Opinião
- 18 de julho de 2008
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Teístas confessionais, niilistas relacionais
Rodrigo de Lima Ferreira
Gosto de filosofia. Entendo a filosofia como uma espécie de irmã da teologia, que pode, e muito, auxiliar o trabalho intelectual de um pastor. Não sei se por força de minha leitura atual, que trata do fenômeno das cosmovisões, mas estou tentando entender o que se passa ao nosso redor a partir de uma visão filosófico-paradigmática.
Cosmovisão é a maneira como enxergamos o mundo, Deus, nossa relação com ele e com o que nos cerca. Não se trata necessariamente de fé (apesar de a fé exercer grandíssima influência), e sim de como aprendemos e apreendemos o que nos cerca. Por exemplo, como cristãos entendemos que a realidade não pode ser limitada apenas ao que podemos apreender com nossos sentidos, mas que tal realidade também é composta de algo que vai além de nossa compreensão. Em outras palavras, entendemos que o mundo material e o mundo imaterial são dois lados de um mesmo sistema. Portanto, assim como judeus e muçulmanos, somos teístas, pois entendemos o universo como um sistema aberto, onde Deus interfere na história.
Mas não há apenas a cosmovisão teísta. Derivada do naturalismo, que é a cosmovisão até a bem pouco tempo reinante (está sendo, aos poucos, desbancada pela cosmovisão pós-moderna), existe a cosmovisão niilista. À semelhança do naturalismo, o niilismo afirma que o universo é um sistema fechado, onde não existe Deus. Mas o niilismo deu um passo avante no seu desespero, pois, uma vez que não há Deus, não há fonte de valor e dignidade do homem. A realidade, na verdade, é uma máquina onde tudo está encaixado rumo ao seu final. Portanto, o homem nada mais é do que um parafuso dessa engrenagem. Até mesmo sua liberdade é uma ilusão, fazendo parte dessa máquina, que olha para si mesma. Portanto, uma vez que o universo é uma máquina, e somos parte dela, não há razão para viver, a não ser para se angustiar e buscar o escape da angústia. Mas como fugir da angústia, se mesmo o desejo pela liberdade faz parte dessa grande máquina? Se a pós-modernidade pode ser classificada como a busca em um quarto escuro e de olhos vendados de um gato preto que lá não está, o niilismo pode ser classificado como a busca em um quarto escuro e de olhos vendados de um gato preto que até mesmo pode estar presente, mas cujo quarto não tem portas ou janelas para você sair, e que você não faz a mínima idéia de como entrou lá. Enfim, o niilismo é uma sinuca de bico.
No Brasil de hoje, sinto que, como evangélicos, estamos coxeando entre dois paradigmas, parafraseando o profeta Elias. Confessionalmente somos todos teístas. Ninguém (ainda) foi louco de negar que Deus age na história de hoje. Mesmo grupos aberrantes no seio evangélico afirmam a transcendência e a imanência do Senhor do universo. O grande problema não está na nossa confessionalidade, e sim no que fazemos na prática com ela. Confessamos o amor de Deus, mas nem sempre vemos esse amor em nossas ações cotidianas. Ignoramos o mendigo, a prostituta e o travesti em nome de uma persona social (“O que pensarão de mim se me virem aqui?” é o que muitos perguntam). Abandonamos o órfão e a viúva à própria sorte em nome da nova programação da igreja, que consumirá os recursos financeiros. Irmãos preciosos, mas que se encontram com dificuldades de diversas ordens, são deixados de lado. Classificamos, de pronto, pessoas com problemas emocionais como carnais, ou, de maneira ainda mais cruel, como endemoniados. Enfim, somos teístas confessionais, mas niilistas relacionais. Confessamos o Deus que interfere na história, mas nos relacionamos como se o universo fosse absurdo e angústia. Dessa maneira, não há como discordar do cantor Steve Camp, que em uma de suas canções disse: “Não lhes diga que Jesus os ama, até que você esteja pronto para amá-los também”.
A cura para isso se chama conversão. Precisamos converter nossas atitudes rumo à nossa confessionalidade. Ou, nas palavras do Senhor, “Seja, porém, o vosso falar: Sim, sim; não, não; pois o que passa daí, vem do Maligno” (Mt 5.37). Sejamos cristãos no falar, mas também no agir, no sentir, no relacionar. Que sejamos todos conhecidos, à semelhança da igreja em Atos, como gente que insiste em crer no amor de Deus e em amar uns aos outros, obedecendo ao exemplo do Senhor (At 2.42-47). Que o Senhor, que insiste em sua graça, tenha misericórdia de nós.
• Rodrigo de Lima Ferreira, casado, duas filhas, é pastor da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil desde 1997. Graduado em teologia e mestre em missões urbanas pela FTSA, hoje pastoreia a IPI de Serranópolis, GO.
Gosto de filosofia. Entendo a filosofia como uma espécie de irmã da teologia, que pode, e muito, auxiliar o trabalho intelectual de um pastor. Não sei se por força de minha leitura atual, que trata do fenômeno das cosmovisões, mas estou tentando entender o que se passa ao nosso redor a partir de uma visão filosófico-paradigmática.
Cosmovisão é a maneira como enxergamos o mundo, Deus, nossa relação com ele e com o que nos cerca. Não se trata necessariamente de fé (apesar de a fé exercer grandíssima influência), e sim de como aprendemos e apreendemos o que nos cerca. Por exemplo, como cristãos entendemos que a realidade não pode ser limitada apenas ao que podemos apreender com nossos sentidos, mas que tal realidade também é composta de algo que vai além de nossa compreensão. Em outras palavras, entendemos que o mundo material e o mundo imaterial são dois lados de um mesmo sistema. Portanto, assim como judeus e muçulmanos, somos teístas, pois entendemos o universo como um sistema aberto, onde Deus interfere na história.
Mas não há apenas a cosmovisão teísta. Derivada do naturalismo, que é a cosmovisão até a bem pouco tempo reinante (está sendo, aos poucos, desbancada pela cosmovisão pós-moderna), existe a cosmovisão niilista. À semelhança do naturalismo, o niilismo afirma que o universo é um sistema fechado, onde não existe Deus. Mas o niilismo deu um passo avante no seu desespero, pois, uma vez que não há Deus, não há fonte de valor e dignidade do homem. A realidade, na verdade, é uma máquina onde tudo está encaixado rumo ao seu final. Portanto, o homem nada mais é do que um parafuso dessa engrenagem. Até mesmo sua liberdade é uma ilusão, fazendo parte dessa máquina, que olha para si mesma. Portanto, uma vez que o universo é uma máquina, e somos parte dela, não há razão para viver, a não ser para se angustiar e buscar o escape da angústia. Mas como fugir da angústia, se mesmo o desejo pela liberdade faz parte dessa grande máquina? Se a pós-modernidade pode ser classificada como a busca em um quarto escuro e de olhos vendados de um gato preto que lá não está, o niilismo pode ser classificado como a busca em um quarto escuro e de olhos vendados de um gato preto que até mesmo pode estar presente, mas cujo quarto não tem portas ou janelas para você sair, e que você não faz a mínima idéia de como entrou lá. Enfim, o niilismo é uma sinuca de bico.
No Brasil de hoje, sinto que, como evangélicos, estamos coxeando entre dois paradigmas, parafraseando o profeta Elias. Confessionalmente somos todos teístas. Ninguém (ainda) foi louco de negar que Deus age na história de hoje. Mesmo grupos aberrantes no seio evangélico afirmam a transcendência e a imanência do Senhor do universo. O grande problema não está na nossa confessionalidade, e sim no que fazemos na prática com ela. Confessamos o amor de Deus, mas nem sempre vemos esse amor em nossas ações cotidianas. Ignoramos o mendigo, a prostituta e o travesti em nome de uma persona social (“O que pensarão de mim se me virem aqui?” é o que muitos perguntam). Abandonamos o órfão e a viúva à própria sorte em nome da nova programação da igreja, que consumirá os recursos financeiros. Irmãos preciosos, mas que se encontram com dificuldades de diversas ordens, são deixados de lado. Classificamos, de pronto, pessoas com problemas emocionais como carnais, ou, de maneira ainda mais cruel, como endemoniados. Enfim, somos teístas confessionais, mas niilistas relacionais. Confessamos o Deus que interfere na história, mas nos relacionamos como se o universo fosse absurdo e angústia. Dessa maneira, não há como discordar do cantor Steve Camp, que em uma de suas canções disse: “Não lhes diga que Jesus os ama, até que você esteja pronto para amá-los também”.
A cura para isso se chama conversão. Precisamos converter nossas atitudes rumo à nossa confessionalidade. Ou, nas palavras do Senhor, “Seja, porém, o vosso falar: Sim, sim; não, não; pois o que passa daí, vem do Maligno” (Mt 5.37). Sejamos cristãos no falar, mas também no agir, no sentir, no relacionar. Que sejamos todos conhecidos, à semelhança da igreja em Atos, como gente que insiste em crer no amor de Deus e em amar uns aos outros, obedecendo ao exemplo do Senhor (At 2.42-47). Que o Senhor, que insiste em sua graça, tenha misericórdia de nós.
• Rodrigo de Lima Ferreira, casado, duas filhas, é pastor da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil desde 1997. Graduado em teologia e mestre em missões urbanas pela FTSA, hoje pastoreia a IPI de Serranópolis, GO.
Casado, duas filhas, é pastor da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil desde 1997. Graduado em teologia e mestre em missões urbanas pela FTSA, é autor de "Princípios Esquecidos" (Editora AGBooks).
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