Opinião
21 de dezembro de 2016
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O menino Jesus em Aleppo

O título da matéria é: "Aleppo é um lugar onde as crianças pararam de chorar."
Impressiona o fato da criança não chorar. São os adultos que choram. Ela os vê, um, dois, três, muitos, e permanece em silêncio, provavelmente olhando para dentro de si em busca de um mundo inexistente, que certamente não mais retornará, como seus pais, mortos em um bombardeio.
A cidade mais populosa da Síria encontra-se em ruínas. Tropas pró governo e rebeldes lutam. O governo, para conquistar a cidade. Os rebeldes, para manter os poucos pontos onde ainda estão em vantagem. Em meio às batalhas, uma mortandade sem fim espalha corpos de civis entre destroços e ruas. Muitos corpos são pequenos, de crianças que um dia brincaram pelas ruas, que um dia sonharam em ser gente grande. Hoje, seus pequenos corpos estão estendidos inertes por toda a cidade, transformada em um grande e terrível cemitério ao ar livre.
A morte de civis é inaceitável. A morte de crianças é uma monstruosidade.
O choro de mães e pais ecoa um antigo choro. O de Raquel, simbolizando as mães de Israel que choraram seus filhos que haviam sido levados para o exílio babilônico (Jr 31.15), e mais à frente, o choro de mães belemitas que choram a morte de seus filhos pelos soldados de Herodes (Mt 2.2.16-18).
Herodes pretendia matar o menino Jesus. Mas foi enganado pelos magos e pelos pais de Jesus, que, avisados pelo anjo, fugiram para o Egito.
Jesus escapou da mortandade. Seus pais conseguiram fugir. Jesus chorou? Certamente, diante da pressa da fuga, de situações de desconforto e perigo para um recém-nascido. José e Maria choraram? Muito provavelmente, frente à maldade de Herodes, frente às incertezas da fuga e da vida em um país estranho.
Eles sabiam que Herodes era o inimigo. Também sabiam que os magos eram amigos, e os anjos, mensageiros de Deus para salvá-los.
As crianças em Aleppo não sabem nada.
De onde vem as bombas que desintegram seus pais, irmãos e amigos? Quem alveja suas casas? Estarão vivos no próximo dia ou, na manhã seguinte, a casa ou apartamento onde moram simplesmente se resumirá a escombros, caixão desajeitado para seus pequenos corpos?
Quem são os amigos? Ainda existem amigos? Por que não vem salvá-las? Por que não impedem que bombas caiam? Por que não as colocam em carros e as levam para longe do inferno? Por que não as conduzem ao encontro de seus pais e irmãos, ainda que esse seja um pedido impossível de ser atendido?
As crianças em Aleppo não conseguem chorar. Esqueceram como se chora? As lágrimas secaram? Estão acostumadas com a brutalidade diária?
Elas olham atônitas, com olhos embaçados, cenas infernais se desenrolarem como um filme de terror.
O menino Jesus está em Aleppo. As mães choram os filhos que já não existem.
• João Leonel é graduado em Teologia e Letras. Mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). Doutor em Teoria e História Literária pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Pós-doutor em História da Leitura pela Universidade Nova de Lisboa, Portugal. Professor no Seminário Presbiteriano do Sul, Campinas (SP), e na graduação e pós-graduação em Letras, Universidade Presbiteriana Mackenzie, SP. Autor do e-book Perguntas de Quem Sofre.
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