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Por Escrito

Pedro, Tiago, João e... – vida e missão dos discípulos de Jesus

Por William Lane | Resenha
 
Aramis C. DeBarros | Editora Hagnos
 
Sempre que queremos conhecer um pouco mais sobre os discípulos de Jesus, logo nos deparamos com a dificuldade de encontrar informações sobre cada um deles. Alguns são bastante citados nos Evangelhos, outros raramente são mencionados fora da lista dos nomes dos discípulos escolhidos por Jesus. Diante disso, a solução é recorrer a um bom dicionário ou enciclopédia bíblica que ofereça dados biográficos a respeito dos discípulos. Geralmente, esses dados são baseados não só no que se sabe a partir dos textos bíblicos, mas também sobre registros dos antigos escritores cristãos e das tradições que se desenvolveram a partir deles. 
 
No início de 2020, a Editora Hagnos lançou uma edição revista e atualizada de uma obra que reúne, em um só volume, preciosas informações sobre os discípulos de Jesus. Trata-se do livro Doze homens, uma missão, de autoria de Aramis C. DeBarros. No livro, o autor reúne dados bíblicos, históricos e tradicionais a respeito da origem, vida e ministério dos doze apóstolos de Jesus. Ele introduz a sua narrativa com uma introdução panorâmica sobre o mundo religioso, político e social do Império Romano do primeiro século da era cristã, e uma apresentação sobre o surgimento de toda a tradição apostólica.
 
Dentre as diversas dificuldades apontadas pelo autor para reconstruir a história dos apóstolos, duas se destacam. A primeira é que eles eram homens simples e vistos pela comunidade cristã como irmãos na fé e cooperadores, não como grandes heróis espirituais. Por isso, os primeiros cristãos não registravam os seus feitos como se fossem obras de importantes figuras no cenário histórico. Assim, DeBarros constata que: 
A história dos doze discípulos é, sobretudo, a história de humildes pregadores de Cristo, e não de célebres pensadores ou notáveis teólogos – embora tenham sim produzido teologia profunda e também transformado, pela reflexão que suscitaram, a cosmovisão do homem ocidental. A história dos apóstolos é a história de homens do povo, plenos de uma fé simples, mas audaciosa; e não de autoridades eclesiais austeras e, porque pomposas e poderosas, distantes do povo (p. 62).
 
A segunda grande dificuldade é que boa parte do registro extrabíblico sobre a vida dos apóstolos está mesclada com relatos fantasiosos de suas obras. Para alguns historiadores, esses relatos devem ser prontamente descartados por sua falta de veracidade e sustentação histórica. Para outros, contudo, é possível separar as descrições fantasiosas das “narrativas consideradas historicamente factíveis” (p. 81). Isso significa procurar identificar, por trás dos relatos fantasiosos, aquilo que possa ser identificado como histórico, com base em outras informações que atestem aos fatos. É justamente essa a abordagem desse autor. DeBarros procede primeiro levantando as informações biográficas contidas na própria Bíblia acerca dos apóstolos. Em seguida, a partir de fontes apócrifas e históricas, prossegue à seleção do conteúdo pertinente, distinguindo o que é historicamente factível ou presumível e o que é fantasioso.
 
 
Algumas dessas dificuldades se verificam, por exemplo, até na identificação de quem eram os doze, uma vez que em alguns casos há ligeira diferença entre as listas dos Evangelhos. Um caso típico é o do primeiro apóstolo apresentado pelo autor – Bartolomeu. Esse discípulo é listado entre os doze em Mateus 10.2-4 e Lucas 6.14-16, porém nunca é citado no Evangelho de João que, por sua vez, menciona Natanael. Assim, estudiosos identificam o Bartolomeu, dos Evangelhos Sinóticos, com o Natanael, de João, se valendo do mesmo raciocínio de que outros apóstolos também tinham dois nomes, como Simão Pedro, Mateus Levi, Judas Iscariotes.
 
Além disso, diversas tradições apostólicas estão associadas a regiões particulares para onde o respectivo apóstolo foi viver. Nossa cultura ocidental preservou mais as tradições acerca de Pedro, João, Tiago, além do apóstolo Paulo, que não fazia parte dos doze. Assim, o livro reúne também as tradições orientais às quais não temos normalmente acesso.
 
Por mais que muitas informações não sejam completamente verificáveis historicamente, elas estão solidamente fundamentadas em fontes bibliográficas e tradições cristãs antigas, mormente dos primeiros séculos da era cristã. Os relatos não são puras especulações, pelo contrário, se baseiam em acurada investigação e pesquisa. 
 
Recomendo essa obra tanto para quem aprecia história antiga, particularmente o cristianismo dos primeiros séculos, quanto para quem deseja conhecer mais a tradição cristã a respeito da vida dos apóstolos. É uma leitura agradável, informativa e inspiradora. Conhecer um pouco da vida e do ministério dos apóstolos a partir das antigas tradições cristãs é enriquecedor.
 
Por fim, vale notar que uma obra publicada originalmente em 2006, e que está em sua sétima reimpressão revista e atualizada, merecia uma adequação de sua grafia ao novo acordo ortográfico, vigente para publicações em língua portuguesa e seguida pelas editoras do país. Apesar de isso não ferir nem comprometer o conteúdo da obra, poderá causar estranheza ao leitor atento já habituado com a nova ortografia.
 
Essa é uma excelente e enriquecedora leitura. Vale a pena ler.

>> Conheça também o livro Lendo as Escrituras com os Pais da Igreja, de Christopher A. Hall
 
 
Pastor presbiteriano e doutor em Antigo Testamento, é professor e capelão no Seminário Presbiteriano do Sul, e tradutor de obras teológicas. É autor do livro O propósito bíblico da missão.
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