Opinião
- 22 de outubro de 2014
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Os Irmãos Cara de Pau
Os Irmãos Cara de Pau (“The Blues Brothers”) é uma comédia musical dirigida por John Landis em 1980. É um dos meus filmes preferidos. Não sei quantas vezes o vi. Só espero poder revê-lo outras tantas! No filme, grandes nomes do “soul”, do “rithm and blues” e do jazz fazem pontas como atores e atrizes, e, claro, cantam e encantam: James Brown, John Lee Hooker, Aretha Franklin, Ray Charles e Cab Calloway. Os protagonistas são Dan Ayckroyd e John Bellushi, que faleceu pouco depois do lançamento do filme.
Os irmãos Blues, Elwood (Ayckrooyd) e Jake “Joliet” (Bellushi) são órfãos, criados em um orfanato dirigido por uma irmandade católica feminina em Chicago. Adultos, se envolvem em uma vida de pequenos crimes e ilícitos de toda sorte. Em uma das primeiras cenas do filme, Elwood está do lado de fora do Centro Correcional Joliet (penitenciária dos Estados Unidos, desativada em 2002, que ficou famosa por causa do filme) esperando seu irmão Jake (apelidado de “Joliet” exatamente por causa do tempo que passou lá...), depois de cumprida sua pena. Os irmãos tomam conhecimento que o orfanato tem uma grande dívida, e poderá ser fechado, e por isso resolvem ajudar. A severa Madre Superiora (a única pessoa no mundo a quem os irmãos trapalhões temem, mas a quem chamam de “Pinguim”) lhes diz que não aceitará qualquer ajuda, por saber que se trataria de dinheiro obtido desonestamente. Eles conversam com Curtis (Cab Calloway), antigo funcionário do orfanato. Ele os aconselha a procurarem uma igreja. Jake diz desdenhosamente: “não vou ouvir nenhum negro pregar sobre céu e inferno”. Mas eles vão. Ao chegar à igreja que lhes foi indicada, o pastor, Rev. Cleophus James (James Brown) prega e eis que neste momento, o inesperado acontece: Jake Blues tem uma revelação divina, uma epifania, uma experiência com o “sagrado selvagem”. Ele entende que conseguirão dinheiro honesto se conseguirem reunir outra vez sua antiga banda de “rithm n’ blues”. Boa parte do filme mostrará os esforços dos irmãos para reunir os antigos companheiros, lendas daquele estilo musical estadunidense: Matt “Guitar” Murphy, Steve Cropper, Donald Dunn, Lou Marini, Murphy Dunne, Willie Hall e Alan Rubin – um time “da pesada”, todos extremamente competentes.
Pois bem, o filme é recheado de situações engraçadas, mas absolutamente inverossímeis, e de música, muita música, da mais alta qualidade. Duas frases são repetidas várias vezes: “The Lords works in mysterious ways” (O Senhor atua de maneiras misteriosas) e “We are on a mission from God” (Temos uma missão dada por Deus). Estas duas frases fornecem a chave de leitura do filme a partir de uma perspectiva filosófica e teológica. Pois os dois irmãos quebrarão todas as leis que existem, não se deixam deter por nada nem por ninguém, tudo com um objetivo já mencionado: levantar o dinheiro para pagar a dívida do orfanato. Entendendo-se imbuídos de uma vocação divina, nada os impedirá de alcançar o que pretendem. O que levanta uma séria questão ética: para fazer o bem pode-se fazer o mal? Um mal menor é justificado se praticado para se alcançar um bem maior?
Esta é uma questão extremamente complexa, que mais cedo ou mais tarde poderá ser um problema real, não apenas para um governante, mas para um cidadão comum. Os Irmãos Blues desobedecem leis, fazem coisas erradas, mas para ajudar crianças órfãs em um orfanato, tal como eles mesmos foram um dia. Eles não se importarão em arcar com todas as consequências dos seus atos, eles serão honestos com os companheiros da banda, mas cumprirão o que entendem que Deus mesmo ordenou que fizessem.
Um filme aparentemente leve, despretensioso, muito divertido, agradabilíssimo, mas que faz pensar em questões complexas. Pois não raro, há cidadãos sérios, corretos, figuras impolutas, mas que não movem uma palha para ajudar quem quer que seja. E pode ser que haja quem quebre leis, para ajudar quem precisa ser ajudado. Jesus advertiu que prostitutas e cobradores de impostos podem preceder religiosos honestos e incorruptíveis no reino dos céus. Por estas e outras vale a pena ver – e rever, e rever, e rever – “Os Irmãos Cara de Pau”.
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Os irmãos Blues, Elwood (Ayckrooyd) e Jake “Joliet” (Bellushi) são órfãos, criados em um orfanato dirigido por uma irmandade católica feminina em Chicago. Adultos, se envolvem em uma vida de pequenos crimes e ilícitos de toda sorte. Em uma das primeiras cenas do filme, Elwood está do lado de fora do Centro Correcional Joliet (penitenciária dos Estados Unidos, desativada em 2002, que ficou famosa por causa do filme) esperando seu irmão Jake (apelidado de “Joliet” exatamente por causa do tempo que passou lá...), depois de cumprida sua pena. Os irmãos tomam conhecimento que o orfanato tem uma grande dívida, e poderá ser fechado, e por isso resolvem ajudar. A severa Madre Superiora (a única pessoa no mundo a quem os irmãos trapalhões temem, mas a quem chamam de “Pinguim”) lhes diz que não aceitará qualquer ajuda, por saber que se trataria de dinheiro obtido desonestamente. Eles conversam com Curtis (Cab Calloway), antigo funcionário do orfanato. Ele os aconselha a procurarem uma igreja. Jake diz desdenhosamente: “não vou ouvir nenhum negro pregar sobre céu e inferno”. Mas eles vão. Ao chegar à igreja que lhes foi indicada, o pastor, Rev. Cleophus James (James Brown) prega e eis que neste momento, o inesperado acontece: Jake Blues tem uma revelação divina, uma epifania, uma experiência com o “sagrado selvagem”. Ele entende que conseguirão dinheiro honesto se conseguirem reunir outra vez sua antiga banda de “rithm n’ blues”. Boa parte do filme mostrará os esforços dos irmãos para reunir os antigos companheiros, lendas daquele estilo musical estadunidense: Matt “Guitar” Murphy, Steve Cropper, Donald Dunn, Lou Marini, Murphy Dunne, Willie Hall e Alan Rubin – um time “da pesada”, todos extremamente competentes.
Pois bem, o filme é recheado de situações engraçadas, mas absolutamente inverossímeis, e de música, muita música, da mais alta qualidade. Duas frases são repetidas várias vezes: “The Lords works in mysterious ways” (O Senhor atua de maneiras misteriosas) e “We are on a mission from God” (Temos uma missão dada por Deus). Estas duas frases fornecem a chave de leitura do filme a partir de uma perspectiva filosófica e teológica. Pois os dois irmãos quebrarão todas as leis que existem, não se deixam deter por nada nem por ninguém, tudo com um objetivo já mencionado: levantar o dinheiro para pagar a dívida do orfanato. Entendendo-se imbuídos de uma vocação divina, nada os impedirá de alcançar o que pretendem. O que levanta uma séria questão ética: para fazer o bem pode-se fazer o mal? Um mal menor é justificado se praticado para se alcançar um bem maior?
Esta é uma questão extremamente complexa, que mais cedo ou mais tarde poderá ser um problema real, não apenas para um governante, mas para um cidadão comum. Os Irmãos Blues desobedecem leis, fazem coisas erradas, mas para ajudar crianças órfãs em um orfanato, tal como eles mesmos foram um dia. Eles não se importarão em arcar com todas as consequências dos seus atos, eles serão honestos com os companheiros da banda, mas cumprirão o que entendem que Deus mesmo ordenou que fizessem.
Um filme aparentemente leve, despretensioso, muito divertido, agradabilíssimo, mas que faz pensar em questões complexas. Pois não raro, há cidadãos sérios, corretos, figuras impolutas, mas que não movem uma palha para ajudar quem quer que seja. E pode ser que haja quem quebre leis, para ajudar quem precisa ser ajudado. Jesus advertiu que prostitutas e cobradores de impostos podem preceder religiosos honestos e incorruptíveis no reino dos céus. Por estas e outras vale a pena ver – e rever, e rever, e rever – “Os Irmãos Cara de Pau”.
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É professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da PUC Minas, onde coordena o GPRA – Grupo de Pesquisa Religião e Arte.
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