Opinião
- 28 de dezembro de 2018
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Posso encontrar Deus sem a Igreja?
Por René Breuel
“Não posso vir à igreja. É acolhedora e persuasiva demais”.
É o que eu ouvi de um amigo cético recentemente. Marco é um estudante de matemática inteligente e perspicaz. Ele veio à igreja que pastoreio em Roma algumas vezes e virou um bom amigo. Gosto muito dele.
Mas, depois de alguns meses, ele começou a vir menos e menos. Me disse que viria ainda para o grupo que temos para curiosos que querem explorar a fé e que estava aberto para encontrar-me para falar de temas espirituais. Mas não viria mais aos domingos, mesmo gostando muito deles.
A razão? A igreja é calorosa, simpática e convincente demais para ele. Ele gosta das pessoas, gosta do culto, e isso é um problema.
Marco me explicou durante um almoço que ele tem medo de abraçar o cristianismo por causa da comunidade, motivado pelas amizades e a boa atmosfera. Ele prefere buscar a Deus ou o que for que exista sozinho, mantendo a sua objetividade. Não quer que o calor da igreja influencie a sua decisão. Quer um caminho individual e autônomo.
Eu nunca tinha ouvido uma explicação como essa antes. A igreja é simpática demais? Por um lado, fico feliz que essa seja a experiência de Marco; queremos realmente ser uma igreja acolhedora para curiosos que querem explorar o cristianismo no seu ritmo e descobrir, espero, quão transformador e lindo é.
Por outro lado, eu não sabia como responder ao Marco. Piorar o culto? Pedir que as pessoas não cumprimentem os visitantes? Pregar sermões insípidos?
Achei muito interessante seu desejo de autonomia e controle ao mesmo tempo que explora algo por definição pessoal e imenso – Deus. É sintomático do espírito da nossa época. Reflete a maneira como valorizamos o ser autônomo, independente e racional. Como explicou o filósofo Charles Taylor em “A Secular Age” (“Uma Era Secular”):
“Passamos de uma era em que a vida religiosa era mais encarnada, onde a presença do sagrado podia ser representada em rituais, ou vista, sentida, tocada, visitada (em peregrinações); à uma época em que é mais ‘na mente’ ... O Cristianismo oficial passou pelo que podemos chamar uma ‘desencarnação’, uma transferência para fora das formas de vida religiosas encarnadas, para aquelas que acontecem mais no nosso interior”.1
Conversando com Marco, porém, não pude deixar de falar da importância da Igreja. Eu disse que poderia sugerir livros e encontrá-lo individualmente. Mas também que se ele quer buscar e conhecer a Deus, a igreja é crucial.
A primeira razão é muito prática: para absorver algo de substancial você precisa de uma comunidade de pessoas para guiá-lo e o encorajar ao longo do caminho. Você pode estudar matemática sozinho, por exemplo; precisa só dos livros certos. Mas se você quiser destrinchá-la, a aprender realmente, e não se desencorajar diante de um corpo de conhecimento tão vasto, você precisa frequentar uma universidade, sentar-se ao lado de outros alunos, ser examinado, passar dos temas mais básicos aos temas mais avançados.
A mesma coisa acontece em todas as áreas da vida: sem virar parte de uma comunidade você não vai ter os estímulos para investigar algo de modo consistente no meio das distrações da vida. Nem vai ser desafiado: provavelmente acabará com uma fé pessoal que será apenas um espelho das suas preferências.
Outra razão porque Deus-sem-a-igreja não é viável é ainda mais crucial. Segundo o cristianismo, conhecer a Deus é algo profundamente pessoal. É tão íntimo que Deus providenciou uma encarnação de si. Segundo os cristãos, Jesus é a imagem encarnada de Deus, e ele deixou a comunidade dos seus seguidores como o seu Corpo na terra. Este corpo, quando animado pelo Espírito, faz com que Cristo e, portanto, Deus, seja singularmente visível, concreto e compreensível. Uma comunidade de pessoas rende concretas afirmações que poderiam virar abstratas e facilmente moldadas no que quer que você desejar. Paradoxalmente, dá a clareza e a objetividade que buscamos. Nos desafia com as partes feias e com as partes bonitas.
Mesmo quando ser acolhedora demais é um problema.
• René Breuel é o pastor fundador de Hopera, uma igreja em Roma, e autor de O Paradoxo da Felicidade.
*Artigo originalmente publicado em inglês no site Evangelical Focus. Traduzido e reproduzido com permissão.
Leia mais
» Desigrejismo – “anomalia” ou opção?
» Livro Dê Outra Chance à Igreja, de Todd Hunter
“Não posso vir à igreja. É acolhedora e persuasiva demais”.
É o que eu ouvi de um amigo cético recentemente. Marco é um estudante de matemática inteligente e perspicaz. Ele veio à igreja que pastoreio em Roma algumas vezes e virou um bom amigo. Gosto muito dele.
Mas, depois de alguns meses, ele começou a vir menos e menos. Me disse que viria ainda para o grupo que temos para curiosos que querem explorar a fé e que estava aberto para encontrar-me para falar de temas espirituais. Mas não viria mais aos domingos, mesmo gostando muito deles.
A razão? A igreja é calorosa, simpática e convincente demais para ele. Ele gosta das pessoas, gosta do culto, e isso é um problema.
Marco me explicou durante um almoço que ele tem medo de abraçar o cristianismo por causa da comunidade, motivado pelas amizades e a boa atmosfera. Ele prefere buscar a Deus ou o que for que exista sozinho, mantendo a sua objetividade. Não quer que o calor da igreja influencie a sua decisão. Quer um caminho individual e autônomo.
Eu nunca tinha ouvido uma explicação como essa antes. A igreja é simpática demais? Por um lado, fico feliz que essa seja a experiência de Marco; queremos realmente ser uma igreja acolhedora para curiosos que querem explorar o cristianismo no seu ritmo e descobrir, espero, quão transformador e lindo é.
Por outro lado, eu não sabia como responder ao Marco. Piorar o culto? Pedir que as pessoas não cumprimentem os visitantes? Pregar sermões insípidos?
Achei muito interessante seu desejo de autonomia e controle ao mesmo tempo que explora algo por definição pessoal e imenso – Deus. É sintomático do espírito da nossa época. Reflete a maneira como valorizamos o ser autônomo, independente e racional. Como explicou o filósofo Charles Taylor em “A Secular Age” (“Uma Era Secular”):
“Passamos de uma era em que a vida religiosa era mais encarnada, onde a presença do sagrado podia ser representada em rituais, ou vista, sentida, tocada, visitada (em peregrinações); à uma época em que é mais ‘na mente’ ... O Cristianismo oficial passou pelo que podemos chamar uma ‘desencarnação’, uma transferência para fora das formas de vida religiosas encarnadas, para aquelas que acontecem mais no nosso interior”.1
Conversando com Marco, porém, não pude deixar de falar da importância da Igreja. Eu disse que poderia sugerir livros e encontrá-lo individualmente. Mas também que se ele quer buscar e conhecer a Deus, a igreja é crucial.
A primeira razão é muito prática: para absorver algo de substancial você precisa de uma comunidade de pessoas para guiá-lo e o encorajar ao longo do caminho. Você pode estudar matemática sozinho, por exemplo; precisa só dos livros certos. Mas se você quiser destrinchá-la, a aprender realmente, e não se desencorajar diante de um corpo de conhecimento tão vasto, você precisa frequentar uma universidade, sentar-se ao lado de outros alunos, ser examinado, passar dos temas mais básicos aos temas mais avançados.
A mesma coisa acontece em todas as áreas da vida: sem virar parte de uma comunidade você não vai ter os estímulos para investigar algo de modo consistente no meio das distrações da vida. Nem vai ser desafiado: provavelmente acabará com uma fé pessoal que será apenas um espelho das suas preferências.
Outra razão porque Deus-sem-a-igreja não é viável é ainda mais crucial. Segundo o cristianismo, conhecer a Deus é algo profundamente pessoal. É tão íntimo que Deus providenciou uma encarnação de si. Segundo os cristãos, Jesus é a imagem encarnada de Deus, e ele deixou a comunidade dos seus seguidores como o seu Corpo na terra. Este corpo, quando animado pelo Espírito, faz com que Cristo e, portanto, Deus, seja singularmente visível, concreto e compreensível. Uma comunidade de pessoas rende concretas afirmações que poderiam virar abstratas e facilmente moldadas no que quer que você desejar. Paradoxalmente, dá a clareza e a objetividade que buscamos. Nos desafia com as partes feias e com as partes bonitas.
Mesmo quando ser acolhedora demais é um problema.
• René Breuel é o pastor fundador de Hopera, uma igreja em Roma, e autor de O Paradoxo da Felicidade.
Nota
1. Charles Taylor, A Secular Age (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 2007), 554.
*Artigo originalmente publicado em inglês no site Evangelical Focus. Traduzido e reproduzido com permissão.
Leia mais
» Desigrejismo – “anomalia” ou opção?
» Livro Dê Outra Chance à Igreja, de Todd Hunter
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