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Opinião

Pornografia – a oferta que não cumpre o que promete

Entrevista | Andréa Vargas

Andréa Vargas trabalha com temas ligados à sexualidade há muitos anos. Seus vídeos são vistos por muita gente pelo Brasil afora. Ministra palestras como convidada em eventos promovidos por diferentes organizações e grupos evangélicos. Sem timidez, Andréa enfrenta assuntos difíceis e polêmicos com propriedade, embasamento bíblico e experiência de anos de aconselhamento. Ela é casada com Diniz e mãe de Miguel. O casal, que congrega na Igreja Batista da Praia da Costa, em Vitória, ES, está à frente da Avalanche Missões. Andréa é presidente da Exodus Brasil.

Qual a definição de pornografia?
Andréa Vargas: É todo tipo de material feito para excitar alguém sexualmente.

Que tipo de pessoa usa a pornografia: apenas jovens, homens, “descrentes”?
Qualquer ser que respira está suscetível a ter contato com a pornografia, independentemente de idade, gênero, estado civil, orientação sexual, credo, classe social, escolaridade etc.

Por que as pessoas procuram a pornografia? Há casos em que as pessoas são “procuradas” ou encontradas pela pornografia?
Diversas podem ser as razões. É comum encontrar alguns disparadores: curiosidade, tédio, solidão, preocupação, tristeza e raiva. A pessoa – não lidando de forma saudável ou pura com algumas emoções – é “disparada” para fugir rumo à pornografia como se ela fosse um atalho capaz de minimizar a sensação desagradável em que se encontra.

Cada vez mais crianças e adolescentes têm sido encontrados pela pornografia em situação de descuido dos pais ou responsáveis quanto às companhias e ao uso da internet ou mídias em geral.

Quando é que seu uso passa a ser considerado um vício? Há diferença entre fazer uso da pornografia e ser viciado?
Vício sexual é a repetição incontrolável de qualquer atividade sexual. Nem todo uso de pornografia representa um vício instalado, mas costuma fazer parte da construção do mesmo. A pornografia costuma vir acompanhada de fantasia sexual e masturbação, no mínimo. Quando essas práticas não surtem o mesmo efeito de antes, a pessoa costuma adicionar requintes de aventura, perigo e até crimes.

Não se costuma usar pornografia imaginando o que ela possa desencadear com o tempo, mas estudos mostram que seu uso tende a atingir um limite (de tolerância) e, a partir daí, a pessoa – para não se ver desolada – precisa aumentar a dose de estímulo para obter a mesma ou uma maior intensidade de prazer. A repetição dessa atividade dá início à construção do vício e todo vício tende a levar à morte.

Quando a Bíblia e a oração não são suficientes, que abordagens terapêuticas podem ser empregadas para ajudar as pessoas a vencerem esse vício?
A Palavra de Deus é suficiente porque Deus nos conhece o suficiente para trazer redenção aos efeitos da queda na forma como vivemos. As pessoas costumam ter uma enorme dificuldade de envolver Deus em sua sexualidade em função do dualismo, religiosidade, orgulho etc.

Obedecer à Palavra de Deus vai além de ler a Bíblia e orar. É bem provável que – dependendo do nível de compulsão sexual – a pessoa precise de uma rede de ajuda maior para obedecer aos preceitos de sabedoria da parte de Deus para ela. Por exemplo: precisará prestar contas a alguém de confiança; procurar por ajuda médica em casos de ansiedade extrema; estabelecer limites quanto a conteúdos de conversa, toques, pensamentos e internet; praticar algum esporte; cuidar do sono e da alimentação; redescobrir atividades de lazer.

O que quero dizer é que o vício sexual não é o problema, mas, sim, o sintoma de um problema chamado idolatria. Sempre que algum ídolo assume o coração humano, todo tipo de desequilíbrio e desajuste acontece. É uma questão de tempo, mas a conta da imoralidade vai chegar e só a obra da cruz tem poder suficiente para resolver a raiz do problema: o coração humano.

Quem sofre com a pornografia?
Pessoas que acreditam em alguma mentira a respeito de si, de Deus ou do outro tendem a ver na pornografia uma oportunidade de se esquecer da própria história e assumir outra, por meio da fantasia sexual que a pornografia inspira. O sofrimento vem em escala maior quando o efeito da fantasia passa e a pessoa se vê diante da mesma realidade de antes. E agora? Ou ela encara o problema ou ela foge e repete.

Como a pornografia afeta a vida dos casais?
Será necessário mentir para sustentar a vida dupla. Inicialmente, na frente, o cônjuge usuário de pornografia é uma pessoa, mas, por trás, é outra. A tendência é que, no decorrer do tempo, o cônjuge (não usuário) note alguma coisa porque a outra parte ficará diferente: não haverá a mesma dedicação de tempo, afeto, energia sexual, nem recurso financeiro. Diante da suspeita, a vigilância aumenta e, por fim, a pessoa é flagrada fazendo uso da pornografia. Vergonha, culpa, medo, raiva, costumam ser algumas das consequências. É preciso resiliência no casamento para superar isso. Muitos não resistem.

De que forma a pornografia afeta o dia a dia e a vida familiar e religiosa de quem faz uso da pornografia?
No início, a dose de pornografia é pequena. Com o tempo, essa intensidade não é mais suprida e é preciso aumentá-la para ter, pelo menos, o mesmo efeito. Isso significa que será exigido da pessoa que ela dedique mais tempo, energia e dinheiro para ter o prazer que julga precisar. Há casos de pessoas que fazem uso de pornografia no ambiente de trabalho ou ministério, veem conteúdo ilegal – imagens com crianças e adolescentes –, dedicam horas à busca de conteúdo pornográfico e não mantêm nutridos os relacionamentos familiares.

Quais são as consequências da pornografia para a pessoa que faz uso dela?
Aconselhando pessoas há quinze anos, tenho visto consequências desastrosas. Além da vergonha, culpa e medo, noto que o uso da pornografia aliena a pessoa da realidade e a mantém infantilizada na condução da própria vida. A pessoa foge e não encara os dilemas pessoais. O atalho que escolhe é a pornografia em função do prazer que oferece, mas o efeito passa e se vê tentada a repetir o uso. Com isso, constrói um hábito e esse passa a ser seu comportamento. Pode estar rodeada de pessoas, mas no fundo está sozinha e não se sente amada por ninguém. Como rompeu com a dignidade própria, não tem mais critérios e pode se submeter a todo tipo de envolvimento sexual. Corre muitos riscos e pode se tornar uma ameaça para si e para os outros. Precisa de ajuda!

Há suficiente esclarecimento sobre os problemas reais que a pornografia provoca na vida de quem a pratica?
Há informações disponíveis, mas a maioria das pessoas não as conhece. Muitas devem ser as causas para tamanha desinformação. Cito algumas:
  1. A pornografia envolve uma indústria bilionária ao redor do mundo e alimenta a rede de tráfico humano, pedofilia, exploração sexual e prostituição. Quem vai querer desmantelá-la?;
  2. Muitos que fazem uso de pornografia estão envolvidos com esferas de poder – política, empresas, igrejas, família etc. É interessante informar sobre seus efeitos nocivos já que traria a conscientização sobre os mesmos e maior responsabilização?;
  3. Pessoas bem informadas sobre a destruição que a pornografia traz estariam mais dispostas a notificar violações junto aos órgãos competentes. O país teria estrutura para fazer frente a essas violações e oferecer rede de atendimento à população?
Ou seja, a situação requer um enfrentamento à altura de sua complexidade. Questiono se há interesse para que isso ocorra.

Pessoas solteiras são mais propensas ao uso da pornografia que as casadas?
Pessoas com dilemas de identidade costumam ser mais propensas à pornografia e isso não é exclusividade de solteiros. Outro agravante é quando solteiros com dilemas de identidade e imoralidade se casam, pois a tendência é que levem o uso da pornografia para dentro do casamento.

A pornografia leva ou pode levar a desvios da sexualidade?
Com certeza, pode! Se as pessoas soubessem o estrago que ela causa, teriam
aversão em usá-la ou disponibilizá-la para os filhos como desculpa de ensinarem “como as coisas são” ou “devem ser”.

Há relação entre pornografia e violência sexual?
Sim. Pode haver violência sexual para obter a pornografia (por exemplo, exploração sexual para adquirir conteúdo pornográfico) e pode haver violência sexual no decorrer do uso da pornografia (por exemplo, em busca de prazer mais intenso, usuários podem fazer uso de conteúdos ilícitos e, além de ver, podem querer fazer o que veem).

Ou seja, será que a imagem pornográfica que a pessoa vê está isenta de ter feito alguma vítima? E será que uma pessoa quando vê conteúdos cada vez mais pesados – imagens com crianças, adolescentes, incesto, estupro, animais etc. – está livre o suficiente para não praticar o que vê? Depois que entra no campo da fantasia, fica mais complicado renunciar aquilo que oferece tanto prazer.

Há retorno? Você conhece pessoas que abandonaram o vício e têm hoje uma vida normal?
Sim. Onde abundou o pecado, pode superabundar a graça. Tenho visto a redenção chegar à vida de pessoas que estavam intoxicadas pela idolatria sexual e que agora conseguem experimentar um novo jeito de viver graças à retomada do senhorio de
Cristo em suas vidas. Cristo reconciliou todas as coisas nele, inclusive a identidade e a sexualidade humanas.

Existem formas de autoprevenção da pornografia? Ou de famílias, grupos de amigos e igrejas prevenirem-se contra ela?
Claro. Oferecer informações honestas e estabelecer limites claros tendem a ajudar. Alguns exemplos:
  1. Manter canal aberto de diálogo com crianças e adolescentes sobre a sexualidade. Para o que perguntam, precisam de boas respostas;
  2. Ainda que crianças e adolescentes não perguntem, oferecer informação sobre cuidado com as partes íntimas. Exemplo: pai e mãe tocam as partes íntimas de crianças somente para higienizar; ninguém pode tocar nas partes íntimas para outros fins, nem fotografar ou filmar; não devem tocar as partes íntimas de ninguém;
  3. Estabelecer limites quanto ao uso das redes sociais e mídias em geral. A indústria pornográfica já sabe que boa parte dos usuários de pornografia na internet são crianças e adolescentes. A rede de pedofilia tira proveito disso e um número enorme de crianças e adolescentes se torna vítima por meio de bate-papo com “amigos” virtuais. Evitar expor fotos de crianças e adolescentes sem ou com pouca roupa, ou com uniforme escolar, ou mesmo evitar exibir detalhes da rotina da família e endereço da residência;
  4. Conhecer a rede de proteção disponível. No Brasil, temos o Disque 100, o Conselho Tutelar, as delegacias, o Ministério Público etc. Acionar a rede força a promoção de políticas públicas de atendimento às vítimas. Nosso país tem altos índices de produção e consumo de pornografia bem como de violência sexual e, ainda assim, os números são subnotificados. Há um gigante a ser vencido!
Como a exposição à pornografia afeta a formação da sexualidade de crianças e adolescentes?
Pessoas em formação não devem ter acesso à pornografia em hipótese alguma. Inclusive, é crime! Inúmeras confusões podem surgir quando crianças e adolescentes são expostos a ela. São erotizados e, com isso, ficam suscetíveis a todo tipo de abusos. Conheci uma criança de 10 anos viciada em pornografia. O sofrimento era tanto que ela se sentia tentada a fugir de casa pela vergonha caso a família descobrisse.

Há relação entre o uso da pornografia e a “troca” da orientação sexual?
O impacto da pornografia na construção de uma estrutura de imoralidade na vida de alguém é tão grande que já vi pessoas se abrirem para práticas sexuais totalmente diferentes das que tinha no início das suas atividades sexuais. Chega uma hora em que aquilo que a pessoa fazia (por exemplo, ver pornografia com cenas de mulheres) não a satisfaz mais e ela “precisa” variar (por exemplo, ver pornografia envolvendo casais, pessoas do mesmo sexo, animais, violência sexual etc.) para não se frustrar já que o estímulo inicial não a supre mais.

> Entrevista originalmente publicada na edição 372 da revista Ultimato.

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