Opinião
- 16 de fevereiro de 2022
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Treze possíveis respostas ao movimento missionário moderno
Por Rafael Zulato Lanfraff e Fernanda Schimenes
O livro A Missão da Igreja Hoje é fruto de um curso de introdução à missiologia ministrado pelo autor por 25 anos. O conteúdo teve forte influência da obra Missão Transformadora de David Bosch. De acordo com Goheen, a obra é uma tentativa de produzir um material mais breve e de mais fácil compreensão, porém contemplando todos os tópicos propostos por Bosch. No Brasil, foi publicado pela Editora Ultimato em parceria com o Martureo e o Seminário Teológico Servo de Cristo em 2019.
Além da introdução, o livro tem três partes:
1. Reflexão bíblica e teológica sobre missão;
2. Reflexão história e contemporânea sobre missão;
3. Temas atuais na missão hoje.
Confira aqui o resumo da introdução e da primeira parte da obra e, a seguir, o da segunda parte.
Parte 2 – Reflexão histórica e contemporânea sobre missão
Capítulo 3 – Paradigmas históricos da missão
Primeiro é necessário diferenciar missão de missões:
• Missões diz respeito ao impacto da igreja no mundo não cristão avançando até culturas que não receberam ainda o evangelho; algo relacionado à ida em direção ao estrangeiro.
• Missão é toda a vida da igreja testemunhando o evangelho integral no mundo todo.
Dessa forma, a história da missão se caracteriza não pela expansão do cristianismo de uma localização e cultura para outra localização e cultura (e a maior parte da literatura trata de histórias contadas sobre as missões), mas pela observação de como houve uma difusão cultural do evangelho, ou seja, como a igreja cumpriu a sua missão dentro da cultura em que ela está inserida. Obviamente a expansão do evangelho ainda é algo significativo e central na história da missão, contudo, não deve ser confundida com a história da missão em si.
Goheen propõe, então, outra maneira de identificar o desenvolvimento histórico da missão: atentando-se aos paradigmas. Paradigma seria uma forma de compreender e praticar a missão em determinado contexto histórico. Desse modo, em cada momento da história eventos importantes causaram uma mudança sísmica, a partir da qual a igreja teve de rever a sua compreensão de si mesma e da sua missão e se adaptar na história. São essas mudanças de paradigma que orientam tal desenvolvimento histórico. Uma das formas de contar a história da missão – de Andrew Walls e Samuel Escobar – é a seguinte: (1) judaica (uma igreja judaica em missão), (2) helenístico-romana, (3) bárbara, (4) europeia ocidental, (5) Europa em expansão e recessão cristã e (6) transmissão intercultural (mudança do cristianismo para o sul). Após apresentar diversas formas de dividir a história da missão por meio de paradigmas, o autor decide por utilizar um modelo baseado em quatro paradigmas:
1. da igreja primitiva;
2. da cristandade;
3. do iluminismo;
4. o paradigma ecumênico.
Capítulo 4 – Um paradigma ecumênico emergente da missão
A partir da ideia de um cristianismo que abrange todo o mundo e todas as culturas, que questões precisariam ser levadas em consideração diante dessas mudanças? Goheen, como David Bosch em Missão Transformadora, desenvolve possíveis respostas ao movimento missionário moderno (novo paradigma ecumênico).
1. Missão em todos os seis continentes, para todos eles e de todos eles em resposta à missão unidirecional.
2. Missiologia da cultura ocidental como resposta à missão exclusivamente intercultural – Não leva em conta apenas as missões interculturais, mas o impacto do evangelho dentro de uma cultura.
3. Eclesiologia missionária como resposta à separação de missão e igreja.
4. Contextualização como resposta a um evangelho exclusivamente ocidental – Como se dá a incorporação fiel do evangelho em cada cultura? Como pode haver um só evangelho e, ainda assim, muitas expressões culturais fiéis?
5. Missio Dei como resposta à missão antropocêntrica.
6. Libertação com resposta ao desenvolvimento (imposto e baseado em estruturas injustas).
7. Missão na fraqueza e no sofrimento como uma resposta à missão que vem da força (de uma “cultura superior”).
8. Missões como parceria em resposta a missões como tarefa da igreja ocidental.
9. Salvação holística como resposta à salvação espiritualizada ou humanista.
10. Unidade como resposta à proliferação de tradições denominacionais – Um ecumenismo mais amplo ofuscaria a centralidade de Cristo? Qual a possibilidade de uma unidade autêntica, verdadeiramente bíblica? As instituições denominacionais podem transcender sua autopreservação?
11. Teologia das religiões como resposta à superioridade do cristianismo ocidental – A realidade destes últimos séculos mostra que o cristianismo tem se deparado com as outras religiões do mundo graças à globalização. As demais religiões não minguaram (como alguns previam), encontraram novos adeptos e cresceram em todas as partes do mundo, fazendo-se necessário um olhar para as Escrituras de como o cristianismo deve lidar com as demais religiões.
12. Missão urbana global em vez de missões em aldeias do terceiro mundo.
13. Missão pentecostal como um complemento à missão católica e protestante.
Goheen encerra o capítulo analisando brevemente cinco tradições missionárias e teológicas.
1. Tradição ecumênica protestante
• É representada institucionalmente pelo Conselho Mundial de Igrejas (WCC, sigla em inglês) e sua vertente missionária é a Comissão de Missão Mundial e Evangelismo (CWME, sigla em inglês).
• Estreita conexão entre missão e unidade.
• Atenção cuidadosa às questões contemporâneas: globalização, pós-modernidade e pluralismo.
• Desejo de ser relevante pode levar à assimilação dos ídolos contemporâneos?
• Alguns acreditam que a preocupação com o social tenha ofuscado o evangelismo.
• O mundo define a agenda da igreja?
2. Tradição evangélica protestante
• Saiu do Concílio Missionário Internacional (IMC) quando ele se juntou ao WCC em 1961.
• Congresso Internacional de Evangelização Mundial (1974, Lausanne, Suíça) – evento decisivo – Pacto de Lausanne.
• Evangelismo tem prioridade sobre a preocupação social.
• Desejo de localizar e alcançar os chamados povos não alcançados (PNAs).
• Dimensões cósmica e coletiva do evangelho podem ser negligenciadas?
• Medo do sincretismo (tradição conciliar/ecumênica) reforça formas mais antigas de ortodoxia.
3. Tradição católica romana
• Concílio Vaticano II (1962-1965) foi um divisor de águas – uma série de novos documentos emergiram, como o Decreto da Atividade Missionária da Igreja (AG; Ad Gentes ou “Às Nações” [1965]).
• Teologia contemporânea gira em torno de uma série de temas: missão trinitária, proclamação, libertação, diálogo, inculturação, missão holística e missão para a cultura moderna.
• Inculturação – criticar a cultura, mas também se apropriar de seus bons elementos.
• Atividade missionária é assunto de todos os cristãos.
• Diálogo inter-religioso.
• Re-evangelização ou nova evangelização da igreja na cultura ocidental (nominais).
• Rica crítica à cultura ocidental moderna: secularização, pluralismo, globalização e consumismo.
4. Tradição ortodoxa oriental
• Igrejas ocidentais têm a visão de que os ortodoxos se retiraram do engajamento missional – consequência do proselitismo “forçado” católico e protestante, de terem vivido sob regimes opressivos (comunismo ateu e regimes islâmicos)?
• Desde 1950, interesse missional renovado: envolvimento com o WCC e com a CWME.
• Missão nasce do amor de Deus pelo mundo.
• Ênfase na encarnação e na ressurreição.
• Para alguns da tradição ortodoxa, é especialmente na unidade da igreja que a tradição ortodoxa vê sua missão (rompimento em 1054) – desunião é escândalo e obstáculo.
• Testemunho por meio da incorporação da mensagem que proclama e por meio da liturgia (abordagem individualista ofusca dimensões cósmica e escatológica do reino).
5. Tradição pentecostal
• Pentecostais representam mais de 25% de todos os cristãos e pouco menos de 10% de toda população mundial (e continuam crescendo).
• Crítica às teologias orientadas ao ocidente moldadas pelo Iluminismo – Corretivo para as tradições clássicas da fé cristã?
• Temas importantes da missão pentecostal: proclamação, urgência escatológica e Espírito Santo (ES).
• O ES prepara a igreja para o evangelismo mundial.
• Falta de uma teologia robusta: missões mais “traduzidas em ação” que “codificadas”.
• Desafia também o naturalismo: necessidade de confrontar as forças sobrenaturais destrutivas que se opõem à iniciativa missionária.
• Mais urbana que rural, mais feminina que masculina, mais do Sul global (66%), mais empobrecida (87%) que abastada: não tem os desafios de estar no status quo.
• Culto exuberante e participativo, adoração entusiástica.
Capítulo 5 – Uma análise da igreja global
Goheen analisa a igreja cristã global com o objetivo de entender os problemas que enfrenta em sua missão nas várias partes do mundo.
Alguns dados iniciais a seguir.
Dados de 2015 do Pew Research Center.
Segundo consta no livro, dos que se declaram cristãos:
• 1,2 bilhão são católicos romanos;
• 500 milhões são protestantes;
• 360 milhões são “independentes” (“pentecostais” não ocidentais cuja diversidade dificulta a caracterização);
• 280 milhões são ortodoxos;
• 90 milhões são anglicanos.
A mudança mais notável que ocorreu na igreja é que hoje ela é majoritariamente do Sul global: a maioria dos cristãos não é branca, nem europeia, nem euramericana. Entender a crescente igreja no Sul é importante porque ela proverá liderança para a igreja global do século 21.
África subsaariana
• Cristãos representavam 10% da população em 2010 e hoje são mais de 60%, quase meio bilhão de pessoas.
• Crescimento das igrejas pentecostais e das Igrejas Nativas Africanas (AICs, sigla em inglês): há talvez mais de 10 mil delas reunindo mais de um terço dos cristãos africanos.
• AICs: revelações diretas, cura, ênfase no poder espiritual. Tudo isso provoca muitas opiniões diferentes. Seriam uma expressão contextualizada do cristianismo na cultura africana?
• Apesar do aumento de teologias contextuais africanas e teólogos africanos bem-preparados, são necessárias uma contextualização autêntica e uma teologia africana fiel, além de formação teológica consistente.
• Há ainda muitos povos não alcançados na maioria dos países.
• Necessidade de unidade, pois há mais de 15 mil denominações.
• Casos de Aids (5% da população africana é soropositiva), pobreza, corrupção, estruturas globais injustas, aumento das favelas – O que a igreja deve fazer diante disso?
• Outro problema diz respeito à violência fruto do passado tribal e do conflito com o islã.
Ásia
• Havia cerca de 22 milhões de cristãos em 1900 e hoje já mais de 360 milhões (cerca de 8% da população).
• Crescimento da igreja na China, na Coreia do Sul (nação não ocidental que envia mais missionários interculturais), nas Filipinas (população é mais de 90% cristã) e até mesmo em Bangladesh, no Cambodja e no Vietnã.
Dentre os principais desafios:
• Enorme população e ainda o pequeno percentual de cristãos.
• Três maiores religiões não cristãs estão enraizadas na Ásia: pluralismo religioso demanda um diálogo inter-religioso.
• Cerca de 75% dos grupos de PNAs estão na Ásia.
• 7 das 10 maiores cidades do mundo e mais de 200 megacidades.
• No sul da Ásia, 60% da população vive em favelas.
• Tráfico de drogas, tráfico humano e comércio sexual.
América Latina
• Dois grandes grupos: católicos romanos e evangélicos (protestantes tradicionais, evangélicos e pentecostais).
Católicos romanos:
• São maioria apesar de o número dos que se declaram católicos ter diminuído de 80% para 67% entre 1995 a 2014 (segundo o instituto Latinobarómetro), porém muitos não frequentam a igreja.
• Vaticano II serviu como base para a Teologia da Libertação.
• Renovação carismática na década de 1970, crescimento do número de comunidades eclesiais de base (CEBs).
Evangélicos:
• Crescimento significativo nas últimas décadas, especialmente dos pentecostais: evangélicos somam mais de 90 milhões (17% da população da América Latina).
• Influência da Teologia da Prosperidade.
• Discipulado inadequado e formação inconsistente de boa parte da liderança.
• Influência na política.
Alguns desafios da igreja latino-americana:
• Estruturas econômicas, políticas e sociais injustas.
• Necessidade de uma unidade eclesial.
• Líderes bem treinados.
• Necessidade de uma compreensão aprofundada da relação do evangelho e da vida pública.
O Oriente Médio e o Norte da África
• Berço do cristianismo, a partir do século 7 a região se tornou o principal palco do islamismo. Hoje, a região tem apenas cerca de 18 milhões de cristãos (1% da comunidade cristã global) dispersos entre 330 milhões de muçulmanos. (Confira aqui a situação dos cristãos na Palestina atual.)
• Os oito países da OPEP praticamente não têm cristãos nativos, por exemplo.
• Predomínio do cristianismo ortodoxo (mais de 80%).
• Ambiente de hostilidade e perseguição aos cristãos.
Pacífico
• 3 grandes regiões (Melanésia, Micronésia e Polinésia) abrangem milhares de ilhas com 34 milhões de pessoas e são praticamente ignoradas nas discussões sobre o cristianismo global atual.
• Esforço missionário no século 19 por católicos e protestantes: hoje, 90% dos ilhéus identificam-se como cristãos.
• Aceitar o evangelho significa abraçar um novo centro religioso para a vida coletiva.
• Falta de profundidade de contextualização e discipulado (nominalismo): não se trata de substituir a cultura tribal e a religião primitiva por uma versão europeia da fé cristã.
• Futuro bastante incerto.
Leste europeu
• Impossível tratar dessa região sem abordar o período comunista uma vez que o Leste Europeu viveu 3 fases recentemente: (1) Estado em favor da igreja cristã dando-lhe posição instituída, (2) Estado hostil à fé cristã (época comunista) e (3) igreja em uma cultura que ignora a fé cristã ao mesmo tempo que permite que ela floresça no âmbito privado (hoje).
• Necessidade de cura entre aqueles que colaboraram e os que não (e com isso sofreram) com o regime.
• Apesar do aumento do número de cristãos, em muitas partes do Leste Europeu as igrejas estão tentando reafirmar o poder que detinham antes da era comunista: sinfonia (termo ortodoxo que designa relação ideal entre igreja e Estado).
• Perigo de uma identificação mais com ideias nacionalistas do que com ideias do reino de Deus.
O Oeste (Europa, América do Norte, Austrália e Nova Zelândia)
• “A igreja na Europa está ‘magra, mas viva’” – Igreja em declínio, vulnerável ao espírito desta era.
• Maioria reivindica o título de cristã, mas poucos participam da comunhão da igreja (celebrações).
• Secularização do Ocidente com o Iluminismo (cosmovisão humanista) – encontro com a cultura deve ser profeticamente crítico.
• Nos Estados Unidos, parece haver, diferente do que na Europa, uma secularidade controlada: acomodação do evangelho ao humanismo secular, especialmente relegando-o às esferas individual e privada.
• Cristianismo em declínio da Nova Zelândia e na Austrália.
Outros problemas: crescente pluralismo religioso, marketing da religião, perda da geração mais jovem, cultura do consumo (de entretenimento, inclusive) que leva à apatia.
• Rafael Zulato Langraff é bacharel em Teologia com especializações em Sociologia e Filosofia, além de acumular formação na área musical. Professor em alguns seminários, também é escritor. Esse texto foi extraído e adaptado por Fernanda Schimenes (editora do Martureo) de um trabalho ele que realizou em cumprimento às exigências da disciplina Teologia de Missão do Master of Divinity (M.Div.) do Seminário Teológico Servo de Cristo.
Artigo originalmente publicado por Martureo.com. Reproduzido com permissão.
O livro A Missão da Igreja Hoje é fruto de um curso de introdução à missiologia ministrado pelo autor por 25 anos. O conteúdo teve forte influência da obra Missão Transformadora de David Bosch. De acordo com Goheen, a obra é uma tentativa de produzir um material mais breve e de mais fácil compreensão, porém contemplando todos os tópicos propostos por Bosch. No Brasil, foi publicado pela Editora Ultimato em parceria com o Martureo e o Seminário Teológico Servo de Cristo em 2019.
Além da introdução, o livro tem três partes:
1. Reflexão bíblica e teológica sobre missão;
2. Reflexão história e contemporânea sobre missão;
3. Temas atuais na missão hoje.
Confira aqui o resumo da introdução e da primeira parte da obra e, a seguir, o da segunda parte.
Parte 2 – Reflexão histórica e contemporânea sobre missão
Capítulo 3 – Paradigmas históricos da missão
Primeiro é necessário diferenciar missão de missões:
• Missões diz respeito ao impacto da igreja no mundo não cristão avançando até culturas que não receberam ainda o evangelho; algo relacionado à ida em direção ao estrangeiro.
• Missão é toda a vida da igreja testemunhando o evangelho integral no mundo todo.
Dessa forma, a história da missão se caracteriza não pela expansão do cristianismo de uma localização e cultura para outra localização e cultura (e a maior parte da literatura trata de histórias contadas sobre as missões), mas pela observação de como houve uma difusão cultural do evangelho, ou seja, como a igreja cumpriu a sua missão dentro da cultura em que ela está inserida. Obviamente a expansão do evangelho ainda é algo significativo e central na história da missão, contudo, não deve ser confundida com a história da missão em si.
Goheen propõe, então, outra maneira de identificar o desenvolvimento histórico da missão: atentando-se aos paradigmas. Paradigma seria uma forma de compreender e praticar a missão em determinado contexto histórico. Desse modo, em cada momento da história eventos importantes causaram uma mudança sísmica, a partir da qual a igreja teve de rever a sua compreensão de si mesma e da sua missão e se adaptar na história. São essas mudanças de paradigma que orientam tal desenvolvimento histórico. Uma das formas de contar a história da missão – de Andrew Walls e Samuel Escobar – é a seguinte: (1) judaica (uma igreja judaica em missão), (2) helenístico-romana, (3) bárbara, (4) europeia ocidental, (5) Europa em expansão e recessão cristã e (6) transmissão intercultural (mudança do cristianismo para o sul). Após apresentar diversas formas de dividir a história da missão por meio de paradigmas, o autor decide por utilizar um modelo baseado em quatro paradigmas:
1. da igreja primitiva;
2. da cristandade;
3. do iluminismo;
4. o paradigma ecumênico.
Capítulo 4 – Um paradigma ecumênico emergente da missão
A partir da ideia de um cristianismo que abrange todo o mundo e todas as culturas, que questões precisariam ser levadas em consideração diante dessas mudanças? Goheen, como David Bosch em Missão Transformadora, desenvolve possíveis respostas ao movimento missionário moderno (novo paradigma ecumênico).
1. Missão em todos os seis continentes, para todos eles e de todos eles em resposta à missão unidirecional.
2. Missiologia da cultura ocidental como resposta à missão exclusivamente intercultural – Não leva em conta apenas as missões interculturais, mas o impacto do evangelho dentro de uma cultura.
3. Eclesiologia missionária como resposta à separação de missão e igreja.
4. Contextualização como resposta a um evangelho exclusivamente ocidental – Como se dá a incorporação fiel do evangelho em cada cultura? Como pode haver um só evangelho e, ainda assim, muitas expressões culturais fiéis?
5. Missio Dei como resposta à missão antropocêntrica.
6. Libertação com resposta ao desenvolvimento (imposto e baseado em estruturas injustas).
7. Missão na fraqueza e no sofrimento como uma resposta à missão que vem da força (de uma “cultura superior”).
8. Missões como parceria em resposta a missões como tarefa da igreja ocidental.
9. Salvação holística como resposta à salvação espiritualizada ou humanista.
10. Unidade como resposta à proliferação de tradições denominacionais – Um ecumenismo mais amplo ofuscaria a centralidade de Cristo? Qual a possibilidade de uma unidade autêntica, verdadeiramente bíblica? As instituições denominacionais podem transcender sua autopreservação?
11. Teologia das religiões como resposta à superioridade do cristianismo ocidental – A realidade destes últimos séculos mostra que o cristianismo tem se deparado com as outras religiões do mundo graças à globalização. As demais religiões não minguaram (como alguns previam), encontraram novos adeptos e cresceram em todas as partes do mundo, fazendo-se necessário um olhar para as Escrituras de como o cristianismo deve lidar com as demais religiões.
12. Missão urbana global em vez de missões em aldeias do terceiro mundo.
13. Missão pentecostal como um complemento à missão católica e protestante.
Goheen encerra o capítulo analisando brevemente cinco tradições missionárias e teológicas.
1. Tradição ecumênica protestante
• É representada institucionalmente pelo Conselho Mundial de Igrejas (WCC, sigla em inglês) e sua vertente missionária é a Comissão de Missão Mundial e Evangelismo (CWME, sigla em inglês).
• Estreita conexão entre missão e unidade.
• Atenção cuidadosa às questões contemporâneas: globalização, pós-modernidade e pluralismo.
• Desejo de ser relevante pode levar à assimilação dos ídolos contemporâneos?
• Alguns acreditam que a preocupação com o social tenha ofuscado o evangelismo.
• O mundo define a agenda da igreja?
2. Tradição evangélica protestante
• Saiu do Concílio Missionário Internacional (IMC) quando ele se juntou ao WCC em 1961.
• Congresso Internacional de Evangelização Mundial (1974, Lausanne, Suíça) – evento decisivo – Pacto de Lausanne.
• Evangelismo tem prioridade sobre a preocupação social.
• Desejo de localizar e alcançar os chamados povos não alcançados (PNAs).
• Dimensões cósmica e coletiva do evangelho podem ser negligenciadas?
• Medo do sincretismo (tradição conciliar/ecumênica) reforça formas mais antigas de ortodoxia.
3. Tradição católica romana
• Concílio Vaticano II (1962-1965) foi um divisor de águas – uma série de novos documentos emergiram, como o Decreto da Atividade Missionária da Igreja (AG; Ad Gentes ou “Às Nações” [1965]).
• Teologia contemporânea gira em torno de uma série de temas: missão trinitária, proclamação, libertação, diálogo, inculturação, missão holística e missão para a cultura moderna.
• Inculturação – criticar a cultura, mas também se apropriar de seus bons elementos.
• Atividade missionária é assunto de todos os cristãos.
• Diálogo inter-religioso.
• Re-evangelização ou nova evangelização da igreja na cultura ocidental (nominais).
• Rica crítica à cultura ocidental moderna: secularização, pluralismo, globalização e consumismo.
4. Tradição ortodoxa oriental
• Igrejas ocidentais têm a visão de que os ortodoxos se retiraram do engajamento missional – consequência do proselitismo “forçado” católico e protestante, de terem vivido sob regimes opressivos (comunismo ateu e regimes islâmicos)?
• Desde 1950, interesse missional renovado: envolvimento com o WCC e com a CWME.
• Missão nasce do amor de Deus pelo mundo.
• Ênfase na encarnação e na ressurreição.
• Para alguns da tradição ortodoxa, é especialmente na unidade da igreja que a tradição ortodoxa vê sua missão (rompimento em 1054) – desunião é escândalo e obstáculo.
• Testemunho por meio da incorporação da mensagem que proclama e por meio da liturgia (abordagem individualista ofusca dimensões cósmica e escatológica do reino).
5. Tradição pentecostal
• Pentecostais representam mais de 25% de todos os cristãos e pouco menos de 10% de toda população mundial (e continuam crescendo).
• Crítica às teologias orientadas ao ocidente moldadas pelo Iluminismo – Corretivo para as tradições clássicas da fé cristã?
• Temas importantes da missão pentecostal: proclamação, urgência escatológica e Espírito Santo (ES).
• O ES prepara a igreja para o evangelismo mundial.
• Falta de uma teologia robusta: missões mais “traduzidas em ação” que “codificadas”.
• Desafia também o naturalismo: necessidade de confrontar as forças sobrenaturais destrutivas que se opõem à iniciativa missionária.
• Mais urbana que rural, mais feminina que masculina, mais do Sul global (66%), mais empobrecida (87%) que abastada: não tem os desafios de estar no status quo.
• Culto exuberante e participativo, adoração entusiástica.
Capítulo 5 – Uma análise da igreja global
Goheen analisa a igreja cristã global com o objetivo de entender os problemas que enfrenta em sua missão nas várias partes do mundo.
Alguns dados iniciais a seguir.
Dados de 2015 do Pew Research Center.
Segundo consta no livro, dos que se declaram cristãos:
• 1,2 bilhão são católicos romanos;
• 500 milhões são protestantes;
• 360 milhões são “independentes” (“pentecostais” não ocidentais cuja diversidade dificulta a caracterização);
• 280 milhões são ortodoxos;
• 90 milhões são anglicanos.
A mudança mais notável que ocorreu na igreja é que hoje ela é majoritariamente do Sul global: a maioria dos cristãos não é branca, nem europeia, nem euramericana. Entender a crescente igreja no Sul é importante porque ela proverá liderança para a igreja global do século 21.
África subsaariana
• Cristãos representavam 10% da população em 2010 e hoje são mais de 60%, quase meio bilhão de pessoas.
• Crescimento das igrejas pentecostais e das Igrejas Nativas Africanas (AICs, sigla em inglês): há talvez mais de 10 mil delas reunindo mais de um terço dos cristãos africanos.
• AICs: revelações diretas, cura, ênfase no poder espiritual. Tudo isso provoca muitas opiniões diferentes. Seriam uma expressão contextualizada do cristianismo na cultura africana?
• Apesar do aumento de teologias contextuais africanas e teólogos africanos bem-preparados, são necessárias uma contextualização autêntica e uma teologia africana fiel, além de formação teológica consistente.
• Há ainda muitos povos não alcançados na maioria dos países.
• Necessidade de unidade, pois há mais de 15 mil denominações.
• Casos de Aids (5% da população africana é soropositiva), pobreza, corrupção, estruturas globais injustas, aumento das favelas – O que a igreja deve fazer diante disso?
• Outro problema diz respeito à violência fruto do passado tribal e do conflito com o islã.
Ásia
• Havia cerca de 22 milhões de cristãos em 1900 e hoje já mais de 360 milhões (cerca de 8% da população).
• Crescimento da igreja na China, na Coreia do Sul (nação não ocidental que envia mais missionários interculturais), nas Filipinas (população é mais de 90% cristã) e até mesmo em Bangladesh, no Cambodja e no Vietnã.
Dentre os principais desafios:
• Enorme população e ainda o pequeno percentual de cristãos.
• Três maiores religiões não cristãs estão enraizadas na Ásia: pluralismo religioso demanda um diálogo inter-religioso.
• Cerca de 75% dos grupos de PNAs estão na Ásia.
• 7 das 10 maiores cidades do mundo e mais de 200 megacidades.
• No sul da Ásia, 60% da população vive em favelas.
• Tráfico de drogas, tráfico humano e comércio sexual.
América Latina
• Dois grandes grupos: católicos romanos e evangélicos (protestantes tradicionais, evangélicos e pentecostais).
Católicos romanos:
• São maioria apesar de o número dos que se declaram católicos ter diminuído de 80% para 67% entre 1995 a 2014 (segundo o instituto Latinobarómetro), porém muitos não frequentam a igreja.
• Vaticano II serviu como base para a Teologia da Libertação.
• Renovação carismática na década de 1970, crescimento do número de comunidades eclesiais de base (CEBs).
Evangélicos:
• Crescimento significativo nas últimas décadas, especialmente dos pentecostais: evangélicos somam mais de 90 milhões (17% da população da América Latina).
• Influência da Teologia da Prosperidade.
• Discipulado inadequado e formação inconsistente de boa parte da liderança.
• Influência na política.
Alguns desafios da igreja latino-americana:
• Estruturas econômicas, políticas e sociais injustas.
• Necessidade de uma unidade eclesial.
• Líderes bem treinados.
• Necessidade de uma compreensão aprofundada da relação do evangelho e da vida pública.
O Oriente Médio e o Norte da África
• Berço do cristianismo, a partir do século 7 a região se tornou o principal palco do islamismo. Hoje, a região tem apenas cerca de 18 milhões de cristãos (1% da comunidade cristã global) dispersos entre 330 milhões de muçulmanos. (Confira aqui a situação dos cristãos na Palestina atual.)
• Os oito países da OPEP praticamente não têm cristãos nativos, por exemplo.
• Predomínio do cristianismo ortodoxo (mais de 80%).
• Ambiente de hostilidade e perseguição aos cristãos.
Pacífico
• 3 grandes regiões (Melanésia, Micronésia e Polinésia) abrangem milhares de ilhas com 34 milhões de pessoas e são praticamente ignoradas nas discussões sobre o cristianismo global atual.
• Esforço missionário no século 19 por católicos e protestantes: hoje, 90% dos ilhéus identificam-se como cristãos.
• Aceitar o evangelho significa abraçar um novo centro religioso para a vida coletiva.
• Falta de profundidade de contextualização e discipulado (nominalismo): não se trata de substituir a cultura tribal e a religião primitiva por uma versão europeia da fé cristã.
• Futuro bastante incerto.
Leste europeu
• Impossível tratar dessa região sem abordar o período comunista uma vez que o Leste Europeu viveu 3 fases recentemente: (1) Estado em favor da igreja cristã dando-lhe posição instituída, (2) Estado hostil à fé cristã (época comunista) e (3) igreja em uma cultura que ignora a fé cristã ao mesmo tempo que permite que ela floresça no âmbito privado (hoje).
• Necessidade de cura entre aqueles que colaboraram e os que não (e com isso sofreram) com o regime.
• Apesar do aumento do número de cristãos, em muitas partes do Leste Europeu as igrejas estão tentando reafirmar o poder que detinham antes da era comunista: sinfonia (termo ortodoxo que designa relação ideal entre igreja e Estado).
• Perigo de uma identificação mais com ideias nacionalistas do que com ideias do reino de Deus.
O Oeste (Europa, América do Norte, Austrália e Nova Zelândia)
• “A igreja na Europa está ‘magra, mas viva’” – Igreja em declínio, vulnerável ao espírito desta era.
• Maioria reivindica o título de cristã, mas poucos participam da comunhão da igreja (celebrações).
• Secularização do Ocidente com o Iluminismo (cosmovisão humanista) – encontro com a cultura deve ser profeticamente crítico.
• Nos Estados Unidos, parece haver, diferente do que na Europa, uma secularidade controlada: acomodação do evangelho ao humanismo secular, especialmente relegando-o às esferas individual e privada.
• Cristianismo em declínio da Nova Zelândia e na Austrália.
Outros problemas: crescente pluralismo religioso, marketing da religião, perda da geração mais jovem, cultura do consumo (de entretenimento, inclusive) que leva à apatia.
• Rafael Zulato Langraff é bacharel em Teologia com especializações em Sociologia e Filosofia, além de acumular formação na área musical. Professor em alguns seminários, também é escritor. Esse texto foi extraído e adaptado por Fernanda Schimenes (editora do Martureo) de um trabalho ele que realizou em cumprimento às exigências da disciplina Teologia de Missão do Master of Divinity (M.Div.) do Seminário Teológico Servo de Cristo.
Artigo originalmente publicado por Martureo.com. Reproduzido com permissão.
- 16 de fevereiro de 2022
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