Opinião
- 10 de janeiro de 2019
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O desafio da liberdade de cátedra nas escolas: perspectivas cristãs
Por Cícero Bezerra
As questões relacionadas ao ensino e a liberdade de aprender têm sido assunto nas pautas do cotidiano de professores, alunos e familiares atualmente. Existe uma preocupação a respeito de o ensino não ser manipulador e seguir determinadas ideologias. A questão que se levanta é sobre quem deve influenciar o ensino nas escolas: as matérias curriculares, os professores ou deve se desenvolver uma alternativa para que tanto a família como os docentes desenvolvam um programa que acabe resultando numa boa formação para os alunos?
A sociedade e a própria academia, divididas em ambientes teóricos múltiplos, passam a questionar a legitimidade das liberdades que envolvem o ato de lecionar. Por sua vez, os religiosos cristãos sentem-se afrontados por temas polêmicos como as questões sobre o conceito de gênero, masculino e feminino, também com a formulação de um novo modelo de família e até mesmo as questões relacionadas com a iniciação sexual das crianças. Onde se encontra o equilíbrio entre o ensino adequado, a participação da família na formação do indivíduo e a participação da igreja ao apresentar os postulados cristãos como forma de orientação para seus membros?
As proposições relacionadas à educação devem seguir um processo de formação de conhecimentos e habilidades para tratar os temas complexos da sociedade. Tanto os que formulam as teorias do conhecimento, como aqueles que se propõem a aprender, fazem parte de um complexo sistema que deve desenvolver qualidade, ética e conhecimento técnico a respeito dos conceitos estudados. Cada curso tem a sua especificidade e, como tal, devem ser respeitados os métodos e normas que lhes são adequados.
A educação é direito fundamental previsto no artigo 6º da Constituição Federal, ou seja, está inserido dentre os direitos sociais. De acordo com o jurista “José Afonso da Silva, discorrendo acerca dos artigos 205 e 227 da Constituição Federal de 1988, salienta a necessidade de que o Estado amplie cada vez mais a garantia constitucional de acesso ao ensino, oportunizando a todos a possibilidade de exercê-lo em grau de igualdade, bem como, de que esse direito passe a ser interpretado como pleno e efetivo, reconhecendo ‘que é direito plenamente eficaz e de aplicabilidade imediata, isto é, exigível judicialmente, se não for prestado espontaneamente’.”[1]
De sua parte, os cristãos levam em conta os ensinamentos bíblicos: a educação cristã tem como ponto de partida a relação entre os pais e os filhos. O princípio fundamental é que os filhos sejam criados nos caminhos do Senhor (Efésios 6:4), e a palavra grega paideia ("criação") traz consigo a ideia de formação, educação, instrução e disciplina. Na medida em que os filhos são ensinados a respeito da crença em Deus eles vão aprendendo a honrar aos seus pais, valor esse inquestionável para qualquer família cristã. Por isso, a ideia de valores e ética ensinados de forma distorcida desse padrão bíblico não é aceita pelos cristãos.
Doutra feita a liberdade de cátedra ou liberdade acadêmica é um princípio que assegura a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber. Tem como finalidade a garantia do pluralismo de ideias e concepções no ensino, especialmente o universitário, bem como a autonomia didático-científica. A escola é o ambiente do contraditório; o espaço da sala de aula é o ambiente próprio para ensinar a crítica e a análise das questões diversas da vida, bem como a própria vida, a morte, a obediência, a bondade e a maldade, realidades que fazem parte da existência humana.
"Cátedra" é expressão que deriva do latim e significa cadeira magistral ou doutrinária e teve a sua inspiração na influência da própria cadeira de São Pedro, a chamada Cathedra, Cathedra Petri ou Cadeira de Pedro, conservada até os dias atuais na Basílica de São Pedro, por ser um símbolo da origem das palavras e conselhos magistrais e da sabedoria, razão que inspirou também ao contexto da atividade docente como um direito de defender suas ideias ou professar conhecimentos relacionados a sua formação.
Os termos relacionados ao conceito de “catedral” têm sua base nas doutrinas da igreja cristã, com conotações de autoridade, moral e intelectualidade. Jesus, no seu ministério e convivência com os apóstolos, transmitiu com sabedoria esse conceito que seguiu com o passar do tempo até aos cristãos contemporâneos. Na tradição católica, os bispos possuíam uma cadeira no seu local de ensino que era denominada cátedra – essa ideia também deu origem ao termo igreja como catedral.
Usualmente, pode-se aplicar esses conceitos relacionados à liberdade de cátedra como a liberdade de ensinar. Segundo o professor Moraes[2], liberdade de cátedra é um direito que o professor possui em que poderá exercer o ensino com liberdade e apresentar seus pensamentos para os estudantes, sem sofrer intervenção administrativa ressalvado o respeito ao currículo em que o docente tenha concordado no início do programa letivo.
“A liberdade de cátedra penetrou em nosso sistema constitucional pela Constituição de 1934 (art. 155), foi suprimida pela Carta de 1937 e restaurada pela Constituição de 1946 (art. 168, VII). A Carta de 1967 a manteve (art. 168, VI) e a de 1969 a restringiu profundamente (v. arts. 176, § 3º, VII e 154)”.[3]
A constituição brasileira prevê a liberdade de agir como valor e princípio. Destaca que todo cidadão tem o direito de livremente fazer ou não fazer o que for decorrente de suas escolhas, salvo quando uma lei determine o contrário. Relacionando o tema à docência, cabe aos professores respeitarem as ideologias ensinadas pelos pais sem tentar manipular ou coagir os estudantes a seguirem seus conjuntos de normas e valores. Para concluir, podemos afirmar que os docentes devem respeitar os pontos de vista religiosos, políticos e sociais de seus alunos, levando em conta os valores familiares que são a base da formação do indivíduo.
Notas
[1] RODRIGUES, Horácio Wanderlei; MOROCCO, Andréa de Almeida Leite. Liberdade de cátedra e a Constituição Federal de 1988: Alcance e limites da autonomia docente. Disponível em <https://abmes.org.br/arquivos/documentos/hwr_artigo2014-liberdadecatedra_unifor.pdf>. Acesso em 7 jan. 2019.
[2] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2007
[3] MELLO FILHO, José Celso. Constituição federal anotada, p. 418.
Notas
[1] RODRIGUES, Horácio Wanderlei; MOROCCO, Andréa de Almeida Leite. Liberdade de cátedra e a Constituição Federal de 1988: Alcance e limites da autonomia docente. Disponível em <https://abmes.org.br/arquivos/documentos/hwr_artigo2014-liberdadecatedra_unifor.pdf>. Acesso em 7 jan. 2019.
[2] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2007
[3] MELLO FILHO, José Celso. Constituição federal anotada, p. 418.
• Cícero Bezerra é coordenador do curso de bacharelado em teologia no Centro Universitário Uninter e do curso de bacharelado presencial da Faculdade de Teologia Betânia e faz parte da Confederação Brasileira de Pastores e da Aliança Cristã Evangélica Brasileira.
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