Opinião
- 03 de novembro de 2009
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Simonton: um pioneiro do Evangelho
Robinson Cavalcanti
Mochila nas Costas e Diário na Mão – a fascinante história de Ashbel Green Simonton, é o novo livro de autoria do Rev. Elben M. Lenz César, diretor da revista Ultimato, publicado dentro da programação comemorativa dos 150 anos do Presbiterianismo no Brasil. Esta obra é uma biografia do pioneiro daquele ramo reformado em nosso país, à base, principalmente, do seu diário. Na contracapa encontramos um bom resumo da vida de Simonton: “Ele organizou o primeiro jornal protestante da América do Sul (1864), a primeira escola paroquial (1866), o primeiro seminário (1867) e ordenou o primeiro pastor brasileiro (1865). Desembarcou no Rio de Janeiro em 1859 e morreu de febre amarela em São Paulo, aos 34 anos, em 1867. Uma vida breve, que mudou a história”.
Embora as igrejas protestantes de imigrantes (anglicanas e luteranas) já estivessem estabelecidas entre nós durante os períodos do Reino Unido e do Primeiro Reinado, é na segunda metade do século 19 (Segundo Reinado e Primeira República) que aportaram aqui os pioneiros do protestantismo de missão aos brasileiros, e em língua portuguesa:
1. Igreja Congregacional: Rev. Robert Reid Kalley – 1855;
2. Igreja Presbiteriana: Rev. Ashbel Green Simonton – 1859;
3. Igreja Metodista: Rev. Junius E. Newman – 1867;
4. Igreja Batista: Reverendos William Buck Bagby e Zacarias Clay Taylor;
5. Igreja Episcopal (Anglicana): Reverendos Lucien Lee Kinsolving (primeiro bispo) e James Watson Morris – 1890.
Esses cinco ramos reformados foram os únicos entre 1855 e 1909, conseguindo se expandir nacionalmente, sob as restrições legais da Constituição Imperial, de 1824, e sob a severa perseguição social durante o período republicano (após 1889). Há textos sobre esse primeiro período de cada igreja e de seus pioneiros. Um livro recomendado para a segunda metade do século 19 é o clássico “Protestantismo, Maçonaria e a Questão Religiosa no Brasil”, de David Gueiros Vieira.
A primeira metade do século 20 presenciou a expansão do protestantismo histórico, de suas igrejas e suas instituições, bem como a chegada do pentecostalismo e dos “corpos de santidade”. Vale destacar:
1. Congregação Cristã do Brasil: Louis Francescon – 1909;
2. Assembléia de Deus: Gunnar Vingren e Daniel Berg – 1910;
3. Exército da Salvação: David Miche – 1922;
4. Igreja do Evangelho Quadrangular: Harold Williams – 1946.
Essa é a época da criação da Associação das Escolas Bíblicas Dominicais e da Confederação Evangélica do Brasil (CEB). Um texto recomendado é “Protestantismo no Brasil”, de Emile Leonard. Há pesquisas sobre pioneiros regionais muito interessantes, como “A Bíblia e o Bisturi”, do Rev. Edjéce Martins, sobre os missionários médicos George Butler, pai e filho, que, a partir da pequena cidade de Canhotinho, PE, irradiaram o presbiterianismo pela região agreste desse estado. Uma análise sobre a missiologia evangelical e ecumênica é o trabalho de Luis Longuini Neto.
Essa história, tão rica, do protestantismo no Brasil, não se resume a nomes e datas, para a implantação de igrejas e instituições e a elaboração de um pensamento, a partir da herança de cada ramo reformado e de sua inserção em nossa cultura luso-afro-ameríndia.
A crise do protestantismo hoje passa pela ignorância e pela rejeição do legado do passado, bem como pela desvalorização da cultura nacional, o que concorre para a irrelevância e a não “inculturação”, a despeito do crescimento quantitativo. Seminários sem as disciplinas de cultura brasileira e teologia latino-americana, e líderes que não conhecem a nossa literatura, nem as clássicas obras interpretativas do Brasil, como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado, Florestan Fernandes e Raymundo Faoro, entre tantos outros, não nos conduzirão a lugar algum.
Embora haja um setor que procura resgatar e atualizar a história e a identidade evangélica em sua brasilidade, o presentismo e o anglosaxonismo (como novo “helenismo”) crescem em duas vertentes:
- a neo(pseudo)pentecostal da prosperidade e batalha espiritual;
- a macetista, das últimas novidades pragmáticas de origem forânea.
Seja a alienação com ênfase no mundo além túmulo e além história (escatologia), seja o sectarismo moralista, seja a criação de bolhas locais personalistas promotoras da salvação das almas mais educação moral e cívica pequeno-burguesa, estaremos naquela de uma estrada que leva do nada a coisa nenhuma.
Ler biografias como a de Simonton, e conhecer experiências regionais, que terminaram no estabelecimento de convenções, presbitérios, sínodos, dioceses, regiões, distritos ou qualquer outra nomenclatura, é saber que é possível fazer história, construir instituições e elaborar ideários. Tem sido assim por dois mil anos quando há convicção, identidade, compromisso e ética.
Daí a procura, nos doze anos passados, por implantar o episcopado e uma diocese anglicana no nordeste do Brasil. Não tinha nada de utopia. Era um projeto plenamente possível se os seus atores – como tantos outros no passado – tivessem agido de boa fé.
Reconhecer porque isso não ocorreu, e como poderia ter ocorrido, é imprescindível para que não venha outra vez a ocorrer. Para avançarmos para o futuro, deixando para trás o passado, não podemos varrer o mal para debaixo do tapete ou sermos paralisados por eternas “gratidões afetivas”. Temos que dar nomes aos bois, explicitando a tragédia dos pecados dos cismas, das heresias e dos projetos personalistas.
Se Simonton tivesse vivido a conjuntura dos anglicanos e “anglicanos” no Nordeste do Brasil nos anos recentes, sua história e o seu legado teriam sido bem diferentes.
Para construir a história é preciso aprender com ela, se queremos chegar a algum lugar.
• Dom Robinson Cavalcanti é bispo anglicano da Diocese do Recife e autor de, entre outros, Cristianismo e Política -- teoria bíblica e prática histórica e A Igreja, o País e o Mundo -- desafios a uma fé engajada.
www.dar.org.br
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Mochila nas Costas e Diário na Mão – a fascinante história de Ashbel Green Simonton, é o novo livro de autoria do Rev. Elben M. Lenz César, diretor da revista Ultimato, publicado dentro da programação comemorativa dos 150 anos do Presbiterianismo no Brasil. Esta obra é uma biografia do pioneiro daquele ramo reformado em nosso país, à base, principalmente, do seu diário. Na contracapa encontramos um bom resumo da vida de Simonton: “Ele organizou o primeiro jornal protestante da América do Sul (1864), a primeira escola paroquial (1866), o primeiro seminário (1867) e ordenou o primeiro pastor brasileiro (1865). Desembarcou no Rio de Janeiro em 1859 e morreu de febre amarela em São Paulo, aos 34 anos, em 1867. Uma vida breve, que mudou a história”.
Embora as igrejas protestantes de imigrantes (anglicanas e luteranas) já estivessem estabelecidas entre nós durante os períodos do Reino Unido e do Primeiro Reinado, é na segunda metade do século 19 (Segundo Reinado e Primeira República) que aportaram aqui os pioneiros do protestantismo de missão aos brasileiros, e em língua portuguesa:
1. Igreja Congregacional: Rev. Robert Reid Kalley – 1855;
2. Igreja Presbiteriana: Rev. Ashbel Green Simonton – 1859;
3. Igreja Metodista: Rev. Junius E. Newman – 1867;
4. Igreja Batista: Reverendos William Buck Bagby e Zacarias Clay Taylor;
5. Igreja Episcopal (Anglicana): Reverendos Lucien Lee Kinsolving (primeiro bispo) e James Watson Morris – 1890.
Esses cinco ramos reformados foram os únicos entre 1855 e 1909, conseguindo se expandir nacionalmente, sob as restrições legais da Constituição Imperial, de 1824, e sob a severa perseguição social durante o período republicano (após 1889). Há textos sobre esse primeiro período de cada igreja e de seus pioneiros. Um livro recomendado para a segunda metade do século 19 é o clássico “Protestantismo, Maçonaria e a Questão Religiosa no Brasil”, de David Gueiros Vieira.
A primeira metade do século 20 presenciou a expansão do protestantismo histórico, de suas igrejas e suas instituições, bem como a chegada do pentecostalismo e dos “corpos de santidade”. Vale destacar:
1. Congregação Cristã do Brasil: Louis Francescon – 1909;
2. Assembléia de Deus: Gunnar Vingren e Daniel Berg – 1910;
3. Exército da Salvação: David Miche – 1922;
4. Igreja do Evangelho Quadrangular: Harold Williams – 1946.
Essa é a época da criação da Associação das Escolas Bíblicas Dominicais e da Confederação Evangélica do Brasil (CEB). Um texto recomendado é “Protestantismo no Brasil”, de Emile Leonard. Há pesquisas sobre pioneiros regionais muito interessantes, como “A Bíblia e o Bisturi”, do Rev. Edjéce Martins, sobre os missionários médicos George Butler, pai e filho, que, a partir da pequena cidade de Canhotinho, PE, irradiaram o presbiterianismo pela região agreste desse estado. Uma análise sobre a missiologia evangelical e ecumênica é o trabalho de Luis Longuini Neto.
Essa história, tão rica, do protestantismo no Brasil, não se resume a nomes e datas, para a implantação de igrejas e instituições e a elaboração de um pensamento, a partir da herança de cada ramo reformado e de sua inserção em nossa cultura luso-afro-ameríndia.
A crise do protestantismo hoje passa pela ignorância e pela rejeição do legado do passado, bem como pela desvalorização da cultura nacional, o que concorre para a irrelevância e a não “inculturação”, a despeito do crescimento quantitativo. Seminários sem as disciplinas de cultura brasileira e teologia latino-americana, e líderes que não conhecem a nossa literatura, nem as clássicas obras interpretativas do Brasil, como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado, Florestan Fernandes e Raymundo Faoro, entre tantos outros, não nos conduzirão a lugar algum.
Embora haja um setor que procura resgatar e atualizar a história e a identidade evangélica em sua brasilidade, o presentismo e o anglosaxonismo (como novo “helenismo”) crescem em duas vertentes:
- a neo(pseudo)pentecostal da prosperidade e batalha espiritual;
- a macetista, das últimas novidades pragmáticas de origem forânea.
Seja a alienação com ênfase no mundo além túmulo e além história (escatologia), seja o sectarismo moralista, seja a criação de bolhas locais personalistas promotoras da salvação das almas mais educação moral e cívica pequeno-burguesa, estaremos naquela de uma estrada que leva do nada a coisa nenhuma.
Ler biografias como a de Simonton, e conhecer experiências regionais, que terminaram no estabelecimento de convenções, presbitérios, sínodos, dioceses, regiões, distritos ou qualquer outra nomenclatura, é saber que é possível fazer história, construir instituições e elaborar ideários. Tem sido assim por dois mil anos quando há convicção, identidade, compromisso e ética.
Daí a procura, nos doze anos passados, por implantar o episcopado e uma diocese anglicana no nordeste do Brasil. Não tinha nada de utopia. Era um projeto plenamente possível se os seus atores – como tantos outros no passado – tivessem agido de boa fé.
Reconhecer porque isso não ocorreu, e como poderia ter ocorrido, é imprescindível para que não venha outra vez a ocorrer. Para avançarmos para o futuro, deixando para trás o passado, não podemos varrer o mal para debaixo do tapete ou sermos paralisados por eternas “gratidões afetivas”. Temos que dar nomes aos bois, explicitando a tragédia dos pecados dos cismas, das heresias e dos projetos personalistas.
Se Simonton tivesse vivido a conjuntura dos anglicanos e “anglicanos” no Nordeste do Brasil nos anos recentes, sua história e o seu legado teriam sido bem diferentes.
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