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Notícias

O cansaço questiona a potencialidade humana

Diálogos de Esperança realiza live sobre a sociedade do cansaço e o “shabat”

Por Lissânder Dias


“Vivemos no limite”, afirmou o pastor, teólogo em doutor em psicologia, Calvino Camargo, durante a live “O shabat e a sociedade do cansaço”, realizada nessa terça-feira, dia 18 de julho, pelo Diálogos de Esperança. Segundo o entrevistado, citando o filósofo Byung-Chul Han, a positividade tóxica elabora o discurso da alta performance que convence o ser humano a viver uma vida sempre no limite de suas possibilidades. “A positividade funciona hoje como se fosse uma droga, um doping, um movimento que insufla a vida e faz com que o ser humano aumente cada vez mais o nível de sua atividade para responder às exigências do seu tempo”. Para Calvino, esse estilo de vida, sempre no limite, nós chamamos de estresse (na Psiquiatria o termo é “transtorno do estresse pós-traumático”), e o cansaço é um dos sintomas do estresse. “O cansaço questiona a potencialidade do indivíduo e o faz duvidar de si mesmo”. afirmou ele, sintetizando Han.

A psicóloga Erika Nakano também foi uma das entrevistadas na live e ressaltou a distinção entre “cansaço” e “fadiga”. “Cansaço é visto mais como algo que pode ser geralmente aliviado por períodos de descanso. Já a fadiga não; ela está relacionada mais a uma sensação de exaustão”. Nakano destacou ainda que uma forte característica da sociedade atual é a contradição entre a hiperconectividade e a desconexão. “Não tenho uma única expressão para definir o nosso tempo, mas vivemos numa época de hiperconectividade, e, ao mesmo tempo, em uma profunda desconexão”.

O sagrado mandamento do descanso

Para Calvino, segundo os judeus, o “shabat” tem a ver com a eternidade sagrada. “Ele é considerado o momento no qual Deus se presentifica no dia e faz cessar toda obra humana – e animal. É o momento de experimentar a materialização da eternidade que se comunica num dia com a temporalidade humana”. E completa: “talvez isso, por si só, também seja ‘shalom’, a presentificação da paz”. Para ele, tanto o “shabat” quanto o “shalom” são contrapontos ao cansaço como sinal de sofrimento psíquico que atualmente contamina as relações consigo, com o próximo e com Deus. “O ‘shabat’ é o tempo para o sagrado e o tempo para a sacralidade da existência”, explicou.

Um dos dez mandamentos de Deus, o “shabat” tem um profundo significado para o homem moderno. “O "shabat" é uma prática contemplativa que eu procuro praticar com intencionalidade, mesmo que sejam alguns momentos durante a semana”, conta Erika. Ela também ressaltou que não devemos esperar realizar todo o trabalho para então praticar o “shabat”. “Como disse o rabino Abraham Joshua Heschel, em seu livro ‘O Schabat: seu significado para o homem moderno’: repouse no ‘shabat’ como se todo o seu trabalho tivesse sido feito”.

A igreja na sociedade do desempenho
Há espaço para a prática do "shabat" em nossas igrejas? Para Erika, se é uma igreja pautada na sociedade do desempenho, em programas e eventos, onde “quanto mais, melhor”, não, não há espaço. “Mas as igrejas espiritualmente saudáveis, que cultivam a vida interior e o equilíbrio entre a vida contemplativa e a vida comunitária, essas abrem espaço para o que chamo de ‘contemplativos contemporâneos’”, disse.



Calvino percebe uma dificuldade dos cristãos em colocar os conceitos em prática. “Nós, protestantes, trabalhamos relativamente bem com os conceitos teológicos, mas temos dificuldade de transformar esses conceitos em comportamento. O ‘shabat’ precisa ser pensado, e sobretudo vivido, como um momento de sobreposição da eternidade com a história humana. É tempo para adoração a Deus”.

Sobre a atuação da igreja, uma das pessoas que acompanhou a live, o Ednardo Nardim, questionou: “se Jesus disse ‘eu vos darei descanso’ por que há tanta gente cansada, inclusive de igreja?”. O psicólogo Ageu Lisboa comentou no chat uma resposta de Calvino: “Excelente a opinião do Calvino sobre o descanso para adorar, descansar e ter refrigério. Sacralizar a existência!”. Outro espectador da live, o teólogo Roney de Carvalho, perguntou: “Mesmo nos aprofundando na retórica do ‘shabat’, será que verdadeiramente os cristãos vivem dentro dessa lógica de dependência divina?”. Já a Madá Fernandes foi direta: “Por mais igrejas simples”.

Em síntese ao que foi falado na live, um dos âncoras, Valdir Steuernagel, assim encerrou: “Nós reconhecemos que o tema de hoje precisa não somente de mais reflexão, mas exige uma prática. E que o convite de Deus para o nosso ‘shabat’ nele é um convite para a adoração a Deus e para afirmar nossa própria qualidade de vida na comunidade entre os humanos e na natureza em que vivemos”.

Próxima live
A live “O shabat e a sociedade do cansaço” teve como âncoras Claudia Moreira e Valdir Steuernagel. Os “Diálogos de Esperança” são uma realização de quatro organizações cristãs: Aliança Evangélica, Editora Ultimato, Tearfund e Visão Mundial. As lives acontecem quinzenalmente por meio dos canais de transmissão da Editora Ultimato. A próxima será no dia 01 de agosto, às 19h, e terá como tema “O Amor em Movimento: 20 anos de RENAS”.
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Playlist do Diálogos de Esperança
Assista a todas as lives já realizadas aqui.

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Lissânder Dias do Amaral é jornalista, blogueiro, poeta e editor de livros. Integra o Conselho Nacional da Interserve Brasil e o Conselho da Unimissional. É autor de “O Cotidiano Extraordinário – a vida em pequenas crônicas” e responsável pelo blog Fatos e Correlatos do Portal Ultimato. É um dos fundadores do Movimento Vocare e ajudou a criar as organizações cristãs de cooperação Rede Mãos Dadas e Rede Evangélica Nacional de Ação Social (RENAS).

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