o ministério da ABUB (Aliança Bíblica Universitária do Brasil). Tínhamos um pequeno grupo de estudo e oração e no dia a dia procurávamos dar testemunho da nossa fé em Jesus. Entre os colegas cristãos alguns foram muito marcantes, Klaus Rempel, Frederico Cruz e Paulo David Battaglin, entre muitos. Nos encorajávamos e orávamos uns pelos outros. Na ABUB aprendi o que era o Senhorio de Cristo. Os acampamentos, Institutos de Preparação de Lideres (IPL’s), Neuza Itioka, Manfred Loitzembauer, Dieter Brepohl, Valdir Steuernagel e Renato Porath foram pessoas que cuidaram de mim – alguns mais, outros menos – e sou o que sou pela influência positiva deles. Estudantes cristãos de outras faculdades fazem parte do meu acervo de amigos “mais chegados que um irmão”, gente que me desafiou, me disse que eu estava errado, que me fez ver situações e circunstâncias de uma maneira diferente, entre eles Samuel Medeiros, Flávio Lalli, Alberto Elfes, Oseas Heckert, Mairton Oliveira, Alcindo Prado, Maria Celia Del Valle e Gilberto Campos.
Os cursos da ABU me permitiram aprender com pessoas como o Dr. Russell Shedd, Samuel Escobar, René Padilla, Pedro Arana Quiroz, sem citar os livros que eu “devorava” – sejam os publicados em português ou em espanhol pela Ediciones Certeza – e a Revista Certeza, cujos números guardei separados até poucos anos atrás.
Enquanto estudava engenharia, comecei a dar aulas, inicialmente em cursos supletivos e, depois, em curso técnico. Identifiquei-me com esta atividade – meu pai e minha mãe também foram professores.
Foi em um encontro da ABU em Porto Alegre, RS, (1974) que conheci aquela que seria minha esposa. Casei-me com a Glacy em dezembro de 1976, poucos dias após os exames finais do curso de engenharia. O casamento, que completou 47 anos, foi a melhor coisa que me aconteceu na vida. Casei-me com uma mulher sensível, inteligente, criativa e acima de tudo temente a Deus. Minha vida teria sido muito diferente e “menor” não fosse pela presença dela nos momentos de alegria e nos momentos de dificuldades e crises. Junto com a esposa, veio a sogra, uma mulher de oração que orou por mim. E muitas das oportunidades que se abriram para mim ao longo da vida, foram respostas às suas orações.
Mas devo voltar alguns meses no tempo. Em janeiro de 1976, participamos do 1º Congresso Missionário da ABU em Curitiba. Falou-se sobre a possibilidade de profissionais que poderiam ir para outros países para ali exercerem seu ministério enquanto trabalhassem em suas respectivas profissões, o que chamamos de “fazedor de tendas”. Ainda faltava quase um ano para terminar a faculdade, mas comecei a pensar se não haveria possibilidades de ensinar eletrônica em algum curso técnico profissionalizante em Angola ou Moçambique. Mas ao longo do ano esta ideia não se demonstrou prática, pois as colônias portuguesas tornaram-se independentes de Portugal e entraram em um período de guerra civil.
Em janeiro de 1977, recém-formado e recém-casado, mudei-me para Curitiba, onde a Glacy morava e ainda estudava. Alguns anos antes, meus pais tinham se transferido para Curitiba juntamente com minhas duas irmãs.
Comecei minha carreira como engenheiro eletrônico em uma empresa na cidade, os chefes foram muito pacientes comigo, ainda que tivesse uma boa formação, minhas habilidades interpessoais e relacionais eram muito precárias, para dizer o mínimo.
Em Curitiba fomos para a igreja de meus pais, Igreja Presbiteriana da Silva Jardim, onde o jovem pastor Alderi S. Matos, nos recebeu muito bem, dando-nos oportunidade de ministrar aos jovens. Conectamo-nos novamente com uma igreja local.
Em janeiro de 1978, aconteceu o 2º Congresso Missionário da ABU, novamente em Curitiba, e ali surgiu a oportunidade de atender um apelo da ABU da Itália (GBU) que estava aberta para receber algum “obreiro” estrangeiro, de algum país em que o ministério estudantil tivesse um comprovado impacto na vida dos estudantes universitários e secundaristas. Era um convite para dois anos com possibilidade de renovação. Resolvemos, Glacy e eu demonstramos nosso interesse por esta oportunidade. Para nossa total surpresa, e incredulidade, em maio/junho 1978 recebemos a carta convite para irmos como participantes de um programa da IFES (ABU Internacional) e nos estabelecermos em Genova. Foi um susto!
Em julho de 1978, Samuel Escobar e Rene Padilla nos ofereceram a possibilidade de um “treinamento intensivo” com eles, por três ou quatro semanas, na Argentina. Tirei férias do trabalho e lá fomos nós para a nossa primeira experiência internacional. Estudávamos a Bíblia, líamos, e compartilhávamos de manhã, de tarde e de noite! Foi um período de intenso aprendizado, não apenas da Bíblia, mas sobre a vida e família destes dois homens, pois ficamos hospedados na casa deles.
Trabalhei mais dois meses, a Glacy se graduou, em farmácia e bioquímica. E, finalmente, no início de outubro fomos para Londres, para um encontro da IFES onde conhecemos outros profissionais que estavam indo, nas mesmas condições, para outros países. (Alemanha, Camarões, Madagascar, Etiópia e ex-Iugoslávia). Após o encontro na Inglaterra, fomos para a Itália, chegamos em Genova na primeira quinzena de outubro. Ali nos esperava Roberto e Ester Frache. Roberto era o presidente do comitê diretivo dos GBU (ABU Italiana) e professor de química na universidade, ambos eram membros de uma Igreja dos Irmãos Unidos. O casal foi extremamente carinhoso e cuidado conosco. Em menos de um mês tínhamos nosso apartamento, conhecíamos várias igrejas evangélicas e pastores. Iniciamos três grupos de estudos bíblicos durante a semana com estudantes universitários e secundaristas. Nosso objetivo era encorajá-los a darem um bom testemunho cristão e orarem por seus colegas e professores. Deus foi muito bom conosco, éramos jovens, imaturos e sem uma experiência intercultural. Mas mesmo assim os estudantes vinham, pastores nos convidavam para falar em suas igrejas, reuníamo-nos com outros obreiros dos GBU em outras cidades. Eu comecei a cursar algumas matérias na Escola de Aperfeiçoamento em Física e assim mantinha contato com estudantes em seu próprio ambiente. A Glacy fez algumas matérias como aluna ouvinte. Ficamos ali pouco mais de dois anos, retornando ao Brasil em dezembro de 1980. Um pouco frustrados: achamos que não houve fruto. Os números de nosso relatório eram baixos e nossa imaturidade e despreparo altos! Mas retornei à Itália em 1997, 2012 e 2018 e pude encontrar vários daqueles outrora estudantes engajados nas suas igrejas locais, na liderança de organizações cristãs. Não fomos os responsáveis diretos por isso, mas cremos que Deus nos usou para influenciá-los de alguma maneira.
Em janeiro 1981, voltei a trabalhar como engenheiro na mesma empresa de antes, é como se Deus tivesse guardado a minha vaga enquanto estávamos na Itália.
No ano seguinte nasceu nossa primeira filha, Elena, e dois anos depois a nossa segunda filha Julia. Neste tempo a Igreja Batista do Prado Velho, que era a igreja original da Glacy, tinha uma boa estrutura para crianças, assim deixamos a Igreja Presbiteriana de Silva Jardim e fomos para ela. Fizemos muito amigos, exercemos um ministério ativo de ensino, crescemos na vida comunitária e somos gratos a Deus por aqueles anos ali.
Em 1985, iniciei um novo trabalho em São Paulo, fomos morar no bairro Perdizes e começamos a frequentar a Igreja Batista do Morumbi. Lembramos com carinho da forma como fomos recebidos pelo pastor Ary Velloso. Naquela igreja, reencontramos com o meu colega da engenharia Frederico Cruz e a esposa Pérola, conhecemos o Paulo Moreira, Lisânias Moura, Daniel Lima, Paulo Andrade e Dora, Oscar Zanquetta e Débora e tantos outros que não imaginam as marcas que deixaram nas nossas vidas e na vida da nossa família.
Em São Paulo, devido à dinâmica da cidade, e a dinâmica da família, frequentamos diversas igrejas. Participamos por vários anos do Projeto Raízes, uma experiência única, uma igreja com jovens casais e muitas crianças onde fomos muito apoiados e suportados em amor. Temos muita gratidão a Deus por aquele tempo. Foi no Raízes que conhecemos aquele que se tornou meu melhor amigo (o irmão que não tive), Valdir Martins Joaquim, a esposa Diva e as filhas Virginia e Carolina. Ainda nos falamos todas as semanas e mantemos um relacionamento que é mais profundo que o de irmão.
Retornamos à Igreja Batista do Morumbi por mais quatro ou cinco anos e, em 2002, passamos a frequentar a Igreja Batista da Água Branca (IBAB). Outra experiência rica e transformadora para todos nós. O pastor Ed René Kivitz e a equipe nos receberam muito bem, desenvolvemos amizades que são para a vida. E por estarmos na IBAB, foram os pastores Ed René e Ariovaldo Ramos que oficiaram os casamentos de nossas duas filhas.
Quando voltamos para São Paulo, pude dedicar-me a aprofundar meus estudos: fiz ma pós graduação em finanças, outra graduação em direito, uma pós-graduação em direito constitucional, e um mestrado em ciências da religião, completado em 2008.
Em 1997 fui trabalhar na Siemens, uma grande empresa global, e pude viajar a trabalho para conhecer a operação da empresa na Alemanha, EUA, Argentina, Chile, Itália, e da posição inicial em vendas migrei para a área de recursos humanos, com a qual muito me identifiquei.
Ao mesmo tempo, comecei a desenvolver uma carreira paralela no ensino superior na FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado), FIAP (Faculdade de Informática e Administração Paulista) e ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).
No início dos anos 2000, minhas filhas com os esposos emigraram para a Austrália, onde se estabeleceram. Em 2012, em uma fase de pré-aposentadoria, Glacy e eu também nos mudamos para o país.
Na Austrália, fazemos parte de uma igreja pentecostal (Life Christian Centre), onde servimos com toda a família. Eu continuo no meu ministério de ensino. A esta altura temos três netos que nos dão muita alegria.
Esta é a minha vida. Uma colcha de retalhos de influências que recebemos de amigos e igrejas. Cada pedacinho de mim reflete algum aspecto da vida destes muitos que citei ao longo desta enfadonha narrativa. “A quem honra, honra”.
Um carreira contendo muitas carreiras. Uma estrada com muitos desvios em que pude aprender a gostar de coisas diferentes e apreciar outros saberes que não faziam parte da minha formação.
Em tudo posso encontrar a fidelidade de Deus, e agora aposentado e descobrindo outras coisas neste país distante, nos anos que me restam, aprendi a agradecer a Deus pela minha vida e família. Viver mais lentamente, contemplar mais, ler mais, descansar mais e estar atento às oportunidades de servir.
Versão ampliada do artigo Uma crônica da minha vida, publicado na edição 407 de Ultimato.
- Tácito L. Maranhão Pinto, bacharel em Engenharia Eletrônica e em Direito com Pós-Graduação em Direito Constitucional. Bacharel l. Mestre em Ciências da Religião. Autor do livro "O Mandado de Injunção: Trajetória de um Instituto". Atuou como Executivo de várias empresas nacionais e multinacionais (Schause, Maxitec, Mangels, Siemens, Rede Energia). Atuou como Consultor em Comportamento Organizacional, realizando serviços e treinamento no Brasil, Argentina, México e Costa Rica. Foi docente das disciplinas de Gestão de Pessoas, Ética Empresarial e Estratégia em cursos de Pós-Graduação na FAAP e FIAP. Foi missionário na Itália com a Aliança Bíblica Universitária Internacional. É Executive Coach certificado. Foi docente internacional e nacional do Haggai. Desde 2012 reside na Austrália, juntamente com a esposa, Glacy, as duas filhas, genros e netos. É voluntário em um Residential Care Centre. Nos últimos anos recebeu seu Diploma Avançado em Ministério Cristão. É membro da Life Christian Centre (Igreja Local) onde tem exercido seu ministério de ensino e treinamento.
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O avanço da tecnologia nas últimas décadas é maior do que em qualquer outra época da história. Tal aumento se dá em muitas frentes e, mais significativo, confere um caráter tecnológico à vida contemporânea.
Quais são os desafios trazidos por esse avanço? A ética cristã é suficiente para responder aos aspectos relacionados às novas tecnologias? Como a igreja pode atuar nesse cenário tão desafiador?
É disso que trata a matéria de capa da edição 407 da revista Ultimato. Para assinar, clique aqui.
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